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Jurisprudência


TJPA 0011697-32.2015.8.14.0000

Ementa
SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA COMARCA DE TAILÂNDIA/PA AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 0011697-32.2015.814.0000 AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ RELATOR: DES. LEONARDO DE NORONHA TAVARES DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVL. CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS IRREGULARIDADES ESTRUTURAIS E SANITÁRIAS. CONDIÇÕES INSALUBRES. POSSIBILIDADE JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STF E STJ. ART. 557, CAPUT, DO CPC. NEGADO SEGUIMENTO. I - Nega-se seguimento a Agravo de Instrumento interposto manifestamente em confronto com jurisprudência dominante do STF e STJ. II- ¿o exercício da discricionariedade administrativa pelo não desenvolvimento de determinadas políticas públicas acarreta grave vulneração a direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituição -, a intervenção do Poder Judiciário se justifica como forma de implementar, concreta e eficientemente, os valores que o constituinte elegeu como 'supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social'..¿ Precedente do STJ. III- ¿A questão da legitimidade constitucional do controle e da intervenção do poder judiciário em tema de implementação de políticas públicas, quando configurada hipótese de abusividade governamental. dimensão política da jurisdição constitucional atribuída ao supremo tribunal federal. inoponibilidade do arbítrio estatal à efetivação dos direitos sociais, econômicos e culturais. caráter relativo da liberdade de conformação do legislador. considerações em torno da cláusula da "reserva do possível". necessidade de preservação, em favor dos indivíduos, da integridade e da intangibilidade do núcleo consubstanciador do 'mínimo existencial'.¿ Precedente do STF. IV - ¿Consoante o disposto no art. 66, incisos VII e VIII, da Lei n.º 7.210/84, compete ao Juiz da Execução Criminal fiscalizar mensalmente os estabelecimentos penais, bem como interditar, no todo ou em parte, aqueles que estiverem funcionando em condições inadequadas ou com infringência aos dispositivos da Lei das Execuções Penais.¿ Precedente do STJ. V - É dominante e pacífico no STF e STJ que verificada a escassez de vontade política estatal levando a deterioração do estabelecimento prisional, a ponto de tornar insuportável o cumprimento das penas e expor a risco a sociedade, outro remédio não resta senão a inadiável determinação de interdição do estabelecimento prisional. VI - Agravo de Instrumento ao qual se nega seguimento. DECISÃO MONOCRÁTICA             O EXMO. SR. DESEMBARGADOR LEONARDO DE NORONHA TAVARES (RELATOR):            Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo ESTADO DO PARÁ contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível de Tailândia que nos autos da Ação Civil Pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ que em seu dispositivo assim consignou: ¿defiro o pedido liminar de antecipação da tutela para decretar a total interdição da carceragem da Delegacia de Polícia de Tailândia (PA), determinando: (I) a imediata cessação da lotação de novos presos na sobredita unidade sob qualquer pretexto ou a qualquer título, sob pena de multa diária de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais); (II) a transferência de todos os presos atualmente custodiados na unidade de carceragem da Delegacia de Polícia Civil de Tailândia (PA) para algum dos Centros de Recuperação da Região Metropolitana de Belém ou outro onde houver disponibilidade de vagas, a critério da SUSIPE, no prazo improrrogável de 20 (vinte) dias, sob pena de multa diária ao demandado no valor de R$ 60.000,00 (Sessenta mil reais).¿            Em suas razões, às fls. 04/22 o Ente Estatal narrou que os fatos sob sua ótica.            Defendeu o cabimento do Agravo em sua modalidade por instrumento.            Afirmou que a decisão é nula, pois o juízo ¿baseou-se em supostas solicitações de transferência de presos da Comarca de Tailândia para outros centros de custódia.¿; e que ¿nos autos consta apenas um ofício do Delegado, em que diz ser inviável a permanência dos detentos na carceragem da SUSIPE, por se tratar de lugar vulnerável.¿.            Ponderou que o Juízo disse ter conhecimento in loco acerca das condições em que se encontra a carceragem da Polícia Civil e que tem ouvido reclamações sobre a qualidade e quantidade do alimento por parte dos internos. Assim enfatizou que não foi intimado para participar da inspeção judicial e não foi juntado aos autos do processo o auto circunstanciado; e, por conseguinte, a prova é absolutamente nula.            Asseverou que os requisitos autorizadores para a concessão da tutela antecipada não estavam preenchidos.            Aludiu ser impossível o cumprimento simultâneo de todas as medidas liminares que lhe são imputadas. Assim estaria caracterizado um excesso de obrigações judicialmente atribuídas ao Estado do Pará.            Discorreu acerca do déficit da situação carcerária do Pará; e que estaria ausente justa para interferência judicial.            Teceu comentário acerca da impossibilidade de interferência do Poder Judiciário no mérito administrativo, em decorrência do princípio da separação dos poderes.            Sustentou que a reforma total da ala carcerária ou a construção de nova carceragem no Município, em curto espaço de tempo, não é possível pelos entraves burocráticos insuperáveis, nos quais se incluem providências orçamentárias.            Ponderou pela redução da multa.            Afirmou não estarem presentes os fumus boni iuri e do periculum in mora e que na verdade estaria caracterizado o periculum in mora inverso.            Pugnou pela concessão do efeito suspensivo; e ao final pelo provimento do recurso.            É o relatório.            DECIDO.            Em análise do presente recurso, verifica-se em confronto com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.            Em caso análogo o Tribunal da Cidadania assim decidiu, conforme noticiado no Informativo de Jurisprudência nº 0543: ¿DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS RELACIONADO A INÚMERAS IRREGULARIDADES ESTRUTURAIS E SANITÁRIAS EM CADEIA PÚBLICA. Constatando-se inúmeras irregularidades em cadeia pública - superlotação, celas sem condições mínimas de salubridade para a permanência de presos, notadamente em razão de defeitos estruturais, de ausência de ventilação, de iluminação e de instalações sanitárias adequadas, desrespeito à integridade física e moral dos detentos, havendo, inclusive, relato de que as visitas íntimas seriam realizadas dentro das próprias celas e em grupos, e que existiriam detentas acomodadas improvisadamente -, a alegação de ausência de previsão orçamentária não impede que seja julgada procedente ação civil publica que, entre outras medidas, objetive obrigar o Estado a adotar providências administrativas e respectiva previsão orçamentária para reformar a referida cadeia pública ou construir nova unidade, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. De fato, evidencia-se, na hipótese em análise, clara situação de violação à garantia constitucional de respeito da integridade física e moral do preso (art. 5º, XLIX, da CF) e aos princípios da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial. Nessas circunstâncias - em que o exercício da discricionariedade administrativa pelo não desenvolvimento de determinadas políticas públicas acarreta grave vulneração a direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituição -, a intervenção do Poder Judiciário se justifica como forma de implementar, concreta e eficientemente, os valores que o constituinte elegeu como "supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social", como apregoa o preâmbulo da CF. Há, inclusive, precedentes do STF (RE-AgR 795.749, Segunda Turma, DJe 20/5/2014; e ARE-AgR 639.337, Segunda Turma, DJe 15/9/2011) e do STJ (AgRg no REsp 1.107.511-RS, Segunda Turma, DJe 6/12/2013) endossando a possibilidade de excepcional controle judicial de políticas públicas. Além disso, não há, na intervenção em análise, ofensa ao princípio da separação dos poderes. Isso porque a concretização dos direitos sociais não pode ficar condicionada à boa vontade do Administrador, sendo de suma importância que o Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente importantes. Tratando-se de direito essencial, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. Ademais, também não há como falar em ofensa aos arts. 4º, 6º e 60 da Lei 4.320/1964 (que preveem a necessidade de previsão orçamentária para a realização das obras em apreço), na medida em que a ação civil pública analisada objetiva obrigar o Estado a realizar previsão orçamentária das obras solicitadas, não desconsiderando, portanto, a necessidade de previsão orçamentária das obras. Além do mais, tem-se visto, recorrentemente, a invocação da teoria da reserva do possível, importada do Direito alemão, como escudo para o Estado se escusar do cumprimento de suas obrigações prioritárias. Não se pode deixar de reconhecer que as limitações orçamentárias são um entrave para a efetivação dos direitos sociais. No entanto, é preciso ter em mente que o princípio da reserva do possível não pode ser utilizado de forma indiscriminada. Na verdade, o direito alemão construiu essa teoria no sentido de que o indivíduo só pode requerer do Estado uma prestação que se dê nos limites do razoável, ou seja, na qual o peticionante atenda aos requisitos objetivos para sua fruição. Informa a doutrina especializada que, de acordo com a jurisprudência da Corte Constitucional alemã, os direitos sociais prestacionais estão sujeitos à reserva do possível no sentido daquilo que o indivíduo, de maneira racional, pode esperar da sociedade. Ocorre que não se podem importar preceitos do direito comparado sem atentar para Estado brasileiro. Na Alemanha, os cidadãos já dispõem de um mínimo de prestações materiais capazes de assegurar existência digna. Por esse motivo, o indivíduo não pode exigir do Estado prestações supérfluas, pois isso escaparia do limite do razoável, não sendo exigível que a sociedade arque com esse ônus. Eis a correta compreensão do princípio da reserva do possível, tal como foi formulado pela jurisprudência germânica. Todavia, situação completamente diversa é a que se observa nos países periféricos, como é o caso do Brasil, país no qual ainda não foram asseguradas, para a maioria dos cidadãos, condições mínimas para uma vida digna. Nesse caso, qualquer pleito que vise a fomentar uma existência minimamente decente não pode ser encarado como sem razão, pois garantir a dignidade humana é um dos objetivos principais do Estado brasileiro. É por isso que o princípio da reserva do possível não pode ser oposto a um outro princípio, conhecido como princípio do mínimo existencial. Desse modo, somente depois de atingido esse mínimo existencial é que se poderá discutir, relativamente aos recursos remanescentes, em quais outros projetos se deve investir. Ou seja, não se nega que haja ausência de recursos suficientes para atender a todas as atribuições que a Constituição e a Lei impuseram ao estado. Todavia, se não se pode cumprir tudo, deve-se, ao menos, garantir aos cidadãos um mínimo de direitos que são essenciais a uma vida digna, entre os quais, sem a menor dúvida, podemos incluir um padrão mínimo de dignidade às pessoas encarceradas em estabelecimentos prisionais. Por esse motivo, não havendo comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário determine a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político. REsp 1.389.952-MT, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 3/6/2014.            É imperioso destacar que no presente caso a determinação judicial não foi de reforma e construção de cadeia, logo não vislumbro óbice orçamentário. E diferentemente do que afirmou a Procuradora do Estado, o juízo não fundamentou sua decisão em apenas um ofício do Delegado, vejamos as razões de decidir do magistrado a quo: ¿Com efeito, o laudo pericial de exame de constatação técnica em imóvel, acostado às folhas 37-39 dos autos, atesta taxativamente que o imóvel onde funciona as instalações físicas da carceragem da Delegacia de Polícia de Tailândia (PA) ¿não apresenta condições de manter presos custodiados no local, visto a falta de condições de segurança, insalubridade da área¿. Note-se, em primeiro passo, que no aspecto da segurança, a unidade de encarceramento da polícia civil n¿o apresenta resistência física para qualquer investida violenta de algum agressor externo, fator que certamente propicia a possibilidade de resgate de presos sem maiores obstáculos, mas tampouco oferece efetiva segurança de guarda interna a julgar pela facilidade com que, não raro, tem ocorrido fuga de presos. Se, por um lado, a Superintendência do Sistema Penal SUSIPE não considera que a unidade em questão esteja incluída no rol dos estabelecimentos colocados sob a sua tutela, e por isso vem se eximindo de qualquer responsabilidade na gestão do local, por outro, a Delegacia de Polícia tampouco assume esse papel, limitando-se a fazer uso da carceragem para dar vazão à sua demanda de vagas sem se comprometer seriamente com a estrutura e o funcionamento da cadeia, do que resulta total omissão do Estado em se desincumbir de sua atribuição e responsabilidade legal. Certo é que atualmente a guarda dos presos é realizada através de alguns poucos agentes cedidos pela SUSIPE à Delegacia Civil, sem o aparato e a formação necessárias e recomendáveis para lidar com a peculiaridade de fazer a guarda de pessoas presas e mesmo sem qualquer suporte de retaguarda em termos de policiamento e vigilância adequada. As condições físicas das celas, como bem descreve o laudo pericial, apresentam ambiente totalmente insalubre, sem aeração e sem condições térmicas adequadas para o convívio humano minimamente saudável, no que resultam por solapar direitos básicos fundamentais dos internos num inegável atentado à dignidade humana. Decerto, o ambiente inóspito da carceragem de Tailândia longe está de atender minimamente ao preceito do art. 3º da Lei de Execução Penal, segundo o qual ¿ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei¿, mormente porque, se tais direitos são reconhecidos aos indivíduos reconhecidamente culpados por sentença penal condenatória transitada em julgada, com maior ordem de razão devem sê-lo também ao preso provisório, visto que - embora igual ao condenado em dignidade humana - ainda portador do reconhecido direito constitucional de presunção de inocência. As repisadas condições ambientais, posto que insalubres, tem fomentado a disseminação de inúmeros acometimentos na saúde dos presos, com a proliferação de doenças de pele, respiratórias, cardíacas, infecto-contagiosas e outros eventos agravados pela qualidade da água e da comida que lhes são fornecidas. Este juiz houve por determinar a realização de coleta de amostras da água para análise laboratorial pendente de resultado, bem como solicitou à SUSIPE informações detalhadas sobre o contrato de fornecimento de alimentação por uma empresa terceirizada, sem que até o momento tenha havido qualquer resposta ao expediente deste juízo, mas tem ouvido inúmeras reclamações dos internos, na ocasião das inspeções carcerárias, sobre a qualidade e cozimento do alimento que são obrigados a consumir. As celas de custódia, sobre não apresentarem iluminação e aeração adequadas e ostentarem excesso de umidade e odores repulsivos, também não possuem a área mínima legal como exige o art. 8º da Lei n. 7.210/84, situação agravada pela sobrelotação de internos à vista do expressivo movimento de ocorrências na comarca. Diante da conjuntura delineada, faz-se mesmo imperativa a concessão da liminar antecipatória da tutela pleiteada pelo Ministério Público para interdição total da carceragem da Delegacia de Polícia de Tailândia (PA), por isso que satisfeitos os requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil à vista da prova inequívoca de que o estabelecimento não possui as condições mínimas de funcionamento (vide laudo pericial de fls. 37-39 dos autos), e da verossimilhança da alegação segundo a qual a manutenção do funcionamento da unidade é uma contínua violação de direitos humanos que, por certo, resultaria em dano irreparável ou de difícil reparação à vida, saúde e integridade dos presos.¿            O Superior Tribunal de Justiça acerca da possibilidade de interdição de carceragens: ¿RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. INTERDIÇÃO DE CADEIA PÚBLICA PELO JUÍZO DAS EXECUÇÕES. POSSIBILIDADE PREVISTA EM LEI. ART. 66, INCISOS VII E VIII, DA LEI DE EXECUÇÕES PENAIS. IMPETRAÇÃO DA AUTORIDADE POLICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE EFETUAR NOVAS PRISÕES. INEXISTÊNCIA. DEVER FUNCIONAL QUE NÃO SE CONFUNDE COM DIREITO LÍQUIDO E CERTO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A concessão de mandado de segurança contra ato judicial somente é admitida em hipóteses excepcionais, como decisões de natureza teratológica, de manifesta ilegalidade ou abuso de poder, capazes de produzir danos irreparáveis ou de difícil reparação. 2. Consoante o disposto no art. 66, incisos VII e VIII, da Lei n.º 7.210/84, compete ao Juiz da Execução Criminal fiscalizar mensalmente os estabelecimentos penais, bem como interditar, no todo ou em parte, aqueles que estiverem funcionando em condições inadequadas ou com infringência aos dispositivos da Lei das Execuções Penais. 3. Não há ilegalidade na decisão impugnada, que proibiu a admissão de novos presos em Cadeia Pública superlotada, tampouco violação à direito líquido e certo da Recorrente, que não se confunde com seu dever funcional de Delegada de Polícia, uma vez que não foi proibida pela Autoridade Judicial de prender em flagrante e dar cumprimento a mandados de prisão. 4. Recurso desprovido.¿ (RMS 44.537/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 24/06/2014) ¿AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. INTERDIÇÃO PARCIAL DA DELEGACIA DE NIOAQUE COM FUNDAMENTO NO ART. 66, VIII, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL E NO ART. 123 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADO. 1. Trata-se, na origem, de Mandado de segurança impetrado pelo Estado de Mato Grosso do Sul contra decisão judicial que determinou a interdição parcial da Cadeia Pública de Nioaque/MS e a vedação à internação de adolescentes no local. 2. Conforme a decisão do Tribunal a quo, diante das precárias condições de segurança da Cadeia Pública de Nioaque e das infringências às exigências da Lei de Execuções Penais, foi decretada a interdição parcial daquela unidade prisional, com amparo no disposto no art. 66, VIII, da LEP, segundo o qual "Compete ao Juiz da execução: & VIII - interditar, no todo ou em parte, estabelecimento penal que estiver funcionando em condições inadequadas ou com infringência aos dispositivos desta Lei", não havendo falar em interferência do Poder Judiciário sobre o Poder Executivo. Ato que se encontra em consonância com o disposto tanto na Lei de Execuções Penais quanto no Estatuto da Criança e do Adolescente, que dispõe, no art. 123, que "A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração." 3. O agravante não trouxe qualquer argumento capaz de infirmar os fundamentos da decisão recorrida e demonstrar ofensa ao direito líquido e certo. 4. Agravo Regimental não provido.¿ (AgRg no RMS 41.445/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 24/06/2014)            Descabe, outrossim, qualquer arguição por ventura de defesa da observância do princípio da reserva do possível a justificar a omissão na tomada de providências para a solução do imbróglio.            É que a argüição do princípio, segundo, inclusive, a jurisprudência do e. STF, não é hábil a exonerar o Estado de garantir os direitos fundamentais da pessoa humana previstos na Carta Maior, notadamente, no caso, o da vida, e o da dignidade humana.            É o que se extraí do julgamento da ADPF nº 45, da lavra do eminente Ministro Celso Mello: ¿ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA "RESERVA DO POSSÍVEL". NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO "MÍNIMO EXISTENCIAL". VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO). (...) Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.¿ (...)             Com efeito: ¿APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DECONTRADITÓRIO. REJEIÇÃO. REFORMA PENITENCIÁRIA, DE CADEIA PÚBLICA, CONSTRUÇÃO DE CADEIAS NAS COMARCAS, CONCURSO PARA SERVIDORES, AQUISIÇÃO DEVEÍCULOS. SEPARAÇÃO DOS PODERES. RESERVA DO POSSÍVEL. Dignidade da pessoa humana - Diminuição da multa e ampliação do prazo para consecução do determinado na sentença. Provimento parcial.¿ (TJRR; AC 0010.06.138962-2; Rel. Des. Robério Nunes; Julg. 24/05/2011; DJERR 27/05/2011) ¿AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. MEDIDA QUE ESGOTA, EM PARTE, O OBJETO DA AÇÃO. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. REFORMA E AMPLIAÇÃO DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL. DEMORA INJUSTIFICADA NA REALIZAÇÃO DE OBRAS NECESSÁRIAS. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA DE INGERÊNCIA INDEVIDA. MULTA POR DESCUMPRIMENTO EXCESSIVA. REDUÇÃO. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. O princípio da dignidade humana autoriza a antecipação de tutela para determinar que o Estado tome providências, há muito reclamadas, para Resolução de situação precária, insalubre e de insegurança existente em estabelecimento prisional, ainda que esgote, em parte, o objeto da ação. "Não obstante haja certa reserva quanto à possibilidade de conceder tutela antecipada em ações movidas contra a Fazenda Pública, o certo é que não se mostra razoável deixar de se adotar tal medida, que é necessária para evitar riscos à vida dos detentos e funcionários da cadeia pública, bem como garantir a segurança da população em geral." (Dra. Giovana Pasqual, Juíza de Direito). É cabível a cominação de multa, em valor razoável, para o caso de descumprimento da ordem judicial.¿ (TJMT; RAI 96343/2006; Juína; Sexta Câmara Cível; Rel. Des. Juracy Persiani; Julg. 06/06/2007). ¿APELAÇÃO CÍVEL. CADEIA PÚBLICA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE GUAPIARA. PRECARIEDADE DAS INSTALAÇÕES E SUPERLOTAÇÃO. PROPENSÃO A FUGAS E REBELIÃO. Atentado à incolumidade física e moral dos presos, bem como à tranquilidade da coletividade que está instalada aos arredores do estabelecimento. Dever do Estado de promover a segurança pública. Poder Judiciário que deve determinar o cumprimento do mandamento constitucional. Precedente do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Pedido inicial julgado improcedente em primeiro grau. Reforma da r. Sentença atacada Provimento.¿ (TJSP; APL-Rev 389.067.5/1; Ac. 2592452; Capão Bonito; Décima Segunda Câmara de Direito Público; Rel. Des. Prado Pereira; Julg. 23/04/2008; DJESP 10/06/2008)             Nesse diapasão, é cediço que a doutrina e a jurisprudência vêm se inclinando no sentido de que cabe ao Judiciário interferir nas prioridades do Executivo com relação à realização de obras e destinação do dinheiro público, quando haja infração aos direitos e garantias constitucionais do cidadão. Nesta hipótese não se pode falar em ofensa ao princípio da separação de poderes (CF, art. 2º), mas efetividade dos direitos fundamentais.            Com relação ao valor da multa, entendo que seu valor é plenamente razoável, coadunando com o valor inestimável envolvido no imbróglio, qual seja e incolumidade e dignidade da pessoa humana dos apenados.             Acrescento que é princípio constitucional o respeito à integridade física e moral do preso (artigo 5°, inciso XLIX, da Constituição Federal), sendo certo que não se privará o condenado de qualquer outro direito que não aquele atingido pela sentença ou pela legislação em vigor, o que é dever das autoridades públicas garantir (artigos 3° e 40, da Lei de Execuções Penais).             Assim, quando a escassez de vontade política estatal leva à deterioração do estabelecimento prisional, a ponto de tornar insuportável o cumprimento das penas e expor a risco a sociedade, outro remédio não resta senão a inadiável determinação de interdição do estabelecimento prisional.            Assim depreende-se que inconsistentes as razões do agravo, tese amplamente discutida e afastada pelo dominante entendimento jurisprudencial.            O ¿caput¿ do art. 557, do Código de Processo Civil preceitua: ¿Art. 557 - O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.¿ (destaque nosso).            Ante o exposto, com fundamento no art. 557, do CPC, nego seguimento ao presente recurso, por estar manifestamente em confronto com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Belém (PA), 29 de junho de 2015. LEONARDO DE NORONHA TAVARES RELATOR (2015.02350566-20, Não Informado, Rel. LEONARDO DE NORONHA TAVARES, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-07-06, Publicado em 2015-07-06)

Data do Julgamento : 06/07/2015
Data da Publicação : 06/07/2015
Órgão Julgador : 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : LEONARDO DE NORONHA TAVARES
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