TJPA 0010549-49.2016.8.14.0000
2.ª TURMA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º 0010549-49.2016.8.14.0000 COMARCA DE ORIGEM: BELÉM AGRAVANTE: BANCO ITAU S/A ADVOGADO: CELSO MARCON - OAB/PA 13.536-A AGRAVADO: AUTO ESCOLA GOLD LTDA ADVOGADO: NÃO HÁ NOS AUTOS RELATORA: DESª. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. LIMINAR INDEFERIDA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. INAPLICABILIDADE. ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MORA COMPROVADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O atual posicionamento jurisprudencial do Colendo Superior Tribunal de Justiça é no sentido de reconhecer a impossibilidade da aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial às ações de busca e apreensão, a fim de evitar prejuízo ao instituto da garantia fiduciária. 2. Recurso Conhecido e Provido. DECISÃO MONOCRÁTICA A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA): Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por BANCO ITAU S/A, objetivando a reforma de decisão interlocutória proferida pelo MM. Juízo da 3.ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Belém, que indeferiu o pedido liminar de busca e apreensão de veículo, nos autos da ação de busca e apreensão, com fundamento na teoria do inadimplemento substancial, processo nº 0006772-94.2014.8.14.0301, movido em desfavor de AUTO ESCOLA GOLD LTDA, ora agravada. Inconformado o requerido pugna por reforma do interlocutório aduzindo a comprovação da mora da agravada, em relação ao veículo Fiat Palio Fire chassi 9BD17164LB5672457, descabendo a aplicação da teoria do adimplemento substancial, mesmo que a agravada tenha dado cumprimento a 35 das 48 das parcelas devidas. Juntou documentos (fls. 09-78). O feito foi inicialmente distribuído, em 31.08.2016, à relatoria da Exma. Sra. Desembargadora Rosileide Maria da Costa Cunha (fls. 79). Mediante decisão da relatora originária de fls. 81-84 foi indeferido o pedido de efeito suspensivo da decisão agravada. Ausentes contrarrazões da parte agravada. Por força da Emenda Regimental nº 05 e a incompetência superveniente da Desembargadora relatora, coube-me a relatoria do feito por redistribuição, com registro de entrada no gabinete em 29.05.17. É o relatório. D E C I D O A EXMª. SRª DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA): Satisfeitos os pressupostos processuais viabilizadores de admissibilidade recursal, conheço do presente recurso. Consoante jurisprudências dos tribunais pátrio acerca do tema se vê autorizado o julgamento monocrático na forma do dispositivo vigente. Importa observar que a ampliação dos poderes do relator é motivada inclusive, no intuito de solucionar o excessivo de demandas, de molde que o decisum singular contribui para atender ao princípio da celeridade, economicidade e duração razoável do processo. É imperioso salientar que este momento processual se presta, apenas e tão somente, para analisar sobre o acerto ou não da decisão interlocutória guerreada. As questões ainda não submetidas à apreciação do Juízo da causa não são passíveis de análise, sob pena de supressão de instância e violação ao duplo grau de jurisdição, diante a vedação pelo nosso ordenamento jurídico. No mérito, o agravante invoca que a Teoria do Adimplemento Substancial não deve ser conferida, eis que para o deferimento da liminar de busca e apreensão, deve apenas comprovar a mora e o contrato com o devedor. Os argumentos apresentados pelo Agravante devem prosperar. Comprovada a mora nos autos, é cediço que o atual posicionamento jurisprudencial do Colendo Superior Tribunal de Justiça é no sentido de reconhecer a impossibilidade da aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial às ações de busca e apreensão, a fim de evitar prejuízo ao instituto da garantia fiduciária. Senão, vejamos: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO, COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA REGIDO PELO DECRETO-LEI 911/69. INCONTROVERSO INADIMPLEMENTO DAS QUATRO ÚLTIMAS PARCELAS (DE UM TOTAL DE 48). EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO (OU DETERMINAÇÃO PARA ADITAMENTO DA INICIAL, PARA TRANSMUDÁ-LA EM AÇÃO EXECUTIVA OU DE COBRANÇA), A PRETEXTO DA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. DESCABIMENTO. 1. ABSOLUTA INCOMPATIBILIDADE DA CITADA TEORIA COM OS TERMOS DA LEI ESPECIAL DE REGÊNCIA. RECONHECIMENTO. 2. REMANCIPAÇÃO DO BEM AO DEVEDOR CONDICIONADA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA, ASSIM COMPREENDIDA COMO OS DÉBITOS VENCIDOS, VINCENDOS E ENCARGOS APRESENTADOS PELO CREDOR, CONFORME ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DA SEGUNDA SEÇÃO, SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS (REsp n. 1.418.593/MS). 3. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO, COM A UTILIZAÇÃO DA VIA JUDICIAL ELEITA PELA LEI DE REGÊNCIA COMO SENDO A MAIS IDÔNEA E EFICAZ PARA O PROPÓSITO DE COMPELIR O DEVEDOR A CUMPRIR COM A SUA OBRIGAÇÃO (AGORA, POR ELE REPUTADA ÍNFIMA), SOB PENA DE CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE NAS MÃOS DO CREDOR FIDUCIÁRIO. 4. DESVIRTUAMENTO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL, CONSIDERADA A SUA FINALIDADE E A BOA-FÉ DOS CONTRATANTES, A ENSEJAR O ENFRAQUECIMENTO DO INSTITUTO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA. VERIFICAÇÃO. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A incidência subsidiária do Código Civil, notadamente as normas gerais, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infungíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela "lei geral" não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela lei especial (ut Art. 1.368-A, introduzido pela Lei n. 10931/2004). 1.1 Além de o Decreto-Lei n. 911/1969 não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, é expresso em exigir a quitação integral do débito como condição imprescindível para que o bem alienado fiduciariamente seja remancipado. Em seus termos, para que o bem possa ser restituído ao devedor, livre de ônus, não basta que ele quite quase toda a dívida; é insuficiente que pague substancialmente o débito; é necessário, para esse efeito, que quite integralmente a dívida pendente. 2. Afigura-se, pois, de todo incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso _ desimportando sua extensão, se de pouca monta ou se de expressão considerável _, quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente. Compreensão diversa desborda, a um só tempo, do diploma legal exclusivamente aplicável à questão em análise (Decreto-Lei n. 911/1969), e, por via transversa, da própria orientação firmada pela Segunda Seção, por ocasião do julgamento do citado Resp n. 1.418.593/MS, representativo da controvérsia, segundo a qual a restituição do bem ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento, no prazo de cinco dias contados da execução da liminar de busca e apreensão, da integralidade da dívida pendente, assim compreendida como as parcelas vencidas e não pagas, as parcelas vincendas e os encargos, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 3. Impor-se ao credor a preterição da ação de busca e apreensão (prevista em lei, segundo a garantia fiduciária a ele conferida) por outra via judicial, evidentemente menos eficaz, denota absoluto descompasso com o sistema processual. Inadequado, pois, extinguir ou obstar a medida de busca e apreensão corretamente ajuizada, para que o credor, sem poder se valer de garantia fiduciária dada (a qual, diante do inadimplemento, conferia-lhe, na verdade, a condição de proprietário do bem), intente ação executiva ou de cobrança, para só então adentrar no patrimônio do devedor, por meio de constrição judicial que poderá, quem sabe (respeitada o ordem legal), recair sobre esse mesmo bem (naturalmente, se o devedor, até lá, não tiver dele se desfeito). 4. A teoria do adimplemento substancial tem por objetivo precípuo impedir que o credor resolva a relação contratual em razão de inadimplemento de ínfima parcela da obrigação. A via judicial para esse fim é a ação de resolução contratual. Diversamente, o credor fiduciário, quando promove ação de busca e apreensão, de modo algum pretende extinguir a relação contratual. Vale-se da ação de busca e apreensão com o propósito imediato de dar cumprimento aos termos do contrato, na medida em que se utiliza da garantia fiduciária ajustada para compelir o devedor fiduciante a dar cumprimento às obrigações faltantes, assumidas contratualmente (e agora, por ele, reputadas ínfimas). A consolidação da propriedade fiduciária nas mãos do credor apresenta-se como consequência da renitência do devedor fiduciante de honrar seu dever contratual, e não como objetivo imediato da ação. E, note-se que, mesmo nesse caso, a extinção do contrato dá-se pelo cumprimento da obrigação, ainda que de modo compulsório, por meio da garantia fiduciária ajustada. 4.1 É questionável, se não inadequado, supor que a boa-fé contratual estaria ao lado de devedor fiduciante que deixa de pagar uma ou até algumas parcelas por ele reputadas ínfimas _ mas certamente de expressão considerável, na ótica do credor, que já cumpriu integralmente a sua obrigação _, e, instado extra e judicialmente para honrar o seu dever contratual, deixa de fazê-lo, a despeito de ter a mais absoluta ciência dos gravosos consectários legais advindos da propriedade fiduciária. A aplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 4.2. A propriedade fiduciária, concebida pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada da teoria do adimplemento substancial. 5. Recurso Especial provido. (STJ - REsp: 1622555 MG 2015/0279732-8, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 22/02/2017, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/03/2017) Logo, não há falar em aplicação da referida teoria para afastar a concessão da medida liminar em ação de busca e apreensão. Diante a faculdade do credor utilizar a Ação de Busca e Apreensão como meio de reivindicar seu crédito, CONHEÇO E PROVEJO O PRESENTE RECURSO, para reformar o decisum guerreado, revogando o ato em favor da parte agravada, para determinar ao juízo de origem promova a busca e apreensão sobre o veículo informado na inicial, diante a comprovação da inadimplência do devedor (Decreto Lei nº 911/69). P.R.I.C. Serve esta decisão como Mandado/Intimação/Ofício, para os fins de direito. Após o trânsito em julgado promova-se a respectiva baixa nos registros de pendência referente a esta Relatora e arquivem-se, se for o caso. Em tudo certifique. À Secretaria para as devidas providências. Belém, (PA), 20 de outubro de 2017. Desa. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES Desembargadora Relatora Assinatura eletrônica
(2017.04531711-10, Não Informado, Rel. EDINEA OLIVEIRA TAVARES, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2017-10-27, Publicado em 2017-10-27)
Ementa
2.ª TURMA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º 0010549-49.2016.8.14.0000 COMARCA DE ORIGEM: BELÉM AGRAVANTE: BANCO ITAU S/A ADVOGADO: CELSO MARCON - OAB/PA 13.536-A AGRAVADO: AUTO ESCOLA GOLD LTDA ADVOGADO: NÃO HÁ NOS AUTOS RELATORA: DESª. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. LIMINAR INDEFERIDA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. INAPLICABILIDADE. ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MORA COMPROVADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O atual posicionamento jurisprudencial do Colendo Superior Tribunal de Justiça é no sentido de reconhecer a impossibilidade da aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial às ações de busca e apreensão, a fim de evitar prejuízo ao instituto da garantia fiduciária. 2. Recurso Conhecido e Provido. DECISÃO MONOCRÁTICA A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA): Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por BANCO ITAU S/A, objetivando a reforma de decisão interlocutória proferida pelo MM. Juízo da 3.ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Belém, que indeferiu o pedido liminar de busca e apreensão de veículo, nos autos da ação de busca e apreensão, com fundamento na teoria do inadimplemento substancial, processo nº 0006772-94.2014.8.14.0301, movido em desfavor de AUTO ESCOLA GOLD LTDA, ora agravada. Inconformado o requerido pugna por reforma do interlocutório aduzindo a comprovação da mora da agravada, em relação ao veículo Fiat Palio Fire chassi 9BD17164LB5672457, descabendo a aplicação da teoria do adimplemento substancial, mesmo que a agravada tenha dado cumprimento a 35 das 48 das parcelas devidas. Juntou documentos (fls. 09-78). O feito foi inicialmente distribuído, em 31.08.2016, à relatoria da Exma. Sra. Desembargadora Rosileide Maria da Costa Cunha (fls. 79). Mediante decisão da relatora originária de fls. 81-84 foi indeferido o pedido de efeito suspensivo da decisão agravada. Ausentes contrarrazões da parte agravada. Por força da Emenda Regimental nº 05 e a incompetência superveniente da Desembargadora relatora, coube-me a relatoria do feito por redistribuição, com registro de entrada no gabinete em 29.05.17. É o relatório. D E C I D O A EXMª. SRª DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA): Satisfeitos os pressupostos processuais viabilizadores de admissibilidade recursal, conheço do presente recurso. Consoante jurisprudências dos tribunais pátrio acerca do tema se vê autorizado o julgamento monocrático na forma do dispositivo vigente. Importa observar que a ampliação dos poderes do relator é motivada inclusive, no intuito de solucionar o excessivo de demandas, de molde que o decisum singular contribui para atender ao princípio da celeridade, economicidade e duração razoável do processo. É imperioso salientar que este momento processual se presta, apenas e tão somente, para analisar sobre o acerto ou não da decisão interlocutória guerreada. As questões ainda não submetidas à apreciação do Juízo da causa não são passíveis de análise, sob pena de supressão de instância e violação ao duplo grau de jurisdição, diante a vedação pelo nosso ordenamento jurídico. No mérito, o agravante invoca que a Teoria do Adimplemento Substancial não deve ser conferida, eis que para o deferimento da liminar de busca e apreensão, deve apenas comprovar a mora e o contrato com o devedor. Os argumentos apresentados pelo Agravante devem prosperar. Comprovada a mora nos autos, é cediço que o atual posicionamento jurisprudencial do Colendo Superior Tribunal de Justiça é no sentido de reconhecer a impossibilidade da aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial às ações de busca e apreensão, a fim de evitar prejuízo ao instituto da garantia fiduciária. Senão, vejamos: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO, COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA REGIDO PELO DECRETO-LEI 911/69. INCONTROVERSO INADIMPLEMENTO DAS QUATRO ÚLTIMAS PARCELAS (DE UM TOTAL DE 48). EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO (OU DETERMINAÇÃO PARA ADITAMENTO DA INICIAL, PARA TRANSMUDÁ-LA EM AÇÃO EXECUTIVA OU DE COBRANÇA), A PRETEXTO DA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. DESCABIMENTO. 1. ABSOLUTA INCOMPATIBILIDADE DA CITADA TEORIA COM OS TERMOS DA LEI ESPECIAL DE REGÊNCIA. RECONHECIMENTO. 2. REMANCIPAÇÃO DO BEM AO DEVEDOR CONDICIONADA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA, ASSIM COMPREENDIDA COMO OS DÉBITOS VENCIDOS, VINCENDOS E ENCARGOS APRESENTADOS PELO CREDOR, CONFORME ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DA SEGUNDA SEÇÃO, SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS (REsp n. 1.418.593/MS). 3. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO, COM A UTILIZAÇÃO DA VIA JUDICIAL ELEITA PELA LEI DE REGÊNCIA COMO SENDO A MAIS IDÔNEA E EFICAZ PARA O PROPÓSITO DE COMPELIR O DEVEDOR A CUMPRIR COM A SUA OBRIGAÇÃO (AGORA, POR ELE REPUTADA ÍNFIMA), SOB PENA DE CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE NAS MÃOS DO CREDOR FIDUCIÁRIO. 4. DESVIRTUAMENTO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL, CONSIDERADA A SUA FINALIDADE E A BOA-FÉ DOS CONTRATANTES, A ENSEJAR O ENFRAQUECIMENTO DO INSTITUTO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA. VERIFICAÇÃO. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A incidência subsidiária do Código Civil, notadamente as normas gerais, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infungíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela "lei geral" não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela lei especial (ut Art. 1.368-A, introduzido pela Lei n. 10931/2004). 1.1 Além de o Decreto-Lei n. 911/1969 não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, é expresso em exigir a quitação integral do débito como condição imprescindível para que o bem alienado fiduciariamente seja remancipado. Em seus termos, para que o bem possa ser restituído ao devedor, livre de ônus, não basta que ele quite quase toda a dívida; é insuficiente que pague substancialmente o débito; é necessário, para esse efeito, que quite integralmente a dívida pendente. 2. Afigura-se, pois, de todo incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso _ desimportando sua extensão, se de pouca monta ou se de expressão considerável _, quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente. Compreensão diversa desborda, a um só tempo, do diploma legal exclusivamente aplicável à questão em análise (Decreto-Lei n. 911/1969), e, por via transversa, da própria orientação firmada pela Segunda Seção, por ocasião do julgamento do citado Resp n. 1.418.593/MS, representativo da controvérsia, segundo a qual a restituição do bem ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento, no prazo de cinco dias contados da execução da liminar de busca e apreensão, da integralidade da dívida pendente, assim compreendida como as parcelas vencidas e não pagas, as parcelas vincendas e os encargos, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 3. Impor-se ao credor a preterição da ação de busca e apreensão (prevista em lei, segundo a garantia fiduciária a ele conferida) por outra via judicial, evidentemente menos eficaz, denota absoluto descompasso com o sistema processual. Inadequado, pois, extinguir ou obstar a medida de busca e apreensão corretamente ajuizada, para que o credor, sem poder se valer de garantia fiduciária dada (a qual, diante do inadimplemento, conferia-lhe, na verdade, a condição de proprietário do bem), intente ação executiva ou de cobrança, para só então adentrar no patrimônio do devedor, por meio de constrição judicial que poderá, quem sabe (respeitada o ordem legal), recair sobre esse mesmo bem (naturalmente, se o devedor, até lá, não tiver dele se desfeito). 4. A teoria do adimplemento substancial tem por objetivo precípuo impedir que o credor resolva a relação contratual em razão de inadimplemento de ínfima parcela da obrigação. A via judicial para esse fim é a ação de resolução contratual. Diversamente, o credor fiduciário, quando promove ação de busca e apreensão, de modo algum pretende extinguir a relação contratual. Vale-se da ação de busca e apreensão com o propósito imediato de dar cumprimento aos termos do contrato, na medida em que se utiliza da garantia fiduciária ajustada para compelir o devedor fiduciante a dar cumprimento às obrigações faltantes, assumidas contratualmente (e agora, por ele, reputadas ínfimas). A consolidação da propriedade fiduciária nas mãos do credor apresenta-se como consequência da renitência do devedor fiduciante de honrar seu dever contratual, e não como objetivo imediato da ação. E, note-se que, mesmo nesse caso, a extinção do contrato dá-se pelo cumprimento da obrigação, ainda que de modo compulsório, por meio da garantia fiduciária ajustada. 4.1 É questionável, se não inadequado, supor que a boa-fé contratual estaria ao lado de devedor fiduciante que deixa de pagar uma ou até algumas parcelas por ele reputadas ínfimas _ mas certamente de expressão considerável, na ótica do credor, que já cumpriu integralmente a sua obrigação _, e, instado extra e judicialmente para honrar o seu dever contratual, deixa de fazê-lo, a despeito de ter a mais absoluta ciência dos gravosos consectários legais advindos da propriedade fiduciária. A aplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 4.2. A propriedade fiduciária, concebida pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada da teoria do adimplemento substancial. 5. Recurso Especial provido. (STJ - REsp: 1622555 MG 2015/0279732-8, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 22/02/2017, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/03/2017) Logo, não há falar em aplicação da referida teoria para afastar a concessão da medida liminar em ação de busca e apreensão. Diante a faculdade do credor utilizar a Ação de Busca e Apreensão como meio de reivindicar seu crédito, CONHEÇO E PROVEJO O PRESENTE RECURSO, para reformar o decisum guerreado, revogando o ato em favor da parte agravada, para determinar ao juízo de origem promova a busca e apreensão sobre o veículo informado na inicial, diante a comprovação da inadimplência do devedor (Decreto Lei nº 911/69). P.R.I.C. Serve esta decisão como Mandado/Intimação/Ofício, para os fins de direito. Após o trânsito em julgado promova-se a respectiva baixa nos registros de pendência referente a esta Relatora e arquivem-se, se for o caso. Em tudo certifique. À Secretaria para as devidas providências. Belém, (PA), 20 de outubro de 2017. Desa. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES Desembargadora Relatora Assinatura eletrônica
(2017.04531711-10, Não Informado, Rel. EDINEA OLIVEIRA TAVARES, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2017-10-27, Publicado em 2017-10-27)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
27/10/2017
Data da Publicação
:
27/10/2017
Órgão Julgador
:
2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO
Relator(a)
:
EDINEA OLIVEIRA TAVARES
Número do documento
:
2017.04531711-10
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
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