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Jurisprudência


TJPA 0008669-85.2017.8.14.0000

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ GAB. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA  AGRAVO DE INSTRUMENTO   PROCESSO Nº: 0008669-85.2017.8.14.0000 AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ PROCURADOR: GISLENO AUGUSTO COSTA DA CRUZ AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ PROMOTORA: LÍLIAN REGINA FURTADO BRAGA INTERESSADA: MARIA EDERTRUDE LOBATO PEREIRA RELATORA: DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA                   DECISÃO MONOCRÁTICA          Tratam os presentes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO, interposto pelo ESTADO DO PARÁ, contra decisão interlocutória proferida pelo M.M Juízo de Direito da 6ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Santarém, proferida nos autos da Ação Civil Pública de Obrigação de Fazer com Pedido de Antecipação de Tutela (proc. n. 0008905-78.2017.8.14.0051), tendo como agravado o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, que deferiu a tutela, nos seguintes termos: ¿(...) Diante dos fatos e fundamentos acima, e uma vez presentes os requisitos já destacados, em caráter excepcional, defiro a liminar pleiteada e determino que o ESTADO DO PARÁ, através da SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE, e o MUNICÍPIO DE SANTARÉM, através da SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE, solidariamente, no prazo máximo de 10 (dez) dias, procedam ao fornecimento dos medicamentos necessários ao tratamento da paciente substituída, nos termos e quantidades especificados na inicial e no receituário médico de fl. 54. Estipulo, para o caso de descumprimento, o bloqueio do valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) das contas dos requeridos ESTADO DO PARÁ e MUNICÍPIO DE SANTARÉM, até o cumprimento da presente decisão, sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal. (...)¿           Em razões recursais (fls.02/11), em breve síntese, o Estado do Pará alega que o medicamento requerido (SERTRALINA), não compõe a relação de medicamentos e insumos do RENAME - Relação Nacional de Medicamentos Essenciais- e nem é fornecido pelo SUS, não podendo ser obrigado a fornecer tal medicamento, uma vez que deve executar as políticas públicas sempre em atenção ao princípio da legalidade.           Aduz que o SUS possui um amplo rol de remédios e que existem outros que podem substituir o fármaco pretendido, e somente após o esgotamento desses, se não houver eficácia no tratamento, é que se pode solicitar um medicamento que não esteja na lista do SUS.          Cita jurisprudência do STF que inclusive exige que condenações em medicamentos fora da lista do RENAME, isto é, medicamentos excepcionais, somente sejam determinados judicialmente, caso reste comprovada a ineficácia dos seus substitutos fornecidos pela rede pública de saúde, alegando ausência dos requisitos ensejadores da concessão da liminar.          A respeito de um outro medicamento também requerido, o RISPERIDONA, assevera que a competência para o seu fornecimento é do Município de Santarém, uma vez que o Município faz parte do Programa de Gestão Plena de Saúde, instituído através da Portaria nº 4.165/2010, e que a partir do momento em que adere ao programa, passa a ter esse tipo de responsabilidade, dado que são concedidos repasses para o Sistema Municipal de Saúde, invocando o periculum in mora inverso, na medida em que existe a possibilidade do Estado não conseguir reaver os valores gastos com o fornecimento dessa medicação.          Assevera que o Ministério da Saúde aprova Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas - PCDT, para definir critérios cientificamente comprovados e seguros para diagnostico e prognostico de tratamento de saúde, e no caso na dor crônica, como o caso dos autos, fora aprovado o PCDT de dor crônica, através da portaria nº 1083/2012, onde foram previstos os fármacos apropriados para tratar a doença da interessada, não podendo o Judiciário ter ingerência nas atividades do Governo, papel este que compete aos poderes legislativos das três esferas, sob pena de comprometer todo o bom andamento das políticas públicas de saúde.          Destaca a inviabilidade de imposição de crime de desobediência ao agente público, em caso de descumprimento de decisão judicial, colacionando jurisprudência sobre o tema.          Invoca também a impossibilidade de bloqueio de contas públicas para compelir o Estado a cumprir prestação de saúde de responsabilidade do ente público municipal, apontando o comprometimento da efetividade das políticas públicas estaduais, alegando ainda a desproporcionalidade do valor arbitrado, pleiteando sua redução.          Por fim, requer a conversão do bloqueio estabelecido pelo magistrado a quo em multa mensal no valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais), ressaltando a necessidade de aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.          Pugna pela concessão do efeito suspensivo ao agravo, para sustar imediatamente os efeitos da decisão recorrida, afastando o crime de desobediência, os riscos de prisão dos agentes públicos, o cometimento de ato de improbidade e o bloqueio de recursos públicos, bem como, para ser definido o tratamento de acordo com o Protocolo Clinico e Diretrizes Terapêuticas de dor crônica, sem o fornecimento do fármaco Sertralina, uma vez que não consta da lista do RENAME, e ainda, que o Município de Santarém seja compelido ao fornecimento requerido, na medida em que faz parte do Programa de Gestão Plena, e no mérito, pelo conhecimento e provimento do recurso.          Juntou documentos de fls. 12/85.          Coube-me o feito por distribuição (fl. 86)          É o relatório.          Decido.          Preenchidos os requisitos de admissibilidade, recebo o presente Agravo de Instrumento, nos termos do art. 1.015 do Novo Código de Processo Civil.          Passo a análise do pedido de efeito suspensivo formulado pelo ora agravante:          Sabe-se que em sede de Agravo de Instrumento a abordagem deve ser restrita ao acerto ou não da decisão que concedeu a medida liminar, levando-se em conta a presença dos requisitos aptos a ensejarem o (in) deferimento ab initio do pleito excepcional e não do mérito da ação.          Para a concessão do efeito suspensivo são necessários os preenchimentos dos requisitos autorizadores, quais sejam fumus boni iuris e periculum in mora.          Sendo assim, faz-se necessário a presença simultânea da fumaça do bom direito, ou seja, que o agravante consiga demonstrar através das alegações aduzidas, em conjunto com as documentações acostadas, a possibilidade de que o direito pleiteado exista no caso concreto, e o reconhecimento de que a demora na definição do direito poderá causar dano grave e de difícil reparação ao demandante com um suposto direito violado ou ameaçado de lesão.          A respeito de tais requisitos, José Miguel Garcia Medina assim preleciona: "Probabilidade do direito. Urgência e Sumariedade da cognição. Fumus boni iuris. Esse ¿ambiente¿ a que nos referimos acima, a exigir pronunciamento em espaço de tempo mais curto, impõe uma dupla Sumariedade: da cognição, razão pela qual contenta-se a lei processual com a demonstração da probabilidade do direito; e do procedimento (reduzindo-se um pouco, por exemplo, o prazo para resposta, cf. art. 306 do CPC/2015, em relação à tutela cautelar). Pode-se mesmo dizer que, mercê da urgência, contenta-se com a probabilidade do direito (ou - o que é dizer o mesmo - quanto maior a urgência, menos se exigirá, quanto à probabilidade de existência do direito, cf. se diz infra); sob outro ponto de vista, contudo, essa probabilidade é vista como requisito, no sentido de que a parte deve demonstrar, no mínimo, que o direito afirmado é provável ( e mais se exigirá, no sentido de se demonstrar que tal direito muito provavelmente existe, quanto o menor for o grau de periculum, cf. se procura demonstrar infra). A esse direito aparente ou muito provável costuma-se vincular a expressão fumus boni iuris." "Sumariedade da cognição sobre o periculum. Sentido de ¿urgência¿. A cognição, face a urgência, é sumária não apenas quanto à existência do direito que se visa proteger (cf. comentário supra), mas, também, quanto ao próprio perigo. Aqui, entram em jogo, dentre outros fatores, saber se é mesmo provável que o dano poderá vir a acontecer caso não concedida a medida, se sua ocorrência é iminente, se a lesão é pouco grave ou seus efeitos são irreversíveis, se o bem que o autor pretende proteger tem primazia sobre aquele defendido pelo réu (o que envolve a questão atinente à importância do bem jurídico, como se diz infra) etc. Ao analisar se há urgência, assim, não restringe-se o magistrado a verificar se algo pode vir acontecer muito em breve. Visto de outro modo, o termo ¿urgência¿ deve ser tomado em sentido amplo.¿          Estabelecidos, pois, os limites possíveis de apreciação judicial nesta fase de cognição sumária, passo ao exame dos requisitos mencionados.          Alega o Agravante que a liminar concedida desrespeita o ordenamento jurídico pátrio, uma vez que o Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos não incluídos nas políticas públicas do SUS quando não comprovada a ineficácia/impropriedade ou inexistência de tratamento estabelecido pela rede pública.           Aduz a impossibilidade de imposição de crime de desobediência ao agente público em caso de descumprimento de ordem judicial, ao mesmo tempo em que destaca a impossibilidade de bloqueio das contas públicas visando compelir o Estado a cumprir prestação de saúde que é de responsabilidade do ente municipal, bem como a desproporcionalidade do valor previsto para bloqueio.           Primordialmente, e sem necessidade de qualquer outro argumento nesta análise prévia, convém destacar que estamos diante de uma ação que versa sobre o maior bem de todos: a vida, que prevalece sobre todas as outras questões trazidas pela parte agravante, visto que a saúde encontra-se em severo risco.          Conforme entendimento pacífico da jurisprudência dos Tribunais Superiores Pátrios, os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inalienáveis, constitucionalmente consagrados, cujo primado, em um Estado Democrático de Direito, reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana e há de superar quaisquer espécies de restrições legais.          No presente caso, constata-se a inexistência do direito alegado pelo agravante (Fumus boni iuris), posto que, há de se prevalecer a efetividade de um direito fundamental assegurado na Carta Magna, além de que é inconsistente o receio de dano irreparável (periculum in mora).          Agiu corretamente o Juízo de piso, ao antecipar os efeitos da tutela, uma vez que o bem protegido está dentre os mais preciosos para o ser humano - a saúde.          Acrescento que no art. 1º da CF/88, o constitucionalista institui a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito.          E necessário se ter por norte que a suspensão de tal efeito insurge-se em lesão irreparável ao agravado e não ao agravante, configurando-se dano reverso.          Assim, constata-se que há de prevalecer a efetividade de um direito fundamental assegurado na Carta Magna, além de que é inconsistente o receio de dano irreparável (periculum in mora).          Com relação a parte final da decisão agravada que determinou o bloqueio no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), na hipótese de descumprimento pelo Estado, importa ressaltar que a adoção da multa, nos casos de prestação de fazer ou de não fazer, tem em vista conferir efetividade às decisões que decorrem desses feitos, encontrando respaldo nos artigos 497 e 498 do NCPC, que tratou da chamada tutela específica da obrigação e a tutela pelo equivalente.          Eis o que dizem as normas referidas: ¿Art. 497.  Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Parágrafo único.  Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. Art. 498.  Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação. Parágrafo único.  Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.¿             Portanto, previstas as possibilidades de concessão da tutela específica e da tutela pelo equivalente, a norma adjetiva dispôs ao julgador uma série de medidas coercitivas, descritas pela lei como ¿medidas necessárias¿, as quais tem por finalidade viabilizar o cumprimento daquelas tutelas, dentre elas a imposição de multa mesmo que seja contra a Fazenda Pública.          Ressalta-se que o objetivo preponderante do valor do bloqueio é a coerção, razão pela qual não tenho por abusivo o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) imposto pelo magistrado singular.          Ante o exposto, INDEFIRO O EFEITO SUSPENSIVO pleiteado, nos termos na presente fundamentação.          Nos moldes do art. 1.019 do Novo Código de Processo Civil, determino: 1)     Comunique-se o Juízo da 6ª Vara Cível e Empresarial de Santarém, acerca desta decisão, para fins de direito. 2)     Intime-se o agravado, na forma prescrita no inciso II do art. 1.019 do Novo Código de Processo Civil para que, em querendo, responda no prazo de 15 (quinze) dias, sendo-lhe facultado juntar cópias das peças que entender conveniente. 3)     Encaminhem-se os autos ao Ministério Público de 2º grau para exame e pronunciamento, na forma legal.            Servirá a presente decisão, por cópia digitalizada, como OFÍCIO/INTIMAÇÃO, nos termos do artigo 4º, parágrafo único c/c artigo 6º da Portaria nº 3731/2015-GP. Cumpra-se na forma e sob as penas da lei.            Após, retornem os autos conclusos.            Publique-se. Intime-se.            Belém, 04 de julho de 2017. ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA Desembargadora Relatora                 08 (2017.02965043-73, Não Informado, Rel. ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-07-14, Publicado em 2017-07-14)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 14/07/2017
Data da Publicação : 14/07/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA
Número do documento : 2017.02965043-73
Tipo de processo : Agravo de Instrumento