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Jurisprudência


TJPA 0014476-61.2014.8.14.0301

Ementa
SECRETARIA DA 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA 8ª VARA CÍVEL DE BELÉM/PA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2014.3.011257-8 AGRAVANTE: OZIEL DE SOUSA GONÇALVES AGRAVADO: AYMORE CREDITO FINANCEIRO E INVESTIMENTO S/A RELATOR: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE AGRAVO DE INSTRUMENTO. LIMINAR DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO. DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO LIMINAR DE BUSCA E APREENSAO FORMULADO NO PRIMEIRO GRAU. - Mesmo após do advento da Lei nº 10.931/04, e estando pago 40% do preço financiado, é possível o devedor purgar a mora. - No caso, a purga da mora deve ser assegurada ao agravante, nos termos do art. 401, inc. I, do Código Civil, salientando que o pagamento, mesmo com atraso, sempre será mais útil ao credor do que a recuperação do bem objeto da garantia fiduciária. - Não há motivos para que o agravante perca a posse do veículo, visto que pagou mais de 40% do valor financiado (26 das 60 parcelas). Inteligência do art. 53 do Código de Defesa do Consumidor. - Conheço do recurso e DOU PROVIMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por OZIEL DE SOUSA GONÇALVES contra decisão proferida pelo MM. Juízo da 8ª Vara Cível de Belém/PA , nos autos da Ação de Busca e Apreensão n. 0014476-61.2014.814.0301, ajuizada em desfavor de AYMORE CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A. A decisão agravada, com fundamento na súmula 284 do STJ, deferiu liminarmente a medida de busca e apreensão do Veículo Peugeot/206 presence 1.4 modelo 2005/2005 cor prata, placa KLN 5726. Relata que o agravante está em mora desde dezembro de 2013, tendo sido regularmente notificado procurou o banco para saldar a dívida, tentando de todas as formas quitar as parcelas em atraso junto ao agravado que só aceita receber o valor do debito na sua totalidade e com cobrança de juros, encargos exorbitantes impossibilitando o adimplemento das parcelas em atraso. Requer a reforma da decisão objurgada para indeferir a liminar de busca e apreensão do veículo alienado fiduciariamente. É o relatório. DECIDO. Preenchidos os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade Inicialmente, cabe salientar, que consta dos documentos de fls. 47 dos autos que o agravado encontra-se inadimplente em seis parcelas do contrato de financiamento, a saber: parcelas 28 a 60, a partir de dezembro de 2013. No caso, a purga da mora deve ser assegurada, ao agravado nos termos do art. 401, inc. I, do Código Civil, salientando que o pagamento, mesmo com atraso, sempre será mais útil ao credor do que a recuperação do bem objeto da garantia fiduciária. Neste sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGA DA MORA MEDIANTE O PAGAMENTO DAS PARCELAS ATRASADAS DO CONTRATO ATÉ O DIA DO DEPÓSITO, ACRESCIDAS DOS SEUS ENCARGOS MORATÓRIOS. DIREITO A SER ASSEGURADO AO DEVEDOR FIDUCIÁRIO MESMO APÓS O ADVENTO DA LEI 10.931/04. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, OBRIGACIONAIS E DE PROTEÇÃO ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO. DESCONSIDERAÇÃO DO VENCIMENTO ANTECIPADO DA AVENÇA. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70013642665, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel de Borba Lucas, Julgado em 23/03/2006) (grifei) Para fins de purga da mora, o devedor deve depositar o valor devido e vencido até a data do depósito, acrescido dos encargos moratórios, não devendo ser incluídas nas parcelas vincendas. Obviamente que o juiz não pode aplicar pura e simplesmente esta regra especial, sem confrontá-la e interpretá-la sistematicamente com os princípios constitucionais, de direito obrigacional e de proteção ao consumidor, uma vez que cumpre àquela interpretar e aplicar de forma integrada as normas legais e vigentes, assegurando a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal. In casu, não há motivos para que o agravante perca a posse do veículo, visto que pagou mais de 40% do valor financiado (26 das 60 parcelas). Tal fato atesta a lisura de sua conduta e boa-fé no proceder. A matéria objeto do presente recurso encontra-se pacificada nas Turmas 3ª e 4ª que compõem a 2ª Seção de Direito Privado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, como se verifica da seguinte passagem extraída decisão monocrática proferida no RESP 251946, da lavra do eminente Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA; julgado em 20/06/2000: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. LIMITE DE 40%. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE. ORIENTAÇÃO DA SEGUNDA SEÇÃO. RESSALVA DO PONTO DE VISTA PESSOAL. RECURSO PROVIDO. - A Segunda Seção, ao uniformizar a jurisprudência das Turmas que a compõem, por maioria acabou por optar pelo entendimento segundo o qual as disposições contidas nos arts. 6º, VI e 53 do Código de Defesa do Consumidor não afastaram a limitação de 40%(quarenta por cento) do preço financiado para a purgação da mora nos contratos de alienação fiduciária, de que trata o § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/69. (...) 2. Cinge-se a controvérsia dos autos a respeito da eventual revogação, pelas disposições contidas nos arts. 6º, VI e 53 do Código de Defesa do Consumidor(Lei n. 8.078/90), do § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/69, que permite a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, quando pagos, no mínimo, 40% do preço financiado. 3. A questão vinha sendo decidida por esta Turma no mesmo sentido do acórdão impugnado, consoante entendimento retratado nesta "Alienação fiduciária em garantia. Emenda da mora. Devedor fiduciante que não chegou a solver 40% do preço financiado. Admissibilidade em face do Código de Defesa do Consumidor. - A exigência imposta pelo § 1º do art. 3º do Decreto-lei n. 911/69(pagamento no mínimo de 40% do preço financiado) está afastada pelas disposições contidas nos arts. 6º, VI, e 53, caput, do Código de Defesa do Consumidor(Lei n. 8.078/90)". No voto condutor desse acórdão, extrai-se: "Inicialmente devo destacar que o Código de Defesa do Consumidor alberga normas de caráter nitidamente protecionista ao consumidor, em razão de sua presumida hipo-suficiência econômica. Assim, o inciso IV, do seu art. 6º, estabelece que são direitos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos. Por sua vez, pontifica o seu art. 53, no que interessa: "Art. 53 - ... nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado". Já o § 1º, do art. 3º, do Decreto-lei nº 911/69, só admite a purgação da mora, nas alienações fiduciárias, se o devedor já tiver pago o percentual mínimo de 40% do preço financiado. A questão consiste em saber se esse obstáculo de purgação da mora veiculado nesse preceito ainda subsiste em razão daquela nova regra. A norma contida no referido art. 53 deve ser interpretada ampliativamente, sempre tendo-se em conta que a sua finalidade está em preservar o consumidor de regras abusivas que importem não só na perda das prestações como do próprio bem, desde que o devedor restabeleça a regularidade dos pagamentos a que se comprometera, para adquiri-lo. Destarte, como salientado pelo recorrente, o Código de Defesa do Consumidor, ao afastar a perda automática das prestações pagas, em razão do inadimplemento do devedor, propicia também a proibição de interpretar dispositivo de lei anteriormente vigente que possa afrontá-lo, em face de um direito individual criado pelo legislador e que objetiva impedir um dano patrimonial, como é o direito à purgação da mora nos contratos de alienação fiduciária. Sendo assim, o obstáculo imposto pelo Decreto-lei nº 911/69 para purgação da mora, não mais subsiste ante a norma contida no art. 53 do Código de Defesa do Consumidor, por isso que esta afasta a aplicação daquela. Esta me parece ser a interpretação que mais se compadece com os princípios estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor". Em face do conteúdo acima exposto, não vejo motivo para apreensão do veículo. Ante o exposto, CONHEÇO DO RECURSO E DOU-LHE PROVIMENTO, para anular a sentença recorrida e fazer retornar os autos ao juízo de primeiro grau, nos termos do art. 557,§ 1º-A do CPC. Após o trânsito em julgado, arquive-se e devolva ao juízo a quo. Belém, 15 de maio de 2014. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora (2014.04543143-05, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-05-30, Publicado em 2014-05-30)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 30/05/2014
Data da Publicação : 30/05/2014
Órgão Julgador : 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE
Número do documento : 2014.04543143-05
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
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