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Jurisprudência


TJPA 0004464-58.2013.8.14.0095

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ PROCESSO N. 2014.3.019175-4. SECRETARIA DA 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA APELAÇÃO CÍVEL. COMARCA DE SÃO CAETANO DE ODIVELAS. APELANTE: JOSIANE CRISTINA DE SANTA GARÇA. ADVOGADO: LUCIANA TARCILA VIEIRA GUEDES - DEFENSORA PUBLICA. APELADO: BANIF - BANCO INTERNACIONAL DE FUNCHAL (BRASIL). ADVOGADO: FRANCISCO GOMES COELHO - OAB/CE 1.745 E OUTROS. RELATORA: DESEMBARGADORA DIRACY NUNES ALVES. DECISÃO MONOCRÁTICA      Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por JOSIANE CRISTINA DE SANTA GARÇA em face de sentença prolatada pelo Juízo da Vara Única de São Caetano de Odivelas que, nos autos de ação ordinária de revisão, a julgou improcedente.      Irresignado, interpôs recurso de Apelação (fls. 130/135) alegando que a taxa de juros praticada pelo banco, nos contratos objeto da lide, estão acima da média de mercado e devem ser revisionados.      Contrarrazões às fls. 137/155.      Remetidos os autos a esta Egrégia Corte, coube-me a sua relatoria após distribuição (fl. 158).      Julgamento realizado sem observar a ordem cronológica, em face do permissivo do art. 12, §2º, III do CPC/2015.      É o breve relatório.      DECIDO.      Conheço do recurso porque preenchidos os requisitos de admissibilidade.      Sem preliminares, passo a analisar o mérito da demanda. MÉRITO.       a) DA RELATIVIZAÇÃO DOS CONTRATOS DE EMPRESTIMO BANCÁRIO.       A questão da relativização dos contratos de empréstimos bancários é fato claro nas cortes superiores, neste sentido já julgou o Superior Tribunal de Justiça em diversas oportunidades, tais como o AgRg no REsp n. 1.422.547/RS, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe de 14/03/2014; AgRg no AREsp n. 349.273/RN, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJe de 07/10/2013 e AgRg no REsp n. 1.245.399/SC, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, DJe de 04/03/2013, entre outros, tanto que o Juízo de Piso relativizou o contrato.       Quanto o efeito devolutivo presente no novo Código de Processo Civil, previsto no art. 1.013, §1º, entendo que apesar de ter sido feito de forma superficial, requereu a recorrente o deferimento de todas as parcelas tidas como abusivas em sua inicial, neste sentido nos ensina Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha: ¿Quanto à extensão, o grau de devolutividade é definido pelo recorrente no pedido recursal. Significa dizer que, ao deduzir o pedido de nova decisão, o recorrente delimita a extensão da devolutividade, a fim de que o tribunal possa julgar o recurso. O recorrente definirá o capítulo da sentença apelada que ele pretende seja reexaminado pelo tribunal.¿ (DIDIER JR., Fredie. CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e Processo nos Tribunais. vol. 3. 13ª ed. Salvador: JusPodivm, 2016. f. 177).      Deste modo, passo a analisar cada um dos elementos indicados como abusivos pela recorrente desde a sua inicial.       a.1) abusividade da taxa de juros.       Entende a recorrente que a taxa de juros praticada no contrato é abusiva, porque não estaria atrelado aos juros praticados pelo mercado.       A questão não merece maiores digressões, pois já foi devidamente analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, na metodologia dos recursos repetitivos: ¿(...) ORIENTAÇÃO. 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada- art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto¿. (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).      Portanto, de início, cabe frisar que não é porque os juros anuais do contrato superam 12% que este deve ser considerado abusivo, porque este simples fato por si só considerado não representa abusividade.      No entanto, a abusividade dos juros remuneratórios, contratados com as instituições financeiras que compreendem o Sistema Financeiro Nacional, pode ser reconhecida após comparação com a taxa média de mercado estabelecida pelo Banco Central, pois de acordo com as regras do Código de Defesa do Consumidor (Súmula n. 297 do STJ) não se deve permitir a vantagem excessiva dos bancos em desfavor dos consumidores (artigos 39, inciso V, e 51, inciso IV). Uma vez constatado excesso na taxa praticada, cabível a revisão judicial. Neste sentido vem julgando o STJ já também em outras oportunidades, sempre considerando a taxa de juros remuneratórios como abusiva, quando discrepante da média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, à época da contratação. Vejamos: AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO REVISIONAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO AFASTADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. TAXA MÉDIA DE MERCADO. CABIMENTO. SÚMULA N. 294 DO STJ. NÃO-CUMULAÇÃO COM JUROS REMUNERATÓRIOS, CORREÇÃO MONETÁRIA, JUROS MORATÓRIOS E MULTA MORATÓRIA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. 1. A alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado. (sublinhei) 2. É lícita a cobrança de comissão de permanência após o vencimento da dívida, devendo ser observada a taxa média dos juros de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa de juros contratada para o período da normalidade (Súmula n. 294 do STJ). 3. Satisfeita a pretensão da parte recorrente, desaparece o interesse de agir. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 960.880 - RS (2007¿0138353-5 -.RELATOR MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, julgado em 03.12.2009).   PROCESSO CIVIL. CONTRATO BANCÁRIO. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. SÚMULA 7¿STJ. I - No paradigmático REsp 1.061.530¿RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, restou pacificado que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios da Lei de Usura (Decreto 22.626¿33) e que a sua fixação acima do patamar de 12%, por si só, não denota abusividade - hipótese em que é admitida a revisão do percentual. II - Constatada a significativa exorbitância na taxa praticada pela instituição financeira em comparação à média do mercado, não cabe a esta Corte, in casu, promover sua reavaliação, em homenagem à Súmula 7¿STJ. (sublinhei) III - Agravo regimental improvido .(AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 936.099 - RJ (2007¿0066386-2) Relator MINISTRO PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ¿BA) , julgado em 17.11.2009).      De igual modo, o STJ já sumulou que o limite de juros é encontrado na média de mercado, vejamos: Súmulas 296 do STJ. Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado. (Súmula 296, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/05/2004, DJ 09/09/2004, p. 149)      No caso dos autos, trata-se de dois contratos que passo a comparar a taxa de juros praticada com a de mercado, apurada pelo SGS - Sistema Gerenciador de Séries Temporais - v2.1, vide tabela do Banco Central - código 20745 - taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - pessoas físicas - crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público, disponível no site do Banco Central do Brasil (https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries), vejamos:       Ordem Contrato Tipo Data da contratação Taxa de juros anual praticada Taxa de juros anual de mercado calculada pelo BACEN 1 505815877 Empréstimo Consignado 13/07/2011 47,52% 26,61% 2 506385680 Empréstimo Consignado 11/05/2012 49,72% 24,85%      De fato, as taxas praticadas em todos os contratos superam a média de mercado aferida pelo Banco Central e devem ser revisados a fim de minorar a taxa de juros, conforme quadro acima.      a.2) DA COMPENSAÇÃO E DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS ATRAVÉS DE CLÁUSULAS ABUSIVAS.      É sabido que uma vez declarada a abusividade de cláusula que exige encargo excessivo sobre o valor contratado, mostra-se necessário apurar o valor real do débito oriundo do contrato revisando.      Uma vez realizados os cálculos e estes venham a apurar a existência de saldo devedor, deverão então ser compensados os pagamentos a maior que tenham sido efetuados no curso da contratualidade.      Porém, caso os cálculos apurem que o contrato já está quitado, os valores eventualmente pagos a maior devem ser devolvidos ao consumidor, na forma simples, devidamente atualizados pelo IGP-M desde o desembolso e contando juros legais, desde a citação na presente ação.      De fato, não se desconhece as previsões legais para as situações de restituição em dobro (art. 940 do Código Civil e art. 42 do Código de Defesa do Consumidor), in verbis: ¿Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição¿. ¿Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável¿.      Entretanto, o caso concreto não se amolda as situações previstas nos dispositivos citados, tendo em vista que cobrança excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções referidas, pois diante da incerteza momentânea sobre a liquidez do crédito oriundo do contrato revisando, não há como se afirmar que a instituição financeira cobra dívida já paga, sabedora de tal circunstância.      Portanto, no caso concreto, é possível a compensação e a devolução simples dos valores eventualmente pagos a maior.      DO DISPOSITIVO.      Ante o exposto, na forma permitida pelo art. 932, V, ¿b¿ do CPC/2015 e art. 133 do Regimento Interno desta Corte, conheço do recurso e o julgo parcialmente procedente para modificar a sentença vergastada nos seguintes pontos:      a) Revisionar os contratos para minorar os juros para a média apresentada pelo Banco Central conforme quadro abaixo:       Ordem Contrato Tipo Taxa de juros anual de mercado calculada pelo BACEN 1 505815877 Empréstimo Consignado 26,61% 2 506385680 Empréstimo Consignado 24,85%      b) Em sede de liquidação mediante o cálculo do contrato nas premissas acima estabelecidas, caso exista saldo devedor deve ocorrer a compensação dos pagamentos a maior que tenham sido efetuados no curso da contratualidade. Caso os cálculos apurem que o contrato já está quitado, os valores eventualmente pagos a maior devem ser devolvidos ao consumidor, na forma simples, devidamente atualizados pelo IGP-M desde o desembolso e contando juros legais, desde a citação na presente ação.      Fixo honorários advocatícios em 10% sobre o valor do proveito econômico obtido. Destes 60% devem ser pagos aos advogados do consumidor e o restante em benefício dos advogados do banco, sendo que esta parcela resta suspensa em razão do autor/recorrente ser beneficiário da assistência judiciária, apurado mediante liquidação de sentença.      Belém, 14 de julho de 2016. Desembargadora DIRACY NUNES ALVES RELATORA (2016.02803560-56, Não Informado, Rel. DIRACY NUNES ALVES, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2016-07-15, Publicado em 2016-07-15)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 15/07/2016
Data da Publicação : 15/07/2016
Órgão Julgador : 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA
Relator(a) : DIRACY NUNES ALVES
Número do documento : 2016.02803560-56
Tipo de processo : Apelação
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