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Jurisprudência


TJPA 0013327-66.2016.8.14.0040

Ementa
2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013327-66.2016.814.0040 (I VOLUME) COMARCA DE ORIGEM: PARAUAPEBAS APELANTE: BANCO FIAT S/A ADVOGADO: JOSÉ MARTINS (OAB Nº 84314) E OUTRO APELADO: RUDSON PEREIRA ADVOGADO: NÃO CONSTA NOS AUTOS RELATORA: DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA DE DEFESA, QUE NÃO PODE SER CONHECIDA DE OFÍCIO PELO JULGADOR. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Não há falar em ausência de interesse processual pela aplicação da teoria do adimplemento substancial, quando a matéria sequer foi arguida pela parte contrária. 2. Não é permitido ao julgador conhecer de ofício matéria de direito disponível, arguível em sede de defesa, devendo prevalecer o princípio da inércia. 3. Conforme recente posicionamento da Corte Superior, a teoria do adimplemento substancial não tem o condão de afastar a propositura da ação de busca e apreensão. 4. Recurso de apelação conhecido e provido. DECISÃO MONOCRÁTICA A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA): Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por BANCO FIAT S/A, em face de decisão prolatada pelo MM. Juízo da 2ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Parauapebas, que extinguiu o feito sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC-15, por falta de interesse de agir, nos autos da ação de busca e apreensão movida em face de RUDSON PEREIRA. Em breve histórico, Trata-se de Ação de Busca e Apreensão com pedido liminar, em que o Requerente afirma ter celebrado contrato que deu origem à Cédula de Crédito de nº 62410000000633966098, em 10.10.2011, por meio do qual foi fornecido crédito ao Requerido no valor de R$ 75.631,80 (setenta e cinco mil, seiscentos e trinta e um reais e oitenta centavos), cujo pagamento se daria em 60 (sessenta) parcelas mensais, tendo por objeto o veículo FIAT SIENA (FI)(Ns)El 1.4, ano 2011, cor branca, placa OBW6398, RENAVAM 00365898198, Chassi 8AP372111C6009958. Afirma que o inadimplemento da parcela de nº 54 resultou no vencimento antecipado das demais parcelas, somando débito no valor total de R$ 9.838,49 (nove mil, oitocentos e trinta e oito reais e quarenta e nove centavos), pelo que requereu a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. Sobreveio sentença às fls. 28-28verso, extinguindo o feito sem resolução do mérito, havendo o magistrado aplicado a Teoria do Adimplemento Substancial, por constatar que fora adimplido o valor correspondente a cerca de 90% (noventa por cento) da dívida. Inconformado, o Requerente interpôs apelação às fls. 29-39, afirmando que a teoria do adimplemento substancial é matéria de defesa e não de ordem pública, razão pela qual não poderia ter sido o feito extinto de ofício, razão pela qual requereu a reforma da sentença. Nesta instância ad quem, coube-me a relatoria do feito por distribuição. É o relatório. D E C I D O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA Satisfeitos os pressupostos processuais viabilizadores de admissibilidade recursal, conheço do presente Recurso. Passo a apreciá-lo, procedendo ao julgamento na forma monocrática por se tratar de matéria cristalizada no âmbito da jurisprudência pátria e, deste E. Tribunal. Inexistindo questões preliminares suscitadas em sede recursal, passo à análise do meritum causae. As razões apresentadas pelo Apelante em seu recurso prosperam.   Em exame aos fundamentos utilizados na sentença apelada, constata-se que o togado singular adentrou liminarmente no mérito da causa, malgrado tenha declarado extinto o feito sem resolução do mesmo, reconhecendo de ofício matéria de defesa que sequer fora arguida pela parte contrária, a qual, nem fora citada para apresentar resposta. Ora, a Teoria do Adimplemento Substancial, além de constituir matéria de defesa, não configura direito indisponível, sendo, assim, impossível seu conhecimento de ofício, conforme farta jurisprudência de nossos Tribunais. Confira-se: APELAÇÃO CÍVEL N.º 1229961-5, DA COMARCA DE PONTA GROSSA - 4ª VARA CÍVEL APELANTE: BANCO BGN S/A APELADA: MARCELO FABIO RELATOR: DES. VITOR ROBERTO SILVACIVIL. PROCESSUAL CIVIL. BUSCA E APREENSÃO. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL DO CONTRATO.IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DA PARCELA CUMPRIDA ESTAR MUITO PRÓXIMA DA EXTINÇÃO DO CONTRATO PELO PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE, ADEMAIS, DE RECONHECIMENTO DE OFICIO. DIREITO DISPONÍVEL. RECURSO PROVIDO. (TJPR - 18ª C.Cível - AC - 1229961-5 - Ponta Grossa - Rel.: Vitor Roberto Silva - Unânime - - J. 18.03.2015) (TJ-PR - APL: 12299615 PR 1229961-5 (Acórdão), Relator: Vitor Roberto Silva, Data de Julgamento: 18/03/2015, 18ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 1538 01/04/2015) CIVIL. PROCESSO CIVIL. BUSCA E APREENSÃO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. NÃO CONFIGURADA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. MATÉRIA DE DEFESA. NÃO COGNOSCÍVEL DE OFÍCIO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA CASSADA. 1. Ateoria do adimplemento substancial estipula que não serão rescindidos os contratos que já tiverem sido consideravelmente cumpridos, persistindo, portanto, o dever de cumprir cada parte com aquilo que foi avençado. 2. Embora realmente possa se vislumbrar a aplicação de tal teoria diante do percentual de cumprimento, in casu, 75% do contrato, tal matéria, salvo melhor juízo, trata de matéria de defesa, sendo, portanto, inviável o reconhecimento de ofício pelo órgão jurisdicional. 3. Assim, mesmo que, no âmbito do direito material, seja possível a manutenção do negócio jurídico, diante do reconhecimento do substancial cumprimento das obrigações acordadas, entendo que, deve ser valorado o princípio da inércia, que impede o magistrado de suscitar de oficio matérias de ordem particular. 4. Fere os princípios da inércia e do dispositivo o reconhecimento de ofício de matérias que dependem de provocação da parte. 5. Ademais, o magistrado age desproporcionalmente ao indeferir a inicial de pronto, sem oportunizar a parte a emenda da inicial, tendo em vista que o próprio Decreto-Lei 911/69, prevê no artigo 4º a possibilidade de conversão do feito em execução, o que, por sua vez, demandaria do juiz uma postura mais cooperativa, para resolver a crise jurídica. 6. Recurso Provido para cassar a sentença de primeiro grau. (TJ-DF - APC: 20150910188094, Relator: GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 09/12/2015, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 18/12/2015 . Pág.: 219) Ademais, convém que se observe o entendimento mais recente do C. STJ a respeito da referida teoria: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO, COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA REGIDO PELO DECRETO-LEI 911/69. INCONTROVERSO INADIMPLEMENTO DAS QUATRO ÚLTIMAS PARCELAS (DE UM TOTAL DE 48). EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO (OU DETERMINAÇÃO PARA ADITAMENTO DA INICIAL, PARA TRANSMUDÁ-LA EM AÇÃO EXECUTIVA OU DE COBRANÇA), A PRETEXTO DA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. DESCABIMENTO. 1. ABSOLUTA INCOMPATIBILIDADE DA CITADA TEORIA COM OS TERMOS DA LEI ESPECIAL DE REGÊNCIA. RECONHECIMENTO. 2. REMANCIPAÇÃO DO BEM AO DEVEDOR CONDICIONADA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA, ASSIM COMPREENDIDA COMO OS DÉBITOS VENCIDOS, VINCENDOS E ENCARGOS APRESENTADOS PELO CREDOR, CONFORME ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DA SEGUNDA SEÇÃO, SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS (REsp n. 1.418.593/MS). 3. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO, COM A UTILIZAÇÃO DA VIA JUDICIAL ELEITA PELA LEI DE REGÊNCIA COMO SENDO A MAIS IDÔNEA E EFICAZ PARA O PROPÓSITO DE COMPELIR O DEVEDOR A CUMPRIR COM A SUA OBRIGAÇÃO (AGORA, POR ELE REPUTADA ÍNFIMA), SOB PENA DE CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE NAS MÃOS DO CREDOR FIDUCIÁRIO. 4. DESVIRTUAMENTO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL, CONSIDERADA A SUA FINALIDADE E A BOA-FÉ DOS CONTRATANTES, A ENSEJAR O ENFRAQUECIMENTO DO INSTITUTO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA. VERIFICAÇÃO. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A incidência subsidiária do Código Civil, notadamente as normas gerais, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infugíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela "lei geral" não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela lei especial (ut Art. 1.368-A, introduzido pela Lei n. 10931/2004). 1.1 Além de o Decreto-Lei n. 911/1969 não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, é expresso em exigir a quitação integral do débito como condição imprescindível para que o bem alienado fiduciariamente seja remancipado. Em seus termos, para que o bem possa ser restituído ao devedor, livre de ônus, não basta que ele quite quase toda a dívida; é insuficiente que pague substancialmente o débito; é necessário, para esse efeito, que quite integralmente a dívida pendente. 2. Afigura-se, pois, de todo incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso _ desimportando sua extensão, se de pouca monta ou se de expressão considerável _, quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente. Compreensão diversa desborda, a um só tempo, do diploma legal exclusivamente aplicável à questão em análise (Decreto-Lei n. 911/1969), e, por via transversa, da própria orientação firmada pela Segunda Seção, por ocasião do julgamento do citado Resp n. 1.418.593/MS, representativo da controvérsia, segundo a qual a restituição do bem ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento, no prazo de cinco dias contados da execução da liminar de busca e apreensão, da integralidade da dívida pendente, assim compreendida como as parcelas vencidas e não pagas, as parcelas vincendas e os encargos, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 3. Impor-se ao credor a preterição da ação de busca e apreensão (prevista em lei, segundo a garantia fiduciária a ele conferida) por outra via judicial, evidentemente menos eficaz, denota absoluto descompasso com o sistema processual. Inadequado, pois, extinguir ou obstar a medida de busca e apreensão corretamente ajuizada, para que o credor, sem poder se valer de garantia fiduciária dada (a qual, diante do inadimplemento, conferia-lhe, na verdade, a condição de proprietário do bem), intente ação executiva ou de cobrança, para só então adentrar no patrimônio do devedor, por meio de constrição judicial que poderá, quem sabe (respeitada o ordem legal), recair sobre esse mesmo bem (naturalmente, se o devedor, até lá, não tiver dele se desfeito). 4. A teoria do adimplemento substancial tem por objetivo precípuo impedir que o credor resolva a relação contratual em razão de inadimplemento de ínfima parcela da obrigação. A via judicial para esse fim é a ação de resolução contratual. Diversamente, o credor fiduciário, quando promove ação de busca e apreensão, de modo algum pretende extinguir a relação contratual. Vale-se da ação de busca e apreensão com o propósito imediato de dar cumprimento aos termos do contrato, na medida em que se utiliza da garantia fiduciária ajustada para compelir o devedor fiduciante a dar cumprimento às obrigações faltantes, assumidas contratualmente (e agora, por ele, reputadas ínfimas). A consolidação da propriedade fiduciária nas mãos do credor apresenta-se como consequência da renitência do devedor fiduciante de honrar seu dever contratual, e não como objetivo imediato da ação. E, note-se que, mesmo nesse caso, a extinção do contrato dá-se pelo cumprimento da obrigação, ainda que de modo compulsório, por meio da garantia fiduciária ajustada. 4.1 É questionável, se não inadequado, supor que a boa-fé contratual estaria ao lado de devedor fiduciante que deixa de pagar uma ou até algumas parcelas por ele reputadas ínfimas _ mas certamente de expressão considerável, na ótica do credor, que já cumpriu integralmente a sua obrigação _, e, instado extra e judicialmente para honrar o seu dever contratual, deixa de fazê-lo, a despeito de ter a mais absoluta ciência dos gravosos consectários legais advindos da propriedade fiduciária. A aplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 4.2. A propriedade fiduciária, concebida pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada da teoria do adimplemento substancial. 5. Recurso Especial provido. (STJ - REsp: 1622555 MG 2015/0279732-8, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 22/02/2017, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/03/2017) Logo, constatando-se o vício existente na sentença recorrida, deve a mesma ser anulada, devolvendo-se os autos à origem, para regular processamento e julgamento do feito. ISTO POSTO, CONHEÇO e PROVEJO o Recurso de Apelação, para anular a sentença vergastada e determinar o retorno dos autos à instância de origem, para, o regular processamento, nos termos da fundamentação. P.R.I.C. Serve esta decisão como Mandado/Intimação/Ofício, para os fins de direito. Após o trânsito em julgado promova-se a respectiva baixa nos registros de pendência referente a esta Relatora e, remetam-se os autos ao Juízo de origem. Em tudo certifique. À Secretaria para as devidas providências. Belém, (PA), 21 de agosto de 2017. Desa. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES Desembargadora Relatora Ass. Eletrônica (2017.03530082-31, Não Informado, Rel. EDINEA OLIVEIRA TAVARES, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2017-08-23, Publicado em 2017-08-23)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 23/08/2017
Data da Publicação : 23/08/2017
Órgão Julgador : 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : EDINEA OLIVEIRA TAVARES
Número do documento : 2017.03530082-31
Tipo de processo : Apelação
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