TJPA 0014054-86.2009.8.14.0301
SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA COMARCA DE BELÉM/PA REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014054-86.2009.8.14.0301 SENTENCIANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA DE FAZENDA DE BELÉM SENTENCIADO/APELANTE: ESTADO DO PARÁ SENTENCIADO/APELADO: MARIA CLEONICE DOS SANTOS MOURA RELATOR: DES. LEONARDO DE NORONHA TAVARES EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. Reclamação Trabalhista. FGTS. servidor PÚBLICO temporário. contrato de trabalho declarado nulo. reconhecimento do direito ao depósito do FGTS. limitação, de ofício, ao quinquênio anterior à propositura da ação. precedentes do stf e stj. decisão monocrática. negado seguimento ao recurso. inteligência do art. 557 do cpc. em reexame necessário, A TEOR DA SÚMULA 253 DO STJ, sentença parcialmente modificada, MONOCRATICAMENTE, para reconhecer a incidência da prescrição quinquenal e a observância dos juros e correção monetária de acordo com o entendimento do stf na questão de ordem em face dAS ADINs 4425 e 4357. DECISÃO MONOCRÁTICA O EXMO. SR. DESEMBARGADOR LEONARDO DE NORONHA TAVARES (RELATOR): Trata-se de REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo ESTADO DO PARÁ em face da sentença de fls. 87/88v proferida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara de Fazenda de Belém que, nos autos da Ação de Cobrança movida por MARIA CLEONICE DOS SANTOS MOURA, julgou parcialmente procedente o pedido exordial, condenando o apelante ao pagamento dos depósitos do FGTS, a que a autora teria direito durante a vigência do contrato. Irresignado, o Estado do Pará interpôs recurso de apelação às fls. 90/118. Em suas razões, alegou, preliminarmente, que houve cerceamento de defesa ao decidir pelo julgamento antecipado e rejeição dos pedidos de prova, além da falta de fundamentação quanto ao valor estabelecido a título de pagamento do FGTS. Ademais, invocou a impossibilidade jurídica do pedido, ante a ausência de previsão legal das verbas pleiteadas em face do regime estatutário que regeu a relação entre a autora e o município. Destacou também a ausência de interesse processual, pois o trabalho executado tinha natureza jurídico-administrativa, sob a égide do regime jurídico único, não sendo empregado do Estado do Pará, motivo pelo qual não possui interesse jurídico para se insurgir por meio da ação. Em prejudicial, arguiu a prescrição trienal prevista no art. 206, § 3º, do Código Civil/02, por se tratar de prestações vencidas de rendas temporárias. No mérito, asseverou que a contratação temporária da autora reveste-se de legalidade, à luz do que prevê o artigo 37, IX, da CF e as Leis Complementares Estaduais nº 07/91 e 47/2004. Argumentou pela impossibilidade de produção de efeitos do ato supostamente nulo decorrente de contratação indicada como irregular. Teceu comentário sobre a discricionariedade do ato administrativo de exoneração a qualquer momento, diante de critérios pautados na oportunidade e na conveniência do encerramento do contrato. Sustentou que não devem ser aplicados os recentes entendimentos adotados pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, pois o caso em questão não se enquadraria nos mesmos fatos estudados no caso paradigma. Colacionou jurisprudência que entende coadunar com a tese defendida. Ao final, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso, para que haja a reforma da sentença. Sem contrarrazões, conforme certidão de fl. 122. Encaminhado a esta Egrégia Corte de Justiça, coube-me a relatoria do feito (fl. 123). É o relatório. DECIDO. Inicialmente, cumpre ressaltar o que dispõe a Súmula 253 do Superior Tribunal de Justiça: ¿O art. 557 do CPC, que autoriza o relator a decidir o recurso, alcança o reexame necessário¿. Em relação a preliminar apontada de cerceamento de defesa, entendo que a pretensão recursal não merece prosperar, pois da acurada análise dos autos, verifico que a questão tratada versa sobre matéria exclusivamente de direito, que dispensa instrução probatória. Além disso, é cediço que o princípio do livre convencimento motivado permite que o Magistrado, na construção do seu convencimento, leve em consideração todo o conjunto probatório, afigurando-se possível o reconhecimento da materialidade de forma indireta, através dos demais meios de prova existentes nos autos, que foram suficientes para a sua decisão. Ademais, se existem nos autos documentos válidos à elucidação da controvérsia e, se, diante das peculiaridades do caso concreto, o juiz verificar que a prova pretendida é despicienda, lícito que a dispense, o que não configura cerceamento de defesa. O julgador não está adstrito a deferir a produção de prova postulada, porque a parte assim o requereu, valendo ressaltar, ainda, que o juiz, como destinatário final da mesma, pode dispensar aquelas que julgar desnecessárias (artigo 130 do CPC). Na lição de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Nery Código de processo civil comentado: e legislação extravagante. 10. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 435. "Concisão e brevidade não significam ausência de fundamentação". Conclui esse convencimento, citando farta jurisprudência, plenamente pacificada pelos Tribunais Pátrios, no sentido de que "Não é nula a sentença fundamentada sucintamente, (STJ-RJTE 102/100-STJ-3ª Turma, Resp 2.227-GO, Rel. Min. Nilson Naves, j. 03.04.90, não conheceram, v.u., DJU 30.04.90, p. 3.526, 2ª col., em.; STJ-3ª Turma, Resp 10.670-MG, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 05.11.91, p. 17.072, 1ª col., em; STF-2ª Turma, RE 88.439-4-SP, j. 28.02.78, não conheceram, DJU 05.05.78, p. 2.980, 1ª col., em.; RTFR 125/165, 125/249, à p. 251, RT 594/109, JTA 166/156), de maneira deficiente (RSTJ 23/320; RT 612/121) ou mal fundamentada (RT 599/76, RJTJESP 94/241, RP 4/406, em. 191), desde, porém, nestes três casos, que contenha o essencial (STJ-4ª Turma, Resp 7.870-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 03.12.91, deram provimento parcial, DJU 03.02.92, p. 469, 1ª col.). Preliminar rejeitada. Quanto à alegação de impossibilidade jurídica do pedido e ausência de interesse processual, deixo para me manifestar no desenvolvimento do voto, visto que a matéria se confunde com o mérito. No que diz respeito à prejudicial de mérito da prescrição trienal, também não assiste razão ao apelante; todavia, anoto ser necessária a observação do prazo prescricional quinquenal, pelo que, uma vez que se trata de Reexame Necessário e matéria de ordem pública, deve ser analisado a qualquer tempo e grau de jurisdição. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça é uníssono a respeito da matéria, firmando entendimento de que nas ações de cobrança de qualquer verba, inclusive FGTS, em face da Fazenda Pública, o prazo a ser aplicado é quinquenal, em atenção ao disposto no Decreto nº 20.910/32, senão vejamos: ¿PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO AGRAVADA. FUNDAMENTOS NÃO IMPUGNADOS. SÚMULA 182/STJ. INCIDÊNCIA. FGTS. DEMANDA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PRAZO PRESCRICIONAL. APLICAÇÃO DO DECRETO N. 20.910/32. 1. É inviável o agravo que deixa de atacar, especificamente, todos os fundamentos da decisão impugnada. Incidência da Súmula 182 do Superior Tribunal de Justiça. 2. 'O Decreto 20.910/32, por ser norma especial, prevalece sobre a lei geral. Desse modo, o prazo prescricional para a cobrança de débito relativo ao FGTS em face da Fazenda Pública é de cinco anos' (REsp 1.107.970/PE, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJe 10/12/2009). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.¿(AgRg no AREsp 461.907/ES, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 02/04/2014) (Grifei.) ¿PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FGTS. COBRANÇA EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA. PRAZO PRESCRICIONAL. PREVALÊNCIA DO DECRETO 20.910/32. 1. O Decreto 20.910/32, por ser norma especial, prevalece sobre a lei geral. Desse modo, o prazo prescricional para a cobrança de débito relativo ao FGTS em face da Fazenda Pública é de cinco anos. Aplica-se, por analogia, o disposto na Súmula 107 do extinto TFR: "A ação de cobrança do crédito previdenciário contra a Fazenda Pública está sujeita à prescrição qüinqüenal estabelecida no Decreto n. 20.910, de 1932". Nesse sentido: REsp 559.103/PE, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 16.2.2004. 2. Ressalte-se que esse mesmo entendimento foi adotado pela Primeira Seção/STJ, ao apreciar os EREsp 192.507/PR (Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 10.3.2003), em relação à cobrança de contribuição previdenciária contra a Fazenda Pública. 3. Recurso especial provido.¿(STJ. REsp 1107970/PE, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/11/2009, DJe 10/12/2009) (Grifei.). No mérito, cinge-se à análise do presente recurso se devido o pagamento do FGTS ao servidor temporário, que teve seu contrato declarado nulo em razão da ausência de prévia aprovação em concurso público, pelo que, revendo o meu posicionamento anterior acerca do tema em questão, vislumbro a aplicação, in casu, da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário nº 596478/RR, objetivando uniformizar o entendimento referente à discussão travada. Nesse sentido, restou decidido pela Suprema Corte, in verbis: ¿EMENTA Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento¿.(STF, Relator: Min. ELLEN GRACIE. Relator (a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 13/06/2012, Tribunal Pleno. REPERCURSÃO GERAL. Div. 28.02.2013. P. 01/03/2013. Trânsito em julgado 09.03.2015). Ressalto, ainda, que o STF, em decisão paradigmática, no RE nº 895.070, reformou decisão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, que havia negado FGTS a servidor sob regime jurídico-administrativo, diante do entendimento firmado no RE nº 596.478/RR, apontando, por outro lado, que as questões postas naquele recurso, sob o manto da repercussão geral, são devidos indistintamente tanto a servidores celetistas, quanto aos estatutários, senão vejamos: ¿AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS. DIREITO AO RECEBIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. PRECEDENTES. 1. O Plenário da Corte, no exame do RE nº 596.478/RR-RG, Relator para o acórdão o Ministro Dias Toffoli, concluiu que, 'mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados'. 2. Essa orientação se aplica também aos contratos temporários declarados nulos, consoante entendimento de ambas as Turmas. 3. A jurisprudência da Corte é no sentido de que é devida a extensão dos diretos sociais previstos no art. 7º da Constituição Federal a servidor contratado temporariamente, nos moldes do art. 37, inciso IX, da referida Carta da República, notadamente quando o contrato é sucessivamente renovado. 4. Agravo regimental não provido.¿ (AgR 895.070, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, DATA DE PUBLICAÇÃO DJE 08/09/2015 - ATA Nº 125/2015. DJE nº 175, divulgado em 04/09/2015). Ademais, em recente julgado do Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário n. 960.708, do Estado do Pará, a Excelsa Corte decidiu o seguinte, in verbis: ¿RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA NULA. FGTS. INCIDÊNCIA DO ART. 19-A DA LEI N. 8.036/1990. PRECEDENTES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.¿ (RE 960.708, Relator (a) Min. Cármen Lúcia, Decisão Monocrática do dia 2/5/2016). Depreende, desse modo, que o STF não fez distinção entre os servidores celetistas e servidores público submetidos ao regime jurídico-administrativo. Assim, os julgamentos acima apontados garantem, às pessoas contratadas sem concurso público pela Administração Pública, o direito ao depósito do FGTS, previsto no art. 19-A da Lei nº 8.036/90, considerando, para tanto, a nulidade do contrato por violação das hipóteses contidas no art. 37, § 2º da CF/88. Em Reexame Necessário, também vislumbro a aplicação do disposto no art. 1°-F da Lei 9.494/97, conforme decisão proferida pelo STF, na Questão de Ordem, em que modulou os efeitos do decisum das ADINs 4425 e 4357; declarando, assim, a inconstitucionalidade parcial por arrastamento do art. 5° da Lei 11.960/09, impondo, desse modo, um desmembramento entre os juros de mora, que por se tratar de verba de natureza não tributária deve corresponder aos juros aplicados à caderneta de poupança (regra do art. 1°-F da Lei 9.494/97), desde a citação, e a correção monetária que deverá ser calculada pelo INPC até julho de 2009, alterado em razão do advento da Lei n. 11.960/2009, que instituiu a TR, aplicada até 25/03/2015; e após a esta data, a substituição pelo IPCA-E. Ante o exposto, a teor do art. 557 do CPC, com base em precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, nego seguimento ao recurso interposto. Em reexame necessário, a teor da Súmula 253 do STJ, modifico, monocraticamente, a sentença para reconhecer a prescrição quinquenal, e a aplicação dos juros e correção monetária conforme decisão proferida pelo STF, na Questão de Ordem, em que modulou os efeitos do decisum das ADINs 4425 e 4357. Belém (PA), de setembro de 2016. LEONARDO DE NORONHA TAVARES RELATOR
(2016.03870778-81, Não Informado, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2016-10-14, Publicado em 2016-10-14)
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SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA COMARCA DE BELÉM/PA REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014054-86.2009.8.14.0301 SENTENCIANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA DE FAZENDA DE BELÉM SENTENCIADO/APELANTE: ESTADO DO PARÁ SENTENCIADO/APELADO: MARIA CLEONICE DOS SANTOS MOURA RELATOR: DES. LEONARDO DE NORONHA TAVARES REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. Reclamação Trabalhista. FGTS. servidor PÚBLICO temporário. contrato de trabalho declarado nulo. reconhecimento do direito ao depósito do FGTS. limitação, de ofício, ao quinquênio anterior à propositura da ação. precedentes do stf e stj. decisão monocrática. negado seguimento ao recurso. inteligência do art. 557 do cpc. em reexame necessário, A TEOR DA SÚMULA 253 DO STJ, sentença parcialmente modificada, MONOCRATICAMENTE, para reconhecer a incidência da prescrição quinquenal e a observância dos juros e correção monetária de acordo com o entendimento do stf na questão de ordem em face dAS ADINs 4425 e 4357. DECISÃO MONOCRÁTICA O EXMO. SR. DESEMBARGADOR LEONARDO DE NORONHA TAVARES (RELATOR): Trata-se de REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo ESTADO DO PARÁ em face da sentença de fls. 87/88v proferida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara de Fazenda de Belém que, nos autos da Ação de Cobrança movida por MARIA CLEONICE DOS SANTOS MOURA, julgou parcialmente procedente o pedido exordial, condenando o apelante ao pagamento dos depósitos do FGTS, a que a autora teria direito durante a vigência do contrato. Irresignado, o Estado do Pará interpôs recurso de apelação às fls. 90/118. Em suas razões, alegou, preliminarmente, que houve cerceamento de defesa ao decidir pelo julgamento antecipado e rejeição dos pedidos de prova, além da falta de fundamentação quanto ao valor estabelecido a título de pagamento do FGTS. Ademais, invocou a impossibilidade jurídica do pedido, ante a ausência de previsão legal das verbas pleiteadas em face do regime estatutário que regeu a relação entre a autora e o município. Destacou também a ausência de interesse processual, pois o trabalho executado tinha natureza jurídico-administrativa, sob a égide do regime jurídico único, não sendo empregado do Estado do Pará, motivo pelo qual não possui interesse jurídico para se insurgir por meio da ação. Em prejudicial, arguiu a prescrição trienal prevista no art. 206, § 3º, do Código Civil/02, por se tratar de prestações vencidas de rendas temporárias. No mérito, asseverou que a contratação temporária da autora reveste-se de legalidade, à luz do que prevê o artigo 37, IX, da CF e as Leis Complementares Estaduais nº 07/91 e 47/2004. Argumentou pela impossibilidade de produção de efeitos do ato supostamente nulo decorrente de contratação indicada como irregular. Teceu comentário sobre a discricionariedade do ato administrativo de exoneração a qualquer momento, diante de critérios pautados na oportunidade e na conveniência do encerramento do contrato. Sustentou que não devem ser aplicados os recentes entendimentos adotados pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, pois o caso em questão não se enquadraria nos mesmos fatos estudados no caso paradigma. Colacionou jurisprudência que entende coadunar com a tese defendida. Ao final, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso, para que haja a reforma da sentença. Sem contrarrazões, conforme certidão de fl. 122. Encaminhado a esta Egrégia Corte de Justiça, coube-me a relatoria do feito (fl. 123). É o relatório. DECIDO. Inicialmente, cumpre ressaltar o que dispõe a Súmula 253 do Superior Tribunal de Justiça: ¿O art. 557 do CPC, que autoriza o relator a decidir o recurso, alcança o reexame necessário¿. Em relação a preliminar apontada de cerceamento de defesa, entendo que a pretensão recursal não merece prosperar, pois da acurada análise dos autos, verifico que a questão tratada versa sobre matéria exclusivamente de direito, que dispensa instrução probatória. Além disso, é cediço que o princípio do livre convencimento motivado permite que o Magistrado, na construção do seu convencimento, leve em consideração todo o conjunto probatório, afigurando-se possível o reconhecimento da materialidade de forma indireta, através dos demais meios de prova existentes nos autos, que foram suficientes para a sua decisão. Ademais, se existem nos autos documentos válidos à elucidação da controvérsia e, se, diante das peculiaridades do caso concreto, o juiz verificar que a prova pretendida é despicienda, lícito que a dispense, o que não configura cerceamento de defesa. O julgador não está adstrito a deferir a produção de prova postulada, porque a parte assim o requereu, valendo ressaltar, ainda, que o juiz, como destinatário final da mesma, pode dispensar aquelas que julgar desnecessárias (artigo 130 do CPC). Na lição de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Nery Código de processo civil comentado: e legislação extravagante. 10. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 435. "Concisão e brevidade não significam ausência de fundamentação". Conclui esse convencimento, citando farta jurisprudência, plenamente pacificada pelos Tribunais Pátrios, no sentido de que "Não é nula a sentença fundamentada sucintamente, (STJ-RJTE 102/100-STJ-3ª Turma, Resp 2.227-GO, Rel. Min. Nilson Naves, j. 03.04.90, não conheceram, v.u., DJU 30.04.90, p. 3.526, 2ª col., em.; STJ-3ª Turma, Resp 10.670-MG, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 05.11.91, p. 17.072, 1ª col., em; STF-2ª Turma, RE 88.439-4-SP, j. 28.02.78, não conheceram, DJU 05.05.78, p. 2.980, 1ª col., em.; RTFR 125/165, 125/249, à p. 251, RT 594/109, JTA 166/156), de maneira deficiente (RSTJ 23/320; RT 612/121) ou mal fundamentada (RT 599/76, RJTJESP 94/241, RP 4/406, em. 191), desde, porém, nestes três casos, que contenha o essencial (STJ-4ª Turma, Resp 7.870-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 03.12.91, deram provimento parcial, DJU 03.02.92, p. 469, 1ª col.). Preliminar rejeitada. Quanto à alegação de impossibilidade jurídica do pedido e ausência de interesse processual, deixo para me manifestar no desenvolvimento do voto, visto que a matéria se confunde com o mérito. No que diz respeito à prejudicial de mérito da prescrição trienal, também não assiste razão ao apelante; todavia, anoto ser necessária a observação do prazo prescricional quinquenal, pelo que, uma vez que se trata de Reexame Necessário e matéria de ordem pública, deve ser analisado a qualquer tempo e grau de jurisdição. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça é uníssono a respeito da matéria, firmando entendimento de que nas ações de cobrança de qualquer verba, inclusive FGTS, em face da Fazenda Pública, o prazo a ser aplicado é quinquenal, em atenção ao disposto no Decreto nº 20.910/32, senão vejamos: ¿PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO AGRAVADA. FUNDAMENTOS NÃO IMPUGNADOS. SÚMULA 182/STJ. INCIDÊNCIA. FGTS. DEMANDA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PRAZO PRESCRICIONAL. APLICAÇÃO DO DECRETO N. 20.910/32. 1. É inviável o agravo que deixa de atacar, especificamente, todos os fundamentos da decisão impugnada. Incidência da Súmula 182 do Superior Tribunal de Justiça. 2. 'O Decreto 20.910/32, por ser norma especial, prevalece sobre a lei geral. Desse modo, o prazo prescricional para a cobrança de débito relativo ao FGTS em face da Fazenda Pública é de cinco anos' (REsp 1.107.970/PE, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJe 10/12/2009). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.¿(AgRg no AREsp 461.907/ES, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 02/04/2014) (Grifei.) ¿PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FGTS. COBRANÇA EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA. PRAZO PRESCRICIONAL. PREVALÊNCIA DO DECRETO 20.910/32. 1. O Decreto 20.910/32, por ser norma especial, prevalece sobre a lei geral. Desse modo, o prazo prescricional para a cobrança de débito relativo ao FGTS em face da Fazenda Pública é de cinco anos. Aplica-se, por analogia, o disposto na Súmula 107 do extinto TFR: "A ação de cobrança do crédito previdenciário contra a Fazenda Pública está sujeita à prescrição qüinqüenal estabelecida no Decreto n. 20.910, de 1932". Nesse sentido: REsp 559.103/PE, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 16.2.2004. 2. Ressalte-se que esse mesmo entendimento foi adotado pela Primeira Seção/STJ, ao apreciar os EREsp 192.507/PR (Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 10.3.2003), em relação à cobrança de contribuição previdenciária contra a Fazenda Pública. 3. Recurso especial provido.¿(STJ. REsp 1107970/PE, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/11/2009, DJe 10/12/2009) (Grifei.). No mérito, cinge-se à análise do presente recurso se devido o pagamento do FGTS ao servidor temporário, que teve seu contrato declarado nulo em razão da ausência de prévia aprovação em concurso público, pelo que, revendo o meu posicionamento anterior acerca do tema em questão, vislumbro a aplicação, in casu, da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário nº 596478/RR, objetivando uniformizar o entendimento referente à discussão travada. Nesse sentido, restou decidido pela Suprema Corte, in verbis: ¿EMENTA Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento¿.(STF, Relator: Min. ELLEN GRACIE. Relator (a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 13/06/2012, Tribunal Pleno. REPERCURSÃO GERAL. Div. 28.02.2013. P. 01/03/2013. Trânsito em julgado 09.03.2015). Ressalto, ainda, que o STF, em decisão paradigmática, no RE nº 895.070, reformou decisão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, que havia negado FGTS a servidor sob regime jurídico-administrativo, diante do entendimento firmado no RE nº 596.478/RR, apontando, por outro lado, que as questões postas naquele recurso, sob o manto da repercussão geral, são devidos indistintamente tanto a servidores celetistas, quanto aos estatutários, senão vejamos: ¿AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS. DIREITO AO RECEBIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. PRECEDENTES. 1. O Plenário da Corte, no exame do RE nº 596.478/RR-RG, Relator para o acórdão o Ministro Dias Toffoli, concluiu que, 'mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados'. 2. Essa orientação se aplica também aos contratos temporários declarados nulos, consoante entendimento de ambas as Turmas. 3. A jurisprudência da Corte é no sentido de que é devida a extensão dos diretos sociais previstos no art. 7º da Constituição Federal a servidor contratado temporariamente, nos moldes do art. 37, inciso IX, da referida Carta da República, notadamente quando o contrato é sucessivamente renovado. 4. Agravo regimental não provido.¿ (AgR 895.070, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, DATA DE PUBLICAÇÃO DJE 08/09/2015 - ATA Nº 125/2015. DJE nº 175, divulgado em 04/09/2015). Ademais, em recente julgado do Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário n. 960.708, do Estado do Pará, a Excelsa Corte decidiu o seguinte, in verbis: ¿RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA NULA. FGTS. INCIDÊNCIA DO ART. 19-A DA LEI N. 8.036/1990. PRECEDENTES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.¿ (RE 960.708, Relator (a) Min. Cármen Lúcia, Decisão Monocrática do dia 2/5/2016). Depreende, desse modo, que o STF não fez distinção entre os servidores celetistas e servidores público submetidos ao regime jurídico-administrativo. Assim, os julgamentos acima apontados garantem, às pessoas contratadas sem concurso público pela Administração Pública, o direito ao depósito do FGTS, previsto no art. 19-A da Lei nº 8.036/90, considerando, para tanto, a nulidade do contrato por violação das hipóteses contidas no art. 37, § 2º da CF/88. Em Reexame Necessário, também vislumbro a aplicação do disposto no art. 1°-F da Lei 9.494/97, conforme decisão proferida pelo STF, na Questão de Ordem, em que modulou os efeitos do decisum das ADINs 4425 e 4357; declarando, assim, a inconstitucionalidade parcial por arrastamento do art. 5° da Lei 11.960/09, impondo, desse modo, um desmembramento entre os juros de mora, que por se tratar de verba de natureza não tributária deve corresponder aos juros aplicados à caderneta de poupança (regra do art. 1°-F da Lei 9.494/97), desde a citação, e a correção monetária que deverá ser calculada pelo INPC até julho de 2009, alterado em razão do advento da Lei n. 11.960/2009, que instituiu a TR, aplicada até 25/03/2015; e após a esta data, a substituição pelo IPCA-E. Ante o exposto, a teor do art. 557 do CPC, com base em precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, nego seguimento ao recurso interposto. Em reexame necessário, a teor da Súmula 253 do STJ, modifico, monocraticamente, a sentença para reconhecer a prescrição quinquenal, e a aplicação dos juros e correção monetária conforme decisão proferida pelo STF, na Questão de Ordem, em que modulou os efeitos do decisum das ADINs 4425 e 4357. Belém (PA), de setembro de 2016. LEONARDO DE NORONHA TAVARES RELATOR
(2016.03870778-81, Não Informado, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2016-10-14, Publicado em 2016-10-14)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
14/10/2016
Data da Publicação
:
14/10/2016
Órgão Julgador
:
1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a)
:
ROBERTO GONCALVES DE MOURA
Número do documento
:
2016.03870778-81
Tipo de processo
:
Apelação / Remessa Necessária
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