TJPA 0006759-23.2017.8.14.0000
1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO ORIGEM: JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DE MOSQUEIRO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0006759-23.2017.8.14.0000 AGRAVANTE: DISAL ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA AGRAVADO: IVANILDO DA SILVA RELATORA: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - ADIMPLEMENTO DE 78 % DO VALOR CONTRATADO - INAPLICABILIDADE - CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO MONOCRATICAMENTE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO, com pedido de efeito suspensivo, interposto por DISAL ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA, em face da decisão prolatada pelo douto Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Mosqueiro, nos autos da Ação de Busca e Apreensão, ajuizada em face de IVANILDO DA SILVA A decisão agravada foi lavrada nos seguintes termos: Trata-se de ação de busca e apreensão ajuizada por DISAL ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA em face de IVANILDO DA SILVA, objetivando a retomada do bem tornando definitiva a consolidação da propriedade e da posse plena e exclusiva em mãos do autor em razão da inadimplência do réu. Houve pedido de liminar de busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. É o relatório. Passo a decidir o pedido de liminar Compulsando os autos, observo que o réu pagou mais de 65% (sessenta e cinco por cento) do valor do bem financiado, tendo o inadimplemento atingido parcela mínima do valor do contrato Em observância aos princípios da boa-fé objetiva (art. 422 do CC), da função social dos contratos (art. 421 do CC), do enriquecimento sem causa (art. 884 do CC) e firmado na teoria do adimplemento substancial, indefiro o pedido liminar de busca e apreensão. Vale destacar que a 4ª e 5ª Câmaras Cível Isolada do TJE/PA têm decidido nesta esteira (AI 137912, 136338, 133793, 133532, todos da 4ª CCI e AI 137204 e 133544 da 5ª CCI). CITE-SE o réu para, em 05 (cinco) dias, querendo, pagar a integralidade da dívida, ou contestar a ação em 15 (quinze) dias, ficando a ré alertada que não contestada a ação, presumir-se-ão, como verdadeiros, os fatos alegados pelo autor na inicial. Belém - Ilha do Mosqueiro, 03 de maio de 2017. JOSÉ TORQUATO ARAÚJO DE ALENCAR Juiz de Direito Titular da Vara Distrital Juntou documentos às fls. 12/76. Inconformado o agravado interpôs recurso (fls.02/24) alegando inaplicabilidade da teoria do adimplemento substancial, requerendo que seja deferida a liminar e expedido o mandado de busca e apreensão do bem objeto da lide. Por fim, pugnou que seja conferido efeito ativo ao presente agravo, determinando a paralisação do processo, até seu julgamento final. Efeito ativo deferido às fls. 65/67, tendo em vista que o agravado somente teria adimplido 78% do contrato celebrado ao tempo do ajuizamento da ação de busca e apreensão. Em sede de contrarrazões (fls. 071/072), o agravado sustenta que o STJ vem aplicando o instituto do adimplemento substancial em hipóteses que o consumidor tenha adimplido a quase totalidade do contrato. Apresenta trecho de doutrina que cita a configuração do instituto quando faltar apenas uma parcela ou já houver sido 16 das 18 parcelas ou mesmo 94% do contrato (fl. 072). DECIDO. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Primeiramente ressalto que restam presentes os requisitos para o deferimento da busca e apreensão, uma vez que a relação contratual se encontra evidenciada às fls. 51/55 e a existência da dívida está comprovada nos autos. No que tange a alegação de que o contrato estava quase que integralmente cumprido (aproximadamente 78% das parcelas já teriam sido pagas) e por isso aplicável a espécie a teoria do adimplemento substancial, entendo que não prospera tal argumento. Primeiro porque não se verifica a presença dos requisitos para aplicação do instituto, pois, no caso dos autos, verifico que o agravado adimpliu somente 78 (setenta e oito por cento) do contrato e seu saldo devedor totaliza R$ 19.613,43 (fls. 09). Neste contexto, o próprio agravado defende em suas contrarrazões (fls. 72) que o instituto do adimplemento substancial somente seria aplicável quando houver quitação da quase totalidade do contrato, o que não é o caso. Segundo porque, conforme o julgamento do REsp 1622555 / MG, há entendimento firmado de que não se aplica a teoria do adimplemento substancial aos contratos de alienação fiduciária em garantia regidos pelo Decreto-Lei 911/69. Senão vejamos: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO, COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA REGIDO PELO DECRETO-LEI 911/69. INCONTROVERSO INADIMPLEMENTO DAS QUATRO ÚLTIMAS PARCELAS (DE UM TOTAL DE 48). EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO (OU DETERMINAÇÃO PARA ADITAMENTO DA INICIAL, PARA TRANSMUDÁ-LA EM AÇÃO EXECUTIVA OU DE COBRANÇA), A PRETEXTO DA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. DESCABIMENTO. 1. ABSOLUTA INCOMPATIBILIDADE DA CITADA TEORIA COM OS TERMOS DA LEI ESPECIAL DE REGÊNCIA. RECONHECIMENTO. 2. REMANCIPAÇÃO DO BEM AO DEVEDOR CONDICIONADA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA, ASSIM COMPREENDIDA COMO OS DÉBITOS VENCIDOS, VINCENDOS E ENCARGOS APRESENTADOS PELO CREDOR, CONFORME ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DA SEGUNDA SEÇÃO, SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS (REsp n. 1.418.593/MS). 3. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO, COM A UTILIZAÇÃO DA VIA JUDICIAL ELEITA PELA LEI DE REGÊNCIA COMO SENDO A MAIS IDÔNEA E EFICAZ PARA O PROPÓSITO DE COMPELIR O DEVEDOR A CUMPRIR COM A SUA OBRIGAÇÃO (AGORA, POR ELE REPUTADA ÍNFIMA), SOB PENA DE CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE NAS MÃOS DO CREDOR FIDUCIÁRIO. 4. DESVIRTUAMENTO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL, CONSIDERADA A SUA FINALIDADE E A BOA-FÉ DOS CONTRATANTES, A ENSEJAR O ENFRAQUECIMENTO DO INSTITUTO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA. VERIFICAÇÃO. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A incidência subsidiária do Código Civil, notadamente as normas gerais, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infugíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela "lei geral" não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela lei especial (ut Art. 1.368-A, introduzido pela Lei n. 10931/2004). 1.1 Além de o Decreto-Lei n. 911/1969 não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, é expresso em exigir a quitação integral do débito como condição imprescindível para que o bem alienado fiduciariamente seja remancipado. Em seus termos, para que o bem possa ser restituído ao devedor, livre de ônus, não basta que ele quite quase toda a dívida; é insuficiente que pague substancialmente o débito; é necessário, para esse efeito, que quite integralmente a dívida pendente. 2. Afigura-se, pois, de todo incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso _ desimportando sua extensão, se de pouca monta ou se de expressão considerável _, quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente. Compreensão diversa desborda, a um só tempo, do diploma legal exclusivamente aplicável à questão em análise (Decreto-Lei n. 911/1969), e, por via transversa, da própria orientação firmada pela Segunda Seção, por ocasião do julgamento do citado Resp n. 1.418.593/MS, representativo da controvérsia, segundo a qual a restituição do bem ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento, no prazo de cinco dias contados da execução da liminar de busca e apreensão, da integralidade da dívida pendente, assim compreendida como as parcelas vencidas e não pagas, as parcelas vincendas e os encargos, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 3. Impor-se ao credor a preterição da ação de busca e apreensão (prevista em lei, segundo a garantia fiduciária a ele conferida) por outra via judicial, evidentemente menos eficaz, denota absoluto descompasso com o sistema processual. Inadequado, pois, extinguir ou obstar a medida de busca e apreensão corretamente ajuizada, para que o credor, sem poder se valer de garantia fiduciária dada (a qual, diante do inadimplemento, conferia-lhe, na verdade, a condição de proprietário do bem), intente ação executiva ou de cobrança, para só então adentrar no patrimônio do devedor, por meio de constrição judicial que poderá, quem sabe (respeitada o ordem legal), recair sobre esse mesmo bem (naturalmente, se o devedor, até lá, não tiver dele se desfeito). 4. A teoria do adimplemento substancial tem por objetivo precípuo impedir que o credor resolva a relação contratual em razão de inadimplemento de ínfima parcela da obrigação. A via judicial para esse fim é a ação de resolução contratual. Diversamente, o credor fiduciário, quando promove ação de busca e apreensão, de modo algum pretende extinguir a relação contratual. Vale-se da ação de busca e apreensão com o propósito imediato de dar cumprimento aos termos do contrato, na medida em que se utiliza da garantia fiduciária ajustada para compelir o devedor fiduciante a dar cumprimento às obrigações faltantes, assumidas contratualmente (e agora, por ele, reputadas ínfimas). A consolidação da propriedade fiduciária nas mãos do credor apresenta-se como consequência da renitência do devedor fiduciante de honrar seu dever contratual, e não como objetivo imediato da ação. E, note-se que, mesmo nesse caso, a extinção do contrato dá-se pelo cumprimento da obrigação, ainda que de modo compulsório, por meio da garantia fiduciária ajustada. 4.1 É questionável, se não inadequado, supor que a boa-fé contratual estaria ao lado de devedor fiduciante que deixa de pagar uma ou até algumas parcelas por ele reputadas ínfimas _ mas certamente de expressão considerável, na ótica do credor, que já cumpriu integralmente a sua obrigação _, e, instado extra e judicialmente para honrar o seu dever contratual, deixa de fazê-lo, a despeito de ter a mais absoluta ciência dos gravosos consectários legais advindos da propriedade fiduciária. A aplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 4.2. A propriedade fiduciária, concebida pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada da teoria do adimplemento substancial. 5. Recurso Especial provido. (STJ - REsp: 1622555 MG 2015/0279732-8, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 22/02/2017, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/03/2017) A jurisprudência dos Tribunais pátrios também não destoa do acima exposto: EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - COMPROVAÇÃO DA MORA - NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL VÁLIDA - TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - INAPLICABILIDADE - PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DA LIMINAR. 1. Nos contratos de alienação fiduciária em garantia regidos pelo Decreto-Lei 911/69, restando comprovada a mora por meio de notificação extrajudicial remetida para o endereço constante do contrato celebrado entre as partes, estão caracterizados os requisitos legais para o deferimento da liminar de busca e apreensão. 2. Conforme posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, não se aplica a teoria do adimplemento substancial paos regidos pelo Decreto-Lei 911/69. 3. Recurso provido. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.17.035420-3/001, Relator(a): Des.(a) José Américo Martins da Costa , 15ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 05/04/0018, publicação da súmula em 11/04/2018) Pelo exposto, entendo que a decisão monocrática deve ser reformada, pois incabível na espécie a Teoria do Adimplemento Substancial. Ante o exposto, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento, reformando a decisão recorrida e concedendo a busca e apreensão pleiteada. Belém, 17 de julho de 2018. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora
(2018.02873861-30, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2018-07-26, Publicado em 2018-07-26)
Ementa
1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO ORIGEM: JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DE MOSQUEIRO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0006759-23.2017.8.14.0000 AGRAVANTE: DISAL ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA AGRAVADO: IVANILDO DA SILVA RELATORA: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - ADIMPLEMENTO DE 78 % DO VALOR CONTRATADO - INAPLICABILIDADE - CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO MONOCRATICAMENTE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO, com pedido de efeito suspensivo, interposto por DISAL ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA, em face da decisão prolatada pelo douto Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Mosqueiro, nos autos da Ação de Busca e Apreensão, ajuizada em face de IVANILDO DA SILVA A decisão agravada foi lavrada nos seguintes termos: Trata-se de ação de busca e apreensão ajuizada por DISAL ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA em face de IVANILDO DA SILVA, objetivando a retomada do bem tornando definitiva a consolidação da propriedade e da posse plena e exclusiva em mãos do autor em razão da inadimplência do réu. Houve pedido de liminar de busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. É o relatório. Passo a decidir o pedido de liminar Compulsando os autos, observo que o réu pagou mais de 65% (sessenta e cinco por cento) do valor do bem financiado, tendo o inadimplemento atingido parcela mínima do valor do contrato Em observância aos princípios da boa-fé objetiva (art. 422 do CC), da função social dos contratos (art. 421 do CC), do enriquecimento sem causa (art. 884 do CC) e firmado na teoria do adimplemento substancial, indefiro o pedido liminar de busca e apreensão. Vale destacar que a 4ª e 5ª Câmaras Cível Isolada do TJE/PA têm decidido nesta esteira (AI 137912, 136338, 133793, 133532, todos da 4ª CCI e AI 137204 e 133544 da 5ª CCI). CITE-SE o réu para, em 05 (cinco) dias, querendo, pagar a integralidade da dívida, ou contestar a ação em 15 (quinze) dias, ficando a ré alertada que não contestada a ação, presumir-se-ão, como verdadeiros, os fatos alegados pelo autor na inicial. Belém - Ilha do Mosqueiro, 03 de maio de 2017. JOSÉ TORQUATO ARAÚJO DE ALENCAR Juiz de Direito Titular da Vara Distrital Juntou documentos às fls. 12/76. Inconformado o agravado interpôs recurso (fls.02/24) alegando inaplicabilidade da teoria do adimplemento substancial, requerendo que seja deferida a liminar e expedido o mandado de busca e apreensão do bem objeto da lide. Por fim, pugnou que seja conferido efeito ativo ao presente agravo, determinando a paralisação do processo, até seu julgamento final. Efeito ativo deferido às fls. 65/67, tendo em vista que o agravado somente teria adimplido 78% do contrato celebrado ao tempo do ajuizamento da ação de busca e apreensão. Em sede de contrarrazões (fls. 071/072), o agravado sustenta que o STJ vem aplicando o instituto do adimplemento substancial em hipóteses que o consumidor tenha adimplido a quase totalidade do contrato. Apresenta trecho de doutrina que cita a configuração do instituto quando faltar apenas uma parcela ou já houver sido 16 das 18 parcelas ou mesmo 94% do contrato (fl. 072). DECIDO. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Primeiramente ressalto que restam presentes os requisitos para o deferimento da busca e apreensão, uma vez que a relação contratual se encontra evidenciada às fls. 51/55 e a existência da dívida está comprovada nos autos. No que tange a alegação de que o contrato estava quase que integralmente cumprido (aproximadamente 78% das parcelas já teriam sido pagas) e por isso aplicável a espécie a teoria do adimplemento substancial, entendo que não prospera tal argumento. Primeiro porque não se verifica a presença dos requisitos para aplicação do instituto, pois, no caso dos autos, verifico que o agravado adimpliu somente 78 (setenta e oito por cento) do contrato e seu saldo devedor totaliza R$ 19.613,43 (fls. 09). Neste contexto, o próprio agravado defende em suas contrarrazões (fls. 72) que o instituto do adimplemento substancial somente seria aplicável quando houver quitação da quase totalidade do contrato, o que não é o caso. Segundo porque, conforme o julgamento do REsp 1622555 / MG, há entendimento firmado de que não se aplica a teoria do adimplemento substancial aos contratos de alienação fiduciária em garantia regidos pelo Decreto-Lei 911/69. Senão vejamos: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO, COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA REGIDO PELO DECRETO-LEI 911/69. INCONTROVERSO INADIMPLEMENTO DAS QUATRO ÚLTIMAS PARCELAS (DE UM TOTAL DE 48). EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO (OU DETERMINAÇÃO PARA ADITAMENTO DA INICIAL, PARA TRANSMUDÁ-LA EM AÇÃO EXECUTIVA OU DE COBRANÇA), A PRETEXTO DA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. DESCABIMENTO. 1. ABSOLUTA INCOMPATIBILIDADE DA CITADA TEORIA COM OS TERMOS DA LEI ESPECIAL DE REGÊNCIA. RECONHECIMENTO. 2. REMANCIPAÇÃO DO BEM AO DEVEDOR CONDICIONADA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA, ASSIM COMPREENDIDA COMO OS DÉBITOS VENCIDOS, VINCENDOS E ENCARGOS APRESENTADOS PELO CREDOR, CONFORME ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DA SEGUNDA SEÇÃO, SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS (REsp n. 1.418.593/MS). 3. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO, COM A UTILIZAÇÃO DA VIA JUDICIAL ELEITA PELA LEI DE REGÊNCIA COMO SENDO A MAIS IDÔNEA E EFICAZ PARA O PROPÓSITO DE COMPELIR O DEVEDOR A CUMPRIR COM A SUA OBRIGAÇÃO (AGORA, POR ELE REPUTADA ÍNFIMA), SOB PENA DE CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE NAS MÃOS DO CREDOR FIDUCIÁRIO. 4. DESVIRTUAMENTO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL, CONSIDERADA A SUA FINALIDADE E A BOA-FÉ DOS CONTRATANTES, A ENSEJAR O ENFRAQUECIMENTO DO INSTITUTO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA. VERIFICAÇÃO. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A incidência subsidiária do Código Civil, notadamente as normas gerais, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infugíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela "lei geral" não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela lei especial (ut Art. 1.368-A, introduzido pela Lei n. 10931/2004). 1.1 Além de o Decreto-Lei n. 911/1969 não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, é expresso em exigir a quitação integral do débito como condição imprescindível para que o bem alienado fiduciariamente seja remancipado. Em seus termos, para que o bem possa ser restituído ao devedor, livre de ônus, não basta que ele quite quase toda a dívida; é insuficiente que pague substancialmente o débito; é necessário, para esse efeito, que quite integralmente a dívida pendente. 2. Afigura-se, pois, de todo incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso _ desimportando sua extensão, se de pouca monta ou se de expressão considerável _, quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente. Compreensão diversa desborda, a um só tempo, do diploma legal exclusivamente aplicável à questão em análise (Decreto-Lei n. 911/1969), e, por via transversa, da própria orientação firmada pela Segunda Seção, por ocasião do julgamento do citado Resp n. 1.418.593/MS, representativo da controvérsia, segundo a qual a restituição do bem ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento, no prazo de cinco dias contados da execução da liminar de busca e apreensão, da integralidade da dívida pendente, assim compreendida como as parcelas vencidas e não pagas, as parcelas vincendas e os encargos, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 3. Impor-se ao credor a preterição da ação de busca e apreensão (prevista em lei, segundo a garantia fiduciária a ele conferida) por outra via judicial, evidentemente menos eficaz, denota absoluto descompasso com o sistema processual. Inadequado, pois, extinguir ou obstar a medida de busca e apreensão corretamente ajuizada, para que o credor, sem poder se valer de garantia fiduciária dada (a qual, diante do inadimplemento, conferia-lhe, na verdade, a condição de proprietário do bem), intente ação executiva ou de cobrança, para só então adentrar no patrimônio do devedor, por meio de constrição judicial que poderá, quem sabe (respeitada o ordem legal), recair sobre esse mesmo bem (naturalmente, se o devedor, até lá, não tiver dele se desfeito). 4. A teoria do adimplemento substancial tem por objetivo precípuo impedir que o credor resolva a relação contratual em razão de inadimplemento de ínfima parcela da obrigação. A via judicial para esse fim é a ação de resolução contratual. Diversamente, o credor fiduciário, quando promove ação de busca e apreensão, de modo algum pretende extinguir a relação contratual. Vale-se da ação de busca e apreensão com o propósito imediato de dar cumprimento aos termos do contrato, na medida em que se utiliza da garantia fiduciária ajustada para compelir o devedor fiduciante a dar cumprimento às obrigações faltantes, assumidas contratualmente (e agora, por ele, reputadas ínfimas). A consolidação da propriedade fiduciária nas mãos do credor apresenta-se como consequência da renitência do devedor fiduciante de honrar seu dever contratual, e não como objetivo imediato da ação. E, note-se que, mesmo nesse caso, a extinção do contrato dá-se pelo cumprimento da obrigação, ainda que de modo compulsório, por meio da garantia fiduciária ajustada. 4.1 É questionável, se não inadequado, supor que a boa-fé contratual estaria ao lado de devedor fiduciante que deixa de pagar uma ou até algumas parcelas por ele reputadas ínfimas _ mas certamente de expressão considerável, na ótica do credor, que já cumpriu integralmente a sua obrigação _, e, instado extra e judicialmente para honrar o seu dever contratual, deixa de fazê-lo, a despeito de ter a mais absoluta ciência dos gravosos consectários legais advindos da propriedade fiduciária. A aplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 4.2. A propriedade fiduciária, concebida pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada da teoria do adimplemento substancial. 5. Recurso Especial provido. (STJ - REsp: 1622555 MG 2015/0279732-8, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 22/02/2017, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/03/2017) A jurisprudência dos Tribunais pátrios também não destoa do acima exposto: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - COMPROVAÇÃO DA MORA - NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL VÁLIDA - TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - INAPLICABILIDADE - PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DA LIMINAR. 1. Nos contratos de alienação fiduciária em garantia regidos pelo Decreto-Lei 911/69, restando comprovada a mora por meio de notificação extrajudicial remetida para o endereço constante do contrato celebrado entre as partes, estão caracterizados os requisitos legais para o deferimento da liminar de busca e apreensão. 2. Conforme posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, não se aplica a teoria do adimplemento substancial paos regidos pelo Decreto-Lei 911/69. 3. Recurso provido. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.17.035420-3/001, Relator(a): Des.(a) José Américo Martins da Costa , 15ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 05/04/0018, publicação da súmula em 11/04/2018) Pelo exposto, entendo que a decisão monocrática deve ser reformada, pois incabível na espécie a Teoria do Adimplemento Substancial. Ante o exposto, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento, reformando a decisão recorrida e concedendo a busca e apreensão pleiteada. Belém, 17 de julho de 2018. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora
(2018.02873861-30, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2018-07-26, Publicado em 2018-07-26)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
26/07/2018
Data da Publicação
:
26/07/2018
Órgão Julgador
:
1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO
Relator(a)
:
MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE
Número do documento
:
2018.02873861-30
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
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