TJPA 0010027-87.2011.8.14.0301
GABINETE DA DESEMBARGADORA GLEIDE PEREIRA DE MOURA SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2012.3.002748-0 AGRAVANTE : INSTITUTO DE GESTÃO PREVIDENCIÁRIA DO ESTADO DO PARÁ - IGEPREV ADVOGADO : VAGNER ANDREI TEIXEIRA LIMA PROC. AUTÁRQUICO AGRAVADO : FLORA LUIZA SILVA DE AGUIAR AGRAVADO : SEBASTIÃO SILVA SOUSA AGRAVADO : RAIMUNDO NONATO NARROS RAMOS AGRAVADO : JOÃO TELES DOS SANTOS AGRAVADO : ELSON BENEDITO NAVARRO DE SOUZA AGRAVADO : MANOEL GREGÓRIODE JESUS AGRAVADO : OSVALDO PEREIRA MIRANDA REPRESENTANTE : MARIA DA ROSA MIRANDA AGRAVADO : ANTONIO CARLOS CASSEB DE ALMEIDA AGRAVADO : MARIO ANTUNES DE OLIVEIRA AGRAVADO : CARLOS DE LIMA COSTA AGRAVADO : VÂNIA LÚCIA COSTA DA MOTA ADVOGADO : RENATA DINIZ MONTEIRO CAMARGOS RELATORA : DESEMBARGADORA GLEIDE PEREIRA DE MOURA DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto pelo INSTITUTO DE GESTÃO PREVIDENCIÁRIA DO ESTADO DO PARÁ IGEPREV em face da decisão proferida pelo Juiz de Direito da 2a Vara de Fazenda da Comarca da Capital nos autos de Ação de Mandado de Segurança c/c Pedido de Liminar, contra FLORA LUIZA SILVA DE AGUIAR e OUTROS. Em decisão de fls. 267/268 dos autos do presente agravo, o juízo a quo concedeu a liminar pleiteada, determinando que a autoridade coatora equipare imediatamente o abono salarial dos Agravados em relação ao concedido aos militares da ativa, observadas as peculiaridades do cargo de cada um dos Recorridos. Julgou o magistrado quehárelevante fundamento para a concessão da liminar, pois medida contrária importaria em olvidar a aplicação de norma legal e constitucional, nitidamente o §8o do art. 40 da Constituição Federal, bem como o §17 do mesmo dispositivo. Acrescentou que o pleito dos Agravados encontra-se consagrado nos arts. 58 e 60 da Lei Estadual no 5.251/85, assim como no que dispõem os Decretos Estaduais nos 2.386/98 e 2.838/98 e na Lei no 4.491/73. Quanto ao segundo requisito, concluiu que a natureza alimentar da parcela comprova a existência de periculum in mora. Inconformado, o agravante busca reforma da decisão, sustentando, preliminarmente: 1) ilegitimidade passiva do IGEPREV, tendo em vista que os recursos necessários para o pagamento do abono são pagos pelo Tesouro Estadual, que, por motivo de conveniência, apenas efetua o repasse ao IGEPREV, para que este proceda ao seu pagamento; 2) inépcia da inicial por impossibilidade jurídica do pedido. Como prejudicial de mérito, alega a decadência do Mandado de Segurança. No mérito, aduzque o pedido formulado pelo Agravado é juridicamente impossível, pois o abono salarial constitui vantagem pecuniária caracterizada pela transitoriedade, conforme reconhecido pelos Decretos Estaduais nos 2.219/97, 2.836/98 e 0176/2003. Logo é vedada sua incorporação aos vencimentos dos servidores ou aos proventos de aposentadoria e pensão. Soma queé inconstitucional a própria instituição do abono salarial pelos Decretos Estaduais nos 2.219/97 e 2.837/98, uma vez que não haveria autorização legal para tanto, nem previsão orçamentária. Outrossim, o abono requerido não integraria o salário de contribuição por não compor a remuneração que era paga ao Recorrido enquanto militar ativo e, portanto, não teria incidido contribuição previdenciária sobre a parcela. Assim, haveria violação do princípio contributivo. Aduz que, ao permitir a incorporação do abono, o magistrado estaria atuando como legislador positivo, o que é vedado pelo ordenamento pátrio devido ao princípio da separação dos poderes. Sustenta que a não incorporação do abono aos proventos de aposentadoria não reduziram a remuneração do Agravado, de modo que não houve violação do princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos contido no art. 37, XV, da Constituição Federal. Giza que o abono salarial ora tratado não integra a remuneração dos servidores civis e militares por ser transitório, de modo que o art. 52 da Lei no 5.251/85 não teria abrangência sobre esta parcela, a ponto de determinar que seu valor passe a ser o fixado igualmente ao posto superior. Sustenta, ainda: 1) impossibilidade legal de deferimento de tutela antecipada, tendo em vista o que preceitua o §2o do art. 7o da Lei no 12.016/2009; 2) inconstitucionalidade e ilegalidade da Súmula 729 do STF; 3) ausência dos requisitos para a concessão da liminar devido à existência de periculum in mora inverso, pois existe perigo de ser provocada grave lesão e de difícil ou incerta reparação ao Agravante. Requer, por derradeiro, que seja concedido efeito suspensivo ao presente recurso, alegando a irreversibilidade do dano ao erário público caso não sejamsuspensos os efeitos da decisão a quo, em virtude não apenas da dificuldade que circunda a repetição do indébito, mas também e, principalmente, pela instabilidade financeira que pode gerar ao Fundo Previdenciário, ao se configurar precedente para outras situações similares. Junta documentos às fls. 43/409. É o sucinto relatório. DECIDO: Ab initio, cumpre-me salientar que, consoante o art. 527, caput, da lei adjetiva civil, registrado e distribuído o agravo de instrumento, cabe ao relator empreender um exame preliminar do recurso. Assim, entre as medidas que podem ser tomadas por ele, prevê o inciso I do referido dispositivo a negação de seguimento ao recurso nos casos do art. 557 do mesmo código, o qual possui a seguinte redação: Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.(Sem grifos no original). Na lição de Cássio Scarpinella Bueno, a própria existência de uma súmula é dispensada, bastando que haja 'jurisprudência dominante', assim entendida aquela que, a despeito de sua não formalização como súmula (...), é representativa, de forma objetiva, do entendimento amplamente aceito pelo Tribunal. E completa afirmando que, assim sendo, a orientação dos precedentes deve ser aplicada de imediato ao recurso, conferindo assim maior racionalidade aos julgamentos dos tribunais (Curso Sistematizado de Direito Processual Civil, volume 5: Recursos, Processos e Incidentes nos Tribunais. Sucedâneos recursais: técnicas de controle das decisões jurisdicionais, 2a Ed., São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 122/123). No presente caso, observo que a matéria tratada no recurso não é nova nesta Egrégia Corte, havendo reiteradas decisões das Câmaras sobre a maioria das razões recursais; decisões do Plenário sobre outras e, ainda, jurisprudência pacífica do STF sobre as demais. Conforme demonstrarei abaixo pormenorizadamente, todos os argumentos expendidos pelo Agravante já foram analisados e considerados improcedentes por esta Corte e/ou pelos Tribunais Superiores, o que justifica a aplicação do inciso I do art. 557 do CPC para o julgamento monocrático do agravo de instrumento. Em razão dos inúmeros argumentos apresentados pelo Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Pará, que demandam refutação individual, passemos a analisar a questão pormenorizadamente. 1. DAS PRELIMINARES: 1.1. DA DECADÊNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA: Afirma o Recorrente que aação fora proposta fora do prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias, de acordo com o disposto na Lei no 12.016/09. Defende que o mandado de segurança somente foi impetrado no dia 26 de janeiro de 2012, sendo que o prazo decadencial teria como termo a quo a data da concessão (homologação) da pensão aos agravados. Todavia, conforme a jurisprudência dominante deste Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por configurar-se ato de trato sucessivo, uma vez que o valor do abono integrava todo mês à remuneração dos agravados, com isso renovava-se a violação do direito a equiparação do referido valor ao que era destinado aosmilitares da ativa. Foi neste sentido que decidiu a 1a Câmara Cível Isolada nos autos do Agravo de Instrumento no 2010.3.002491-7, de minha relatoria, cujo acórdão foi publicado em 21/11/2011. Da mesma forma, apenas a título de exemplificação, entendeu a 5a Câmara Cível Isolada, conforme o acórdão de no91346, publicado em 28/09/2010, no qual colacionaram-se diversos julgados do Superior Tribunal de Justiça no mesmo sentido. Deste modo, afasto a prejudicial de mérito alegada pelo Agravante. 1.2. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO IGEPREV: Alega o Agravante carecer de legitimidade para compor o polo passivo da relação jurídica processual, uma vez que os recursos destinados ao custeio das despesas com o pagamento de abono salarial dos policias inativos são provenientes do Tesouro Estadual, conforme o art. 3o do Decreto no 2.836/1998 e do Decreto no 2.837/1998, ambos elaborados pelo Governador do Estado. Aduz que apenas por questão de operacionalização, os recursos destinados ao pagamento da referida vantagem pecuniária são repassados ao IGEPREV para inclusão na folha de pagamento, não tendo este instituto qualquer ingerência sobre os mesmos. Analiso. A jurisprudência uniforme desta Corte é de que Há muito a jurisprudência pátria já firmou o entendimento de que as autarquias, por possuírem autonomia financeira e administrativa, são partes legítimas para figurarem no pólo passivo de demandas nas quais se busquem discutir atos por elas exarados, conforme o acórdão no 93.144 proferido nos autos do processo no 200830058556, cuja relatora é a Eminente Desa. Eliana Rita DaherAbufaiad. Ademais, nas próprias decisões juntadas pelo Agravante, como peça facultativas para formarem o instrumento, os relatores afastaram esta preliminar, sob os mesmos fundamentos, a exemplo do acórdão proferido pela 2a Câmara Cível Isolada nos autos do Agravo de Instrumento no 2008.3.01186703, cuja relatora é a Eminente Desa. Carmencin Marques Cavalcante Ora, diferente não poderia ser, pois da personalidade jurídica própria de uma autarquia decorre que os bens transferidos a elas passam a compor seu patrimônio próprio, que não mais se confunde com o do ente que o transferiu, no caso, o Estado do Pará. Assim, seguindo o entendimento pacífico desta Corte, considero inconsistentes os argumentos expendidos pelo Agravante. 2. DO MÉRITO: 2.1. DA IMPOSSIBILIDADE LEGAL DE CONCESSÃO DE LIMINAR DA SÚMULA 729 DO STF: Primeiramente, não se pode esquecer que, embora a Súmula 729 do STF não seja vinculante e, por causa disso, não se tenha a obrigatoriedade de observá-la, ela representa o entendimento dominante do STF, guardião maior da Constituição e, como tal, o primeiro interessado em salvaguardar a ordem jurídica, que engloba não apenas a Constituição como também todas as normas jurídicas vigentes. Assim, quando o Pretório Excelso declara, ao editar a Súmula 729, que A decisão na ação direta de constitucionalidade 4 não se aplica à antecipação de tutela em causa de natureza previdenciária, claro está que neste caso específico causas de natureza previdenciária é permitida a concessão de tutela antecipada ou de liminar contra a Fazenda Pública, não havendo, portanto, nenhuma inconstitucionalidade, porque assim entende o responsável pela observância das normas constitucionais. Nenhuma dúvida há quanto à aplicação e à constitucionalidade da Súmula 729 pelo STF, conforme demonstram as Reclamações nos4233, 2480, 2379, 2457, além de outras, conforme as ementas a seguir transcritas: EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO. Inativo. Pensionista. Remuneração. Vencimentos ou proventos. Pensão. Vantagem pecuniária. Incorporação da gratificação conhecida como "quintos". Antecipação de tutela concedida. Ofensa à autoridade da decisão proferida na ADC nº 4. Não ocorrência. Benefício de caráter previdencial. Reclamação julgada improcedente. Agravo improvido. Inteligência da súmula 729. Precedentes inaplicáveis. Em se tratando de benefícios previdenciarios, como proventos e pensões, não se lhes aplica o decidido na ADC nº 4. (Rcl 4233 AgR/CE, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julgado em 28.03.2007). AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE Nº 4-6 - ALCANCE DO PRONUNCIAMENTO - MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA. O que decidido na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 4-6 não alcança conflito de interesses de natureza previdenciária, pouco importando a espécie da parcela em jogo e a entidade devedora envolvida. (Rcl 2480 MC/PE, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 09.09.2004). Como se pode perceber, ainda que a regra seja a da impossibilidade de se antecipar os efeitos da tutela contra a fazenda pública nos casos que versem sobre reclassificação, equiparação de servidores públicos, bem como concessão de aumento ou extensão de vantagens, conforme decidido pelo STF na ADC no 4, esta mesma Egrégia Corte tratou de excepcionar seu entendimento, quando a matéria em discussão possuir natureza previdenciária. É exatamente este o presente caso, por se tratar de incorporação de abono salarial a provento de aposentadoria, devendo-se decidir consoante a Súmula 729 do Pretório Excelso. Destarte, não se aplica ao caso o disposto no §2o do art. 7o da Lei no 12.016/09, quando dispõe que não caberá liminar caso tenha por objeto a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. Por todos estes fundamentos, julgo insubsistentes os argumentos do Agravante. 2.2. DA IMPOSSIBILIDADE DE INCORPORAÇÃO DO ABONO SALARIAL: O Agravante afirma que o Agravado não preenche os requisitos exigidos por lei para que o juiz antecipe os efeitos da tutela, pois careceria de demonstração do fumus boni iuris. Alega, primeiro, que a própria instituição do abono salarial seria inconstitucional, pois esta vantagem teria sido criada e majorada por meio de simples decretos estaduais e sem que houvesse autorização legal ou previsão orçamentária votada pelo Poder Legislativo Estadual, violando, assim, o inciso X, do art. 37 da Constituição Federal. Acrescenta que o abono salarial do qual busca-se a incorporação possui natureza transitória, por força do que dispõem o art. 1o do Decreto Estadual no 2.219/97 e o art. 2o do Decreto Estadual no 2.836/98. Destarte, de acordo com o Decreto Estadual no 0176/2003, art. 1o, seria vedada a incorporação dessas parcelas aos proventos de aposentadoria e pensões. Outrossim, sustenta que a Lei no 9.717/98 veda o pagamento de benefícios distintos dos previstos pelo INSS, bem como a inclusão de parcelas remuneratórias que não integram o salário de contribuição do servidor, como o caso do abono salarial. Consequentemente, não poderiam ser incluídas nos proventos vantagens alheias ao conceito de remuneração, sobre as quais não incidiu contribuição previdenciária. Por fim, aduz que, ao permitir a incorporação do abono, o magistrado estaria atuando como legislador positivo, o que é vedado pelo ordenamento pátrio devido ao princípio da separação dos poderes. Analiso. Assim como as demais matérias abordados pelo Agravante, estas matérias não são novas nesta Corte de Justiça. Primeiramente, é pacífico o entendimento de que os decretos mencionados acima não são eivados de vício de inconstitucionalidade, conforme assentado no Acórdão no 100234, proferido nos autos da Apelação Cívelnº 2010.3.004.250-5, o qual foi ementado da seguinte forma: EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS DECRETOS ESTADUAIS 2.219/97 E 2.837/98, POR VÍCIO FORMAL, NÃO ACOLHIDO. DECRETOS QUE NÃO INOVAM NA SEARA JURIDICA, MAS APENAS REGULAMENTE DIREITOS JÁ PREVISTOS EM LEI. INEXISTÊNCIA DE AUMENTO DE DESPESA, POR SE CUIDAR DE MERA REPOSIÇÃO SALARIAL. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À CONSTITUIÇÃO POR SE TRATAR DE DESPESA SEM PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PROVA DO FATO ALEGADO. ARGUMENTO QUE NÃO É SUFICIENTE PAR AFASTAR O DIREITO EM ANÁLISE. PEDIDO DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADO IMPROCEDENTE. DECISÃO UNÂNIME. I Os objurgados decretos estaduais não inovam no ordenamento jurídico, criando novos direitos e deveres, mas apenas regulamentam o previsto no artigo 117 do Regimento Jurídico Único dos Servidores Estaduais. Por conseguinte, não há ofensa ao princípio constitucional da reserva legal; II No mesmo sentido, deve ser rechaçada a alegação de que os supracitados decretos criaram aumento de despesa sem preceito em lei, uma vez que, além de existir previsão legal estabelecendo os abonos, não se pode olvidar que as controvertidas normas tinham por objetivo expresso apenas repor perdas salariais dos servidores em destaque. Logo, não há aumento, mas mera restituição de valores devidos. III No que se refere à assertiva de inconstitucionalidade por ausência de previsão orçamentária, é de se destacar que o autor do incidente não comprovou esta alegação. Ademais, o STF já firmou o entendimento de que a ausência de previsão orçamentária não é causa suficiente para provocar a inconstitucionalidade da norma guerreada. IV Pedido de inconstitucionalidade conhecido e julgado improcedente. V Decisão unânime. (Acórdão no: 100234; Processo no: 201030042505, 4a Câmara Cível Isolada, Relatora Desa. Eliana Rita DaherAbufaiad, publicado em 06/09/2011, Cad.1 Pág.64). No que tange ao suposto caráter de transitoriedade do abono salarial, não posso deixar de seguir a jurisprudência dominante desta Corte de Justiça no sentido de que o mesmo consiste, na verdade, em aumento salarial simulado. Então,não há qualquer justificativa jurídica para que a majoração se dê exclusivamente aos servidores da ativa, sob pena de ferir-se com isso a isonomia entre os agentes públicos ativos e inativos. Com efeito, conforme ventilado no acórdão no 111794, ainda que o decretos estaduais em questão disponham sobre a criação de um abono salarial com caráter supostamente transitório, como se qualificar como fugaz um abono que é pago há mais de 10 (dez) anos, regularmente, para os policiais militares? Como entender que o aludido benefício é temerário se perdura há mais de uma década, sem que o Estado do Pará tenha ofertado qualquer justificativa extraordinária que demonstrasse a manutenção da situação precária? (Apelação Cível no 2012.3.011.269-5, Relatora Desa. Eliana Rita DaherAbufaiad, publicado em 12/09/2012). O mesmo entendimento foi seguido pela 5a Câmara Cível Isolada nos autos de Agravo de Instrumento no2009.3.012027-1 e pela 2a Câmara Cível Isolada nos autos de Agravo de Instrumento no2009.3.011779-9. Outrossim, os Decretos Estaduais nos 2.219/97 e 2.837/98, assim como os demais decretos que fixaram reajustes, preveem a criação de um abono, o qual, no entanto, não pode ser considerado transitório ou emergencial, visto que vem sendo pago há quase quinze anos. Ora, resta cristalino que não se pode atribuir caráter temporário a um benefício que perdura há mais de uma década, sem qualquer justificativa para sua manutenção. Ratificando este entendimento, transcrevo recente julgado da 4a Câmara Cível Isolada de nosso Tribunal de Justiça, de relatoria da Eminente Desembargadora Eliana Rita DaherAbufaiad, assim ementado: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO-PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E DE NECESSIDADE DE INCLUSÃO DO ESTADO DO PARÁ NO PÓLO PASSIVO REJEITADAS. APELANTE QUE É AUTARQUIA DOTADA DE AUTONOMIA FINANCEIRA E ADMINISTRATIVA. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO AFASTADA. PRETENSÃO DE TRATO SUCESSIVO, QUE SE RENOVA MENSALMENTE. PREJUDICIAL DE MÉRITO DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS DECRETOS QUE FUNDAMENTAM A LIDE NÃO CONHECIDA. INCIDENTE QUE NÃO TEVE SEGUIMENTO NO PLENÁRIO DESTA CORTE. MÉRITO. SUPOSTO ABONO SALARIAL QUE, POR POSSUIR NOTÓRIO CARÁTER PERMANENTE, SE TRANSFIGURA EM VERDADEIRA MAJORAÇÃO DE VENCIMENTOS DISFARÇADO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO CARÁTER CONTRIBUTIVO DO SISTEMA. DECISÃO QUE NÃO IMPORTA EM ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO LEGISLADOR. POSSIBILIDADE DE PAGAMENTO DE ABONO EM PATAMAR CORRESPONTE AO POSTO IMEDIATAMENTE SUPERIOR AO DO APELADO. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. I Sendo o Igeprev autarquia dotada de autonomia administrativa-financeira, é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, sem a necessária presença do Estado do Pará. II O pleito do apelado não se encontra atingido pela prescrição qüinqüenal, visto que, como se cuida de obrigação de trato sucessivo, o prejuízo se renova mensalmente. Destarte, não pode ser acolhida a prejudicial em destaque. III Em razão da decisão firmada no acórdão 100234, resta superada a discussão acerca da constitucionalidade dos decretos estaduais 2.219/97 e 2.837/98. IV O abono salarial em testilha se cuida de notório reajuste salarial simulado. Portanto, não havendo qualquer razão jurídica que possibilite essa majoração exclusivamente aos servidores da ativa e justifique a quebra da isonomia entre os agentes públicos ativos e inativos, torna-se evidente que o mesmo deve ser estendido a todos os servidores. V Como a contribuição previdenciária se operacionaliza levando em consideração a remuneração dos servidores, e sendo este abono um verdadeiro acréscimo remuneratório simulado, resta claro que não há ofensa ao caráter contributivo do sistema. VI A determinação ora combatida não implica em atuação legislativa do Poder Judiciário, uma vez que não se está criando direitos, mas apenas determinando a restituição de parcela que foi indevidamente subtraída. VII Apelação Cível conhecida e improvida. VIII Decisão unânime. (Apelação Cível no 2012.3.011.269-5, publicado em 12.09.2012) (Grifei). Assim, comungo do entendimento de que estamos diante de um reajuste salarial simulado, mesmo porque os decretos que o originaram não trazem qualquer contraprestação laboral para a sua concessão. Deste modo, se o abono possui natureza salarial, não há o que legitime sua não concessão aos inativos. Ademais, afastada a suposta natureza transitória do abono, também não procede o argumento de inépcia da inicial por impossibilidade jurídica do pedido, já que não há qualquer vedação legal. Da mesma forma, não se pode invocar o art. 52 da Leino 5.251/85, pois não se trata de parcela estranha à remuneração. No que se refere à violação à Lei no 9.717/98, uma vez assentado que o abono ora tratado constitui-se, na verdade, em reajuste salarial simulado, decorre daí que não se está diante de uma parcela nova que não compunha o salario de contribuição. Trata-se de mera tentativa de corrigir os efeitos da desvalorização da moeda, sendo igualmente improcedente o argumento do Agravante por não haver qualquer violação ao princípio contributivo. Finalmente, quanto à violação ao princípio da separação de poderes, também não merece acolhimento este argumento levantado pelo Agravante. No mesmo acórdão acima referido, foi assentado que Quando o Supremo Tribunal Federal consignou que não pode o Judiciário aumentar vencimentos, está claramente impossibilitando a inovação salarial, não trazendo qualquer proibição para a correção de distorções remuneratórias ilegais. (...) No caso em exposição, não se verifica qualquer atuação inovadora do Poder Judiciário, posto a parcela visada já existir e ter sido subtraída indevidamente. Portanto, não pode prevalecer a tese ora estudada. Logo, não se está legislando de forma positiva, mas apenas corrigindo a atuação ilegítima da Administração Pública. 2.3. DA IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA LIMINAR DO PERICULUM IN MORA INVERSO Não obstante, saliento que o periculum in mora inverso, ou seja, o risco de provocar dano grave e de difícil reparação ao Réu/Impetrado, deve ser superado por meio de um juízo de proporcionalidade. Com efeito, suspender os efeitos da medida liminar concedida pela magistrada de 1o grau importaria em um mal muito superior às possíveis perdas econômicas que o Agravante poderia suportar. É mais importante garantir que o Agravado sobreviva com dignidade até o julgamento final do writ que preocupar-se com o prejuízo econômico do ente da Administração Pública Indireta, principalmente se considerarmos que a parcela requerida possui natureza alimentar e que os fundamentos apresentados no Mandado de Segurança possuem grande relevância e são bastante verossímeis. Assim, considerando todos os argumentos já expostos, preenchidos os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço do Agravo de Instrumento, porém nego-lhe provimento com supedâneo no art. 557 do Código de Processo Civil, mantendo a decisão agravada por todos os seus termos. Belém, 23 de outubro de 2012 DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA RELATORA
(2012.03463878-38, Não Informado, Rel. GLEIDE PEREIRA DE MOURA, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2012-10-24, Publicado em 2012-10-24)
Ementa
GABINETE DA DESEMBARGADORA GLEIDE PEREIRA DE MOURA SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2012.3.002748-0 AGRAVANTE : INSTITUTO DE GESTÃO PREVIDENCIÁRIA DO ESTADO DO PARÁ - IGEPREV ADVOGADO : VAGNER ANDREI TEIXEIRA LIMA PROC. AUTÁRQUICO AGRAVADO : FLORA LUIZA SILVA DE AGUIAR AGRAVADO : SEBASTIÃO SILVA SOUSA AGRAVADO : RAIMUNDO NONATO NARROS RAMOS AGRAVADO : JOÃO TELES DOS SANTOS AGRAVADO : ELSON BENEDITO NAVARRO DE SOUZA AGRAVADO : MANOEL GREGÓRIODE JESUS AGRAVADO : OSVALDO PEREIRA MIRANDA REPRESENTANTE : MARIA DA ROSA MIRANDA AGRAVADO : ANTONIO CARLOS CASSEB DE ALMEIDA AGRAVADO : MARIO ANTUNES DE OLIVEIRA AGRAVADO : CARLOS DE LIMA COSTA AGRAVADO : VÂNIA LÚCIA COSTA DA MOTA ADVOGADO : RENATA DINIZ MONTEIRO CAMARGOS RELATORA : DESEMBARGADORA GLEIDE PEREIRA DE MOURA DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto pelo INSTITUTO DE GESTÃO PREVIDENCIÁRIA DO ESTADO DO PARÁ IGEPREV em face da decisão proferida pelo Juiz de Direito da 2a Vara de Fazenda da Comarca da Capital nos autos de Ação de Mandado de Segurança c/c Pedido de Liminar, contra FLORA LUIZA SILVA DE AGUIAR e OUTROS. Em decisão de fls. 267/268 dos autos do presente agravo, o juízo a quo concedeu a liminar pleiteada, determinando que a autoridade coatora equipare imediatamente o abono salarial dos Agravados em relação ao concedido aos militares da ativa, observadas as peculiaridades do cargo de cada um dos Recorridos. Julgou o magistrado quehárelevante fundamento para a concessão da liminar, pois medida contrária importaria em olvidar a aplicação de norma legal e constitucional, nitidamente o §8o do art. 40 da Constituição Federal, bem como o §17 do mesmo dispositivo. Acrescentou que o pleito dos Agravados encontra-se consagrado nos arts. 58 e 60 da Lei Estadual no 5.251/85, assim como no que dispõem os Decretos Estaduais nos 2.386/98 e 2.838/98 e na Lei no 4.491/73. Quanto ao segundo requisito, concluiu que a natureza alimentar da parcela comprova a existência de periculum in mora. Inconformado, o agravante busca reforma da decisão, sustentando, preliminarmente: 1) ilegitimidade passiva do IGEPREV, tendo em vista que os recursos necessários para o pagamento do abono são pagos pelo Tesouro Estadual, que, por motivo de conveniência, apenas efetua o repasse ao IGEPREV, para que este proceda ao seu pagamento; 2) inépcia da inicial por impossibilidade jurídica do pedido. Como prejudicial de mérito, alega a decadência do Mandado de Segurança. No mérito, aduzque o pedido formulado pelo Agravado é juridicamente impossível, pois o abono salarial constitui vantagem pecuniária caracterizada pela transitoriedade, conforme reconhecido pelos Decretos Estaduais nos 2.219/97, 2.836/98 e 0176/2003. Logo é vedada sua incorporação aos vencimentos dos servidores ou aos proventos de aposentadoria e pensão. Soma queé inconstitucional a própria instituição do abono salarial pelos Decretos Estaduais nos 2.219/97 e 2.837/98, uma vez que não haveria autorização legal para tanto, nem previsão orçamentária. Outrossim, o abono requerido não integraria o salário de contribuição por não compor a remuneração que era paga ao Recorrido enquanto militar ativo e, portanto, não teria incidido contribuição previdenciária sobre a parcela. Assim, haveria violação do princípio contributivo. Aduz que, ao permitir a incorporação do abono, o magistrado estaria atuando como legislador positivo, o que é vedado pelo ordenamento pátrio devido ao princípio da separação dos poderes. Sustenta que a não incorporação do abono aos proventos de aposentadoria não reduziram a remuneração do Agravado, de modo que não houve violação do princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos contido no art. 37, XV, da Constituição Federal. Giza que o abono salarial ora tratado não integra a remuneração dos servidores civis e militares por ser transitório, de modo que o art. 52 da Lei no 5.251/85 não teria abrangência sobre esta parcela, a ponto de determinar que seu valor passe a ser o fixado igualmente ao posto superior. Sustenta, ainda: 1) impossibilidade legal de deferimento de tutela antecipada, tendo em vista o que preceitua o §2o do art. 7o da Lei no 12.016/2009; 2) inconstitucionalidade e ilegalidade da Súmula 729 do STF; 3) ausência dos requisitos para a concessão da liminar devido à existência de periculum in mora inverso, pois existe perigo de ser provocada grave lesão e de difícil ou incerta reparação ao Agravante. Requer, por derradeiro, que seja concedido efeito suspensivo ao presente recurso, alegando a irreversibilidade do dano ao erário público caso não sejamsuspensos os efeitos da decisão a quo, em virtude não apenas da dificuldade que circunda a repetição do indébito, mas também e, principalmente, pela instabilidade financeira que pode gerar ao Fundo Previdenciário, ao se configurar precedente para outras situações similares. Junta documentos às fls. 43/409. É o sucinto relatório. DECIDO: Ab initio, cumpre-me salientar que, consoante o art. 527, caput, da lei adjetiva civil, registrado e distribuído o agravo de instrumento, cabe ao relator empreender um exame preliminar do recurso. Assim, entre as medidas que podem ser tomadas por ele, prevê o inciso I do referido dispositivo a negação de seguimento ao recurso nos casos do art. 557 do mesmo código, o qual possui a seguinte redação: Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.(Sem grifos no original). Na lição de Cássio Scarpinella Bueno, a própria existência de uma súmula é dispensada, bastando que haja 'jurisprudência dominante', assim entendida aquela que, a despeito de sua não formalização como súmula (...), é representativa, de forma objetiva, do entendimento amplamente aceito pelo Tribunal. E completa afirmando que, assim sendo, a orientação dos precedentes deve ser aplicada de imediato ao recurso, conferindo assim maior racionalidade aos julgamentos dos tribunais (Curso Sistematizado de Direito Processual Civil, volume 5: Recursos, Processos e Incidentes nos Tribunais. Sucedâneos recursais: técnicas de controle das decisões jurisdicionais, 2a Ed., São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 122/123). No presente caso, observo que a matéria tratada no recurso não é nova nesta Egrégia Corte, havendo reiteradas decisões das Câmaras sobre a maioria das razões recursais; decisões do Plenário sobre outras e, ainda, jurisprudência pacífica do STF sobre as demais. Conforme demonstrarei abaixo pormenorizadamente, todos os argumentos expendidos pelo Agravante já foram analisados e considerados improcedentes por esta Corte e/ou pelos Tribunais Superiores, o que justifica a aplicação do inciso I do art. 557 do CPC para o julgamento monocrático do agravo de instrumento. Em razão dos inúmeros argumentos apresentados pelo Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Pará, que demandam refutação individual, passemos a analisar a questão pormenorizadamente. 1. DAS PRELIMINARES: 1.1. DA DECADÊNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA: Afirma o Recorrente que aação fora proposta fora do prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias, de acordo com o disposto na Lei no 12.016/09. Defende que o mandado de segurança somente foi impetrado no dia 26 de janeiro de 2012, sendo que o prazo decadencial teria como termo a quo a data da concessão (homologação) da pensão aos agravados. Todavia, conforme a jurisprudência dominante deste Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por configurar-se ato de trato sucessivo, uma vez que o valor do abono integrava todo mês à remuneração dos agravados, com isso renovava-se a violação do direito a equiparação do referido valor ao que era destinado aosmilitares da ativa. Foi neste sentido que decidiu a 1a Câmara Cível Isolada nos autos do Agravo de Instrumento no 2010.3.002491-7, de minha relatoria, cujo acórdão foi publicado em 21/11/2011. Da mesma forma, apenas a título de exemplificação, entendeu a 5a Câmara Cível Isolada, conforme o acórdão de no91346, publicado em 28/09/2010, no qual colacionaram-se diversos julgados do Superior Tribunal de Justiça no mesmo sentido. Deste modo, afasto a prejudicial de mérito alegada pelo Agravante. 1.2. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO IGEPREV: Alega o Agravante carecer de legitimidade para compor o polo passivo da relação jurídica processual, uma vez que os recursos destinados ao custeio das despesas com o pagamento de abono salarial dos policias inativos são provenientes do Tesouro Estadual, conforme o art. 3o do Decreto no 2.836/1998 e do Decreto no 2.837/1998, ambos elaborados pelo Governador do Estado. Aduz que apenas por questão de operacionalização, os recursos destinados ao pagamento da referida vantagem pecuniária são repassados ao IGEPREV para inclusão na folha de pagamento, não tendo este instituto qualquer ingerência sobre os mesmos. Analiso. A jurisprudência uniforme desta Corte é de que Há muito a jurisprudência pátria já firmou o entendimento de que as autarquias, por possuírem autonomia financeira e administrativa, são partes legítimas para figurarem no pólo passivo de demandas nas quais se busquem discutir atos por elas exarados, conforme o acórdão no 93.144 proferido nos autos do processo no 200830058556, cuja relatora é a Eminente Desa. Eliana Rita DaherAbufaiad. Ademais, nas próprias decisões juntadas pelo Agravante, como peça facultativas para formarem o instrumento, os relatores afastaram esta preliminar, sob os mesmos fundamentos, a exemplo do acórdão proferido pela 2a Câmara Cível Isolada nos autos do Agravo de Instrumento no 2008.3.01186703, cuja relatora é a Eminente Desa. Carmencin Marques Cavalcante Ora, diferente não poderia ser, pois da personalidade jurídica própria de uma autarquia decorre que os bens transferidos a elas passam a compor seu patrimônio próprio, que não mais se confunde com o do ente que o transferiu, no caso, o Estado do Pará. Assim, seguindo o entendimento pacífico desta Corte, considero inconsistentes os argumentos expendidos pelo Agravante. 2. DO MÉRITO: 2.1. DA IMPOSSIBILIDADE LEGAL DE CONCESSÃO DE LIMINAR DA SÚMULA 729 DO STF: Primeiramente, não se pode esquecer que, embora a Súmula 729 do STF não seja vinculante e, por causa disso, não se tenha a obrigatoriedade de observá-la, ela representa o entendimento dominante do STF, guardião maior da Constituição e, como tal, o primeiro interessado em salvaguardar a ordem jurídica, que engloba não apenas a Constituição como também todas as normas jurídicas vigentes. Assim, quando o Pretório Excelso declara, ao editar a Súmula 729, que A decisão na ação direta de constitucionalidade 4 não se aplica à antecipação de tutela em causa de natureza previdenciária, claro está que neste caso específico causas de natureza previdenciária é permitida a concessão de tutela antecipada ou de liminar contra a Fazenda Pública, não havendo, portanto, nenhuma inconstitucionalidade, porque assim entende o responsável pela observância das normas constitucionais. Nenhuma dúvida há quanto à aplicação e à constitucionalidade da Súmula 729 pelo STF, conforme demonstram as Reclamações nos4233, 2480, 2379, 2457, além de outras, conforme as ementas a seguir transcritas: SERVIDOR PÚBLICO. Inativo. Pensionista. Remuneração. Vencimentos ou proventos. Pensão. Vantagem pecuniária. Incorporação da gratificação conhecida como "quintos". Antecipação de tutela concedida. Ofensa à autoridade da decisão proferida na ADC nº 4. Não ocorrência. Benefício de caráter previdencial. Reclamação julgada improcedente. Agravo improvido. Inteligência da súmula 729. Precedentes inaplicáveis. Em se tratando de benefícios previdenciarios, como proventos e pensões, não se lhes aplica o decidido na ADC nº 4. (Rcl 4233 AgR/CE, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julgado em 28.03.2007). AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE Nº 4-6 - ALCANCE DO PRONUNCIAMENTO - MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA. O que decidido na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 4-6 não alcança conflito de interesses de natureza previdenciária, pouco importando a espécie da parcela em jogo e a entidade devedora envolvida. (Rcl 2480 MC/PE, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 09.09.2004). Como se pode perceber, ainda que a regra seja a da impossibilidade de se antecipar os efeitos da tutela contra a fazenda pública nos casos que versem sobre reclassificação, equiparação de servidores públicos, bem como concessão de aumento ou extensão de vantagens, conforme decidido pelo STF na ADC no 4, esta mesma Egrégia Corte tratou de excepcionar seu entendimento, quando a matéria em discussão possuir natureza previdenciária. É exatamente este o presente caso, por se tratar de incorporação de abono salarial a provento de aposentadoria, devendo-se decidir consoante a Súmula 729 do Pretório Excelso. Destarte, não se aplica ao caso o disposto no §2o do art. 7o da Lei no 12.016/09, quando dispõe que não caberá liminar caso tenha por objeto a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. Por todos estes fundamentos, julgo insubsistentes os argumentos do Agravante. 2.2. DA IMPOSSIBILIDADE DE INCORPORAÇÃO DO ABONO SALARIAL: O Agravante afirma que o Agravado não preenche os requisitos exigidos por lei para que o juiz antecipe os efeitos da tutela, pois careceria de demonstração do fumus boni iuris. Alega, primeiro, que a própria instituição do abono salarial seria inconstitucional, pois esta vantagem teria sido criada e majorada por meio de simples decretos estaduais e sem que houvesse autorização legal ou previsão orçamentária votada pelo Poder Legislativo Estadual, violando, assim, o inciso X, do art. 37 da Constituição Federal. Acrescenta que o abono salarial do qual busca-se a incorporação possui natureza transitória, por força do que dispõem o art. 1o do Decreto Estadual no 2.219/97 e o art. 2o do Decreto Estadual no 2.836/98. Destarte, de acordo com o Decreto Estadual no 0176/2003, art. 1o, seria vedada a incorporação dessas parcelas aos proventos de aposentadoria e pensões. Outrossim, sustenta que a Lei no 9.717/98 veda o pagamento de benefícios distintos dos previstos pelo INSS, bem como a inclusão de parcelas remuneratórias que não integram o salário de contribuição do servidor, como o caso do abono salarial. Consequentemente, não poderiam ser incluídas nos proventos vantagens alheias ao conceito de remuneração, sobre as quais não incidiu contribuição previdenciária. Por fim, aduz que, ao permitir a incorporação do abono, o magistrado estaria atuando como legislador positivo, o que é vedado pelo ordenamento pátrio devido ao princípio da separação dos poderes. Analiso. Assim como as demais matérias abordados pelo Agravante, estas matérias não são novas nesta Corte de Justiça. Primeiramente, é pacífico o entendimento de que os decretos mencionados acima não são eivados de vício de inconstitucionalidade, conforme assentado no Acórdão no 100234, proferido nos autos da Apelação Cívelnº 2010.3.004.250-5, o qual foi ementado da seguinte forma: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS DECRETOS ESTADUAIS 2.219/97 E 2.837/98, POR VÍCIO FORMAL, NÃO ACOLHIDO. DECRETOS QUE NÃO INOVAM NA SEARA JURIDICA, MAS APENAS REGULAMENTE DIREITOS JÁ PREVISTOS EM LEI. INEXISTÊNCIA DE AUMENTO DE DESPESA, POR SE CUIDAR DE MERA REPOSIÇÃO SALARIAL. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À CONSTITUIÇÃO POR SE TRATAR DE DESPESA SEM PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PROVA DO FATO ALEGADO. ARGUMENTO QUE NÃO É SUFICIENTE PAR AFASTAR O DIREITO EM ANÁLISE. PEDIDO DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADO IMPROCEDENTE. DECISÃO UNÂNIME. I Os objurgados decretos estaduais não inovam no ordenamento jurídico, criando novos direitos e deveres, mas apenas regulamentam o previsto no artigo 117 do Regimento Jurídico Único dos Servidores Estaduais. Por conseguinte, não há ofensa ao princípio constitucional da reserva legal; II No mesmo sentido, deve ser rechaçada a alegação de que os supracitados decretos criaram aumento de despesa sem preceito em lei, uma vez que, além de existir previsão legal estabelecendo os abonos, não se pode olvidar que as controvertidas normas tinham por objetivo expresso apenas repor perdas salariais dos servidores em destaque. Logo, não há aumento, mas mera restituição de valores devidos. III No que se refere à assertiva de inconstitucionalidade por ausência de previsão orçamentária, é de se destacar que o autor do incidente não comprovou esta alegação. Ademais, o STF já firmou o entendimento de que a ausência de previsão orçamentária não é causa suficiente para provocar a inconstitucionalidade da norma guerreada. IV Pedido de inconstitucionalidade conhecido e julgado improcedente. V Decisão unânime. (Acórdão no: 100234; Processo no: 201030042505, 4a Câmara Cível Isolada, Relatora Desa. Eliana Rita DaherAbufaiad, publicado em 06/09/2011, Cad.1 Pág.64). No que tange ao suposto caráter de transitoriedade do abono salarial, não posso deixar de seguir a jurisprudência dominante desta Corte de Justiça no sentido de que o mesmo consiste, na verdade, em aumento salarial simulado. Então,não há qualquer justificativa jurídica para que a majoração se dê exclusivamente aos servidores da ativa, sob pena de ferir-se com isso a isonomia entre os agentes públicos ativos e inativos. Com efeito, conforme ventilado no acórdão no 111794, ainda que o decretos estaduais em questão disponham sobre a criação de um abono salarial com caráter supostamente transitório, como se qualificar como fugaz um abono que é pago há mais de 10 (dez) anos, regularmente, para os policiais militares? Como entender que o aludido benefício é temerário se perdura há mais de uma década, sem que o Estado do Pará tenha ofertado qualquer justificativa extraordinária que demonstrasse a manutenção da situação precária? (Apelação Cível no 2012.3.011.269-5, Relatora Desa. Eliana Rita DaherAbufaiad, publicado em 12/09/2012). O mesmo entendimento foi seguido pela 5a Câmara Cível Isolada nos autos de Agravo de Instrumento no2009.3.012027-1 e pela 2a Câmara Cível Isolada nos autos de Agravo de Instrumento no2009.3.011779-9. Outrossim, os Decretos Estaduais nos 2.219/97 e 2.837/98, assim como os demais decretos que fixaram reajustes, preveem a criação de um abono, o qual, no entanto, não pode ser considerado transitório ou emergencial, visto que vem sendo pago há quase quinze anos. Ora, resta cristalino que não se pode atribuir caráter temporário a um benefício que perdura há mais de uma década, sem qualquer justificativa para sua manutenção. Ratificando este entendimento, transcrevo recente julgado da 4a Câmara Cível Isolada de nosso Tribunal de Justiça, de relatoria da Eminente Desembargadora Eliana Rita DaherAbufaiad, assim ementado: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO-PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E DE NECESSIDADE DE INCLUSÃO DO ESTADO DO PARÁ NO PÓLO PASSIVO REJEITADAS. APELANTE QUE É AUTARQUIA DOTADA DE AUTONOMIA FINANCEIRA E ADMINISTRATIVA. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO AFASTADA. PRETENSÃO DE TRATO SUCESSIVO, QUE SE RENOVA MENSALMENTE. PREJUDICIAL DE MÉRITO DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS DECRETOS QUE FUNDAMENTAM A LIDE NÃO CONHECIDA. INCIDENTE QUE NÃO TEVE SEGUIMENTO NO PLENÁRIO DESTA CORTE. MÉRITO. SUPOSTO ABONO SALARIAL QUE, POR POSSUIR NOTÓRIO CARÁTER PERMANENTE, SE TRANSFIGURA EM VERDADEIRA MAJORAÇÃO DE VENCIMENTOS DISFARÇADO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO CARÁTER CONTRIBUTIVO DO SISTEMA. DECISÃO QUE NÃO IMPORTA EM ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO LEGISLADOR. POSSIBILIDADE DE PAGAMENTO DE ABONO EM PATAMAR CORRESPONTE AO POSTO IMEDIATAMENTE SUPERIOR AO DO APELADO. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. I Sendo o Igeprev autarquia dotada de autonomia administrativa-financeira, é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, sem a necessária presença do Estado do Pará. II O pleito do apelado não se encontra atingido pela prescrição qüinqüenal, visto que, como se cuida de obrigação de trato sucessivo, o prejuízo se renova mensalmente. Destarte, não pode ser acolhida a prejudicial em destaque. III Em razão da decisão firmada no acórdão 100234, resta superada a discussão acerca da constitucionalidade dos decretos estaduais 2.219/97 e 2.837/98. IV O abono salarial em testilha se cuida de notório reajuste salarial simulado. Portanto, não havendo qualquer razão jurídica que possibilite essa majoração exclusivamente aos servidores da ativa e justifique a quebra da isonomia entre os agentes públicos ativos e inativos, torna-se evidente que o mesmo deve ser estendido a todos os servidores. V Como a contribuição previdenciária se operacionaliza levando em consideração a remuneração dos servidores, e sendo este abono um verdadeiro acréscimo remuneratório simulado, resta claro que não há ofensa ao caráter contributivo do sistema. VI A determinação ora combatida não implica em atuação legislativa do Poder Judiciário, uma vez que não se está criando direitos, mas apenas determinando a restituição de parcela que foi indevidamente subtraída. VII Apelação Cível conhecida e improvida. VIII Decisão unânime. (Apelação Cível no 2012.3.011.269-5, publicado em 12.09.2012) (Grifei). Assim, comungo do entendimento de que estamos diante de um reajuste salarial simulado, mesmo porque os decretos que o originaram não trazem qualquer contraprestação laboral para a sua concessão. Deste modo, se o abono possui natureza salarial, não há o que legitime sua não concessão aos inativos. Ademais, afastada a suposta natureza transitória do abono, também não procede o argumento de inépcia da inicial por impossibilidade jurídica do pedido, já que não há qualquer vedação legal. Da mesma forma, não se pode invocar o art. 52 da Leino 5.251/85, pois não se trata de parcela estranha à remuneração. No que se refere à violação à Lei no 9.717/98, uma vez assentado que o abono ora tratado constitui-se, na verdade, em reajuste salarial simulado, decorre daí que não se está diante de uma parcela nova que não compunha o salario de contribuição. Trata-se de mera tentativa de corrigir os efeitos da desvalorização da moeda, sendo igualmente improcedente o argumento do Agravante por não haver qualquer violação ao princípio contributivo. Finalmente, quanto à violação ao princípio da separação de poderes, também não merece acolhimento este argumento levantado pelo Agravante. No mesmo acórdão acima referido, foi assentado que Quando o Supremo Tribunal Federal consignou que não pode o Judiciário aumentar vencimentos, está claramente impossibilitando a inovação salarial, não trazendo qualquer proibição para a correção de distorções remuneratórias ilegais. (...) No caso em exposição, não se verifica qualquer atuação inovadora do Poder Judiciário, posto a parcela visada já existir e ter sido subtraída indevidamente. Portanto, não pode prevalecer a tese ora estudada. Logo, não se está legislando de forma positiva, mas apenas corrigindo a atuação ilegítima da Administração Pública. 2.3. DA IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA LIMINAR DO PERICULUM IN MORA INVERSO Não obstante, saliento que o periculum in mora inverso, ou seja, o risco de provocar dano grave e de difícil reparação ao Réu/Impetrado, deve ser superado por meio de um juízo de proporcionalidade. Com efeito, suspender os efeitos da medida liminar concedida pela magistrada de 1o grau importaria em um mal muito superior às possíveis perdas econômicas que o Agravante poderia suportar. É mais importante garantir que o Agravado sobreviva com dignidade até o julgamento final do writ que preocupar-se com o prejuízo econômico do ente da Administração Pública Indireta, principalmente se considerarmos que a parcela requerida possui natureza alimentar e que os fundamentos apresentados no Mandado de Segurança possuem grande relevância e são bastante verossímeis. Assim, considerando todos os argumentos já expostos, preenchidos os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço do Agravo de Instrumento, porém nego-lhe provimento com supedâneo no art. 557 do Código de Processo Civil, mantendo a decisão agravada por todos os seus termos. Belém, 23 de outubro de 2012 DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA RELATORA
(2012.03463878-38, Não Informado, Rel. GLEIDE PEREIRA DE MOURA, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2012-10-24, Publicado em 2012-10-24)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
24/10/2012
Data da Publicação
:
24/10/2012
Órgão Julgador
:
1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
GLEIDE PEREIRA DE MOURA
Número do documento
:
2012.03463878-38
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
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