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Jurisprudência


TJPA 0012575-04.2004.8.14.0301

Ementa
SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA COMARCA DE BELÉM/PA REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL Nº. 2013.3.005048-0 SENTENCIANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA DE FAZENDA DA CAPITAL SENTENCIADO/APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ SENTENCIADO/APELADOS: RAIMUNDO NONATO BARBOSA LIMA E OUTROS SENTENCIADO: INSTITUTO DE GESTÃO PREVIDENCIÁRIA DO ESTADO DO PARÁ - IGEPREV RELATOR: DES. LEONARDO DE NORONHA TAVARES REEXAME NECESSÁRIO - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS - CONTRIBUIÇÕES À FORMAÇÃO DO PECÚLIO - ILEGITIMIDADE DO IGEPREV - MATÉRIA CONHECIDA DE OFÍCIO- DECISÃO MONOCRÁTICA. I - Ilegitimidade do IGEPREV conhecida de ofício por ser matéria de ordem pública. II - Decisão monocrática conhecendo de ofício da ilegitimidade do IGEPREV, reformando, assim, em Reexame Necessário, a sentença proferida; restando, ademais, prejudicada a Apelação interposta pelo Ministério Público Estadual. DECISÃO MONOCRÁTICA              O EXMO. SR. DESEMBARGADOR LEONARDO DE NORONHA TAVARES (RELATOR):            Trata-se de Reexame de Sentença e de Recurso de Apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ contra sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 3ª Vara de Fazenda Pública da Comarca da Capital, nos autos da Ação Ordinária, ajuizada por RAIMUNDO NONATO BARBOSA LIMA, HÉRCULES JOSÉ DA SILVA, AILTON CARVALHO GUIMARÃES, FLAVIANO GOMES MELO, FRANCISCO RIBEIRO MACHADO, NEWTON FERNANDO SILVA BRASIL, e ROBERTO PESSOA CAMPOS, com o intuito de obter a devolução dos valores pagos a título de pecúlio, em desfavor do Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Pará.             Na origem, informaram os requerentes que a Lei Estadual nº 4.721/1977 estabeleceu benefícios, dentre eles o pecúlio, cuja contribuição era utilizada para formação de fundo de poupança, sendo descontado 1% (um por cento) do salário base dos servidores públicos civis e militares.             Ademais, que a Lei Estadual nº 5.011/1981, ao instituir o novo Regime de Previdência do Estado, excluiu o pecúlio do elenco de benefícios, de modo que as contribuições deixaram de ser revertidas tão logo determinada a sua extinção.            Alegaram que não receberam, a título de indenização compensatória, o saldo das contribuições realizadas, afirmando ser flagrante enriquecimento ilícito por parte do Estado, instituidor do aludido benefício.             Argumentaram que deveria ser feita a devolução corrigida monetariamente e acrescida de juros de poupança, por ser um direito, ainda que administrativamente o Instituto tenha se pronunciado que não teria nenhuma obrigação em ressarcir os valores pagos ao longo dos anos.             Citação, de ofício, do Estado do Pará para figurar como réu, diante da Resolução 002/CGE, e do IGEPREV, para compor a lide como substituto processual do IPASEP.             O IGEPREV e o ESTADO DO PARÁ apresentaram contestação às fls. 70/79 e fls. 98/115, respectivamente.             Sobreveio sentença, às fls. 164/169, que em julgamento antecipado da lide, excluiu o Estado do Pará da lide, por entender que não havia previsão legal de litisconsórcio passivo obrigatório nas ações em que seja parte autarquia estadual, mantendo apenas o réu IGEPREV no polo passivo da demanda. Rejeitou a preliminar arguida pelo IGEPREV de que lhe faltaria atribuição legalmente prevista. Ao final, julgou procedente o pedido da inicial, condenando o réu IGEPREV a devolver aos autores os valores pagos a título de pecúlio com os acréscimos legais e ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor da condenação, a ser apurado em liquidação de sentença.             Embargos de Declaração opostos pelo IGEPREV, em que o juízo de origem, à fl. 180, conheceu e deu provimento para constar que, onde se lê Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado do Pará - IGEPREV, leia-se Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Pará - IGEPREV.             Irresignado, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ interpôs recurso de apelação, por dever de ofício, às fls. 182/192.             Em suas razões, asseverou que o juízo de primeiro grau contrariou entendimento recentemente pacificado deste Egrégio Tribunal, julgando procedente o pedido de devolução de contribuições para formação de pecúlio, a qual só pode ocorrer nos casos de morte ou invalidez.             Ao final, requereu o provimento do recurso, com a reforma da sentença.            O IGEPREV apresentou contrarrazões, às fls. 195/202.          Subiram os autos a esta Egrégia Corte.          Após regular distribuição, coube-me a relatoria (fl. 229).          Instado a se manifestar, o Ministério Público de 2° Grau manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso de apelação voluntária, opinando pela reforma da sentença prolatada, em reexame necessário.            É o relatório.          DECIDO.    Ab initio, vislumbro a ilegitimidade do IGEPREV e a decreto de ofício por se tratar de matéria de ordem pública, tendo em vista que o citado Instituto foi criado muito após a extinção do Pecúlio, motivo pelo qual o Estado do Pará responde por todas as demandas que se referem ao benefício. Assim, restar-se-ão prejudicadas as demais alegações presentes no Recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público Estadual.    Nesse sentido, colaciono jurisprudência desta Corte de Justiça, senão vejamos: ¿APELAÇÂO/REEXAME NECESSÁRIO. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO DOS AUTORES, CONDENANDO O ESTADO DO PARÁ A DEVOLVER AOS AUTORES OS VALORES PAGOS A TÍTULO DE PECÚLIO COM OS ACRÉSCIMOS LEGAIS, A SEREM APURADOS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. PRELIMINAR DE REINCLUSÂO NA LIDE DO ESTADO DO PARÁ E A EXCLUSÃO DO IGEPREV ACATADA. (...).¿ (TJPA. Apelação/Reexame Necessário nº 20133009150-9. Relatora Desa. GLEIDE PEREIRA DE MOURA. Acórdão nº 124050, Publicado no DJe 09/09/2013).                  Todavia, a fim de que não pairem dúvidas a respeito da questão, devo consignar que a matéria não comporta maiores discussões; importando mencionar que a lide manteve-se em torno do direito dos apelados, em reaver as contribuições vertidas ao pecúlio compulsório, por força da Lei nº. 5011/81, porquanto não foi previsto na Lei Complementar Estadual nº. 039/2002, sendo extinto do rol dos benefícios previdenciários, sem que tenha ocorrido o ressarcimento do mesmo.    Na hipótese, vale lembrar que, em se tratando de benefícios previdenciários, a lei a ser observada é a vigente ao tempo que determinou a incidência do fato gerador, tendo em vista o princípio tempus regit actum. Daí entender, permissa maxima venia, que o pedido de restituição do pecúlio previdenciário não encontra amparo legal.    O pecúlio em comento foi instituído compulsoriamente no âmbito estadual desde a edição da Lei n.º 755, de 31/12/1953, sendo continuamente previsto nas legislações precedentes, a saber:    Decreto-Lei Estadual 13/1969; Decreto-Lei Estadual 183/1970; Lei 4.721/1977; permanecendo até a vigência da Lei Estadual 5.011/1981 (art. 24, II, b), que previa o pagamento do benefício somente nos casos de morte ou invalidez do segurado, parcial ou total, consoante redação do artigo 37, caput e parágrafos, deste diploma legal.    No entanto, com o advento da Lei Complementar n.º 039/2002, não houve a previsão do pecúlio previdenciário, nem determinação de restituição de valores pagos a título desse benefício, inexistindo direito adquirido dos segurados em menção, considerando que tinham apenas mera expectativa de direito, pois se trata de contrato público aleatório cuja prestação é incerta e dependente de evento futuro.    Assim sendo, frisa-se: não é da natureza jurídica do pecúlio a restituição dos valores referentes às contribuições pagas ao plano, quando em razão do seu cancelamento e/ou exclusão, sem que tenha ocorrido a condição para a obtenção do benefício (morte ou invalidez) durante a vigência do benefício.    Conforme citado linhas acima, outro não é o entendimento pacificado neste Tribunal: Vejamos:    Em julgamento realizado em 25 de abril de 2012, acordaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes do Conselho da Magistratura, por maioria de votos, em Negar Provimento ao Recurso Administrativo, Processo Nº 2011.3.021817-1, voto condutor do Excelentíssimo Senhor Desembargador Milton Augusto de Brito Nobre, que de maneira clara e precisa compôs com acerto a questão trazida ao crivo judicial:   Acórdão nº. 197938. ¿RECURSO ADMINISTRATIVO. RESTITUIÇÃO DE VALORES DESCONTADOS MENSALMENTE A TÍTULO DE PECÚLIO JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. ASSOCIAÇÃO COMPULSÓRIA AO FUNDO. INOCORRÊNCIA. ADESÃO TÁCITA A CONTRATO DE DIREITO PRIVADO. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. IMPROVIMENTO. 1. A presente irresignação não pode prosperar, vez que contraria a ratio essendi do Pecúlio Judiciário, bem como os princípios da legalidade e da boa-fé objetiva, os quais devem permear a relação mantida entre a Administração Pública e seus servidores. 2. Não tem razão o recorrente ao afirmar que não aderiu ao Pecúlio Judiciário, vez que, durante muitos anos, contribuiu mensalmente àquele Fundo, sendo os descontos informados tanto nos contracheques, quanto em seu extrato financeiro anual, corporificando-se verdadeira adesão tácita a um contrato privado da Administração, sob a égide do Direito Civil. 3. Quando o Estado firma contratos regulados pelo direito privado, situa-se no mesmo plano jurídico da outra parte, não lhe sendo atribuída, como regra, qualquer vantagem especial que refuja às linhas do direito contratual comum, agindo no exercício de seu jus gestionis. 4. O princípio da boa-fé impõe o dever de fidelidade à palavra dada, expressa ou tacitamente, não se podendo admitir a frustração ou o abuso de confiança, muito menos a utilização da própria torpeza para a obtenção de benefícios. 5. A boa-fé integra todos os tipos de contratos, inclusive os não escritos ou verbais, sendo que nestes a confiança e a lealdade encontram-se potencializadas vez que a inexistência de pactuação escrita denota a habitualidade do comportamento e a confiança das partes envolvidas , devendo o negócio jurídico ser interpretado de acordo com a praxe administrativa referente à adesão ao Pecúlio Judiciário, conforme permitido pelo art. 113, do CC. 6. Como instituto relacionado à boa-fé objetiva tem-se a proibição ao "venire contra factum proprium, traduzindo esta locução o exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente pelo exercente. 7. O Pecúlio Judiciário amolda-se aos contornos do art. 757 do Código Civil, o qual dispõe sobre o contrato de seguro. Desfeita a avença, os valores pagos não são passíveis de restituição, uma vez que a entidade correu o risco próprio da aleatoriedade. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 8. No Pecúlio Judiciário há a socialização do risco, não havendo previsão de restituição em nenhuma das Resoluções que o regem, desde 1970. 9. Por maioria, recurso improvido¿             No mesmo sentido, decidiu a 5ª Câmara Cível Isolada, sob a relatoria do Des. Constantino Augustos Guerreiro, cujo Acórdão n.º 86.687 transcrevo: ¿EMENTA APELAÇÃO CÍVEL. PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO. AFASTADA. MÉRITO. O PECÚLIO FOI CONTEMPLADO COMO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO COMPULSÓRIO ATÉ A VIGÊNCIA LEI ESTADUAL 5.011, DE 16/11/81, NÃO SENDO PREVISTO NA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N.º 039, DE 11/01/2002. PORTANTO, EM FACE DO PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM, NÃO CABE A RESTITUIÇÃO PLEITEADA. ADEMAIS, ENTENDER DE FORMA DIVERSA IMPLICARIA QUEBRA DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL, PORQUANTO NA VIGÊNCIA DO PECÚLIO OS SEGURADOS E/OU SEUS BENEFICIÁRIOS ESTAVAM ACOBERTADOS PELO SEGURO EM CASO DE OCORRÊNCIA DO SINISTRO (MORTE OU INVALIDEZ). ASSIM, EMBORA NÃO TENHA OCORRIDO O FATO GERADOR, NEM POR ISSO DEIXARAM OS RECORRIDOS DE USUFRUIR DA CONTRAPRESTAÇÃO DO SERVIÇO DURANTE TODA A VIGÊNCIA DA LEI ESTADUAL 5.011/81. PRECEDENTES. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.¿. (TJ-PA 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA - APELAÇÃO CÍVEL Nº 2009.3.017094-5 Rel. Des. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO, Acórdão n.º 86687, DJ-E 16/04/2010).       Colaciono ainda desta Egrégia Corte os julgados:    Acórdão n. 73143 - Rela. Desa. Célia Regina de Lima Pinheiro - 2.ª Câmara Cível Isolada, Publ.: 27/08/2009).    Acórdão n. 90637 - Rel. Des. Ricardo Ferreira Nunes - 4ª Câm. Cível Isolada - - Nº DO PROCESSO: 200930060287 - Jul.: 16/08/2010.             Acórdão N. 107047 - Rel. Desa. Gleide Pereira De Moura- 1ª Câmara Cível Isolada - Processo Nº 20113016997-8, Julg.:. 23/04/2012.     Sobre a questão, a Corte Superior, STJ já se pronunciou. Vejamos os julgados: ¿CIVIL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. DESFILIAÇÃO. A desfiliação do associado não implica a devolução dos valores por ele pagos a título de pecúlio por invalidez ou morte tudo porque, enquanto subsistiu a relação, a instituição previdenciária correu o risco, como é próprio dos contratos aleatórios. Agravo regimental não provido. (AgRg no Recurso Especial n.º 617.152, 3.ª T., Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJ de 19/09/2005). ¿Os valores pagos a título de pecúlio por invalidez ou morte não são passíveis de restituição, uma vez que a entidade suportou o risco. E, embora não tenha ocorrido o sinistro, nem por isso deixaram os associados de usufruir da prestação do serviço na vigência do contrato, que é, por natureza.¿. (Embargos de Divergência no REsp. n.º 327.419/DF, 2.ª Seção, Rel. Min. CASTRO FILHO, DJ de 01/07/2004). ¿Os valores pagos a título de pecúlio por invalidez ou morte (Capec) não são passíveis de restituição, uma vez que a entidade correu o risco, como é próprio dos contratos aleatórios. (REsp. n.º 438.735/DF, 4.ª Turma, Rel. Min. RUY ROSADO DE AGUIAR, DJ de 02/12/2002).    Do mesmo modo, entendo que não tem como persistir o pleito dos apelados em reaver a importância revestida para a formação do pecúlio, pois, neste período, estavam abrangidos pela lei em comento e somente não houve ocorrência do fato gerador do benefício, ou seja, morte ou invalidez.    Impende destacar, ainda, que não há previsão legal que imponha a Administração Pública a restituir a importância recolhida a esse título.    É sabido que o ente estatal deve obedecer ao princípio da legalidade e, como o próprio nome sugere, esse princípio diz respeito à obediência à lei, não podendo fazer nada que não esteja nela determinado ou delimitado.             Por essas razões, em Reexame Necessário, reformo a sentença proferida pelo juízo de origem, conhecendo de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública, da ilegitimidade do IGEPREV, restando, assim, prejudicado o Recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público Estadual.      Belém, de janeiro de 2016. LEONARDO DE NORONHA TAVARES RELATOR (2016.00040062-57, Não Informado, Rel. LEONARDO DE NORONHA TAVARES, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-01-15, Publicado em 2016-01-15)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 15/01/2016
Data da Publicação : 15/01/2016
Órgão Julgador : 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : LEONARDO DE NORONHA TAVARES
Número do documento : 2016.00040062-57
Tipo de processo : Apelação / Remessa Necessária
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