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Jurisprudência


TJPA 0006671-98.2016.8.14.0006

Ementa
DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de REMESSA NECESSÁRIA, em razão de sentença proferida pelo Juízo de Direito da Vara de Fazenda da Comarca de Ananindeua, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer com pedido de Tutela de Urgência (processo nº 0006671-98.2016.8.14.0006) ajuizada por PEDRO GONÇALVES RAMOS contra o HOSPITAL OPHIR LOYOLA. Na petição inicial (fls. 02/10), o autor afirma que vem sofrendo com estenose da ureta a mais de 10 (dez) anos, realizando diversas cirurgias. Relata que após a complicação decorrente do último procedimento cirúrgico (21.10.2013), recebeu a notícia, no dia 25.09.2015, de que seria necessário realizar nova cirurgia, no entanto, teria que aguardar a disponibilização de leito. Assevera que até a data deste protocolo (abril/2016) a cirurgia sequer foi marcada. Diante disso, requereu a concessão da tutela de urgência a fim de que seja providenciada a imediata realização da cirurgia. Juntou documentos às fls. 11/21. O Juízo a quo proferiu despacho à fl. 22, determinando que o Hospital apresentasse informações acerca da disponibilização do leito e da realização do procedimento cirúrgico, diligência cumprida às fls.24/80. Em seguida, o pedido de liminar foi deferido às fls. 82/83, tendo o Hospital Ophir Loyola apresentado contestação às fls. 95/103. Após a apresentação de Réplica (fls. 145/146), o Juízo a quo proferiu sentença (fls. 148/149) com a seguinte conclusão: (...) ISTO POSTO e por tudo mais que dos autos constam, TORNO EM DEFINITIVA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA AS FLS. 82/83, e JULGO TOTALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO, para determinar que o HOSPITAL OFIR LOYOLA providencie ao autor Pedro Gonçalves ramos o tratamento do qual necessita prescrito conforme solicitação de fl. 18. Por conseguinte, DECRETO EXTINTO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO nos termos do art. 487, I do NCPC. Sem custas e honorários, nos termos da Lei Estadual nº 5.738/93 e Sumula 421 do STJ. SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA SUJEITA AO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO. Após as formalidades de estilo e trânsito em julgado devidamente certificado, subam os autos ao E. TJE/PA com ou sem recurso voluntário. (grifos nossos). A entidade autárquica peticionou à fl. 150, informando que o paciente já foi internado em 15.06.2016, recebendo alta hospitalar com seu estado de saúde melhorado em 23.06.2016, assim, requereu o arquivamento do feito após o reexame necessário. As partes não interpuseram recurso voluntário, conforme certificado pela Diretora de Secretaria à fl.154. Coube-me a relatoria do feito por distribuição (fl. 156). A Procuradoria de Justiça, na qualidade de fiscal da ordem jurídica, se manifestou pela manutenção integral da sentença (fls. 160/162). É o relato do essencial. Decido. À luz do CPC/15, conheço da Remessa Necessária e passo a analisá-la monocraticamente, a teor da Súmula 253 do STJ que dispõe: o art. 557 do CPC/73, (com correspondência no art. 932 do CPC/2015 e 133 do Regimento Interno do Tribunal), que autoriza o relator a decidir o recurso, alcança o Reexame Necessário. O art. 932, VIII do CPC/2015 e art. 133, XI, ¿d¿ do Regimento Interno dispõem: Art. 932.  Incumbe ao relator: VIII - exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal. Art. 133. Compete ao relator XI - negar provimento ao recurso contrário: a) à súmula do STF, STJ ou do próprio Tribunal; b) ao acórdão proferido pelo STF ou STJ no julgamento de recursos repetitivos; c) ao entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; d) à jurisprudência dominante desta e. Corte ou de Cortes Superiores; A questão em análise reside em verificar a legalidade da sentença que determinou que o Hospital Ophir Loyola providenciasse o tratamento do qual o autor necessita. Analisando o Laudo Médico à fl. 18, constata-se que o autor vem sofrendo com estenose da uretra, fazendo tratamento no Hospital Ophir Loyola desde o ano de 2007, tendo realizado diversos procedimentos cirúrgicos (Uretrotomia interna- 2007; Uretroplastia- 2010; Uretonomia- 2012 e Unetroplastia- 2013), apresentando complicações após o último procedimento cirúrgico, tendo que aguardar a disponibilização de leito. Com efeito, o laudo médico evidenciou a necessidade de receber o devido tratamento cirúrgico. De início, afirma-se que por expressa determinação dos artigos 23, II e 196 da Constituição Federal, o direito à saúde é um dever linear de todos os entes, senão vejamos: Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência; Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros O direito à vida e à saúde se qualificam como um direito subjetivo inalienável, assegurado a todos pela própria Constituição Federal. Deste modo, em situações como a dos autos, em que resta demonstrada a necessidade de tratamento cirúrgico a pessoa comprovadamente com hipossuficiência de recursos, não se mostra razoável prevalecer o interesse financeiro e secundário do Estado. Logo, o Estado, em sua acepção ampla (União, Estado, Distrito Federal e Municípios), tem o dever constitucional de fornecer às pessoas os tratamentos necessários à sua sobrevivência e melhoria de qualidade de vida, por se tratar de serviço de relevância pública, conforme se observa no RE 393.175-AgR, de Relatoria do Ministro Celso de Mello: PACIENTES COM ESQUIZOFRENIA PARANÓIDE E DOENÇA MANÍACO-DEPRESSIVA CRÔNICA, COM EPISÓDIOS DE TENTATIVA DE SUICÍDIO - PESSOAS DESTITUÍDAS DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - NECESSIDADE IMPERIOSA DE SE PRESERVAR, POR RAZÕES DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO, A INTEGRIDADE DESSE DIREITO ESSENCIAL - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS INDISPENSÁVEIS EM FAVOR DE PESSOAS CARENTES - DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, "CAPUT", E 196) - PRECEDENTES (STF) - ABUSO DO DIREITO DE RECORRER - IMPOSIÇÃO DE MULTA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. [...] Precedentes. (RE 393175 AgR, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 12/12/2006, DJ 02-02-2007 PP-00140 EMENT VOL-02262-08 PP-01524). (grifos nossos). As normas contidas nos artigos 196 e 198 da CF/88 possuem natureza programática ao implementarem políticas de governo a serem seguidas pelo legislador ordinário, pois traçam diretrizes e fins colimados pelo Estado na consecução dos fins sociais, tal circunstância, no entanto, não afasta a responsabilidade do Estado em garantir o direito essencial do ser humano à saúde, a qual consiste em um direito fundamental indissociável do direito à vida. Neste viés, cabe ao Poder Público a obrigação de tornar efetivas as prestações de saúde, incumbindo-lhe promover em favor das pessoas e da comunidade medidas preventivas e de recuperação, que fundadas em políticas públicas idôneas, tenham por finalidade viabilizar e dar concreção ao que dispõe o art. 196, CF/88, sendo possível inclusive, o fornecimento de medicamento não incluídos na lista fornecida pelo SUS, comprovando-se a sua imprescindibilidade para a manutenção da vida do indivíduo. Neste sentido, colacionam-se julgados do STF: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO À SAÚDE. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERATIVOS. TRATAMENTO NÃO PREVISTO PELO SUS. FORNECIMENTO PELO PODER PÚBLICO. PRECEDENTES. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos. O fornecimento gratuito de tratamentos e medicamentos necessários à saúde de pessoas hipossuficientes é obrigação solidária de todos os entes federativos, podendo ser pleiteado de qualquer deles, União, Estados, Distrito Federal ou Municípios (Tema 793). O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS [...] Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 831385 AgR, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 17/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 31-03-2015 PUBLIC 06-04-2015). (grifos nossos). E M E N T A: PACIENTE PORTADORA DE DOENÇA ONCOLÓGICA ¿ NEOPLASIA MALIGNA DE BAÇO ¿ PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS ¿ DIREITO À VIDA E À SAÚDE ¿ NECESSIDADE IMPERIOSA DE SE PRESERVAR, POR RAZÕES DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO, A INTEGRIDADE DESSE DIREITO ESSENCIAL ¿ FORNECIMENTO GRATUITO DE MEIOS INDISPENSÁVEIS AO TRATAMENTO E À PRESERVAÇÃO DA SAÚDE DE PESSOAS CARENTES ¿ DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, ¿CAPUT¿, E 196) ¿ PRECEDENTES (STF) ¿ RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS PESSOAS POLÍTICAS QUE INTEGRAM O ESTADO FEDERAL BRASILEIRO ¿ CONSEQUENTE POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DA AÇÃO CONTRA UM, ALGUNS OU TODOS OS ENTES ESTATAIS ¿ RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. (RE 716777 AgR, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 09/04/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-091 DIVULG 15-05-2013 PUBLIC 16-05-2013). (grifos nossos). Este Egrégio Tribunal de Justiça posiciona-se no mesmo sentido: REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. APLICAÇÃO DA NORMA PROCESSUAL NO CASO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO ORDINÁRIA PARA TRATAMENTO DE SAÚDE. PRELIMINARES. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO E ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO PARÁ. AFASTADAS. MÉRITO. DIREITO À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. TRATAMENTO MÉDICO INDISPENSÁVEL À SAÚDE DO AUTOR. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 20, §4º DO CPC/73. MINORAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA NESSE PONTO. APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. DECISÃO UNÂNIME. 1. Ante o disposto no art. 14, do CPC/2015, tem-se que a norma processual não retroagirá, de maneira que devem ser respeitados os atos processuais e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da lei revogada. Desse modo, hão de ser aplicados os comandos insertos no CPC/1973, vigente por ocasião da publicação e da intimação da decisão apelada. PRELIMINARES 2. Ilegitimidade Passiva do Estado do Pará. A saúde é responsabilidade do Estado que, em seu sentido amplo, compreende todos entes federados (União, Estado e Municípios, além do Distrito Federal), não havendo falar em fatiamento de atribuições quando se trata da prestação dessa garantia constitucional. 3. Perda do objeto. Não há que se falar em superveniente perda do objeto diante da decisão que deferiu a tutela antecipada, eis que tal fato não afasta a possibilidade de se apurar, com o julgamento do mérito da demanda, o cabimento da medida da forma consoante pretendida. MÉRITO 4. O direito à saúde, constitucionalmente assegurado, revela-se como uma das pilastras sobre a qual se sustenta a Federação, o que levou o legislador constituinte a estabelecer um sistema único e integrado por todos os entes federados, cada um dentro de sua esfera de atribuição, para administrá-lo e executá-lo, seja de forma direta ou por intermédio de terceiros. 5. Impende assinalar a existência de expressa disposição constitucional sobre o dever de participação dos entes federados no financiamento do Sistema Único de Saúde, nos termos do art. 198, parágrafo único. Precedentes do C. STJ e STF, legitimidade do Município, do Estado e da União Federal, no que pertinente à obrigação para viabilizar o tratamento de saúde dos que dele necessitam. 6. Reexame Necessário e Recurso de Apelação conhecidos e parcialmente providos, a fim de minorar os honorários advocatícios para o importe de R$1.000,00, mantendo, quanto ao mais, a sentença de 1º grau. (2017.01432779-35, 173.177, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-03-27, Publicado em 2017-04-11). REEXAME NECESSÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DIREITO À SAÚDE. RESPONSABILIDADE DO MUNICIPIO. DEVER DE ARCAR COM OS CUSTOS DA PACIENTE COM MOLESTIA GRAVE. SENTENÇA MANTIDA. 1- O direito à saúde é tutelado por norma de índole constitucional, garantidora da universalidade e da igualdade de acesso às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 2- Compete a qualquer ente público indistintamente disponibilizar os recursos necessários como forma de garantir tal direito a pessoa economicamente desamparada, em iminente risco de vida. 3- A determinação judicial não fere o princípio da isonomia e impessoalidade, tampouco viola o princípio da separação dos poderes, porquanto não pretende o Poder Judiciário imiscuir-se no papel da Administração na definição das prioridades de atendimento. Em verdade, o Judiciário busca dar efetividade mínima às disposições insertas no art. 196 da Constituição Federal e, desse mister não pode se omitir. 4- Nesse contexto, impõem-se a manutenção da sentença. (2017.00743164-64, 170.950, Rel. EZILDA PASTANA MUTRAN, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-02-20, Publicado em 2017-02-24). (grifos nossos). Portanto, a imposição de tratamento cirúrgico encontra respaldo na Constituição da República e na legislação infraconstitucional, em observância à proteção integral concedida aos cidadãos. Assim, a condenação em questão não representa ofensa aos princípios da separação dos poderes, da legalidade, do devido processo legal ou da reserva do possível.    Impende destacar, que o Poder Judiciário não é insensível aos graves e agudos problemas financeiros por que passam os entes federativos e, não desconhece que cabe a eles tarefa executiva de administrar e gerir os recursos públicos, bem como é cediço não ser de responsabilidade do Judiciário discutir a implementação ou não de políticas públicas, impor programas políticos, ou direcionar recursos financeiros, atribuições afetas à esfera da Administração Pública. Entretanto, ao Judiciário cabe dar efetividade à lei, ou seja, na inobservância da legislação pelos Poderes Públicos, aquele Poder deve intervir, dando uma resposta efetiva às pretensões das partes. Ante o exposto, nos termos da fundamentação, conheço do REEXAME NECESSÁRIO, mantendo a sentença em sua integralidade. P.R.I Belém (PA), 31 de maio de 2017. ELVINA GEMAQUE TAVEIRA Desembargadora Relatora (2017.02273137-88, Não Informado, Rel. MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-06-09, Publicado em 2017-06-09)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 09/06/2017
Data da Publicação : 09/06/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA
Número do documento : 2017.02273137-88
Tipo de processo : Remessa Necessária
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