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Jurisprudência


TJPA 0004810-70.2014.8.14.0031

Ementa
D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A             Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por W. S. L., devidamente representado por defensor público habilitado nos autos, com fulcro nos arts 198 e ss. do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e art. 513 e ss. do CPC, contra sentença prolatada pelo douto Juízo da Vara Única da Comarca de Moju (fls. 57/60) que, nos autos da REPRESENTAÇÃO Nº 0004810-70.2014.814.0031 promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, julgou parcialmente procedente a representação, e tendo em vista a gravidade do ato infracional praticado, aplicou ao representado a medida socioeducativa de internação por prazo indeterminado.             A demanda teve início com representação formulada pelo Ministério Público Estadual contra o infante W. S. L., noticiando que no dia 18 de setembro de 2014, por volta de 00h30min, com o propósito de subtrair pertences da casa nº 38, localizada na Travessa João Paulo I, bairro Alto, na cidade de Moju, foi surpreendido pela vítima Carla Quaresma de Sousa que ao gritar, pedindo ajuda ao seu pai, foi atingida por um projetil de arma de fogo disparado pelo menor, causando-lhe lesões que determinaram a sua morte.             Após o disparo empreendeu fuga, deixando para trás os objetos roubados (vídeo game e um violão), bem como deixou suas sandálias junto ao poste que utilizou para ingressar na casa assaltada.             Em seguida, por volta das 01h00min, na avenida das Palmeiras, o representado ingressou na casa nº 288 através da janela lateral e, mediante grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo, dominou a vítima Eliana Samarah Barbosa de Souza, subtraindo-lhe a importância de R$ 280,00 (duzentos e oitenta reais), além de vários objetos.             O representado teve inicialmente decretada a sua internação provisória, através de decisão interlocutória de fls. 08/10 dos autos.             Em audiência de apresentação, o representado prestou depoimento e na ocasião negou o cometimento dos atos infracionais imputados contra si.             No decorrer da instrução processual, foram ouvidas além da segunda vítima, mais quatro testemunhas. Foi juntado aos autos, o relatório circunstancial de medida cautelar (fls. 35/42).             O Ministério Público em alegações finais, sustentou em parte, a procedência da representação, pedindo a aplicação de medida socioeducativa de internação (fls. 45/49).             Por outro lado, a Defensoria Pública, em alegações finais, pediu a improcedência da representação, diante da insuficiência de provas e em caso de condenação, a aplicação de medida em meio aberto (fls. 53/55).             O juízo de piso sentenciou a demanda, julgando parcialmente procedente a representação, aplicando a medida socioeducativa de internação, diante da gravidade do ato infracional praticado (fls. 57/60).             Inconformado com a sentença, o adolescente através da Defensoria Pública do Estado, ingressou com recurso de apelação cível (fls. 66/70), pleiteando a concessão de efeito suspensivo ao apelo.             Asseverou a ocorrência da ausência de provas de autoria, além da ausência dos requisitos legais para imposição da medida de internação e finalmente requereu a alteração da medida de internação, sendo adequada a aplicação de medida socioeducativa mais branda, permitindo-se a ressocialização efetiva.             Por fim, requereu o conhecimento e provimento do recurso.             O juízo sentenciante não realizou juízo de retratação e recebeu o apelo no efeito devolutivo (fl. 74).             Noutra ponta, em sede de contrarrazões ao recurso (fls. 77/80), o Órgão Ministerial de 1º grau, em síntese, requereu o improvimento do apelo, com a manutenção da sentença guerreada em sua integralidade.             Coube-me a relatoria do feito por distribuição (fl. 93).             Instado a se manifestar, o Ministério Público de 2º grau, às fls. 98/102 dos autos, por intermédio de sua 11ª Procuradora de Justiça Cível, Drª. Maria Tércia Ávila Bastos dos Santos, pronunciou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso.             Vieram-me conclusos os autos (fl.102v).             DECIDO.            Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo a apreciá-lo monocraticamente.            O cerne do recurso manejado pela Defensoria Pública do Estado cinge-se em pedir a reforma da sentença atacada, com o intuito de ser aplicada medida socioeducativa mais branda a seu assistido.            Primeiramente manifesto-me acerca do pedido da Defensoria Pública do recebimento do recurso em seu duplo efeito.            No citado caso, o adolescente praticou, ato infracional assemelhado à conduta típica prevista no art. 157, §2º, I do CP, in verbis: Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: (...) § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;            Em primeiro plano, correto o recebimento do apelo apenas no efeito devolutivo.            Verifico que o art. 215, do Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceque o juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irreparável à parte.            Na espécie, a defesa não demonstrou a ocorrência de qualquer das hipóteses descritas anteriormente no art.198, VI, do ECA, cuja redação dispunha: (...) a apelação será recebida em seu efeito devolutivo. Será também conferido efeito suspensivo quando interposta contra sentença que deferir a adoção por estrangeiro e, a juízo da autoridade judiciária, sempre que houver perigo de dano irreparável ou de difícil reparação".            De certo que a mudança trazida pela Lei nº 12.010/09, a qual revogou o inciso acima mencionado, refere-se tão somente aos processos cíveis de adoção, sendo que o próprio art.1º da referida lei limitou sua abrangência nestes moldes.             Além do mais, faz-se necessária a reflexão de que o retardamento da aplicação da medida inviabiliza os efeitos ressocializadores, tais como a escolarização obrigatória, a profissionalização e o acompanhamento sistemático pelo Estado. Nesse sentido, recebida a apelação, em despacho fundamentado, pelo juízo de piso, em seu efeito meramente devolutivo, torna-se possível o início da execução provisória da sentença, circunstância que possibilita o atendimento célere à efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes.            Não fosse por isso, é cediço que, revogado o art. 198, inciso VI, do ECA, pela "Lei da Adoção", é de se impor a aplicação conjunta do caput daquele dispositivo, com o art. 520, inciso VII, do Código de Processo Civil, pela sistemática recursal adotada pelo ECA. Se o adolescente foi mantido em internação provisória, nos casos de alteração do quadro fático que autorizava o adolescente responder a apuração solto ou ainda quando a sentença fundamentar a necessidade da imposição de medida socioeducativa, lastreando o julgador em elementos concretos constantes nos autos, o imediato cumprimento do decisum traduz imprescindível instrumento de tutela cautelar.            Destarte, o comando inserto no caput do art. 198 do ECA, ao determinar sejam observadas as regras processuais civis no âmbito recursal das ações menoristas, remete ao previsto no art. 520, do CPC que, por seu turno, determina sejam os recursos de apelação recebidos no duplo efeito, com as exceções nele especificadas, dentre as quais o recurso interposto contra a sentença que confirmar a antecipação dos efeitos da tutela. Há de se atentar que o art. 108, parágrafo único, do ECA, ao prever a possibilidade de ser decretada pelo juiz, no curso da ação socioeducativa, a internação provisória do menor, com base em indícios de autoria e materialidade, e na necessidade imperiosa da medida, apresenta-se, de certa forma, como uma tutela antecipada em relação àquela que se espera prestada ao fim do procedimento de apuração do ato infracional, atraindo a regra do recebimento do apelo no efeito devolutivo (CPC, art. 520, VII).            Assim, seja pela ausência de lesão grave de difícil e incerta reparação, seja pela regra do art. 273 c/c art. 520, VII, ambos do CPC, o recebimento do apelo no efeito devolutivo revelou-se correto.            E mais: existe ainda a possibilidade de o magistrado, na oportunidade da sentença, por haver se alterado o quadro fático que autorizava ao menor responder a apuração do ato infracional em liberdade, fundamentar da necessidade do recolhimento imediato do adolescente infrator, com base em elementos concretos constantes nos autos, para garantir a ordem pública ou a aplicação da lei. Isso fora feito pelo juízo que assentou: o ato infracional fora grave, com emprego de arma de fogo, concurso de agentes e a vítima fora mantida refém, demonstrando seu alto grau de periculosidade e a necessidade de tratamento imediato pelo Estado (fl. 99).            A configuração da autoria e materialidade revela-se patente, diante da das oitivas das testemunhas ouvidas em juízo.            De mais a mais, ressalto que, pelo princípio da imediatidade das provas, deve-se prestigiar a maior proximidade do juízo singular com as partes e com o processo, permitindo-lhe dispor de fartos elementos dirigidos a formar sua convicção.            É certo que, julgada procedente a representação, impõe-se ao julgador a aplicação de uma das medidas socioeducativas elencadas no artigo 112, do ECA, devendo levar em conta a capacidade do adolescente em cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração, ex vi do §1º do artigo 112 do mesmo diploma legal.             Como dito, o ato infracional fora tipificado no art. 157, §2º, I do CP.            Assim é que, amoldando-se o ato infracional à figura tipificada como roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo, mostra-se escorreita a sentença guerreada ao julgar procedente a representação feita em desfavor do recorrente, aplicando-lhe a medida socioeducativa de internação, em total consonância com os ditames do ECA que, em seu art. 122, inc. I, estatui que: Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;            E o roubo, no caso em apreço, ocorreu mediante emprego de arma de fogo, com grave ameaça à pessoa, encaixando-se, perfeitamente, ao suporte fático-legal autorizador da aplicação da medida acima transcrita, pelo que incabível a aplicação de medida em regime aberto.            Não destoando, a melhor jurisprudência orienta: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO DELITO DE ROUBO MAJORADO POR CONCURSO DE AGENTES E EMPREGO DE ARMA DE FOGO. MEDIDA DE INTERNAÇÃO. RELATÓRIO TÉCNICO FAVORÁVEL À MEDIDA DE LIBERDADE ASSISTIDA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ATO COMETIDO MEDIANTE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. INCIDÊNCIA DO ART. 122, INCISO I, DO ECA. RECURSO ORDINÁRIO CONHECIDO EM PARTE, E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. (...) III - Se o ato infracional, como in casu, é cometido mediante violência ou grave ameaça à pessoa, é de ser aplicada aos menores a medida socioeducativa de internação, nos termos do art. 122, inciso I, da Lei nº 8.069/90 (Precedentes). Recurso ordinário parcialmente conhecido, e, nessa extensão, desprovido. (RHC 48.234/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 24/10/2014) HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. INADMISSIBILIDADE. ECA. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE ROUBO MAJORADO (ARMA DE FOGO E CONCURSO DE AGENTES). MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA JUSTIFICADA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. LIMINAR INDEFERIDA. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO. (...) 3. Segundo o disposto no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente, é permitida a aplicação da medida socioeducativa de internação, por prazo indeterminado, na hipótese de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência contra a pessoa, desde que não ultrapassado o prazo máximo legal e caso não haja outra medida mais adequada ao caso concreto. 4. Mostra-se devida a aplicação da medida de internação, consoante o disposto no inciso I do art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente, quando apontados elementos concretos que evidenciam a gravidade concreta da conduta perpetrada pelo paciente, a qual, in casu, foi praticada em concurso com mais dois agentes e mediante grave ameaça e emprego de arma de fogo à vítima, policial militar reformado, que, inclusive, foi largado nu e ferido, tendo os menores infratores fugido na posse do bem subtraído. 5. Ordem não conhecida. (HC 295.347/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 12/08/2014, DJe 27/08/2014) HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. ECA. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE ROUBO PRATICADO COM EMPREGO DE ARMA DE FOGO E EM CONCURSO DE AGENTES NA FORMA TENTADA. IMPOSIÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. ATO PRATICADO COM VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇA. POSSIBILIDADE. ART. 122, I, DO ESTATUTO MENORISTA. 3. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. (...) 2. O art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente autoriza a imposição da medida socioeducativa de internação nas hipóteses de ato infracional praticado com grave ameaça ou violência contra a pessoa, reiteração no cometimento de outras infrações graves ou descumprimento reiterado e injustificável de medida anteriormente imposta. Na espécie, o ato infracional praticado pelo paciente subsume-se ao tipo previsto no art. 157, § 2º, I e II, c/c o art.14, II, ambos do Código Penal, o que remete, de pronto, à hipótese normativa prevista no inciso I do art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente, não havendo, portanto, qualquer constrangimento ilegal. 3. Habeas corpus não conhecido. (HC 295.454/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 07/08/2014, DJe 15/08/2014) HABEAS CORPUS. ECA. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE ROUBO. CONCURSO DE AGENTES E EMPREGO DE ARMA DE FOGO. INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. MANUTENÇÃO. POSSIBILIDADE. Os atos infracionais cometidos com violência e/ou grave ameaça contra pessoa, nos termos do art. 122, I, do ECA, recomendam a internação provisória dos menores infratores. Fortes indícios acerca da materialidade e autoria, em decorrência do flagrante policial e do reconhecimento dos agentes pelas vítimas no inquérito policial. ORDEM DENEGADA. (Habeas Corpus Nº 70063164636, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Julgado em 12/01/2015)            Portanto, a medida socioeducativa de internação se mostra necessária para promover a reeducação e a ressocialização do adolescente infrator, convidando-o a refletir acerca da conduta desenvolvida, na expectativa de que ainda possa se tornar pessoa socialmente útil e capaz de se reintegrar à vida em comunidade, bem como de respeitar a integridade física e o patrimônio dos seus semelhantes.            Finalizo ponderando que, com a manutenção da sentença objurgada, não se está a pregar a "cultura do aprisionamento". Na verdade, na colisão de valores de índole constitucional, deve ser, também, considerado o interesse da sociedade, que necessita se sentir segura de que a medida aplicada ao menor infrator surtirá o efeito desejado, qual seja, a sua reinserção social e não o contrário, sob pena de se prestigiar a impunidade, com a determinação de medidas menos gravosas que não alcancem os concretos objetivos a serem atingidos.            Por fim, trago à baila alguns trechos da manifestação ministerial, que robustecem a posição adotada por mim, in verbis: (...) Assim, tendo-se em vista que o ato infracional cometido é análogo ao crime de roubo majorado, desnecessário profunda digressão acerca do cabimento da medida socioeducativa de internação, não havendo por que deixar impune um ato infracional de alto potencial ofensivo. Assim, não merece censura a Sentença vergastada, devendo ser mantida em todos os seus termos.            ANTE O EXPOSTO, NA ESTEIRA DO PARECER MINISTERIAL, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL E NEGO-LHE PROVIMENTO mantendo, em sua integralidade, a sentença atacada, nos moldes e limites da fundamentação lançada, que passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse totalmente transcrita.            Intimem-se, pessoalmente, o Procurador de Justiça na forma do art. 236, § 2º do CPC e, de igual modo, a Defensora Pública, nos termos do art. 56, da LC estadual 054/2006.            Servirá a presente decisão como mandado/oficio, nos termos da Portaria nº 3731/2015-GP.      Belém (Pa), 23 de março de 2016. Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN Relatora (2016.01098917-48, Não Informado, Rel. EZILDA PASTANA MUTRAN, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-03-30, Publicado em 2016-03-30)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 30/03/2016
Data da Publicação : 30/03/2016
Órgão Julgador : 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : EZILDA PASTANA MUTRAN
Número do documento : 2016.01098917-48
Tipo de processo : Apelação
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