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Jurisprudência


TJPA 0015398-85.2001.8.14.0301

Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. ACOLHIDA. NÃO FOI OPORTUNIZADA ÀS PARTES VISTA DO PROCESSO APÓS A JUNTADA DE DOCUMENTO NOVO RELAVANTE PARA O DESLINDE DA DEMANDA. INCIDÊNCIA DO ART. 398 DO CPC. SENTENÇA ANULADA.  DECISÃO MONOCRÁTICA            Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pela AGF BRASIL SEGUROS S/A contra sentença proferida pelo Juízo de Direito da 8ª Vara Cível da Comarca de Belém/Pará que, nos autos da Ação de Repetição de Indébito (Proc. nº 2001118613-5), julgou improcedente o pedido da autora, condenando-a ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios no importe de 15% sobre o valor da causa por entender que o réu não agiu de má-fé, tendo em vista que o fato do veículo furtado está sob penhora, não interferira no direito do segurado de receber, a título de indenização, o pagamento por parte da seguradora a título de indenização.            Em suas razões de fls. 141/152, a Apelante sustenta, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, visto que à fl. 128 o juízo de 1º grau determinou que fosse oficiada a Justiça do Trabalho a fim de que prestasse informações, no prazo de 10 dias, sobre a reclamação trabalhista referida nos autos. Tal diligência fora cumprida, com a juntada de documentos de fls. 130/134, contudo o Magistrado de piso não oportunizara às partes se manifestarem sobre o conteúdo desses documentos novos, o que violaria o art. 5º, LV, da CF, além do art. 398, do CPC, pelo que requer a decretação da nulidade da sentença.            No mérito, defende que, ao contrário do que afirma a sentença, a penhora do veículo de fato ocorreu, conforme se comprova no documento de fl. 72, com data anterior ao furto alegado (sinistro), e ainda que não tenha sido feita a constrição do bem, tal ato prevaleceu para o bloqueio administrativo do veículo junto ao DETRAN/PA, e que tal impedimento administrativo permaneceu até a data de interposição do presente recurso, pelo que se constata que o pagamento do seguro, em razão do furto, ocorreu de forma indevida, considerando que a Apelante encontra-se impossibilitada de transferir o veículo para o seu nome.            Aduz que o contrato de seguro celebrado entre as partes previa, sim, a obrigatoriedade da entrega de documentos do veículo livre e desembaraçados, sem qualquer ônus (item 9.5.2 - fl. 127), o que não ocorreu no presente caso, visto que o apelado omitiu tal informação, agindo de má-fé, na medida em que, com o impedimento administrativo do veículo junto ao DETRAN/PA, o bem encontrava-se a disposição do juízo, e, consequentemente, o proprietário do mesmo não poderia vendê-lo.            Por esses motivos, requer o conhecimento e provimento do presente recurso de Apelação, com a condenação do Apelado também ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.             A Apelação Cível foi recebida no seu duplo efeito (fl. 158).            Apesar de intimado, o Apelado não apresentou contrarrazões dentro do prazo legal (conforme certidão de fl. 160).            Redistribuído os autos à minha relatoria em 09/03/2012 (fl. 168).            É o Relatório, síntese do necessário. DECIDO. PRELIMINAR - CERCEAMENTO DE DEFESA    Alega a Apelante que teve seu direito de defesa cerceado, tendo em vista que não lhe foi dado vista para manifestação dos documentos juntados às fls. 130/134, oriundos da Justiça do Trabalho, a requerimento do juízo de primeiro grau.    Pois bem.    Analisando o andamento processual e as folhas seguintes à apresentação dos referidos documentos, resta evidente o cerceamento de defesa sofrido pela apelante, porquanto, de fato, não lhe foi oportunizado se manifestar sobre eles, o que seria essencial para o desfecho da causa, principalmente quando se verifica que, para proferir a sentença, o magistrado de 1º grau baseou seu convencimento justamente nos documentos provindos da justiça especializada.    A respeito da juntada de documentos, estatui o art. 398, do CPC: ¿Sempre que uma das partes requerer a juntada de documentos aos autos, o juiz ouvirá, a seu respeito, a outra, no prazo de 5 (cinco) dias.¿    Acerca do assunto, NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY in Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, São Paulo: Revista dos Tribunais, 6ª ed., 2002, p. 728, expõem que: ¿Após o deferimento de juntada dos documentos nos autos, o juiz deve determinar seja ouvida a parte contrária. Se isto não ocorrer e o documento influir no julgamento do juiz, em sentido contrário ao interesse da parte preterida, a sentença que vier a ser proferida é nula e assim deve ser declarada.¿    Importante destacar que essa exigência de se abrir vista à parte para se pronunciar sobre os documentos juntados, está diretamente vinculada à sua relevância para o deslinde da causa, ou seja, se o documento contribuiu para fundamentar a decisão, logicamente representou surpresa para a parte e sua impugnação se evidencia importante, implicando a ausência de contradita em nulidade a contaminar o processo.    Assim, se o documento juntado à fl. 130, que atesta que o veículo objeto da lide não se encontrava penhorado, orientou o juiz no sentido de julgar improcedente o pedido (conforme se observa na sentença, especificamente à fl. 136), é certo que a inobservância da regra estatuída no art. 398, do CPC, culminou por implicar na nulidade parcial do processo.    Por fim, sendo dominante na jurisprudência, inclusive do STJ, o entendimento de que a ausência de abertura de vista às partes de documentos que possam ter sido decisivos para o deslinde da demanda configura cerceamento de defesa, a preliminar deve ser acolhida. Senão vejamos: ¿RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. INDEFERIMENTO DE PROVA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO OPORTUNA. PRECLUSÃO. JUNTADA DE DOCUMENTO EM FASE RECURSAL. VISTA À PARTE CONTRÁRIA PARA MANIFESTAÇÃO. NECESSIDADE. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. 1. Ausente impugnação oportuna ao indeferimento da prova realizado em audiência de conciliação, a questão não pode ser discutida em sede de apelação, ante a ocorrência da preclusão. 2. Em atenção ao princípio do contraditório, a juntada de documento novo, mesmo na fase recursal, enseja sempre a manifestação da parte contrária. 3. Recurso especial conhecido em parte e provido.¿ (STJ - REsp: 592888 MG 2003/0166093-4, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 02/02/2010, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/02/2010) ¿PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. JUNTADA DE DOCUMENTOS APÓS CONTRA-RAZÕES DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA PARTE CONTRÁRIA. NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. VIOLAÇÃO DO ART. 398 DO CPC. APLICAÇÃO DA REGRA EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A juntada de documentos, após as contra-razões do agravo de instrumento, que influenciam no julgamento do recurso, sem a intimação da parte contrária para se manifestar, impõe o reconhecimento da nulidade do julgado por cerceamento de defesa. 2. A regra prevista no art. 398 do Código de Processo Civil tem aplicação em sede recursal, conforme lição de Pontes de Miranda sobre o tema (Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo IV-Arts. 282 a 443, Ed. Forense, 1974, pág. 385): "Se os documentos foram juntados na segunda instância, a regra jurídica do art. 398 incide: tal regra jurídica é relativa às provas, e não à primeira instância; está no Livro I, que é sobre o processo de cognição, em geral. Se o tribunal ou algum juiz que funcione na superior instância e possa admitir documento o admite, necessariamente tem de dar vista à outra parte com prazo de cinco dias." 3. Provimento do recurso especial.¿ (REsp 601.309/SC, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/12/2006, DJ 01/02/2007, p. 394)   ¿AÇÃO ORDINÁRIA - OUTORGA DE ESCRITURA PÚBLICA - MULTA CONTRATUAL - JUNTADA DE DOCUMENTOS - NÃO ABERTURA DE VISTA PARA A PARTE CONTRÁRIA - CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO - INTELIGÊNCIA DO ART. 398 DO CPC. A ausência de abertura de vista à parte contrária, a fim de se manifestar acerca dos documentos trazidos aos autos, implica em cerceamento do seu direito de defesa, pois não se admite, no nosso sistema jurídico constitucional, sentença proferida com fulcro em elemento de prova não submetido ao crivo do contraditório¿ (art. 398, do CPC e art. 5º, LV, da CF/88). (Apelação Cível 1.0028.07.013441-7/002, Relator (a): Des.(a) Tarcisio Martins Costa , 9ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/01/2012, publicação da sumula em 13/02/2012)            Diante de todo o exposto, seguindo o entendimento do STJ, DOU PROVIMENTO ao presente recurso de Apelação Cível, nos termos do art. 557, §1º-A do CPC, para ACOLHER A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA, anulando a sentença de fls. 135/138 e determinando que seja dada vista às partes sobre os documentos de fls. 130/134, antes que seja proferida decisão de mérito a nível de 1º grau.    À Secretaria para as devidas providências.     Belém/PA, 18 de agosto de 2015. DES. ROBERTO GONÇALVES DE MOURA, RELATOR (2015.03085111-31, Não Informado, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-08-24, Publicado em 2015-08-24)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 24/08/2015
Data da Publicação : 24/08/2015
Órgão Julgador : 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : ROBERTO GONCALVES DE MOURA
Número do documento : 2015.03085111-31
Tipo de processo : Apelação
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