main-banner

Jurisprudência


TJPA 0007531-20.2016.8.14.0000

Ementa
PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - SENTENÇA - PERDA DO OBJETO - RECURSO PREJUDICADO - DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR. POSSIBILIDADE. ART. 932, III, DO CPC/2015. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo ESTADO DO PARÁ contra decisão proferida pelo Juízo da 6ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Santarém, que concedeu a tutela provisória em caráter de urgência nos autos da Ação Civil Pública (Proc. 0064133-09.2015.814.0051) proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, em favor da menor L. S. A. L., determinando que no prazo de 24 horas, o ESTADO DO PARÁ, em solidariedade com o MUNICÍPIO DE SANTARÉM, forneça o medicamento LHRH, o qual é utilizado para realizar exame de Teste de Estímulo, bem como de 120 sondas uretrais nº 08, 02 frascos de clorexidine não alcoólico e 03 caixas de luvas cirúrgicas, conforme prescrição médica, sob pena de multa de R$10.000,00.            Em suas razões (fls. 03/05), o agravante, após breve exposição dos fatos, esclarece que a liminar não tem como ser cumprida dentro do prazo de 24 horas estabelecido pelo juízo ¿a quo¿, considerando que o Estado não possui esse medicamento em estoque, fazendo-se necessário instaurar um processo administrativo, nos termos da lei de licitações, com o fito de aquisição por meio de dispensa, o que enseja um determinado tempo entre a cotação de preços e a expedição de nota de empenho.            Por essa razão sustenta a necessidade de redução da astreinte (R$10.000,00) e a majoração do prazo para cumprimento da liminar.             Ao final, requer a concessão do efeito suspensivo e, no mérito, o conhecimento e provimento do recurso, para que seja revogada a decisão agravada proferida pelo juízo a quo, ou caso assim não entenda, requer a majoração do prazo para cumprimento e a redução da multa arbitrada em nome do princípio da razoabilidade e proporcionalidade.            Acostou documentos (v. fls. 06/49).            Coube-me a relatoria do feito por distribuição (fl. 50).            Em decisão monocrática de fls. 22/23v, deferi em parte o efeito suspensivo pleiteado pelo agravante.            Contrarrazões às fls. 57-67.            O Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso de agravo de instrumento (fls. 70-74)            É o relatório, síntese do necessário.            DECIDO.            Após, consulta ao Sistema Libra de acompanhamento processual deste TJ/PA, verifico que o juízo a quo proferiu sentença nos seguintes termos: ¿SENTENÇA com resolução de mérito 1 - RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública ajuizada em pelo Ministério Público Estadual, substituto processual de Lilian Stephanie dos Anjos Lima, em face do Estado do Pará e do Município de Santarém. Narra a inicial que substituida processual necessita de farmaco LHRH, bem como sonda uretral 08,02, frascos de clorexidine não alcoólico e 03 caixas de luvas cirúrgicas a paciente substituída. Requereu a expedição de ordem judicial aos requeridos para o fornecimento do medicamento e insumos a substituída. Este Juízo deferiu a tutela antecipada e determinou que os requeridos providenciassem o fornecimento do medicamento e insumos a substituída. Em contestação, o Estado do Pará alegou a preliminar da incompetência do juízo e da perda do objeto por ausência de interesse processual, e no mérito argumentou, ainda, que diante do princípio da reserva do possível e das limitações orçamentárias haveria ingerência não autorizada do Poder Judiciário nas diretrizes orçamentárias estabelecidas pelo Legislativo e nas políticas públicas adotadas pela Administração Pública. Pugnou, assim, pela improcedência da ação. O Município de Santarémnão apresentou contestação, conforme certidão de fl. 133. O Ministério Público refutou os argumentos do requerido e ratificou os termos da inicial. É o relatório. Passo a decidir. 2 - FUNDAMENTAÇÃO Passo ao julgamento antecipado da lide nos termos do art. 330, I, do CPC. DAS PRELIMINARES Inicialmente destaco que tendo em vista o princípio da corresponsabilização dos entes públicos, e considerando o princípio da demanda, na qual a autora elege contra quem irá propor a ação, diante da solidariedade dos entes públicos, não há que se falar em incompetência do juízo ou ilegitimidade passiva ad causam do Estado e do Município de Santarém, pois compete a cada um dos entes federados, em razão da autonomia federativa, encargo solidário com os demais entes, prover diretamente os tratamentos médico-hospitalares exigíveis para o restabelecimento urgente, inadiável e inafastável da saúde de cidadãos como no caso vertente. Desta forma, indefiro a preliminar da incompetência do juízo. Quanto a análise da preliminar da perda do objeto, também afasto a preliminar, eis que a concessão de medida antecipatória satisfativa, com consequente realização do tratamento médico necessário à paciente, a cargo do ente público, não leva à perda do objeto da ação, mostrando-se imprescindível a sua confirmação pela sentença. MÉRITO Não sendo necessária a realização de audiência instrutória, considerando que os fatos estão demonstrados com prova material, aplico o disposto no art. 330, inciso I, do Código de Processo Civil e profiro o julgamento antecipado da lide. O presente caso trata, precipuamente, do direito à saúde, um dos direitos fundamentais mais relevantes. A necessidade dos medicamentos e insumos a substituida foi devidamente atestada por receituário médico. Patente, pois, a necessidade da alimentação para a sobrevivência da paciente-substituída, pois o direito à saúde, em consequência do direito à vida e à dignidade humana, foi alçado pela atual Constituição da República à condição de direito fundamental, abrangendo a saúde como um dos direitos previstos na Ordem Social, em seu artigo 193. Como forma de se garantir efetivamente o bem-estar social, a Constituição, ao cuidar da saúde, assegurou, em seu art. 196: ¿Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação¿. "Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado." Como direito fundamental, por si só, já merece a proteção do Estado. Sendo direito que atine à vida, assume especial importância e, assim sendo, maior é a responsabilidade do Poder Público em resguardá-lo. A garantia à saúde é tão primordial que suplanta qualquer argumento do Estado no tocante ao seu não atendimento. Entendo que direitos fundamentais não podem ser negados sob a justificativa de que o Estado não possui verbas ou infra-estrutura suficientes para atendê-los. A forma de atender é providência que compete ao Poder Público, sendo, no caso particular, o Município e o Estado. Nesse sentido, destaco o julgado do Supremo Tribunal Federal a respeito do tema: ¿PACIENTES COM ESQUIZOFRENIA PARANÓIDE E DOENÇA MANÍACO-DEPRESSIVA CRÔNICA, COM EPISÓDIOS DE TENTATIVA DE SUICÍDIO - PESSOAS DESTITUÍDAS DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - NECESSIDADE IMPERIOSA DE SE PRESERVAR, POR RAZÕES DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO, A INTEGRIDADE DESSE DIREITO ESSENCIAL - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS INDISPENSÁVEIS EM FAVOR DE PESSOAS CARENTES - DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, "CAPUT", E 196) - PRECEDENTES (STF) - ABUSO DO DIREITO DE RECORRER - IMPOSIÇÃO DE MULTA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA, A PESSOAS CARENTES, DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS À PRESERVAÇÃO DE SUA VIDA E/OU DE SUA SAÚDE: UM DEVER CONSTITUCIONAL QUE O ESTADO NÃO PODE DEIXAR DE CUMPRIR. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, "caput", e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF (...)¿ (STF, RE-AgR 393175/RS, Rel. Celso de Mello, j. 12.12.2006, DJ 02.02.2007, GRIFEI). Como bem ressaltado na decisão acima transcrita, a norma programática, apesar de ser programática, é passível de ser cumprida e deve sê-lo. O Estado não pode ser omisso ante à gravidade do estado de saúde de alguém. O serviço público de saúde, ainda que falho, deve dar conta do atendimento necessário à população carente. Nesse sentir, é dever do Estado garantir o tratamento necessários ao pronto estabelecimento da saúde da paciente substituída. Qualquer atitude contrária a esse entendimento configura cerceamento ao direito à saúde e, mais profundamente, ao direito à vida, já que são direito intimamente relacionados. Cabe ser mencionado que a responsabilidade da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios é solidária devendo todos esses entes serem responsabilizados em casos como este em julgamento. Por fim, destaco que entendo que o pedido do autor deve ser confirmado, pois, acima de tudo o direito pela vida é soberano e deve prevalecer nesses casos. DISPOSITIVO Posto isso, e por tudo mais que dos autos constas, JULGO PROCEDENTE o pedido articulado pelo Ministério Público, substituto processual de Lilian Stephanie dos Anjos Lima, em desfavor do Estado do Pará e do Município de Santarém, confirmando os termos da decisão que concedeu a medida liminar pleiteada no presente caso, para o fornecimento do medicamento e insumos necessários ao tratamento da substituída processual, e, por conseguinte, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil JULGO EXTINTO O PRESENTE PROCESSO COM A RESOLUÇÃO DE SEU MÉRITO. Sem custas e sem honorários advocatícios eis que a Ação Civil foi movida pelo Ministério Público. Dê ciência da presente sentença ao Ministério Público do Estado do Pará, encaminhando-lhe os autos e ao Estado do Pará e ao Município de Santarém, nos termos do artigo 183, do CPC. Publique-se. Registre-se e Intimem-se. Santarém, 17 de janeiro de 2017. JOSINEIDE GADELHA PAMPLONA MEDEIROS Juíza de Direito¿ .            Acerca da perda do objeto, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, na obra "Código de Processo Civil Comentado", 8ª ed., São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 1041, anotam: "Recurso prejudicado. É aquele que perdeu seu objeto. Ocorrendo a perda do objeto, há falta superveniente de interesse recursal, impondo-se o não conhecimento do recurso. Assim, ao relator cabe julgar inadmissível o recurso por falta de interesse, ou seja, julgá-lo prejudicado."            O art. 932, III do Código Processual Civil/2015 preceitua: ¿Art. 932. Incumbe ao relator: (...) III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; (grifo nosso)            A jurisprudência assim decidiu: ¿AGRAVO. PERDA DO OBJETO. Face à perda do objeto do agravo de instrumento é imperativa a sua rejeição por decisão liminar, conforme determina o art. 557 do CPC. Agravo rejeitado.¿ (TJRS, 7ª Câm. Cível, AI 70005870639, rel. Desª. Maria Berenice Dias, j. 19.02.2003).            Sobre a superveniência de fato novo, assim leciona Costa Machado in Código de Processo Civil Interpretado e Anotado, Barueri, SP: Manole, 2006, p. 844: ¿(...) Observe-se que a ratio da presente disposição está ligada à idéia de que nem sempre o contexto fático da causa permanece como era quando da propositura da ação - o que, evidentemente, seria o ideal -, de sorte que ao juiz cabe apropriar-se da realidade presente ao tempo da sentença para decidir com justiça o litígio. A regra se aplica também ao acórdão.¿            Com efeito, vislumbra-se que o objeto da ação principal já foi solucionado pelo juízo a quo, motivo pelo qual a análise do presente recurso encontra-se prejudicada. Isso ocorre porque o provimento ou improvimento do recurso resta sem efeito diante da solução do litígio.            Em consonância, a jurisprudência assim se posiciona: ¿AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DIVÓRCIO. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. REDUÇÃO. ACORDO. PERDA DO OBJETO. Agravo de instrumento prejudicado. (Agravo de Instrumento Nº 70059329250, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 02/07/2014). ¿AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACORDO. PERDA DE OBJETO. Flagrada a perda do objeto do recurso, cumpre julgá-lo prejudicado. RECURSO JULGADO PREJUDICADO. (Agravo de Instrumento Nº 70058403262, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 06/02/2014).            Assim sendo, constata-se que não se faz necessária a análise do mérito da decisão interlocutória ora recorrida.            Por todos os fundamentos expostos, nego seguimento ao presente agravo, por julgá-lo prejudicado, nos termos do art. 932, III, do CPC/2015.            Operada a preclusão, arquive-se.            À Secretaria para as devidas providências.            Belém, 07 de fevereiro de 2017. Desembargador ROBERTO GONÇALVES DE MOURA, Relator (2017.00500705-38, Não Informado, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-03-27, Publicado em 2017-03-27)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 27/03/2017
Data da Publicação : 27/03/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : ROBERTO GONCALVES DE MOURA
Número do documento : 2017.00500705-38
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
Mostrar discussão