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Jurisprudência


TJPA 0002994-49.2003.8.14.0028

Ementa
GABINETE DESA. BRÍGIDA GONÇALVES DOS SANTOS ACÓRDÃO nº PROCESSO nº 2013.3.027384-2 TRIBUNAL PLENO Conflito de Competência SUSCITANTE: Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Marabá SUSCITADO: Juízo da 4ª Vara Penal da Comarca de Marabá PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA, em exercício: Miguel Ribeiro Baía RELATORA: Desa. Brígida Gonçalves dos Santos Vistos etc. Trata-se de Conflito Negativo de Competência suscitado pelo Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Marabá em face do Juízo da 4ª Vara Penal de Marabá, no curso da ação penal instaurada para apurar o delito de ato libidinoso diverso da conjunção carnal (art. 214, caput, c/c art. 224, a, do CPB) supostamente praticado pelo genitor contra sua filha menor, a qual possuía três anos de idade ao tempo do crime. Os autos foram distribuídos ao Juízo da 4ª Vara Penal de Marabá (Processo: 0002994-49.2003.814.0028), que recebeu a denúncia, no dia 23.03.2004 (fl. 42) e após o longo período de tramitação do feito naquela Vara, o ora Juízo suscitado, no dia 09.11.2011, declinou da competência em favor do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, por entender que os fatos narrados na exordial se adéquam ao art. 5º, II, da Lei nº 11.340/2006 (fl. 512). O Juízo Especializado, por seu turno, asseverou que o suposto delito havia ocorrido não em razão da violência de gênero, preconizada pela Lei em questão, mas sim diante da condição da ofendida de ser incapaz de resistir à ação delituosa, por ser criança, motivo pelo qual suscitou o presente Conflito Negativo de Competência, no dia 12.09.2013 (fls. 541/541-v). A Procuradoria Geral de Justiça se pronunciou pela declaração da competência do Juízo de Direito da 4ª Vara Penal de Marabá para processar e julgar o feito (fl. 548/552). É o relatório. Decido. O ponto central do Incidente se limita em verificar se o delito de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, supostamente praticado pelo genitor contra sua filha de três anos de idade ao tempo do crime, estaria compreendido ou não como violência doméstica e familiar contra a mulher. Sabe-se que a Lei 11.340/06 tem por escopo salvaguardar, coibir e reprimir as agressões (física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral) sofridas pela mulher no âmbito doméstico, familiar ou de afeto íntimo, vez que nessas hipóteses, em razão de seu gênero, a mesma se encontra em situação de vulnerabilidade, fragilidade e hipossuficiência, em relação ao agente, entendimento esse extraído da interpretação conjunta dos artigos 5º e 7º da referida Lei Especial. As lições de MARIA BERENICE DIAS são nessa direção (In A Lei Maria da Penha na justiça: a efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. São Paulo: RT, 2007, p. 40). In casu, a análise perfunctória dos autos, por meio dos depoimentos e das demais provas colhidos ao longo da instrução processual, permite constatar, ao menos em tese, que os fatos narrados na denúncia não se amoldam à esfera de incidência da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Isso porque, na hipótese, o delito sexual perpetrado, em tese, pelo genitor contra sua filha menor de três anos de idade não decorreu da condição de fragilidade e hipossuficiência da vítima em relação ao agressor, com base no gênero feminino, em um dos ambientes explicitados pela Lei (doméstico, familiar ou de afeto íntimo), mas sim da condição de vulnerabilidade da criança, por não ser capaz de resistir à alegada ação delituosa, em razão de sua imaturidade ou inexperiência. A propósito, em caso semelhante à espécie, quando do julgamento do Acórdão nº 99.035, de minha relatoria, este Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, já decidiu nesse mesmo sentido. Cito a ementa daquele julgado no que interessa: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - SUSCITANTE JUÍZO DA 3ª VARA DE JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE BELÉM - SUSCITADO JUÍZO DA 1ª VARA PENAL DOS INQUÉRITOS POLICIAIS DE BELÉM - ESTUPRO DE VULNERÁVEL - INAPLICABILIDADE DA LEI 11.340/06 - AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO DE GÊNERO - CRIME COMETIDO EM RAZÃO DA CONDIÇÃO DE CRIANÇA DA VÍTIMA (...) COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO À UNANIMIDADE. I - O espírito da Lei 11.340/06 foi o de salvaguardar, coibir e reprimir as agressões (física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral) sofridas pela mulher no âmbito doméstico, familiar ou de afeto íntimo, vez que nessas hipóteses a mesma se encontra em situação de vulnerabilidade, fragilidade e hipossuficiência em relação ao agente. II - In casu, o suposto fato praticado pelo genitor contra sua filha de 10 anos de idade, não está abarcado pela Lei Maria da Penha, pois não se valeu o agente da condição da vítima de ser mulher em um dos ambientes explicitados pela Lei. Em verdade, o suposto autor do fato/genitor aproveitou-se de seu poder familiar e da incapacidade de resistência de sua filha menor. Ou seja, utilizou-se da situação de vulnerabilidade da ofendida, enquanto criança, e não do fato de ser a mesma do gênero feminino, nos moldes disciplinados pela Lei 11.340/06. Logo, não se trata a hipótese de matéria afeta à competência da Vara Especializada de Violência Doméstica. (...) IV - Declarada a competência do Juízo Suscitado à unanimidade. (201130093557, 99035, Rel. BRIGIDA GONCALVES DOS SANTOS, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 06/07/2011, Publicado em 13/07/2011). (Grifei). Imperioso registrar que, em casos análogos à presente hipótese, todos originários daquela Comarca de Marabá, este C. Tribunal Pleno de forma reiterada tem se posicionado na mesma direção. Ou seja, declarando a competência do Juízo Penal Comum para processar e julgar os feitos nos quais, em teoria, vislumbra-se que o agente praticou contra a ofendida conduta ilícita que não se enquadra na violência de gênero preceituada pela Lei Maria da Penha, mas sim, na condição de fragilidade e imaturidade da vítima menor. Cito os precedentes desta Corte: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO DE DIREITO DA 5ª VARA PENAL E JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER, AMBOS DA COMARCA DE MARABÁ/PA. CRIME: ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ARTIGO 217-A, DO CPB. JUIZ NATURAL. COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA 5ª VARA PENAL DA COMARCA DE MARABÁ/PA. CONFLITO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. 1. A Lei nº 11.340/06 visa proteger e proibir, tanto quanto possível, a violência praticada contra mulher, no âmbito familiar, em razão da superioridade física e moral que acredita o homem possuir, ou seja, referida Lei possui direcionamento claro, qual seja, a proteção de gênero, e não qualquer violência ocorrida no seio familiar que demandaria a aplicação do Diploma Legal em comento, mas sim que o motivo da violência esteja indubitavelmente ligado à discriminação de gênero, o que não se vislumbra no caso em apreço. (201430013049, 132460, Rel. VANIA LUCIA SILVEIRA, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 23/04/2014, Publicado em 28/04/2014). (Grifei). CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER E VARA CRIMINAL COMUM. CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PROCEDÊNCIA DO CONFLITO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO PARA A ANÁLISE E JULGAMENTO DA CAUSA. DECISÃO UNÂNIME. 1. O artigo 5º da Lei 11.340/06 prevê como violência doméstica e familiar contra a mulher toda espécie de agressão, comissiva ou omissiva, baseada no gênero, vale dizer, na condição de hipossuficiência da mulher, suficiente a lhe causar morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. 2. Pela narrativa exposta na Denúncia (fls.2-4), não se constata, ao menos a princípio, que a fragilidade e a hipossuficiência proveniente do gênero da vítima, tenham sido os fatores determinantes para a prática do crime, mas sim a sua condição de adolescente, da qual decorrem a natural imaturidade e incapacidade de resistir à ação criminosa. Por tal razão deve ser afastada a aplicação diferenciada da Lei 11.340/06, restando a competência para julgamento do feito ao juízo comum/suscitado 4ª Vara Penal da Comarca de Marabá-Pa. 3. Conflito de Competência conhecido e provido. (201330241419, 126517, Rel. VERA ARAUJO DE SOUZA, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 13/11/2013, Publicado em 18/11/2013). (Grifei). CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. SUPOSTO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL PRATICADO CONTRA VÍTIMA MULHER. HIPÓTESE QUE NÃO SE AMOLDA AO ARTIGO 5º DA LEI 11.340/2006. 1. Pela análise dos autos verifica-se que a suposta violência sexual praticada contra vítima mulher não fora praticado em virtude da vulnerabilidade da vítima ou por causa de seu gênero, mas sim em decorrência de sua imaturidade ou inexperiência, não se amoldando assim a hipótese do artigo 5º da Lei 11.340/2006. 2. Competencia do Juízo suscitado da 4ª Vara Penal da Comarca de Marabá. (201330241394, 126195, Rel. MARIA DE NAZARE SILVA GOUVEIA DOS SANTOS, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 07/11/2013, Publicado em 08/11/2013). (Grifei). Assim, pelos motivos acima delineados e com fulcro nos reiterados precedentes do C. Tribunal Pleno, JULGO MONOCRATICAMENTE o Incidente, no sentido de conhecê-lo, para DECLARAR a competência do Juízo de Direito da 4ª Vara Penal de Marabá, ora Suscitado, para processar e julgar o feito. À Secretaria para as providências cabíveis. Belém, 09 de maio de 2014. Desembargadora BRÍGIDA GONÇALVES DOS SANTOS Relatora (2014.04532263-53, Não Informado, Rel. BRIGIDA GONCALVES DOS SANTOS, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 2014-05-09, Publicado em 2014-05-09)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 09/05/2014
Data da Publicação : 09/05/2014
Órgão Julgador : TRIBUNAL PLENO
Relator(a) : BRIGIDA GONCALVES DOS SANTOS
Número do documento : 2014.04532263-53
Tipo de processo : Conflito de Jurisdição
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