main-banner

Jurisprudência


TJPA 0004406-56.2014.8.14.0051

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUN AL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ GABINETE DESEMBARGADOR CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº. 2014.3.025956-0 AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ PROCURADORA DO ESTADO: ROBERTA HELENA DOREA DACIER LOBATO AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ PROMOTOR DE JUSTIÇA: TULIO CHAVES NOVAES INTERESSADO: MUNICÍPIO DE SANTARÉM ADVOGADO: MARIA DOLOURES CAJADO BRASIL ¿ PROCURADORA MUNICIPAL    D E C I S Ã O  M O N O C R Á T I C A   DES. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO:    CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEDICAMENTO. FORNECIMENTO. TUTELA ANTECIPATÓRIA. ART. 11 DA LEI 7.347/85. MULTA COMINATÓRIA PESSOAL. IMPOSIÇÃO DIRETA AO AGENTE PÚBLICO. POSSIBILIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. INOBSERVADOS. PRECEDENTES. STJ. AGRAVO CONHECIDO E PROVIDO. I. Em sede de ação civil pública, é plenamente cabível a aplicação de multa cominatória ao gestor público ou servidor público responsável pelo ato, no caso de descumprimento de ordem judicial. II. Tal imposição, todavia, se determinada em processo no qual não figuram como partes os gestores públicos, gera violação aos princípios do contraditório e ampla defesa. III. Agravo de Instrumento conhecido e provido.      Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO com pedido de concessão de efeito suspensivo, interposto no âmbito do E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará, pelo ESTADO DO PARÁ, nos autos de AÇÃO CIVIL PÚBLICA (Processo nº. 0004406-56.2014.8.14.0051), ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, em substituição à Hilton José Leão Pereira, em face do inconformismo com a decisão interlocutória do Juízo de Direito da 8ª Vara Cível da Comarca de Santarém/Pa, que, deferiu tutela antecipatória em desfavor do Estado do Pará e do Município de Santarém determinando que estes forneçam medicamento específico ao substituído, no prazo de 48 horas, sob pena de multa pessoal no valor de R$-5.000,00 (cinco mil reais) em caso de descumprimento (fls. 14/15). Nas razões do agravo (fls. 04/12), o Estado do Pará objetiva a reforma da decisão interlocutória, precisamente no ponto que impôs a multa cominatória pessoal sob o gestor público no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais). Alega, em suma, a impossibilidade jurídica de fixação de astreintes sob a figura do gestor estadual, já que a multa, enquanto forma de coerção, não atingiria sua finalidade, porquanto o Estado tem sua atuação pautada inclusive pelo princípio da legalidade, sendo, por isso, desnecessária. Aduz, ainda, que a jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça segue a linha de descabimento de fixação da multa cominatória na pessoa do administrador. Juntou documentos às fls. 13/81. Recebido o agravo, concedi efeitos para suspender a cominação de multa tão somente em relação ao gestor da Agravante (fl.84). Em contrarrazões (fls. 88/94), o Ministério Público Estadual pleiteia o conhecimento e desprovimento do agravo de instrumento, mantendo-se na íntegra a decisão de primeiro grau, considerando que a imposição de multa pessoal sob o administrador visa garantir a efetividade da prestação estatal. Nesta instância, a Procuradoria de Justiça se manifestou pelo conhecimento e provimento do recurso. É o relatório. Decido monocraticamente. Conheço do agravo porque preenchidos os requisitos de admissibilidade. Conforme relatado, o agravo questiona a legalidade de decisão interlocutória proferida nos autos de ação civil pública, no ponto relativo à imposição de multa cominatória por descumprimento da ordem judicial na pessoa do gestor público. Como se sabe, a imposição de astrientes tem como única finalidade coagir o devedor da prestação ao cumprimento efetivo da obrigação determinada na decisão judicial, configurando, assim, uma medida indireta tendente à concretização da decisão, na medida em que, de antemão institui penalidade em face da desídia ou desrespeito às decisões do Poder Judiciário. O fim da multa cominatória é, então, a efetiva prestação da obrigação. Bem por isso, em se tratando de direitos sociais, verbalizados na Carta da República como prestações estatais positivas, nada mais justo que se possibilite o emprego de multas ao ente federado quando este houver por descumprir quaisquer dos direitos sociais enunciados no art. 6º da CF/88. A concreção desses direitos depende obviamente de providências quase sempre emergenciais do Estado, e a sua inércia representa indevida subversão à ordem constitucional. Com esse propósito, ao dispor sobre efetivação das decisões judicias, a Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), em seu art. 11 prevê: Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor.      Tem-se, aqui, expressa disposição legal autorizando a aplicação da cominação de multa diária em caso de descumprimento da obrigação imposta na decisão judicial, de sorte que legitima-se inclusive ao gestor público, ou seja, com vistas a efetivar o cumprimento da prestação, inclusive o administrador poderá ser pessoalmente compelido com imposição de astrientes. Assim, aliás, assentou o C. STJ: ¿a cominação de astreintes prevista no art. 11 da Lei nº 7.347/85 pode ser direcionada não apenas ao ente estatal, mas também pessoalmente às autoridades ou aos agentes responsáveis pelo cumprimento das determinações judiciais" (REsp 1111562/RN, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 18/09/2009)   A imposição de multa ao governador ou ao prefeito, por exemplo, é cabível em sede de ação civil pública, todavia, desde que obedecidos as regras do devido processo legal, mais especificamente, o contraditório e da ampla defesa. Vale dizer: deve a autoridade gestora estar integrando o processo, no qual se pretende a prestação positiva. No caso dos autos, muito embora a pretensão ministerial ostentar adequação à justiça social, entendo que os agentes políticos representantes das pessoas jurídicas de direito público, haja vista não terem integrado à lide, não podem ser submetidos à cominação de multa por descumprimento de decisão judicial. Compreendo, in casu, que para ser imposta multa pessoal contra os administradores, estes deveriam figurar como partes na ação civil pública. Tal entendimento está corroborado pela jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, veja-se: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA CONTRA O ESTADO DE SERGIPE E A FUNDAÇÃO HOSPITALAR DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DAS TESES VEICULADAS NO RECURSO ESPECIAL. SÚMULA 211/STJ. MULTA PREVISTA NO ART. 461, §§ 4º E 5º, DO CPC. IMPOSIÇÃO AO AGENTE PÚBLICO QUE NÃO FIGUROU COMO PARTE NO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. AFRONTA AO DIREITO DE AMPLA DEFESA. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1 - O Tribunal de origem, apesar de instado a fazê-lo por meio dos competentes embargos de declaração, não se pronunciou sobre as teses versadas no presente recurso. Nesse contexto, caberia à parte recorrente, nas razões do apelo especial, indicar ofensa ao art. 535 do CPC, alegando a existência de possível omissão, providência da qual não se desincumbiu. Incide, pois, o óbice da Súmula 211/STJ. 2 - Ainda que assim não fosse, o entendimento exposto no acórdão impugnado se amolda à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, firmada no sentido de que o agente público não pode ser pessoalmente condenado ao pagamento de astreintes se não figurou como parte na relação processual em que imposta a cominação, sob pena de afronta ao direito constitucional de ampla defesa. Precedentes. 3 - Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1433805/SE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 16/06/2014, DJe 24/06/2014)   PROCESSUAL CIVIL. ASTREINTES. ART. 461, § 4º, DO CPC. REDIRECIONAMENTO A QUEM NÃO FOI PARTE NO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Na origem, foi ajuizada Ação Civil Pública para compelir o Estado de Sergipe ao fornecimento de alimentação a presos provisórios recolhidos em Delegacias, tendo sido deferida antecipação de tutela com fixação de multa diária ao Secretário de Estado da Justiça e Cidadania, tutela essa confirmada na sentença e na Apelação Cível, que foi provida apenas para redirecionar as astreintes ao Secretário de Segurança Pública. 2. Na esteira do entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, admite-se a aplicação da sanção prevista no art. 461, § 4º do CPC à Fazenda Pública para assegurar o cumprimento da obrigação, não sendo possível, todavia, estendê-la ao agente político que não participara do processo e, portanto, não exercitara seu constitucional direito de ampla defesa. Precedentes. 3. In casu, a Ação Civil Pública fora movida contra o Estado de Sergipe - e não contra o Secretário de Estado -, de modo que, nesse contexto, apenas o ente público demandado está legitimado a responder pela multa cominatória. 4. Recurso Especial provido. (REsp 1315719/SE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 27/08/2013, DJe 18/09/2013)   ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APLICAÇÃO DE MULTA PREVISTA NO ART. 461, §§ 4º E 5º, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO AO GESTOR PÚBLICO POR NÃO SER PARTE NO FEITO. 1. Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, em se tratando de obrigação de fazer, é permitido ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa cominatória ao devedor (astreintes), mesmo contra a Fazenda Pública. 2. Não é possível, contudo, a extensão ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda Pública em decorrência da sua não participação efetiva no processo. Entendimento contrário acabaria por violar os princípios do contraditório e da ampla defesa. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 196.946/SE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 02/05/2013, DJe 16/05/2013)   Em idêntico sentido: REsp 847907/DF, Quinta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe 16/11/2011; REsp 1373795/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 19/03/2014; e, REsp 1386178/RN, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe 12/11/2013. Deste modo, concluo ser possível, em sede de ação civil pública, a cominação de multa pessoal sob a autoridade gestora, porém, sua legitimação deve estar conforme os postulados básicos do contraditório e da ampla defesa, o que não ocorre na espécie dos autos, devendo, assim, ser modificada a decisão do juízo ¿a quo¿ só neste tocante. ASSIM, nos termos da fundamentação, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO monocrático ao presente agravo de instrumento, na forma do art. 557, §1º-A, do CPC, a fim de reformar a decisão interlocutória proferida pelo juízo de primeiro grau no ponto relativo à imposição de multa pessoal, vez que encontra-se manifestamente contrária a jurisprudência dominante do STJ; aproveitando-se, inclusive, ao município de Santarém, na forma do art. 509, do CPC.   P.R.I. Oficie-se no que couber. Após o trânsito em julgado, remetam-se os autos ao juízo ¿a quo¿. Belém/PA, 07 de abril de 2015.     CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO Desembargador ¿ Relator                                        ___________________________________________________Gabinete Desembargador CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO (2015.01126137-14, Não Informado, Rel. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2015-04-09, Publicado em 2015-04-09)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 09/04/2015
Data da Publicação : 09/04/2015
Órgão Julgador : 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA
Relator(a) : CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO
Número do documento : 2015.01126137-14
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
Mostrar discussão