TJPA 0009714-27.2017.8.14.0000
DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de efeito suspensivo (processo nº 0009714-27.2017.8.14.0000) interposto pela SUPERINTENDENCIA DO SISTEMA PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO PARÁ contra o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO, diante de decisão prolatada pelo Juízo da 3ª Vara Cível e Empresarial de Marabá/PA, nos autos da Ação Civil Pública de Obrigação de Fazer com pedido de liminar (proc. nº 0020489-51.2016.8.14.0028) proposta pelo agravado. A decisão recorrida (fls. 58/61) foi proferida com o seguinte dispositivo: (...)Dito isto, DEFIRO, em parte, a tutela de urgência vindicada para determinar ao Estado do Pará e a SUSIPE que promova dentro do prazo máximo de 90 (noventa) dias a abertura de procedimento licitatório para edificação de nova unidade prisional nesta Cidade, adequadas aos requisitos da habitualidade e salubridade dos estabelecimentos penais, devendo abranger, no mínimo, as vagas excedentes do CRAMA, sob pena de multa diária a ser aplicada às partes rés no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), devendo as partes rés informar a este juízo, mensalmente, o andamento das providências tomadas para cumprimento desta determinação. (...). [sic.] Em suas razões (fls. 02/19), o agravante aduz: a impossibilidade de concessão de liminar e execução provisória contra a Fazenda Pública; a impossibilidade de ingerência do Poder Judiciário em políticas públicas e a necessidade de realização de procedimento licitatório; a ofensa ao princípio da separação de poderes, a ocorrência do periculum in mora inverso; a necessidade de revisão da liminar deferida; a impossibilidade de cumprimento da tutela antecipada no prazo determinado pelo Juízo a quo; a imprescindibilidade de previsão orçamentária; e a inviabilidade de fixação de multa diária. Ao final, requer o conhecimento do agravo de instrumento, para que seja concedido efeito suspensivo à decisão impugnada, julgando-o procedente. Juntou documentos às fls. 20/62. Coube-me a relatoria do feito por distribuição (fls. 63). É o relato do essencial. Decido. À luz do CPC/15, conheço do presente recurso vez que presentes os pressupostos para a sua admissibilidade. No caso em exame, o agravante pretende suspender os efeitos da decisão que deferiu a tutela de urgência para determinar que a SUSIPE promova dentro do prazo máximo de 90 (noventa) dias a abertura de procedimento licitatório para edificação de nova unidade prisional na cidade de Marabá, adequadas aos requisitos da habitualidade e salubridade dos estabelecimentos penais, devendo abranger, no mínimo, as vagas excedentes do CRAMA, sob pena de multa diária a ser aplicada às partes rés no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Nos termos do Código de Processo Civil, o relator poderá suspender a eficácia da decisão recorrida, mas, para isto, é necessário que o agravante além de evidenciar a possibilidade de lesão grave e de impossível reparação, demonstre a probabilidade de provimento do recurso, conforme dispõe o art. 995, parágrafo único, CPC/15: Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso. (grifei) O referido diploma legal possibilita, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela recursal, como estabelece o art. 300 e art. 1.019, I, ambos do CPC/15: Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; Com relação a alegação de impossibilidade de concessão de liminar e execução provisória contra a Fazenda Pública cabe esclarecer que, na hipótese dos autos, o Ministério Público Estadual visa à proteção de direitos afetos à população carcerária local, à incolumidade física e à vida, atinente à dignidade da pessoa humana, direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988. Vale aqui também ressaltar que nesta proteção está inserida toda a sociedade, face a natureza e o caráter difuso dos interesses ali requeridos. Sendo assim, tratando-se de medida deferida com escopo propiciar o exercício pleno dos direitos e garantias fundamentais da população carcerária do Município de Marabá, como assegura a CF/88, possível a concessão da liminar pleiteada contra a Fazenda Pública, desde que presentes seus requisitos ensejadores, o que será objeto de análise no presente recurso. O Poder Judiciário, em princípio, não deve intervir em esfera reservada a outro Poder para substituí-lo em juízos de conveniência e oportunidade, querendo controlar a organização e prestação dos serviços públicos, a não ser, excepcionalmente, quando há violação evidente e arbitrária da incumbência constitucional. Entretanto, em um exame de cognição não exauriente, verifica-se no presente caso a necessidade de intervenção do Judiciário, pois pelo princípio da inafastabilidade da jurisdição, não se pode excluir da apreciação deste Poder qualquer lesão ou ameaça a direito, conforme dispõe o art. 5º, XXXV da CF/88: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. A interferência do Judiciário está a salvaguardar e dar efetividade a direitos fundamentais, que possuem por expressa determinação constitucional aplicabilidade imediata (CF, art. 5º, § 1º): Art. 5º (...) § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Ademais, no que se refere a impossibilidade de ingerência em políticas públicas e a necessidade de realização de procedimento licitatório, o Poder Judiciário não pode ficar inerte a omissão dos Poderes Legislativo e Executivo quando deixam de realizar ações visando a proteção dos direitos garantidos pela Constituição Federal. Acerca do controle pelo Poder Judicial sobre a implementação de políticas públicas, vejamos o precedente do Supremo Tribunal Federal no julgamento do ADPF 45/DF, de relatoria do Min. Celso de Mello, a seguir: ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA ¿RESERVA DO POSSÍVEL¿. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO 'MÍNIMO EXISTENCIAL'. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO). (...) (grifei). Neste sentindo, temos a seguinte jurisprudência deste E. Tribunal: APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO CONTRA O ESTADO DO PARÁ. REFORMA DA CELA EXISTENTE NA DELEGACIA DE SÃO CAETANO DE ODIVELAS. 1. No caso concreto, a ação tem por objeto a adequação da carceragem da Delegacia de Polícia do Município de São Caetano de Odivelas/PA, tendo o juízo de primeiro grau determinado que o Estado do Pará procedesse no prazo de 120 dias, a reforma da cela existente na Delegacia de São Caetano de Odivelas, de forma a sanar a deficiência de segurança, higiene, aeração umidade, instalação sanitária e hidráulica e iluminação artificial e natural, condições mínimas para o acolhimento dos presos, de seres humanos, decisão que atende não só aos interesses individuais de um grupo certo, dos detentos, o que por si só já configura direito coletivo. 2. Da documentação acostada aos autos resta indiscutíveis as condições precárias e insalubres da carceragem da Delegacia de Polícia de SÃO CAETANO DE ODIVELAS/PA, violando os direitos humanos e fundamentais dos presos daquela Delegacia. Não há o que se falar em interferência do Judiciário no mérito administrativo ou mesmo ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes, uma vez que se está buscando a efetividade dos direitos insculpidos na Lei de Execuções Penais, bem como na própria Constituição Federal; aa1 atuação do Poder Judiciário neste caso é para assegurar o cumprimento das disposições da Constituição Federal, que dispõe no art. 5º, XLIX que é assegurado aos presos o respeito e à integridade física e moral e, no artigo 88, parágrafo único da Lei nº 7.210/84 (Lei das Execuções Penais) que preceitua: que são requisitos básicos da unidade celular a salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana. 3. O Poder Judiciário não pode ficar inerte a omissão dos Poderes Legislativo e Executivo. O Estado do Pará afirma que é necessária licitação para efetivação da ordem judicial, bem como não tem condições de cumprir diversas ordens judiciais, restando claro, a falta de comprometimento do Poder Executivo na realização dos direitos garantidos pela Constituição Federal. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. (TJ-PA - APL: 00000923420128140095 BELÉM, Relator: MARNEIDE TRINDADE PEREIRA MERABET SUBSTITUIDA POR ROSI MARIA GOMES DE FARIAS, Data de Julgamento: 30/05/2016, 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Data de Publicação: 06/06/2016) (grifei) Nestes termos, segue Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 592581 do Superior Tribunal de Justiça, que determina ao Poder Executivo a realização de obras em presídio, devendo ser resguardada a integridade física e moral dos presos: CONSTITUCIONAL. INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DOS PRESOS. DETERMINAÇÃO AO PODER EXECUTIVO DE REALIZAÇÃO DE OBRAS EM PRESÍDIO. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. RELEVÂNCIA JURÍDICA, ECONÔMICA E SOCIAL DA QUESTÃO CONSTITUCIONAL. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. (RE 592581 RG, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 22/10/2009, DJe-218 DIVULG 19-11-2009 PUBLIC 20-11-2009 EMENT VOL-02383-06 PP-01173 RDDP n. 84, 2010, p. 125-128) Com efeito, a responsabilidade pela manutenção do estabelecimento prisional é da Agravante e, este se abstém de realizá-la com presteza, atinge direitos fundamentais dos presos. Existem nos autos indícios de que a segurança pública está claramente comprometida e o estabelecimento carcerário não reúne as condições mínimas necessárias ao seu regular funcionamento, representando não só um desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, como também um perigo para toda a coletividade, devendo a Agravante cumprir a determinação do Juízo a quo no prazo estipulado. Por fim, quanto a desproporcionalidade do valor da astreinte e fixação de multa exorbitante, verifica-se, a princípio, que ultrapassa os limites da razoabilidade e da proporcionalidade, pelo que converto em multa diária o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) no caso de descumprimento, até o limite de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais). Ante o exposto, com fundamento no art. 995 e art. 1.019, I, CPC/2015, DEFIRO PARCIALMENTE O PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO, apenas para minorar o valor da multa diária para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), até o limite de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), em caso de descumprimento da decisão recorrida. Oficie-se ao Juízo a quo, comunicando-lhe esta decisão (art. 1.019, I, CPC/2015). Intime-se o agravado para que ofereça contrarrazões, caso queira, no prazo legal de 15 (quinze) dias, ex vi, do artigo 1.019, inciso II, do CPC/15. Após, encaminhem-se os autos ao Órgão Ministerial nesta Superior Instância, para manifestação, na qualidade de fiscal da Ordem Jurídica. P.R.I. Belém, 12 de setembro de 2017. ELVINA GEMAQUE TAVEIRA Desembargadora Relatora
(2017.03900332-28, Não Informado, Rel. MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-10-04, Publicado em 2017-10-04)
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DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de efeito suspensivo (processo nº 0009714-27.2017.8.14.0000) interposto pela SUPERINTENDENCIA DO SISTEMA PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO PARÁ contra o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO, diante de decisão prolatada pelo Juízo da 3ª Vara Cível e Empresarial de Marabá/PA, nos autos da Ação Civil Pública de Obrigação de Fazer com pedido de liminar (proc. nº 0020489-51.2016.8.14.0028) proposta pelo agravado. A decisão recorrida (fls. 58/61) foi proferida com o seguinte dispositivo: (...)Dito isto, DEFIRO, em parte, a tutela de urgência vindicada para determinar ao Estado do Pará e a SUSIPE que promova dentro do prazo máximo de 90 (noventa) dias a abertura de procedimento licitatório para edificação de nova unidade prisional nesta Cidade, adequadas aos requisitos da habitualidade e salubridade dos estabelecimentos penais, devendo abranger, no mínimo, as vagas excedentes do CRAMA, sob pena de multa diária a ser aplicada às partes rés no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), devendo as partes rés informar a este juízo, mensalmente, o andamento das providências tomadas para cumprimento desta determinação. (...). [sic.] Em suas razões (fls. 02/19), o agravante aduz: a impossibilidade de concessão de liminar e execução provisória contra a Fazenda Pública; a impossibilidade de ingerência do Poder Judiciário em políticas públicas e a necessidade de realização de procedimento licitatório; a ofensa ao princípio da separação de poderes, a ocorrência do periculum in mora inverso; a necessidade de revisão da liminar deferida; a impossibilidade de cumprimento da tutela antecipada no prazo determinado pelo Juízo a quo; a imprescindibilidade de previsão orçamentária; e a inviabilidade de fixação de multa diária. Ao final, requer o conhecimento do agravo de instrumento, para que seja concedido efeito suspensivo à decisão impugnada, julgando-o procedente. Juntou documentos às fls. 20/62. Coube-me a relatoria do feito por distribuição (fls. 63). É o relato do essencial. Decido. À luz do CPC/15, conheço do presente recurso vez que presentes os pressupostos para a sua admissibilidade. No caso em exame, o agravante pretende suspender os efeitos da decisão que deferiu a tutela de urgência para determinar que a SUSIPE promova dentro do prazo máximo de 90 (noventa) dias a abertura de procedimento licitatório para edificação de nova unidade prisional na cidade de Marabá, adequadas aos requisitos da habitualidade e salubridade dos estabelecimentos penais, devendo abranger, no mínimo, as vagas excedentes do CRAMA, sob pena de multa diária a ser aplicada às partes rés no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Nos termos do Código de Processo Civil, o relator poderá suspender a eficácia da decisão recorrida, mas, para isto, é necessário que o agravante além de evidenciar a possibilidade de lesão grave e de impossível reparação, demonstre a probabilidade de provimento do recurso, conforme dispõe o art. 995, parágrafo único, CPC/15: Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso. (grifei) O referido diploma legal possibilita, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela recursal, como estabelece o art. 300 e art. 1.019, I, ambos do CPC/15: Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; Com relação a alegação de impossibilidade de concessão de liminar e execução provisória contra a Fazenda Pública cabe esclarecer que, na hipótese dos autos, o Ministério Público Estadual visa à proteção de direitos afetos à população carcerária local, à incolumidade física e à vida, atinente à dignidade da pessoa humana, direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988. Vale aqui também ressaltar que nesta proteção está inserida toda a sociedade, face a natureza e o caráter difuso dos interesses ali requeridos. Sendo assim, tratando-se de medida deferida com escopo propiciar o exercício pleno dos direitos e garantias fundamentais da população carcerária do Município de Marabá, como assegura a CF/88, possível a concessão da liminar pleiteada contra a Fazenda Pública, desde que presentes seus requisitos ensejadores, o que será objeto de análise no presente recurso. O Poder Judiciário, em princípio, não deve intervir em esfera reservada a outro Poder para substituí-lo em juízos de conveniência e oportunidade, querendo controlar a organização e prestação dos serviços públicos, a não ser, excepcionalmente, quando há violação evidente e arbitrária da incumbência constitucional. Entretanto, em um exame de cognição não exauriente, verifica-se no presente caso a necessidade de intervenção do Judiciário, pois pelo princípio da inafastabilidade da jurisdição, não se pode excluir da apreciação deste Poder qualquer lesão ou ameaça a direito, conforme dispõe o art. 5º, XXXV da CF/88: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. A interferência do Judiciário está a salvaguardar e dar efetividade a direitos fundamentais, que possuem por expressa determinação constitucional aplicabilidade imediata (CF, art. 5º, § 1º): Art. 5º (...) § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Ademais, no que se refere a impossibilidade de ingerência em políticas públicas e a necessidade de realização de procedimento licitatório, o Poder Judiciário não pode ficar inerte a omissão dos Poderes Legislativo e Executivo quando deixam de realizar ações visando a proteção dos direitos garantidos pela Constituição Federal. Acerca do controle pelo Poder Judicial sobre a implementação de políticas públicas, vejamos o precedente do Supremo Tribunal Federal no julgamento do ADPF 45/DF, de relatoria do Min. Celso de Mello, a seguir: ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA ¿RESERVA DO POSSÍVEL¿. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO 'MÍNIMO EXISTENCIAL'. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO). (...) (grifei). Neste sentindo, temos a seguinte jurisprudência deste E. Tribunal: APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO CONTRA O ESTADO DO PARÁ. REFORMA DA CELA EXISTENTE NA DELEGACIA DE SÃO CAETANO DE ODIVELAS. 1. No caso concreto, a ação tem por objeto a adequação da carceragem da Delegacia de Polícia do Município de São Caetano de Odivelas/PA, tendo o juízo de primeiro grau determinado que o Estado do Pará procedesse no prazo de 120 dias, a reforma da cela existente na Delegacia de São Caetano de Odivelas, de forma a sanar a deficiência de segurança, higiene, aeração umidade, instalação sanitária e hidráulica e iluminação artificial e natural, condições mínimas para o acolhimento dos presos, de seres humanos, decisão que atende não só aos interesses individuais de um grupo certo, dos detentos, o que por si só já configura direito coletivo. 2. Da documentação acostada aos autos resta indiscutíveis as condições precárias e insalubres da carceragem da Delegacia de Polícia de SÃO CAETANO DE ODIVELAS/PA, violando os direitos humanos e fundamentais dos presos daquela Delegacia. Não há o que se falar em interferência do Judiciário no mérito administrativo ou mesmo ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes, uma vez que se está buscando a efetividade dos direitos insculpidos na Lei de Execuções Penais, bem como na própria Constituição Federal; aa1 atuação do Poder Judiciário neste caso é para assegurar o cumprimento das disposições da Constituição Federal, que dispõe no art. 5º, XLIX que é assegurado aos presos o respeito e à integridade física e moral e, no artigo 88, parágrafo único da Lei nº 7.210/84 (Lei das Execuções Penais) que preceitua: que são requisitos básicos da unidade celular a salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana. 3. O Poder Judiciário não pode ficar inerte a omissão dos Poderes Legislativo e Executivo. O Estado do Pará afirma que é necessária licitação para efetivação da ordem judicial, bem como não tem condições de cumprir diversas ordens judiciais, restando claro, a falta de comprometimento do Poder Executivo na realização dos direitos garantidos pela Constituição Federal. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. (TJ-PA - APL: 00000923420128140095 BELÉM, Relator: MARNEIDE TRINDADE PEREIRA MERABET SUBSTITUIDA POR ROSI MARIA GOMES DE FARIAS, Data de Julgamento: 30/05/2016, 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Data de Publicação: 06/06/2016) (grifei) Nestes termos, segue Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 592581 do Superior Tribunal de Justiça, que determina ao Poder Executivo a realização de obras em presídio, devendo ser resguardada a integridade física e moral dos presos: CONSTITUCIONAL. INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DOS PRESOS. DETERMINAÇÃO AO PODER EXECUTIVO DE REALIZAÇÃO DE OBRAS EM PRESÍDIO. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. RELEVÂNCIA JURÍDICA, ECONÔMICA E SOCIAL DA QUESTÃO CONSTITUCIONAL. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. (RE 592581 RG, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 22/10/2009, DJe-218 DIVULG 19-11-2009 PUBLIC 20-11-2009 EMENT VOL-02383-06 PP-01173 RDDP n. 84, 2010, p. 125-128) Com efeito, a responsabilidade pela manutenção do estabelecimento prisional é da Agravante e, este se abstém de realizá-la com presteza, atinge direitos fundamentais dos presos. Existem nos autos indícios de que a segurança pública está claramente comprometida e o estabelecimento carcerário não reúne as condições mínimas necessárias ao seu regular funcionamento, representando não só um desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, como também um perigo para toda a coletividade, devendo a Agravante cumprir a determinação do Juízo a quo no prazo estipulado. Por fim, quanto a desproporcionalidade do valor da astreinte e fixação de multa exorbitante, verifica-se, a princípio, que ultrapassa os limites da razoabilidade e da proporcionalidade, pelo que converto em multa diária o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) no caso de descumprimento, até o limite de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais). Ante o exposto, com fundamento no art. 995 e art. 1.019, I, CPC/2015, DEFIRO PARCIALMENTE O PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO, apenas para minorar o valor da multa diária para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), até o limite de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), em caso de descumprimento da decisão recorrida. Oficie-se ao Juízo a quo, comunicando-lhe esta decisão (art. 1.019, I, CPC/2015). Intime-se o agravado para que ofereça contrarrazões, caso queira, no prazo legal de 15 (quinze) dias, ex vi, do artigo 1.019, inciso II, do CPC/15. Após, encaminhem-se os autos ao Órgão Ministerial nesta Superior Instância, para manifestação, na qualidade de fiscal da Ordem Jurídica. P.R.I. Belém, 12 de setembro de 2017. ELVINA GEMAQUE TAVEIRA Desembargadora Relatora
(2017.03900332-28, Não Informado, Rel. MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-10-04, Publicado em 2017-10-04)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
04/10/2017
Data da Publicação
:
04/10/2017
Órgão Julgador
:
1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a)
:
MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA
Número do documento
:
2017.03900332-28
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
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