TJPA 0003186-58.2014.8.14.0104
1 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ GABINETE DESEMBARGADOR CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO 5.ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO ¿ Nº. 2014.3.027999-8 COMARCA: BREU BRANCO/PA AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ ¿ FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. PROCURADOR DO ESTADO: DIEGO LEÃO CASTELO BRANCO. ADVOGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. PROMOTOR DE JUSTIÇA: FRANCISCO CHARLES PACHECO TEIXEIRA. RELATOR: DES. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A Des. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO. EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CARÊNCIA DE DEFENSOR PÚBLICO NA COMARCA DE BREU BRANCO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. FIXAÇÃO DE ASTREINTE NA PESSOA DO DEFENDOR PÚBLICO GERAL. IMPOSSIBILIDADE. NÃO PARTICIPAÇÃO EFETIVA NO PROCESSO. PRECEDENTES STJ. DEMOSNTRAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO PELO ESTADO DE SEUS DEVERES CONSTITUCIONAIS. NÃO OCORRÊNCIA DE AFRONTA A SEPARAÇÃO CONSTITUCIONAL DOS PODERES. VIABILIZAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA AOS QUE NECESSITAM DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA ESTATAL. ARTIGO 5º, XXXV E LXXIV DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. POSSIBILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO REALIZAR CONTROLE JUDICIAL SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS. TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE NO CASO EM VERTENTE. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. IMPOSSIBILIDADE DA NOMEAÇÃO DE DEFENSOR ANTE A INEXISTÊNCIA DE CANDIDATOS APROVADOS A SEREM CONVOCADOS. MANUTENÇÃO DO VALOR DA MULTA COMINATÓRIA A SER APICADA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO. ART. 557, §1º-A DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto perante este Egrégio Tribunal de Justiça pelo ESTADO DO PARÁ ¿ FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL, nos autos da Ação Civil Pública (processo nº 0003186-58.2014.814.0104), que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ diante de seu inconformismo com a decisão prolatada pelo juízo monocrático da Vara Única de Breu Branco que deferiu o pedido de tutela antecipada pleiteado, determinando a nomeação de um defensor público ou a designação de um substituto para atuar perante a Comarca de Breu Branco, sob pena de multa diária de R$-12.000,00 (fls. 19/24). Razões às fls.02/18, tendo o Recorrente sustentado, em suma, pela impossibilidade de lotação imediata de defensor no município de Breu Branco, descabimento de ingerência do Poder Judiciário em políticas públicas, não preenchimento dos requisitos da tutela antecipada e pela impossibilidade de fixação de astreinte em face da fazenda pública e na pessoa do defensor público geral. Efeito suspensivo concedido por este Relator às fls. 164. Contrarrazões apresentadas às fls. 169/179. Manifestação do representante do Ministério Público em 2º grau às fls. 195/199, tendo este opinado no sentido de ser conhecido e parcialmente provido o recurso, afastando-se da decisão impugnada, apenas, a determinação de nomeação de Defensor Público, mantendo-se, todavia, a determinação de designação. É o sucinto relatório. Decido monocraticamente. Preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal, conheço do recurso. Ab initio, ressalto que a vedação de concessão de tutela antecipada em face da Fazenda Pública só encontra previsão de proibição nos casos expressamente previstos pela Lei nº 9.494/97. O caso em vertente se trata da determinação, em sede de antecipação de tutela, para que o Estado nomeie ou designe um Defensor Público para atuar na Comarca de Breu Branco. Consoante o STJ, as vedações previstas no art. 2o.-B da Lei 9.494/97 devem ser interpretadas restritivamente. Dessa forma, preenchidos os requisitos autorizadores de sua concessão, é admissível a antecipação dos efeitos da tutela em desfavor da Fazenda Pública, desde que a situação não esteja inserida nas vedações da supramencionada norma. Sobre o assunto, veja a jurisprudência da referida Corte de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. REINTEGRAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. REVISÃO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. SÚMULA 7/STJ. - Não merece amparo a alegação descabimento da concessão de antecipação de tutela, vez que o presente casu não se enquadra entre aqueles em que é vedada a concessão de antecipação de tutela contra a Fazenda Pública pela Lei 9.494/1997, já que se trata de reintegração de servidor público (v.g: REsp 688.780/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, DJ 14/03/2005). (AgRg no REsp 1455954 / PI, Relator Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, publicado em 28/10/2014) Sobre a possibilidade de fixação de astreinte contra a Fazenda Pública e também em face da pessoa do Defensor Público Geral, o Recorrente alega não ser cabível a imposição daquelas em face destes sujeitos, entretanto, tal alegação deve ser acolhida em parte, senão vejamos. No tocante a aplicação de multa cominatória em face do Estado do Pará pelo descumprimento da obrigação de fazer, a jurisprudência do C.STJ possui entendimento dominante no sentido de não haver óbice para a aplicação de astreinte contra a Fazenda Pública Estadual, a saber: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA POR DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. POSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 2. É permitido ao Juízo da execução aplicar multa cominatória ao devedor pelo atraso no cumprimento da obrigação de fazer, ainda que se trate da Fazenda Pública. (AgRg no AREsp 514609 / MT, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, publicado em 09/10/2014) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - RECURSO EPECIAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LOTEAMENTO IRREGULAR - MULTA DIÁRIA COMINATÓRIA - ASTREINTES - APLICABILIDADE CONTRA A FAZENDA PÚBLICA - POSSIBILIDADE. 1. Inexiste qualquer impedimento quanto a aplicação da multa diária cominatória, denominada astreintes, contra a Fazenda Pública, por descumprimento de obrigação de fazer. Inteligência do art. 461 do CPC. Precedentes. (REsp 1360305 / RS, Relator Min. ELIANA CALMON, publicado em 13/06/2013) Já no que pese a aplicação da astreinte contra a pessoa do Defensor Público Geral, de fato, não deve esta ser aplicada em face do representante maior da Defensoria Pública do Estado do Pará. As decisões mais recentes do STJ referentes ao tema, constatam que o entendimento do Tribunal Superior está firmado no sentido de que: a pessoa do representante e da entidade pública não se confundem, não sendo possível também a aplicação de multa cominatória a quem não tenha participado efetivamente do processo, o que se amolda ao caso concreto, uma vez que apesar da multa cominatória ter sido imposta ao defensor público geral, a presente ação foi proposta contra o Estado do Pará, pelo que resta inviabilizada a aplicação da multa. Neste sentido, transcrevo os seguintes precedentes do STJ e deste E. Tribunal: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ALEGADA ILEGITIMIDADE PASSIVA. AFASTADA. CONTRARIEDADE AO ART. 461, § 2.º DO CODEX PROCESSUAL. MULTA COMINATÓRIA NA PESSOA DO REPRESENTANTE DA ENTIDADE PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A Procuradoria-Geral do Distrito Federal, no rol das competências determinadas na Lei Complementar n.º 395/2001, está autorizada a promover a defesa dos ocupantes de cargos de Governador e Secretário em processos judiciais decorrentes de atos praticados no exercício da função 2. O entendimento deste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que as pessoas do representante e da entidade pública não se confundem e, portanto, não é possível aplicar multa cominatória a quem não participou efetivamente do processo. Precedentes. 3. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 847907/DF, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 05/05/2011, DJe 16/11/2011) PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE FAZER. DESCUMPRIMENTO. ASTREINTES. APLICAÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. CABIMENTO. EXTENSÃO DA MULTA DIÁRIA AOS REPRESENTANTES DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme jurisprudência firmada no âmbito desta Corte, a previsão de multa cominatória ao devedor na execução imediata destina-se, de igual modo, à Fazenda Pública. Precedentes. 2. A extensão ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda Pública, ainda que revestida do motivado escopo de dar efetivo cumprimento à ordem mandamental, está despida de juridicidade. 3. As autoridades coatoras que atuaram no mandado de segurança como substitutos processuais não são parte na execução, a qual dirige-se à pessoa jurídica de direito publico interno. 4. A norma que prevê a adoção da multa como medida necessária à efetividade do título judicial restringe-se ao réu, como se observa do § 4º do art. 461 do Códex Instrumental. 5. Recurso especial provido. (REsp 747371/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 26/04/2010). Sobre a questão central que envolve a controvérsia, tal seja a da nomeação ou designação de um Defensor Público para atuar perante a Comarca de Breu Branco, verifica-se, dos documentos juntados aos autos do presente agravo de instrumento, o seguinte. Como alegado na exordial da ação civil pública (fls. 27/57), bem como constatado pelo juiz de piso segundo os documentos juntados pelo Autor, percebe-se que ao tempo da prolação da decisão monocrática, tramitava sob patrocínio da Defensoria Pública no Fórum de Breu Branco aproximadamente 2.000 processos, bem como de que a referida Comarca possui cerca de 60 mil habitantes e encontra-se, atualmente, desprovida da atuação de qualquer representante do referido Órgão Público. Por conseguinte, a Comarca de Tucuruí, a qual é vizinha de Breu Branco, possui 90 mil habitantes e, diferentemente da situação desta Comarca, Aquela está lotada com 05 defensores públicos. Ademais, percebe-se que consoante o ofício de fls. 64, o qual foi dirigido ao juiz de piso pelo Defensor Público Titular da 1ª DP cível de Tucuruí, não haveria previsão para que a Comarca de Breu Branco fosse abrangida com o atendimento de assistência judiciária pelo Estado do Pará. Em contrapartida, ainda que não se aplique a Fazenda Pública a obrigatoriedade de impugnação específica dos fatos ventilados na inicial (interpretação retirada do art. 302, I do CPC acrescido com o entendimento proferido no AgRg no REsp 1187684 / SP pelo Min. Humberto Martins, do STJ), fato este que impede admitir como incontroverso os fatos não impugnados, percebe-se que o Ente Estatal não se preocupou em nenhum momento em sopesar a razão do descumprimento dos deveres constitucionais impostos ao Estado pelos artigos, 5º, LXXIV e XXXV da Constituição Federal, os quais preconizam: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos; Não se pode perder de perspectiva que a frustração do acesso ao aparelho judiciário do Estado, motivada pela injusta omissão do Poder Público ¿ que, sem razão, deixa de adimplir o dever de conferir expressão concreta à norma constitucional que assegura, aos necessitados, o direito à orientação jurídica e à assistência judiciária ¿, culmina por gerar situação socialmente intolerável e juridicamente inaceitável. A Constituição ¿ e sua força normativa ¿ evidentemente não podem pender inertes à míngua de instrumentos processuais que viabilizem sua concretização. Partindo da premissa, é perfeitamente possível ao Poder Judiciário, através da regular prestação jurisdicional, condenar o Estado a uma obrigação de fazer, em ação civil pública, na tutela de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, distribuídos em diversas áreas, como Saúde, Meio Ambiente, Consumidor, Patrimônio e, porque não dizer, Políticas Públicas, cuja razão de existir também é a sociedade. Ora, admitir tese afastando as referidas ¿políticas públicas¿ de qualquer controle judicial ¿ cuja sede adequada, por suas características especiais, é a ação civil pública ¿ redundaria em liberdade irrestrita ao administrador, com a minimização ou mesmo supressão de normas constitucionais, relegando seu cumprimento a plano secundário, a depender da discricionariedade administrativa e das prioridades estabelecidas pelo poder público. Esta, por certo, não é a finalidade do art. 2º, da CF/88, o qual prevê a independência entre os três poderes. Não podemos olvidar também que consoante o artigo 134 da CF, a Defensoria Pública é instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado. Isso posto, se trata aquela de um órgão especificamente voltado para a implementação de políticas públicas de assistência jurídica, assim no campo administrativo como no judicial, pelo que, sob este último prisma, se revela como instrumento de democratização do acesso às instâncias judiciárias, de modo a efetivar o valor constitucional da universalização da justiça (inciso XXXV do art. 5º da CF), fazendo de tal acesso um direito que se desfruta às expensas do Estado, em ordem a se postarem - as defensorias - como um luminoso ponto de interseção do constitucionalismo liberal com o social. Sobre a legitimidade do Poder Judiciário intervir em temas referentes as políticas públicas, a nossa Suprema Corte já se manifestou em sentido positivo, a saber: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA ¿RESERVA DO POSSÍVEL¿. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO ¿MÍNIMO EXISTENCIAL¿. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO). (ADPF 45 MC / DF, Relator Min. CELSO DE MELLO, publicado em 04/05/2004) O Agravante ainda ventila em seu recurso sobre a impossibilidade de concessão da tutela antecipada ante o requisito da verossimilhança da alegação, eis que se trata de nítida hipótese de atendimento imediato do pleito inicial, consoante a aplicação da teoria da reserva do possível. Sobre a referida teoria, sabe-se que ela surgiu no Tribunal Constitucional Alemão, tendo esta Corte entendido que o direito a prestação positiva encontra-se sujeita à reserva do possível, no sentido daquilo que o indivíduo pode esperar, de maneira racional, da sociedade. Ou seja, a argumentação adotada refere-se à razoabilidade da pretensão. Na análise de Ingo SARLET, o Tribunal alemão entendeu que ¿(...) a prestação reclamada deve corresponder ao que o indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade, de tal sorte que, mesmo em dispondo o estado de recursos e tendo poder de disposição, não se pode falar em uma obrigação de prestar algo que não se mantenha nos limites do razoável¿. (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 265.) Ocorre que a teoria da reserva do possível ¿ ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível ¿ não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido essencialmente fundamental. Sobre o assunto, além da aplicação do chamado ¿mínimo existencial¿ para contrapor a teoria da reserva do possível, a Suprema Corte, em casos de violação de preceitos constitucionais fundamentais, vem utilizando-se da teoria da restrição das restrições, conhecida também como teoria do limite dos limites. Nesse sentido, colaciono abaixo trecho do voto do Min. Celso de Mello proferido no AgRg no RE de nº 763.667 / CE: ¿Não se mostrará lícito , contudo, ao Poder Público , criar obstáculo artificial que revele ¿ a partir de indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa ¿ o arbitrário, ilegítimo e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência e de gozo de direitos fundamentais (ADPF 45/DF , Rel. Min. CELSO DE MELLO, Informativo/STF nº 345/2004), a significar, portanto, que se revela legítima a possibilidade de controle jurisdicional da invocação estatal da cláusula da ¿ reserva do possível ¿, considerada , para tanto , a teoria das ¿ restrições das restrições ¿, segundo a qual ¿ consoante observa LUÍS FERNANDO SGARBOSSA (`Crítica à Teoria dos Custos dos Direitos¿, vol. 1/273-274, item n. 2, 2010, Fabris Editor) ¿ as limitações a direitos fundamentais, como o de que ora se cuida, sujeitam-se, em seu processo hermenêutico , a uma exegese necessariamente restritiva, sob pena de ofensa a determinados parâmetros de índole constitucional, como, p. ex. , aqueles fundados na proibição de retrocesso social, na proteção ao mínimo existencial (que deriva do princípio da dignidade da pessoa humana), na vedação da proteção insuficiente e, também, na proibição de excesso. Cumpre advertir, desse modo, na linha de expressivo magistério doutrinário (OTÁVIO HENRIQUE MARTINS PORT, `Os Direitos Sociais e Econômicos e a Discricionariedade da Administração Pública¿, p. 105/110, item n. 6, e p. 209/211, itens ns. 17-21, 2005, RCS Editora Ltda., v.g.), que a cláusula da `reserva do possível¿ ¿ ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível ¿ não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.¿ Por fim, no tocante ao valor da multa, faço as seguintes ponderações. Levando em consideração a finalidade da multa prevista no artigo 461, § 4º do CPC, a decisão agravada deve ser mantida. Primeiro, porque a jurisprudência reiterada do C. STJ admite a cominação da multa diária para o caso do não cumprimento de determinação judicial. Segundo, porque o seu valor deve ser fixado com a observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade os quais foram atendidos, haja vista o porte da instituição financeira. Com efeito, o escopo da multa do artigo 461, § 4º do CPC é compelir a parte ao cumprimento da ordem judicial emprestando, assim, efetividade ao processo e à vontade do Estado. Constituindo meio coativo imposto ao devedor, deve ser estipulada em valor que o "estimule" psicologicamente a evitar o prejuízo advindo da desobediência ao comando judicial. A coação tem que ser efetiva. Ou seja, a desobediência não vai ser mensurada proporcionalmente ao valor atribuído à causa ou ao prejuízo causado pelo inadimplemento, pois o que se pretende preservar é a autoridade do comando estatal para a efetividade e eficácia da prestação da tutela jurisdicional. Sobre o tema Cândido Rangel Dinamarco ao afirma que: ¿Esse tipo de multa que o juiz pode aplicar ex oficio, aproxima-se ao instituto contempt of court ou escárnio ao tribunal, considerando que o desrespeito à decisão judicial é mais da lesão individual ao direito do credor; arranha a autoridade judicial.¿ (DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma do CPC. São Paulo:Malheiros Editores, 1995, p. 157) Da mesma opinião, é o Professor Nélson Nery: ¿(...)deve ser imposta a multa, de ofício ou a requerimento da parte. O valor deve ser significativamente alto, justamente porque tem natureza inibitória. O juiz não deve ficar com receio de fixar o valor em quantia alta, pensando no pagamento.¿ (NERY JÚNIOR. Nélson e ANDRADE NERY, Rosa Maria de. Código de Processo Civil Comentado. 6º Edição, São Paulo: RT, 2002) Sendo esse o contexto, é de se concluir que foram observados o princípio da proporcionalidade e o da razoabilidade, pois o valor de R$-12.000,00 com certeza não ultrapassa a capacidade de solvência do Estado Agravante sendo, ao mesmo tempo, elevado o suficiente a compeli-lo a manter-se obediente à ordem judicial. É assim que deve ser. É esse o espírito da norma. Para corroborar com o pensamento, trago entendimento dominante do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ASTREINTE. VALOR INSUFICIENTE. LIMINAR OBTIDA. EXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO SUSPENSA. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE EXECUÇÃO COM FUNDAMENTO EM CONTRATO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. EXIGIBILIDADE SUSPENSA. NEGATIVAÇÃO NO SERASA. CONSEQUÊNCIA DIRETA DO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO. DESCASO DO DEVEDOR. DESCUMPRIMENTO QUE PERSISTE. GRANDE CAPACIDADE ECONÔMICA DO EXECUTADO. PEDIDO DE MAJORAÇÃO. DEFERIMENTO. MULTA COMINATÓRIA MAJORADA. 3. A astreinte deve, em consonância com as peculiaridades de cada caso, ser elevada o suficiente a inibir o devedor ¿ que intenciona descumprir a obrigação ¿ e sensibilizá-lo de que é muito mais vantajoso cumpri-la do que pagar a respectiva pena pecuniária. (REsp 1185260, Relatora Minª. NANCY ANDRIGUI, 3ª Turma, publicado em 11/11/2010) Ademais, o próprio CPC, em seu art. 461, §6º, prevê a possibilidade do juiz, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva. Sobre tal dispositivo, o Professor Nelson Nery Leciona: ¿A periodicidade e o aumento da multa se justificam pelo fato de ser a multa medida de execução indireta, destinada a forçar o devedor a cumprir a obrigação; a diminuição da multa é injustificável, porque a multa não é destinada a fazer com que o devedor a pague, mas que a não pague e cumpra a obrigação na forma específica.¿ (NERY JUNIOR. Nelson. NERY. Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 12ª Ed. São Paulo: RT, 2012.) Destarte, por todo o exposto, uma vez que se encontram preenchidos os requisitos autorizadores da concessão da tutela antecipada, tais sejam o da prova inequívoca da ausência de implementação pelo Poder Estatal da assistência judiciária aos hipossuficientes, bem como do dano irreparável que tal omissão pode vir a ocasionar com o passar do tempo, entendo por bem manter a decisão que antecipou os efeitos da tutela, entretanto, assim como salientado pelo Representante do parquet em segundo grau, a obrigação que deve constar no decisium é apenas a referente a designação de um defensor público para a Comarca de Breu Branco, eis que é incontestável a impossibilidade material da nomeação de um defensor público para atuar perante esta comarca, pois não há candidatos aprovados pendentes se serem nomeados, referentes ao último concurso para provimento de cargos de defensor público. Por fim, colaciono abaixo o entendimento do STJ e do STF proferidos em casos idênticos ao ora analisados, tais sejam o da possibilidade do Poder Judiciário determinar obrigação de fazer à Fazenda Pública Estadual, para que esta designe defensor público para atuar em comarca desprovida de assistência judicial aos hipossuficientes: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESIGNAÇÃO DE DEFENSOR PÚBLICO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA ESTATAL (ART. 5º. LXXIV, DF/88). ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. 1. É possível a concessão de antecipação dos efeitos da tutela em face da Fazenda Pública, como instrumento de efetividade e celeridade da prestação jurisdicional, sendo certo que a regra proibitiva, encartada no art. 1º, da Lei 9.494/97, reclama exegese estrita, por isso que, onde não há limitação não é lícito ao magistrado entrevê-la. Precedentes do STJ: AgRg no REsp 945.775/DF, QUINTA TURMA, DJ de 16/02/2009; AgRg no REsp 726.697/PE, SEGUNDA TURMA, DJ de 18/12/2008; AgRg no Ag 892.406/PI, QUINTA TURMA, DJ 17/12/2007; AgRg no REsp 944.771/MA, SEGUNDA TURMA, DJ De 31/10/2008; MC 10.613/RJ, Rel. PRIMEIRA TURMA, DJ 08/11/2007; AgRg no Ag 427600/PA, PRIMEIRA TURMA, DJ 07/10/2002. 2. A tutela reversível não esgota o objeto da demanda proposta ab origine, a qual objetiva a designação de Defensor Público para a Comarca de Aripuanã-MT. 3. O aresto que confirma a tutela de urgência sob fundamento de que inocorreu afronta à separação constitucional dos poderes, mercê de ter afirmado a cláusula pétrea do acesso à justiça, contém fundamentos insindicáveis pelo Superior Tribunal de Justiça. 4. É assente no Egrégio Superior Tribunal de Justiça que: "É possível a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública desde que a pretensão autoral não verse sobre reclassificação, equiparação, aumento ou extensão de vantagens pecuniárias de servidores públicos ou concessão de pagamento de vencimentos' (REsp 945.775/DF, QUINTA TURMA, DJ de 16/02/2009) 5. Hipótese de antecipação dos efeitos da tutela concedida nos autos de Ação Civil Pública, promovida pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, para determinar que o demandado providenciasse, no prazo de vinte dias, a designação de Defensor Público para a Comarca de Aripuanã-MT, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$-15.000,00 na hipótese de descumprimento (fls. 12/19). 6. In casu, o bem jurídico tutelado - direito à assistência judiciária estatal assegurado pela Constituição Federal em seu art. 5º, LXXIV - transcende à proibição erigida quanto ao deferimento da tutela de urgência. (STJ - RESp 934138 / MT, Relator Min. LUIZ FUX, publicado em 04/12/2009) DEFENSORIA PÚBLICA ¿ DIREITO DAS PESSOAS NECESSITADAS AO ATENDIMENTO INTEGRAL, NA COMARCA EM QUE RESIDEM, PELA DEFENSORIA PÚBLICA ¿ PRERROGATIVA FUNDAMENTAL COMPROMETIDA POR RAZÕES ADMINISTRATIVAS QUE IMPÕEM, ÀS PESSOAS CARENTES, NO CASO, A NECESSIDADE DE CUSTOSO DESLOCAMENTO PARA COMARCA PRÓXIMA ONDE A DEFENSORIA PÚBLICA SE ACHA MAIS BEM ESTRUTURADA ¿ ÔNUS FINANCEIRO, RESULTANTE DESSE DESLOCAMENTO, QUE NÃO PODE, NEM DEVE, SER SUPORTADO PELA POPULAÇÃO DESASSISTIDA ¿ IMPRESCINDIBILIDADE DE O ESTADO PROVER A DEFENSORIA PÚBLICA LOCAL COM MELHOR ESTRUTURA ADMINISTRATIVA ¿ MEDIDA QUE SE IMPÕE PARA CONFERIR EFETIVIDADE À CLÁUSULA CONSTITUCIONAL INSCRITA NO ART. 5º, INCISO LXXIV, DA LEI FUNDAMENTAL DA REPÚBLICA ¿ OMISSÃO ESTATAL QUE COMPROMETE E FRUSTRA DIREITOS FUNDAMENTAIS DE PESSOAS NECESSITADAS ¿ SITUAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE INTOLERÁVEL ¿ O RECONHECIMENTO, EM FAVOR DE POPULAÇÕES CARENTES E DESASSISTIDAS, POSTAS À MARGEM DO SISTEMA JURÍDICO, DO ¿DIREITO A TER DIREITOS¿ COMO PRESSUPOSTO DE ACESSO AOS DEMAIS DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS ¿ INTERVENÇÃO JURISDICIONAL CONCRETIZADORA DE PROGRAMA CONSTITUCIONAL DESTINADO A VIABILIZAR O ACESSO DOS NECESSITADOS À ORIENTAÇÃO JURÍDICA INTEGRAL E À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITAS (CF, ART. 5º, INCISO LXXIV, E ART. 134) ¿ LEGITIMIDADE DESSA ATUAÇÃO DOS JUÍZES E TRIBUNAIS ¿ O PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS INSTITUÍDAS PELA CONSTITUIÇÃO E NÃO EFETIVADAS PELO PODER PÚBLICO ¿ A FÓRMULA DA RESERVA DO POSSÍVEL NA PERSPECTIVA DA TEORIA DOS CUSTOS DOS DIREITOS: IMPOSSIBILIDADE DE SUA INVOCAÇÃO PARA LEGITIMAR O INJUSTO INADIMPLEMENTO DE DEVERES ESTATAIS DE PRESTAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE IMPOSTOS AO ESTADO ¿ A TEORIA DA ¿RESTRIÇÃO DAS RESTRIÇÕES¿ (OU DA ¿LIMITAÇÃO DAS LIMITAÇÕES¿) ¿ CONTROLE JURISDICIONAL DE LEGITIMIDADE SOBRE A OMISSÃO DO ESTADO: ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO JUDICIAL QUE SE JUSTIFICA PELA NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE CERTOS PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS (PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL, PROTEÇÃO AO MÍNIMO EXISTENCIAL, VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E PROIBIÇÃO DE EXCESSO) ¿ DOUTRINA ¿ PRECEDENTES ¿ A FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA E A ESSENCIALIDADE DESSA INSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA ¿ RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. (STF - RE 763667 AgR / CE, Relator Min. CELSO DE MELLO, publicado em 13/12/2013) ASSIM, CONHEÇO E DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de agravo de instrumento interposto pelo Estado do Pará, ex vi do art. 557, §1º-A do CPC, para: a) Excluir a pessoa do Defensor Público Geral do ônus de suportar o pagamento da astreinte fixada em caso de descumprimento da obrigação de fazer imposta pela decisão ora guerreada. b) Retirar, da decisão agravada, a obrigação de fazer referente a nomeação de um Defensor Público para atuar na Comarca de Breu Branco, devendo permanecer no decisium a obrigação de designar um substituto para atuar no referido município. c) Consoante o que preceitua o art. 461, §4º do CPC, fixo o prazo razoável de 20 dias, para o cumprimento da obrigação de fazer. P.R.I. Oficie-se no que couber. Após o trânsito em julgado, remetam-se os autos ao juízo ¿a quo¿. Belém/PA, 20 de março de 2015. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO Desembargador ¿ Relator 1 ________________________________________________________________________________Gabinete Desembargador CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO
(2015.00957968-24, Não Informado, Rel. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2015-03-24, Publicado em 2015-03-24)
Ementa
1 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ GABINETE DESEMBARGADOR CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO 5.ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO ¿ Nº. 2014.3.027999-8 COMARCA: BREU BRANCO/PA AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ ¿ FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. PROCURADOR DO ESTADO: DIEGO LEÃO CASTELO BRANCO. ADVOGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. PROMOTOR DE JUSTIÇA: FRANCISCO CHARLES PACHECO TEIXEIRA. RELATOR: DES. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A Des. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CARÊNCIA DE DEFENSOR PÚBLICO NA COMARCA DE BREU BRANCO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. FIXAÇÃO DE ASTREINTE NA PESSOA DO DEFENDOR PÚBLICO GERAL. IMPOSSIBILIDADE. NÃO PARTICIPAÇÃO EFETIVA NO PROCESSO. PRECEDENTES STJ. DEMOSNTRAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO PELO ESTADO DE SEUS DEVERES CONSTITUCIONAIS. NÃO OCORRÊNCIA DE AFRONTA A SEPARAÇÃO CONSTITUCIONAL DOS PODERES. VIABILIZAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA AOS QUE NECESSITAM DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA ESTATAL. ARTIGO 5º, XXXV E LXXIV DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. POSSIBILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO REALIZAR CONTROLE JUDICIAL SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS. TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE NO CASO EM VERTENTE. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. IMPOSSIBILIDADE DA NOMEAÇÃO DE DEFENSOR ANTE A INEXISTÊNCIA DE CANDIDATOS APROVADOS A SEREM CONVOCADOS. MANUTENÇÃO DO VALOR DA MULTA COMINATÓRIA A SER APICADA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO. ART. 557, §1º-A DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto perante este Egrégio Tribunal de Justiça pelo ESTADO DO PARÁ ¿ FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL, nos autos da Ação Civil Pública (processo nº 0003186-58.2014.814.0104), que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ diante de seu inconformismo com a decisão prolatada pelo juízo monocrático da Vara Única de Breu Branco que deferiu o pedido de tutela antecipada pleiteado, determinando a nomeação de um defensor público ou a designação de um substituto para atuar perante a Comarca de Breu Branco, sob pena de multa diária de R$-12.000,00 (fls. 19/24). Razões às fls.02/18, tendo o Recorrente sustentado, em suma, pela impossibilidade de lotação imediata de defensor no município de Breu Branco, descabimento de ingerência do Poder Judiciário em políticas públicas, não preenchimento dos requisitos da tutela antecipada e pela impossibilidade de fixação de astreinte em face da fazenda pública e na pessoa do defensor público geral. Efeito suspensivo concedido por este Relator às fls. 164. Contrarrazões apresentadas às fls. 169/179. Manifestação do representante do Ministério Público em 2º grau às fls. 195/199, tendo este opinado no sentido de ser conhecido e parcialmente provido o recurso, afastando-se da decisão impugnada, apenas, a determinação de nomeação de Defensor Público, mantendo-se, todavia, a determinação de designação. É o sucinto relatório. Decido monocraticamente. Preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal, conheço do recurso. Ab initio, ressalto que a vedação de concessão de tutela antecipada em face da Fazenda Pública só encontra previsão de proibição nos casos expressamente previstos pela Lei nº 9.494/97. O caso em vertente se trata da determinação, em sede de antecipação de tutela, para que o Estado nomeie ou designe um Defensor Público para atuar na Comarca de Breu Branco. Consoante o STJ, as vedações previstas no art. 2o.-B da Lei 9.494/97 devem ser interpretadas restritivamente. Dessa forma, preenchidos os requisitos autorizadores de sua concessão, é admissível a antecipação dos efeitos da tutela em desfavor da Fazenda Pública, desde que a situação não esteja inserida nas vedações da supramencionada norma. Sobre o assunto, veja a jurisprudência da referida Corte de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. REINTEGRAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. REVISÃO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. SÚMULA 7/STJ. - Não merece amparo a alegação descabimento da concessão de antecipação de tutela, vez que o presente casu não se enquadra entre aqueles em que é vedada a concessão de antecipação de tutela contra a Fazenda Pública pela Lei 9.494/1997, já que se trata de reintegração de servidor público (v.g: REsp 688.780/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, DJ 14/03/2005). (AgRg no REsp 1455954 / PI, Relator Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, publicado em 28/10/2014) Sobre a possibilidade de fixação de astreinte contra a Fazenda Pública e também em face da pessoa do Defensor Público Geral, o Recorrente alega não ser cabível a imposição daquelas em face destes sujeitos, entretanto, tal alegação deve ser acolhida em parte, senão vejamos. No tocante a aplicação de multa cominatória em face do Estado do Pará pelo descumprimento da obrigação de fazer, a jurisprudência do C.STJ possui entendimento dominante no sentido de não haver óbice para a aplicação de astreinte contra a Fazenda Pública Estadual, a saber: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA POR DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. POSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 2. É permitido ao Juízo da execução aplicar multa cominatória ao devedor pelo atraso no cumprimento da obrigação de fazer, ainda que se trate da Fazenda Pública. (AgRg no AREsp 514609 / MT, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, publicado em 09/10/2014) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - RECURSO EPECIAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LOTEAMENTO IRREGULAR - MULTA DIÁRIA COMINATÓRIA - ASTREINTES - APLICABILIDADE CONTRA A FAZENDA PÚBLICA - POSSIBILIDADE. 1. Inexiste qualquer impedimento quanto a aplicação da multa diária cominatória, denominada astreintes, contra a Fazenda Pública, por descumprimento de obrigação de fazer. Inteligência do art. 461 do CPC. Precedentes. (REsp 1360305 / RS, Relator Min. ELIANA CALMON, publicado em 13/06/2013) Já no que pese a aplicação da astreinte contra a pessoa do Defensor Público Geral, de fato, não deve esta ser aplicada em face do representante maior da Defensoria Pública do Estado do Pará. As decisões mais recentes do STJ referentes ao tema, constatam que o entendimento do Tribunal Superior está firmado no sentido de que: a pessoa do representante e da entidade pública não se confundem, não sendo possível também a aplicação de multa cominatória a quem não tenha participado efetivamente do processo, o que se amolda ao caso concreto, uma vez que apesar da multa cominatória ter sido imposta ao defensor público geral, a presente ação foi proposta contra o Estado do Pará, pelo que resta inviabilizada a aplicação da multa. Neste sentido, transcrevo os seguintes precedentes do STJ e deste E. Tribunal: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ALEGADA ILEGITIMIDADE PASSIVA. AFASTADA. CONTRARIEDADE AO ART. 461, § 2.º DO CODEX PROCESSUAL. MULTA COMINATÓRIA NA PESSOA DO REPRESENTANTE DA ENTIDADE PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A Procuradoria-Geral do Distrito Federal, no rol das competências determinadas na Lei Complementar n.º 395/2001, está autorizada a promover a defesa dos ocupantes de cargos de Governador e Secretário em processos judiciais decorrentes de atos praticados no exercício da função 2. O entendimento deste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que as pessoas do representante e da entidade pública não se confundem e, portanto, não é possível aplicar multa cominatória a quem não participou efetivamente do processo. Precedentes. 3. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 847907/DF, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 05/05/2011, DJe 16/11/2011) PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE FAZER. DESCUMPRIMENTO. ASTREINTES. APLICAÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. CABIMENTO. EXTENSÃO DA MULTA DIÁRIA AOS REPRESENTANTES DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme jurisprudência firmada no âmbito desta Corte, a previsão de multa cominatória ao devedor na execução imediata destina-se, de igual modo, à Fazenda Pública. Precedentes. 2. A extensão ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda Pública, ainda que revestida do motivado escopo de dar efetivo cumprimento à ordem mandamental, está despida de juridicidade. 3. As autoridades coatoras que atuaram no mandado de segurança como substitutos processuais não são parte na execução, a qual dirige-se à pessoa jurídica de direito publico interno. 4. A norma que prevê a adoção da multa como medida necessária à efetividade do título judicial restringe-se ao réu, como se observa do § 4º do art. 461 do Códex Instrumental. 5. Recurso especial provido. (REsp 747371/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 26/04/2010). Sobre a questão central que envolve a controvérsia, tal seja a da nomeação ou designação de um Defensor Público para atuar perante a Comarca de Breu Branco, verifica-se, dos documentos juntados aos autos do presente agravo de instrumento, o seguinte. Como alegado na exordial da ação civil pública (fls. 27/57), bem como constatado pelo juiz de piso segundo os documentos juntados pelo Autor, percebe-se que ao tempo da prolação da decisão monocrática, tramitava sob patrocínio da Defensoria Pública no Fórum de Breu Branco aproximadamente 2.000 processos, bem como de que a referida Comarca possui cerca de 60 mil habitantes e encontra-se, atualmente, desprovida da atuação de qualquer representante do referido Órgão Público. Por conseguinte, a Comarca de Tucuruí, a qual é vizinha de Breu Branco, possui 90 mil habitantes e, diferentemente da situação desta Comarca, Aquela está lotada com 05 defensores públicos. Ademais, percebe-se que consoante o ofício de fls. 64, o qual foi dirigido ao juiz de piso pelo Defensor Público Titular da 1ª DP cível de Tucuruí, não haveria previsão para que a Comarca de Breu Branco fosse abrangida com o atendimento de assistência judiciária pelo Estado do Pará. Em contrapartida, ainda que não se aplique a Fazenda Pública a obrigatoriedade de impugnação específica dos fatos ventilados na inicial (interpretação retirada do art. 302, I do CPC acrescido com o entendimento proferido no AgRg no REsp 1187684 / SP pelo Min. Humberto Martins, do STJ), fato este que impede admitir como incontroverso os fatos não impugnados, percebe-se que o Ente Estatal não se preocupou em nenhum momento em sopesar a razão do descumprimento dos deveres constitucionais impostos ao Estado pelos artigos, 5º, LXXIV e XXXV da Constituição Federal, os quais preconizam: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos; Não se pode perder de perspectiva que a frustração do acesso ao aparelho judiciário do Estado, motivada pela injusta omissão do Poder Público ¿ que, sem razão, deixa de adimplir o dever de conferir expressão concreta à norma constitucional que assegura, aos necessitados, o direito à orientação jurídica e à assistência judiciária ¿, culmina por gerar situação socialmente intolerável e juridicamente inaceitável. A Constituição ¿ e sua força normativa ¿ evidentemente não podem pender inertes à míngua de instrumentos processuais que viabilizem sua concretização. Partindo da premissa, é perfeitamente possível ao Poder Judiciário, através da regular prestação jurisdicional, condenar o Estado a uma obrigação de fazer, em ação civil pública, na tutela de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, distribuídos em diversas áreas, como Saúde, Meio Ambiente, Consumidor, Patrimônio e, porque não dizer, Políticas Públicas, cuja razão de existir também é a sociedade. Ora, admitir tese afastando as referidas ¿políticas públicas¿ de qualquer controle judicial ¿ cuja sede adequada, por suas características especiais, é a ação civil pública ¿ redundaria em liberdade irrestrita ao administrador, com a minimização ou mesmo supressão de normas constitucionais, relegando seu cumprimento a plano secundário, a depender da discricionariedade administrativa e das prioridades estabelecidas pelo poder público. Esta, por certo, não é a finalidade do art. 2º, da CF/88, o qual prevê a independência entre os três poderes. Não podemos olvidar também que consoante o artigo 134 da CF, a Defensoria Pública é instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado. Isso posto, se trata aquela de um órgão especificamente voltado para a implementação de políticas públicas de assistência jurídica, assim no campo administrativo como no judicial, pelo que, sob este último prisma, se revela como instrumento de democratização do acesso às instâncias judiciárias, de modo a efetivar o valor constitucional da universalização da justiça (inciso XXXV do art. 5º da CF), fazendo de tal acesso um direito que se desfruta às expensas do Estado, em ordem a se postarem - as defensorias - como um luminoso ponto de interseção do constitucionalismo liberal com o social. Sobre a legitimidade do Poder Judiciário intervir em temas referentes as políticas públicas, a nossa Suprema Corte já se manifestou em sentido positivo, a saber: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA ¿RESERVA DO POSSÍVEL¿. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO ¿MÍNIMO EXISTENCIAL¿. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO). (ADPF 45 MC / DF, Relator Min. CELSO DE MELLO, publicado em 04/05/2004) O Agravante ainda ventila em seu recurso sobre a impossibilidade de concessão da tutela antecipada ante o requisito da verossimilhança da alegação, eis que se trata de nítida hipótese de atendimento imediato do pleito inicial, consoante a aplicação da teoria da reserva do possível. Sobre a referida teoria, sabe-se que ela surgiu no Tribunal Constitucional Alemão, tendo esta Corte entendido que o direito a prestação positiva encontra-se sujeita à reserva do possível, no sentido daquilo que o indivíduo pode esperar, de maneira racional, da sociedade. Ou seja, a argumentação adotada refere-se à razoabilidade da pretensão. Na análise de Ingo SARLET, o Tribunal alemão entendeu que ¿(...) a prestação reclamada deve corresponder ao que o indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade, de tal sorte que, mesmo em dispondo o estado de recursos e tendo poder de disposição, não se pode falar em uma obrigação de prestar algo que não se mantenha nos limites do razoável¿. (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 265.) Ocorre que a teoria da reserva do possível ¿ ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível ¿ não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido essencialmente fundamental. Sobre o assunto, além da aplicação do chamado ¿mínimo existencial¿ para contrapor a teoria da reserva do possível, a Suprema Corte, em casos de violação de preceitos constitucionais fundamentais, vem utilizando-se da teoria da restrição das restrições, conhecida também como teoria do limite dos limites. Nesse sentido, colaciono abaixo trecho do voto do Min. Celso de Mello proferido no AgRg no RE de nº 763.667 / CE: ¿Não se mostrará lícito , contudo, ao Poder Público , criar obstáculo artificial que revele ¿ a partir de indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa ¿ o arbitrário, ilegítimo e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência e de gozo de direitos fundamentais (ADPF 45/DF , Rel. Min. CELSO DE MELLO, Informativo/STF nº 345/2004), a significar, portanto, que se revela legítima a possibilidade de controle jurisdicional da invocação estatal da cláusula da ¿ reserva do possível ¿, considerada , para tanto , a teoria das ¿ restrições das restrições ¿, segundo a qual ¿ consoante observa LUÍS FERNANDO SGARBOSSA (`Crítica à Teoria dos Custos dos Direitos¿, vol. 1/273-274, item n. 2, 2010, Fabris Editor) ¿ as limitações a direitos fundamentais, como o de que ora se cuida, sujeitam-se, em seu processo hermenêutico , a uma exegese necessariamente restritiva, sob pena de ofensa a determinados parâmetros de índole constitucional, como, p. ex. , aqueles fundados na proibição de retrocesso social, na proteção ao mínimo existencial (que deriva do princípio da dignidade da pessoa humana), na vedação da proteção insuficiente e, também, na proibição de excesso. Cumpre advertir, desse modo, na linha de expressivo magistério doutrinário (OTÁVIO HENRIQUE MARTINS PORT, `Os Direitos Sociais e Econômicos e a Discricionariedade da Administração Pública¿, p. 105/110, item n. 6, e p. 209/211, itens ns. 17-21, 2005, RCS Editora Ltda., v.g.), que a cláusula da `reserva do possível¿ ¿ ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível ¿ não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.¿ Por fim, no tocante ao valor da multa, faço as seguintes ponderações. Levando em consideração a finalidade da multa prevista no artigo 461, § 4º do CPC, a decisão agravada deve ser mantida. Primeiro, porque a jurisprudência reiterada do C. STJ admite a cominação da multa diária para o caso do não cumprimento de determinação judicial. Segundo, porque o seu valor deve ser fixado com a observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade os quais foram atendidos, haja vista o porte da instituição financeira. Com efeito, o escopo da multa do artigo 461, § 4º do CPC é compelir a parte ao cumprimento da ordem judicial emprestando, assim, efetividade ao processo e à vontade do Estado. Constituindo meio coativo imposto ao devedor, deve ser estipulada em valor que o "estimule" psicologicamente a evitar o prejuízo advindo da desobediência ao comando judicial. A coação tem que ser efetiva. Ou seja, a desobediência não vai ser mensurada proporcionalmente ao valor atribuído à causa ou ao prejuízo causado pelo inadimplemento, pois o que se pretende preservar é a autoridade do comando estatal para a efetividade e eficácia da prestação da tutela jurisdicional. Sobre o tema Cândido Rangel Dinamarco ao afirma que: ¿Esse tipo de multa que o juiz pode aplicar ex oficio, aproxima-se ao instituto contempt of court ou escárnio ao tribunal, considerando que o desrespeito à decisão judicial é mais da lesão individual ao direito do credor; arranha a autoridade judicial.¿ (DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma do CPC. São Paulo:Malheiros Editores, 1995, p. 157) Da mesma opinião, é o Professor Nélson Nery: ¿(...)deve ser imposta a multa, de ofício ou a requerimento da parte. O valor deve ser significativamente alto, justamente porque tem natureza inibitória. O juiz não deve ficar com receio de fixar o valor em quantia alta, pensando no pagamento.¿ (NERY JÚNIOR. Nélson e ANDRADE NERY, Rosa Maria de. Código de Processo Civil Comentado. 6º Edição, São Paulo: RT, 2002) Sendo esse o contexto, é de se concluir que foram observados o princípio da proporcionalidade e o da razoabilidade, pois o valor de R$-12.000,00 com certeza não ultrapassa a capacidade de solvência do Estado Agravante sendo, ao mesmo tempo, elevado o suficiente a compeli-lo a manter-se obediente à ordem judicial. É assim que deve ser. É esse o espírito da norma. Para corroborar com o pensamento, trago entendimento dominante do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ASTREINTE. VALOR INSUFICIENTE. LIMINAR OBTIDA. EXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO SUSPENSA. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE EXECUÇÃO COM FUNDAMENTO EM CONTRATO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. EXIGIBILIDADE SUSPENSA. NEGATIVAÇÃO NO SERASA. CONSEQUÊNCIA DIRETA DO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO. DESCASO DO DEVEDOR. DESCUMPRIMENTO QUE PERSISTE. GRANDE CAPACIDADE ECONÔMICA DO EXECUTADO. PEDIDO DE MAJORAÇÃO. DEFERIMENTO. MULTA COMINATÓRIA MAJORADA. 3. A astreinte deve, em consonância com as peculiaridades de cada caso, ser elevada o suficiente a inibir o devedor ¿ que intenciona descumprir a obrigação ¿ e sensibilizá-lo de que é muito mais vantajoso cumpri-la do que pagar a respectiva pena pecuniária. (REsp 1185260, Relatora Minª. NANCY ANDRIGUI, 3ª Turma, publicado em 11/11/2010) Ademais, o próprio CPC, em seu art. 461, §6º, prevê a possibilidade do juiz, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva. Sobre tal dispositivo, o Professor Nelson Nery Leciona: ¿A periodicidade e o aumento da multa se justificam pelo fato de ser a multa medida de execução indireta, destinada a forçar o devedor a cumprir a obrigação; a diminuição da multa é injustificável, porque a multa não é destinada a fazer com que o devedor a pague, mas que a não pague e cumpra a obrigação na forma específica.¿ (NERY JUNIOR. Nelson. NERY. Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 12ª Ed. São Paulo: RT, 2012.) Destarte, por todo o exposto, uma vez que se encontram preenchidos os requisitos autorizadores da concessão da tutela antecipada, tais sejam o da prova inequívoca da ausência de implementação pelo Poder Estatal da assistência judiciária aos hipossuficientes, bem como do dano irreparável que tal omissão pode vir a ocasionar com o passar do tempo, entendo por bem manter a decisão que antecipou os efeitos da tutela, entretanto, assim como salientado pelo Representante do parquet em segundo grau, a obrigação que deve constar no decisium é apenas a referente a designação de um defensor público para a Comarca de Breu Branco, eis que é incontestável a impossibilidade material da nomeação de um defensor público para atuar perante esta comarca, pois não há candidatos aprovados pendentes se serem nomeados, referentes ao último concurso para provimento de cargos de defensor público. Por fim, colaciono abaixo o entendimento do STJ e do STF proferidos em casos idênticos ao ora analisados, tais sejam o da possibilidade do Poder Judiciário determinar obrigação de fazer à Fazenda Pública Estadual, para que esta designe defensor público para atuar em comarca desprovida de assistência judicial aos hipossuficientes: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESIGNAÇÃO DE DEFENSOR PÚBLICO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA ESTATAL (ART. 5º. LXXIV, DF/88). ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. 1. É possível a concessão de antecipação dos efeitos da tutela em face da Fazenda Pública, como instrumento de efetividade e celeridade da prestação jurisdicional, sendo certo que a regra proibitiva, encartada no art. 1º, da Lei 9.494/97, reclama exegese estrita, por isso que, onde não há limitação não é lícito ao magistrado entrevê-la. Precedentes do STJ: AgRg no REsp 945.775/DF, QUINTA TURMA, DJ de 16/02/2009; AgRg no REsp 726.697/PE, SEGUNDA TURMA, DJ de 18/12/2008; AgRg no Ag 892.406/PI, QUINTA TURMA, DJ 17/12/2007; AgRg no REsp 944.771/MA, SEGUNDA TURMA, DJ De 31/10/2008; MC 10.613/RJ, Rel. PRIMEIRA TURMA, DJ 08/11/2007; AgRg no Ag 427600/PA, PRIMEIRA TURMA, DJ 07/10/2002. 2. A tutela reversível não esgota o objeto da demanda proposta ab origine, a qual objetiva a designação de Defensor Público para a Comarca de Aripuanã-MT. 3. O aresto que confirma a tutela de urgência sob fundamento de que inocorreu afronta à separação constitucional dos poderes, mercê de ter afirmado a cláusula pétrea do acesso à justiça, contém fundamentos insindicáveis pelo Superior Tribunal de Justiça. 4. É assente no Egrégio Superior Tribunal de Justiça que: "É possível a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública desde que a pretensão autoral não verse sobre reclassificação, equiparação, aumento ou extensão de vantagens pecuniárias de servidores públicos ou concessão de pagamento de vencimentos' (REsp 945.775/DF, QUINTA TURMA, DJ de 16/02/2009) 5. Hipótese de antecipação dos efeitos da tutela concedida nos autos de Ação Civil Pública, promovida pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, para determinar que o demandado providenciasse, no prazo de vinte dias, a designação de Defensor Público para a Comarca de Aripuanã-MT, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$-15.000,00 na hipótese de descumprimento (fls. 12/19). 6. In casu, o bem jurídico tutelado - direito à assistência judiciária estatal assegurado pela Constituição Federal em seu art. 5º, LXXIV - transcende à proibição erigida quanto ao deferimento da tutela de urgência. (STJ - RESp 934138 / MT, Relator Min. LUIZ FUX, publicado em 04/12/2009) DEFENSORIA PÚBLICA ¿ DIREITO DAS PESSOAS NECESSITADAS AO ATENDIMENTO INTEGRAL, NA COMARCA EM QUE RESIDEM, PELA DEFENSORIA PÚBLICA ¿ PRERROGATIVA FUNDAMENTAL COMPROMETIDA POR RAZÕES ADMINISTRATIVAS QUE IMPÕEM, ÀS PESSOAS CARENTES, NO CASO, A NECESSIDADE DE CUSTOSO DESLOCAMENTO PARA COMARCA PRÓXIMA ONDE A DEFENSORIA PÚBLICA SE ACHA MAIS BEM ESTRUTURADA ¿ ÔNUS FINANCEIRO, RESULTANTE DESSE DESLOCAMENTO, QUE NÃO PODE, NEM DEVE, SER SUPORTADO PELA POPULAÇÃO DESASSISTIDA ¿ IMPRESCINDIBILIDADE DE O ESTADO PROVER A DEFENSORIA PÚBLICA LOCAL COM MELHOR ESTRUTURA ADMINISTRATIVA ¿ MEDIDA QUE SE IMPÕE PARA CONFERIR EFETIVIDADE À CLÁUSULA CONSTITUCIONAL INSCRITA NO ART. 5º, INCISO LXXIV, DA LEI FUNDAMENTAL DA REPÚBLICA ¿ OMISSÃO ESTATAL QUE COMPROMETE E FRUSTRA DIREITOS FUNDAMENTAIS DE PESSOAS NECESSITADAS ¿ SITUAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE INTOLERÁVEL ¿ O RECONHECIMENTO, EM FAVOR DE POPULAÇÕES CARENTES E DESASSISTIDAS, POSTAS À MARGEM DO SISTEMA JURÍDICO, DO ¿DIREITO A TER DIREITOS¿ COMO PRESSUPOSTO DE ACESSO AOS DEMAIS DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS ¿ INTERVENÇÃO JURISDICIONAL CONCRETIZADORA DE PROGRAMA CONSTITUCIONAL DESTINADO A VIABILIZAR O ACESSO DOS NECESSITADOS À ORIENTAÇÃO JURÍDICA INTEGRAL E À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITAS (CF, ART. 5º, INCISO LXXIV, E ART. 134) ¿ LEGITIMIDADE DESSA ATUAÇÃO DOS JUÍZES E TRIBUNAIS ¿ O PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS INSTITUÍDAS PELA CONSTITUIÇÃO E NÃO EFETIVADAS PELO PODER PÚBLICO ¿ A FÓRMULA DA RESERVA DO POSSÍVEL NA PERSPECTIVA DA TEORIA DOS CUSTOS DOS DIREITOS: IMPOSSIBILIDADE DE SUA INVOCAÇÃO PARA LEGITIMAR O INJUSTO INADIMPLEMENTO DE DEVERES ESTATAIS DE PRESTAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE IMPOSTOS AO ESTADO ¿ A TEORIA DA ¿RESTRIÇÃO DAS RESTRIÇÕES¿ (OU DA ¿LIMITAÇÃO DAS LIMITAÇÕES¿) ¿ CONTROLE JURISDICIONAL DE LEGITIMIDADE SOBRE A OMISSÃO DO ESTADO: ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO JUDICIAL QUE SE JUSTIFICA PELA NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE CERTOS PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS (PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL, PROTEÇÃO AO MÍNIMO EXISTENCIAL, VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E PROIBIÇÃO DE EXCESSO) ¿ DOUTRINA ¿ PRECEDENTES ¿ A FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA E A ESSENCIALIDADE DESSA INSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA ¿ RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. (STF - RE 763667 AgR / CE, Relator Min. CELSO DE MELLO, publicado em 13/12/2013) ASSIM, CONHEÇO E DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de agravo de instrumento interposto pelo Estado do Pará, ex vi do art. 557, §1º-A do CPC, para: a) Excluir a pessoa do Defensor Público Geral do ônus de suportar o pagamento da astreinte fixada em caso de descumprimento da obrigação de fazer imposta pela decisão ora guerreada. b) Retirar, da decisão agravada, a obrigação de fazer referente a nomeação de um Defensor Público para atuar na Comarca de Breu Branco, devendo permanecer no decisium a obrigação de designar um substituto para atuar no referido município. c) Consoante o que preceitua o art. 461, §4º do CPC, fixo o prazo razoável de 20 dias, para o cumprimento da obrigação de fazer. P.R.I. Oficie-se no que couber. Após o trânsito em julgado, remetam-se os autos ao juízo ¿a quo¿. Belém/PA, 20 de março de 2015. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO Desembargador ¿ Relator 1 ________________________________________________________________________________Gabinete Desembargador CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO
(2015.00957968-24, Não Informado, Rel. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2015-03-24, Publicado em 2015-03-24)
Data do Julgamento
:
24/03/2015
Data da Publicação
:
24/03/2015
Órgão Julgador
:
5ª CAMARA CIVEL ISOLADA
Relator(a)
:
CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO
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