TJPA 0012543-49.2011.8.14.0401
Vistos etc... Trata-se de Conflito Negativo de Competência em que figura como suscitante a Juíza de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes da Capital, e como suscitada, a Juíza de Direito da 1ª Vara de Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital. Inicialmente, foram os autos do Inquérito Policial instaurado para investigar a suposta ocorrência do crime de ameaça, praticado pelo inquirido LUCIVALDO DOS SANTOS NEVES, tendo como vítimas, a sua esposa e sua filha adolescente, distribuídos ao Juízo da 3ª Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca da Capital, o qual, em decisão interlocutória de fls. 12/15, do apenso, deu-se por incompetente para apreciar o feito em relação à vítima Ailana Beatriz das Neves, pois ela é menor de idade, e que, por isso, com relação à mesma, os referidos autos deveriam ser encaminhados à Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes de Belém. Redistribuído os autos à Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes da Comarca da Capital, foi apresentada a denúncia pelo Ministério Público, imputando a conduta descrita no art. 147, caput, do CP, contra o denunciado LUCIVALDO DOS SANTOS NEVES, figurando como vítima, a filha do mesmo, AILANA BEATRIZ DAS NEVES ARAÚJO, de 16 anos de idade à época do fato, ocorrido em 24 de julho de 2011. A exordial acusatória foi recebida pela magistrada da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes de Belém, em despacho de fls. 04 dos autos principais, datada de 25 de outubro de 2011, porém em decisão interlocutória datada de 11 de março de 2014, acostada às fls.13/15, a referida magistrada declinou da sua competência para processar e julgar o feito, por entender não se tratar de crime previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, nem, tampouco, dos crimes previstos nos arts. 217-A, 218, 218-A e 218-B, todos do CP, que dispõem de forma expressa, sobre crimes praticados contra menores de 18 anos, cujo dolo é direcionado especificamente à essas vítimas, pois o caso narrado na peça inaugural se refere a uma ameaça que foi praticada no âmbito de relação doméstica e familiar do denunciado, contra sua filha adolescente, o que atrai a competência da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, ainda que a vítima seja menor de idade, razão pela qual suscitou o presente conflito negativo de competência, determinando a remessa dos autos a este Egrégio Tribunal. É o relatório. Decido. O fulcro da questão que envolve o presente Conflito de Competência diz respeito à definição do órgão jurisdicional competente para processar e julgar a conduta ilícita em tese imputada a Lucivaldo dos Santos Neves, que teria supostamente ameaçado de agressão a sua filha Ailana Beatriz das Neves Araújo, pois a Juíza de Direito da 3ª Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital entendeu que o fato descrito no Inquérito Policial, onde consta a capitulação provisória descrita no art. 147, do CP, não configura violência doméstica e familiar contra a mulher, por se tratar a vítima de pessoa menor de idade, restando, portanto, afastada a competência do referido Juizado Especial, enquanto que a Juíza de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes entendeu que a conduta atualmente narrada na denúncia apresentada, configura violência doméstica e familiar contra a mulher, pois o crime de ameaça foi em tese praticado no âmbito familiar, ainda que a vítima tenha sido uma adolescente. Antes de mais nada, faz-se necessária a exposição de alguns fatos para melhor subsidiar a solução deste conflito, senão vejamos: Consta na denúncia, que no dia 24 de julho de 2011, por volta das 13:00 horas, o acusado Lucivaldo dos Santos Neves chegou em casa apresentando sinais de embriaguês, e além de ter agredido física e moralmente sua esposa, ainda ameaçou de agressão sua filha adolescente Ailana Beatriz das Neves, a qual interviu, a fim de proteger sua mãe. A exordial acusatória oferecida contra Lucivaldo dos Santos Neves foi distribuída ao Juízo de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes de Belém, que se declarou incompetente para apreciar o feito, determinando a sua redistribuição para uma das Varas do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital, por entender que o delito não foi praticado com base na idade da vítima, mas sim em razão da condição de gênero da mesma. Como cediço, a Lei 11.340/2006 foi criada com a finalidade de coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, bem como estabelecer medidas de assistência e proteção às mulheres em situação doméstica e familiar, conforme previsto em seu art. 5º, verbis: Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo Único - As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. Observa-se, assim, que o legislador levou em conta a mulher numa perspectiva de gênero e em condições de hipossuficiência ou inferioridade física e econômica em relações domésticas, familiares ou de afetividade, não estabelecendo, portanto, nenhuma distinção quanto à idade, razão pela qual é evidente a conclusão da sua incidência no presente caso, ou melhor, do amplo alcance de eficácia das suas disposições às mulheres em suas relações domésticas e familiares, independentemente de serem crianças, adolescentes ou idosas. Assim, na hipótese dos autos, a conduta de Lucivaldo dos Santos Neves se enquadra na relação de gênero no âmbito familiar, pois se vê que ele se valeu da condição de mulher e filha, da vítima, tendo o delito sido, em tese, cometido nessa circunstância e pelo simples fato da mesma ter tentado impedir que acusado continuasse agredindo sua genitora, restando claro, portanto, que a competência para processar e julgar o feito em referência é do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Belém. Impõe ainda ressaltar, que tal entendimento, inclusive, encontra-se sumulado por este Egrégio Tribunal de Justiça, verbis: Súmula Nº 05: CRIMES CONTRA A MULHER LEI MARIA DA PENHA COMPETÊNCIA DAS VARAS ESPECIALIZADAS. SÃO DE COMPETÊNCIA DAS VARAS ESPECIALIZADAS TODAS AS AÇÕES QUE VERSEM SOBRE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER PRATICADAS NA VIGÊNCIA DA LEI N º 11.340/2006. Logo, não há dúvidas que a competência para julgar o feito é do Juízo de Direito da 3ª Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Belém, ora Suscitado, e, como visto, a questão versada nestes autos já foi inclusive dirimida pelo Pleno deste Sodalício, razão pela qual determino o retorno dos autos ao referido juizado, para que o magistrado a ele vinculado proceda como de direito. À Secretária para os procedimentos legais pertinentes. Belém, 05 de maio de 2014. Desa. VANIA FORTES BITAR Relatora
(2014.04529832-71, Não Informado, Rel. VANIA VALENTE DO COUTO FORTES BITAR CUNHA, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 2014-05-06, Publicado em 2014-05-06)
Ementa
Vistos etc... Trata-se de Conflito Negativo de Competência em que figura como suscitante a Juíza de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes da Capital, e como suscitada, a Juíza de Direito da 1ª Vara de Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital. Inicialmente, foram os autos do Inquérito Policial instaurado para investigar a suposta ocorrência do crime de ameaça, praticado pelo inquirido LUCIVALDO DOS SANTOS NEVES, tendo como vítimas, a sua esposa e sua filha adolescente, distribuídos ao Juízo da 3ª Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca da Capital, o qual, em decisão interlocutória de fls. 12/15, do apenso, deu-se por incompetente para apreciar o feito em relação à vítima Ailana Beatriz das Neves, pois ela é menor de idade, e que, por isso, com relação à mesma, os referidos autos deveriam ser encaminhados à Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes de Belém. Redistribuído os autos à Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes da Comarca da Capital, foi apresentada a denúncia pelo Ministério Público, imputando a conduta descrita no art. 147, caput, do CP, contra o denunciado LUCIVALDO DOS SANTOS NEVES, figurando como vítima, a filha do mesmo, AILANA BEATRIZ DAS NEVES ARAÚJO, de 16 anos de idade à época do fato, ocorrido em 24 de julho de 2011. A exordial acusatória foi recebida pela magistrada da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes de Belém, em despacho de fls. 04 dos autos principais, datada de 25 de outubro de 2011, porém em decisão interlocutória datada de 11 de março de 2014, acostada às fls.13/15, a referida magistrada declinou da sua competência para processar e julgar o feito, por entender não se tratar de crime previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, nem, tampouco, dos crimes previstos nos arts. 217-A, 218, 218-A e 218-B, todos do CP, que dispõem de forma expressa, sobre crimes praticados contra menores de 18 anos, cujo dolo é direcionado especificamente à essas vítimas, pois o caso narrado na peça inaugural se refere a uma ameaça que foi praticada no âmbito de relação doméstica e familiar do denunciado, contra sua filha adolescente, o que atrai a competência da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, ainda que a vítima seja menor de idade, razão pela qual suscitou o presente conflito negativo de competência, determinando a remessa dos autos a este Egrégio Tribunal. É o relatório. Decido. O fulcro da questão que envolve o presente Conflito de Competência diz respeito à definição do órgão jurisdicional competente para processar e julgar a conduta ilícita em tese imputada a Lucivaldo dos Santos Neves, que teria supostamente ameaçado de agressão a sua filha Ailana Beatriz das Neves Araújo, pois a Juíza de Direito da 3ª Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital entendeu que o fato descrito no Inquérito Policial, onde consta a capitulação provisória descrita no art. 147, do CP, não configura violência doméstica e familiar contra a mulher, por se tratar a vítima de pessoa menor de idade, restando, portanto, afastada a competência do referido Juizado Especial, enquanto que a Juíza de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes entendeu que a conduta atualmente narrada na denúncia apresentada, configura violência doméstica e familiar contra a mulher, pois o crime de ameaça foi em tese praticado no âmbito familiar, ainda que a vítima tenha sido uma adolescente. Antes de mais nada, faz-se necessária a exposição de alguns fatos para melhor subsidiar a solução deste conflito, senão vejamos: Consta na denúncia, que no dia 24 de julho de 2011, por volta das 13:00 horas, o acusado Lucivaldo dos Santos Neves chegou em casa apresentando sinais de embriaguês, e além de ter agredido física e moralmente sua esposa, ainda ameaçou de agressão sua filha adolescente Ailana Beatriz das Neves, a qual interviu, a fim de proteger sua mãe. A exordial acusatória oferecida contra Lucivaldo dos Santos Neves foi distribuída ao Juízo de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes de Belém, que se declarou incompetente para apreciar o feito, determinando a sua redistribuição para uma das Varas do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital, por entender que o delito não foi praticado com base na idade da vítima, mas sim em razão da condição de gênero da mesma. Como cediço, a Lei 11.340/2006 foi criada com a finalidade de coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, bem como estabelecer medidas de assistência e proteção às mulheres em situação doméstica e familiar, conforme previsto em seu art. 5º, verbis: Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo Único - As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. Observa-se, assim, que o legislador levou em conta a mulher numa perspectiva de gênero e em condições de hipossuficiência ou inferioridade física e econômica em relações domésticas, familiares ou de afetividade, não estabelecendo, portanto, nenhuma distinção quanto à idade, razão pela qual é evidente a conclusão da sua incidência no presente caso, ou melhor, do amplo alcance de eficácia das suas disposições às mulheres em suas relações domésticas e familiares, independentemente de serem crianças, adolescentes ou idosas. Assim, na hipótese dos autos, a conduta de Lucivaldo dos Santos Neves se enquadra na relação de gênero no âmbito familiar, pois se vê que ele se valeu da condição de mulher e filha, da vítima, tendo o delito sido, em tese, cometido nessa circunstância e pelo simples fato da mesma ter tentado impedir que acusado continuasse agredindo sua genitora, restando claro, portanto, que a competência para processar e julgar o feito em referência é do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Belém. Impõe ainda ressaltar, que tal entendimento, inclusive, encontra-se sumulado por este Egrégio Tribunal de Justiça, verbis: Súmula Nº 05: CRIMES CONTRA A MULHER LEI MARIA DA PENHA COMPETÊNCIA DAS VARAS ESPECIALIZADAS. SÃO DE COMPETÊNCIA DAS VARAS ESPECIALIZADAS TODAS AS AÇÕES QUE VERSEM SOBRE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER PRATICADAS NA VIGÊNCIA DA LEI N º 11.340/2006. Logo, não há dúvidas que a competência para julgar o feito é do Juízo de Direito da 3ª Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Belém, ora Suscitado, e, como visto, a questão versada nestes autos já foi inclusive dirimida pelo Pleno deste Sodalício, razão pela qual determino o retorno dos autos ao referido juizado, para que o magistrado a ele vinculado proceda como de direito. À Secretária para os procedimentos legais pertinentes. Belém, 05 de maio de 2014. Desa. VANIA FORTES BITAR Relatora
(2014.04529832-71, Não Informado, Rel. VANIA VALENTE DO COUTO FORTES BITAR CUNHA, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 2014-05-06, Publicado em 2014-05-06)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
06/05/2014
Data da Publicação
:
06/05/2014
Órgão Julgador
:
TRIBUNAL PLENO
Relator(a)
:
VANIA VALENTE DO COUTO FORTES BITAR CUNHA
Número do documento
:
2014.04529832-71
Tipo de processo
:
Conflito de Jurisdição
Mostrar discussão