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Jurisprudência


TJPA 0007936-56.2016.8.14.0000

Ementa
DECISÃO MONOCRÁTICA   Trata-se de Agravo de Instrumento (processo nº 00079365620168140000) interposto pelo MUNICÍPIO DE ALTAMIRA contra o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, diante da decisão prolatada pelo Juízo da 3ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Altamira/PA, nos autos da Ação Civil Pública (processo nº 00056379120168140005).   A decisão recorrida (fls. 61) teve a seguinte conclusão:   Ante o exposto, com fulcro no art. 300, do CPC, defiro o pedido de tutela de urgência, e, por via de consequência, determino a intimação dos requeridos, MUNICÍPIO DE ALTAMIRA e ESTADO DO PARÁ, para que através de suas Secretarias Municipal e Estadual de Saúde, providenciem o tratamento especializado do paciente  VALDECI ALVES DE SOUZA, com encaminhamento, após as providências pertinentes, do mesmo para fins de consulta, exame e mesmo procedimento cirúrgico na área de oncologia indicado na documentação anexada (CID C15.1), indicado na documentação anexada, em hospital especializado, seja vinculado ao Município de Altamira, seja no Estado do Pará ou outro hospital adequado em qualquer Estado da Federação, com a disponibilidade de leito e medicamentos imprescindíveis a sobrevivência do paciente VALDECI ALVES DE SOUZA, e, caso não haja disponibilidade de vaga para a realização na rede pública estadual, que os requeridos, o custeiem na rede privada, até mesmo, se necessário for, em outro Estado da Federação, em razão do grave estado de saúde do paciente, NO PRAZO DE 05 (CINCO) DIAS, a contar da efetiva intimação desta decisão, tudo sob pena de multa diária no valor de R$1.000,00 (mil reais por dia), até o limite de R$50.000,00 (cinquenta mil reais) no caso de descumprimento.   Em suas razões (fls.02/14), o agravante afirma que não cabe liminar contra a Fazenda Pública que esgote no todo ou em parte o objeto da ação, por expressa vedação do § 3º, art. 1º da Lei nº 8.437/92. Sustenta que a decisão recorrida também não observou o art. 2º da mencionada legislação, contrariando assim, o princípio do devido processo legal.   Aduz a inexistência de previsão legal e orçamentária prévia para a execução da determinação judicial e, a inaplicabilidade da solidariedade passiva irrestrita dos entes públicos aos Sistema Único de Saúde.   Deste modo, o agravante pugna pelo conhecimento do recurso, para que seja atribuído efeito suspensivo à decisão impugnada, sendo o agravo ao final, julgado procedente. Juntou documentos às fls.17/46.   Coube-me a relatoria do feito por distribuição.   É o relato do essencial. Decido.   À luz do CPC/73, conheço do Agravo de Instrumento vez que preenchidos os pressupostos de admissibilidade.   Considerando a aplicação imediata da lei processual, observa-se que o relator poderá suspender a eficácia da decisão recorrida, mas para isto é necessário que o agravante além de evidenciar a possibilidade de lesão grave e de impossível reparação, demonstre a probabilidade do provimento do recurso, conforme dispõe o art.995, parágrafo único do CPC/2015.  Art. 995.  Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. Parágrafo único.  A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso. (grifos nossos)   De início, afirma-se que por expressa determinação dos artigos 23, II e 196 da Constituição Federal, o direito à saúde é um dever linear de todos os entes, senão vejamos:   Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;   Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.   Como bem assevera o Supremo Tribunal Federal, o direito à saúde, além de ser um direito fundamental, representa consequência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostra-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir em omissão (RE 271286 AgR/RS). Deste modo, é incontestável o dever do Estado a prestar serviços de saúde, obrigação que deve ser repartida de forma solidária, entre a União, os Estados e os Municípios.   Neste sentido, posiciona-se o Superior Tribunal de Justiça:   ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO JUDICIAL PARA O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PRESSUPOSTOS DO ART. 273 DO CPC. SÚMULA 7/STJ. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA UNIÃO. 1. É possível a concessão de antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública para obrigá-la a fornecer medicamento a cidadão que não consegue ter acesso, com dignidade, a tratamento que lhe assegure o direito à vida, podendo, inclusive, ser fixada multa cominatória para tal fim, ou até mesmo proceder-se a bloqueio de verbas públicas. Precedentes. 2. A apreciação dos requisitos de que trata o art. 273 do Código de Processo Civil para a concessão da tutela antecipada enseja o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7/STJ. 3. O funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problema de saúde. Precedentes. 4. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no REsp: 1291883 PI 2011/0188115-1, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 20/06/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/07/2013).   No caso concreto o Ministério Público ingressou com a ação de obrigação de fazer com vistas a assegurar o tratamento médico especializado a Valdeci Alves de Souza. Em um Juízo de cognição não exauriente, verifica-se que o agravante não demonstrou a coexistência de risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação e da probabilidade do provimento do recurso, bem como, que a medida não merecia a urgência, capaz de autorizar este Juízo de 2º grau, suspender liminarmente a determinação judicial emanada pelo Juízo a quo.   Ademais, a regra invocada pelo agravante, segundo a qual não cabe liminar contra a Fazenda Pública que esgote no todo ou em parte o objeto da ação não é absoluta. O STJ há muito firmou o posicionamento de que em se tratando de direito à saúde, é possível a antecipação da tutela, dado o seu caráter fundamental, senão vejamos:   ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ALEGAÇÃO GENÉRICA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. POSSIBILIDADE DA TUTELA ANTECIPADA CONTRA FAZENDA PÚBLICA. DIREITO À SAÚDE E À VIDA. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DA MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. 1. A alegação genérica de violação do artigo 535 do CPC, atrai a aplicação do disposto na Súmula 284/STF. Ademais, ainda que pudesse ser afastado este óbice, o acórdão recorrido solucionou a controvérsia de forma fundamentada e suficiente, dando adequada prestação jurisdicional. 2. O Tribunal de origem, a quem compete amplo juízo de cognição da lide, com amparo nos elementos de convicção dos autos, manteve a decisão que concedeu a tutela antecipada. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que, para avaliar os critérios adotados pela instância ordinária na concessão da antecipação dos efeitos da tutela, é necessário o reexame dos elementos probatórios, vedado pela Súmula 7/STJ. 3. É possível a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública para obrigá-la a custear cirurgia cardíaca a cidadão que não consegue ter acesso, com dignidade, a tratamento que lhe assegure o direito à vida, podendo ser fixada multa cominatória para tal fim, ou até mesmo determinar o bloqueio de verbas públicas. O direito fundamental, nestes casos, prevalece sobre as restrições financeiras e patrimoniais contra a Fazenda Pública. Precedentes. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no AREsp: 420158 PI 2013/0353259-3, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 26/11/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/12/2013).   Quanto à alegação de lesão à previsão orçamentária municipal, as afirmações são genéricas, pois o agravante não se desincumbiu de demonstrar a inexistência de receita para a realização dos referidos exames. Neste sentido colaciona-se julgado deste Egrégio Tribunal de Justiça:   REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. MEDICAMENTOS.  AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA MOVIDA CONTRA O ESTADO DO PARÁ. Preliminar de ilegitimidade passiva do Estado do Pará. Rejeitada.  MÉRITO: Autora portadora de grave quadro depressivo e dor neuropática crônica miofasial no ombro esquerdo. Necessita fazer uso continuo dos medicamentos: GAPAPENTINA 400m e CITALOPAN 20mg.  PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL. INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. DA INVAZÃO DO JUÍZO DE CONVENIENCIA E OPORTUNIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1.  É dever do Estado e/ou do Município garantir o fornecimento de medicamento, principalmente a pessoa carente de recursos financeiros, conforme se pode inferir do disposto no art. 196 da Constituição Federal. Direito à saúde. 2. O entendimento jurisprudencial pátrio que vem prevalecendo é no sentido de que, para a aceitação da tese da reserva do possível, cabe ao Poder Público comprovar de forma séria e objetiva a inexistência de receita para tal despesa, o que não ocorre no caso em apreço.3. Inexiste ingerência judicial em atividade discricionária da Administração quanto ao gerenciamento interno das políticas de fornecimento de medicamentos. O que existe é ordem judicial para que o Estado em qualquer de suas esferas, cumpra seu dever constitucional de prestar assistência médica/farmacêutica àqueles que dela necessitam.   4. É pacífico o entendimento do STJ de que é possível ao juiz, ex officio ou por meio de requerimento da parte, a fixação de multa diária cominatória (astreintes) contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer.  APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSARIO. DECISÃO UNÂNIME (2016.01508600-86, 158.386, Rel. MARNEIDE TRINDADE PEREIRA MERABET, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-04-18, publicado em 2016-04-25).  Por fim, não obstante o art. 2º da Lei 8.437/92 estabelecer que nas ações civis públicas, a liminar somente será concedida, quando cabível, após audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, o STJ firmou entendimento de que o rigor do referido dispositivo deve ser mitigado em face da possibilidade de graves danos decorrentes da demora do cumprimento da liminar, especialmente quando se tratar de direito a saúde (Resp 439833).   Ante o exposto, com fundamento no art. 995, CPC/2015, INDEFIRO O PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO, nos termos da fundamentação.   Oficie-se ao Juízo a quo, comunicando-lhe esta decisão.   Intime-se o agravado para que ofereça contrarrazões, caso queira, no prazo legal de 15 (quinze) dias, ex vi, do artigo 1.019, inciso II, do CPC/15.   Após, encaminhem-se os autos ao Órgão Ministerial nesta Superior Instância, para manifestação, na qualidade de fiscal da Ordem Jurídica.   Servirá a presente decisão como Mandado/Ofício, nos termos da Portaria 3731/2015-GP.   P.R.I.   Belém, 24 de fevereiro de 2017.                      ELVINA GEMAQUE TAVEIRA Desembargadora Relatora (2017.00801868-07, Não Informado, Rel. MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-03-13, Publicado em 2017-03-13)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 13/03/2017
Data da Publicação : 13/03/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA
Número do documento : 2017.00801868-07
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
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