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Jurisprudência


TJPA 0021313-03.2006.8.14.0401

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ COORDENADORIA DE RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS E ESPECIAIS PROCESSO Nº 0021313-03.2006.814.0401  RECURSO ESPECIAL      RECORRENTE: JOÃO JOSÉ FIGUEIREDO DE SOUZA RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ               Trata-se de recurso especial interposto por JOÃO JOSÉ FIGUEIREDO DE SOUZA, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea ¿a¿ e ¿c¿ da Constituição Federal, contra os vv. acórdãos no. 125.857 e 127.276, assim ementados: Acórdão nº. 125.857 (fl. 244/259) APELAÇÃO PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTIGO 1º, INCISO II, DA LEI 8.137/90. ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE DOLO. IRRELEVÂNCIA. DOSIMETRIA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. INOCORRÊNCIA. REPRIMENDA DEVIDAMENTE JUSTIFICADA. 1. Não procede a pretensão absolutória, sob o argumento de ausência de culpabilidade do apelante, pois este era sócio-gerente da empresa e possuia responsabilidade pelos atos praticados em nome daquela. Ademais, no caso, o tipo subjetivo se esgota no dolo genérico, não sendo necessário demonstrar o animus de obter o benefício indevido. 2. Não há que se falar em exacerbação da pena privativa de liberdade, se esta foi fixada pelo magistrado em estrita observância às diretrizes dos artigos 59 e 68 do Código Penal. 3. Recurso conhecido e improvido à unanimidade. Acórdão nº. 127.276 (fl. 269/275) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO PENAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REDISCUSSÃO DE MATÉRIA JÁ APRECIADA. IMPROVIMENTO. 1. Não existindo nenhuma das hipóteses previstas no art. 619 do CPP no acórdão impugnado, impõe-se o improvimento dos embargos declaratórios, os quais não se prestam para rediscussão de questões decididas unanimemente pelo órgão julgador. 2. Embargos improvidos à unanimidade               Em suas razões recursais, o recorrente aponta violação ao artigo 59, CP; artigos 386, II e IV, CPP; artigo 83, §4º, da Lei nº. 9.430/96; artigo 156, V, do CTN e art. 44 c/c 59, IV, do CP.               Contrarrazões apresentadas às fls. 405/423.               É o relatório. Decido.               Inicialmente, cumpre esclarecer que, não obstante a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil em 18 de março de 2016, os recursos interpostos, ainda que após a vigência do novo CPC, em face de decisões publicadas antes da entrada em vigor do mesmo, serão apreciados com arrimo nas normas do CPC de 1973.               Isso porque ainda que a lei processual possua aplicabilidade imediata aos processos em curso (¿tempus regit actum¿), é cediço que o processo é constituído por atos processuais individualizados que devem ser considerados separadamente dos demais para o fim de se determinar qual a lei que os rege. Pelo isolamento dos atos processuais, a lei nova não alcança os efeitos produzidos em atos já realizados até aquela fase processual, pré-existente à nova norma.               No caso em apreço, o ato jurídico perfeito que gerou direito ao recorrente foi o Acórdão nº 127.276, reputando-se consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou (art. 6º, §1º, da LINDB). Desta feita, considerando que o aresto objurgado foi publicado em 05/12/2013 (fl. 276), o recurso interposto contra a referida decisum será analisado com fulcro na Legislação Processual Civil de 1973. Ilustrativamente: PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ART. 8º DA LEI 12.514/2011. INAPLICABILIDADE ÀS AÇÕES EM TRÂMITE. NORMA PROCESSUAL. ART. 1.211 DO CPC. "TEORIA DOS ATOS PROCESSUAIS ISOLADOS". PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. (...) 3. O Art. 1.211 do CPC dispõe: "Este Código regerá o processo civil em todo o território brasileiro. Ao entrar em vigor, suas disposições aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes". Pela leitura do referido dispositivo conclui-se que, em regra, a norma de natureza processual tem aplicação imediata aos processos em curso. 4. Ocorre que, por mais que a lei processual seja aplicada imediatamente aos processos pendentes, deve-se ter conhecimento que o processo é constituído por inúmeros atos. Tal entendimento nos leva à chamada "Teoria dos Atos Processuais Isolados", em que cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar qual a lei que o rege, recaindo sobre ele a preclusão consumativa, ou seja, a lei que rege o ato processual é aquela em vigor no momento em que ele é praticado. Seria a aplicação do Princípio tempus regit actum. Com base neste princípio, temos que a lei processual atinge o processo no estágio em que ele se encontra, onde a incidência da lei nova não gera prejuízo algum às parte, respeitando-se a eficácia do ato processual já praticado. Dessa forma, a publicação e entrada em vigor de nova lei só atingem os atos ainda por praticar, no caso, os processos futuros, não sendo possível falar em retroatividade da nova norma, visto que os atos anteriores de processos em curso não serão atingidos. (...) 6. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp 1404796/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/03/2014, DJe 09/04/2014)               Dito isto, passo à análise do juízo regular de admissibilidade do presente recurso.               Verifico, in casu, que o insurgente satisfez os pressupostos de cabimento relativos à legitimidade, regularidade de representação, tempestividade e interesse recursal, inexistindo fato impeditivo ou extintivo ao direito de recorrer. Quanto ao preparo, este é dispensado em razão da natureza da Ação Penal (art. art. 3º, II da Resolução STJ/GP 03/2015). 1.     Da suposta ofensa ao art. 59 do Código Penal.               Com relação à suposta violação ao artigo 59 do CPB, o recorrente alega que as duas vetoriais valoradas de forma negativa (antecedentes criminais e motivos do crime), foram apreciadas sem fundamentação que justificasse a pena base fixada acima do mínimo legal.               Analisando a decisão guerreada, constata-se que quando da valoração dos ¿antecedentes criminais¿, a turma julgadora o valorou negativamente com base da certidão positiva de antecedentes às fls. 160/161.               No entanto, compulsando os autos, verifico o referido documento não relata o eventual trânsito em julgado das condenações, contrariando o escólio jurisprudencial do STJ, materializado na Súmula n.º 444, a qual preleciona: ¿é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base¿. Ilustrativamente: HABEAS CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. PENA-BASE. INQUÉRITOS E AÇÕES PENAIS EM ANDAMENTO. SÚMULA 444 DO STJ. CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE. MENORIDADE. QUANTUM DE REDUÇÃO. DESPROPORCIONALIDADE. TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA. MAJORAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. SÚMULA N. 443 DO STF. REGIME INICIAL FECHADO. ILEGALIDADE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. É da jurisprudência deste Tribunal que, em respeito ao princípio da presunção de não culpabilidade, inquéritos policiais ou ações penais em andamento não se prestam a majorar a pena-base, a título de indicador de maus antecedentes, de conduta social negativa ou de a personalidade do agente ser voltada para o crime. Inteligência do Enunciado Sumular n. 444 do STJ, segundo o qual "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base". 2. O Juiz de primeira instância utilizou-se de ação penal em andamento para atribuir valor negativo às circunstâncias da conduta social, dos antecedentes e da personalidade. Há registro de uma ação em que, embora haja informação de condenação contra o paciente, não consta o trânsito em julgado. (...) 10. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para reduzir a pena-base ao mínimo legal, reconhecer a ilegalidade na redução da pena em relação à menoridade relativa do réu, adotar o patamar de 1/3 para o aumento da reprimenda procedido na terceira etapa da dosimetria, resultando a pena definitiva do paciente em 5 anos e 4 meses de reclusão e 13 dias-multa, a ser cumprida no regime inicial semiaberto. (HC 228.310/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 03/03/2016, DJe 11/03/2016) HABEAS CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DILAÇÃO PROBATÓRIA. PENA-BASE. MAUS ANTECEDENTES. SÚMULA N. 444 DO STJ. REDUÇÃO DA REPRIMENDA AQUÉM DO MÍNIMO. VEDAÇÃO. SÚMULA N. 231 DO STJ. MAJORAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CRITÉRIO QUANTITATIVO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. SÚMULA N. 443 DO STJ. DIVERSIDADE DE VÍTIMAS. CONCURSO FORMAL. RECONHECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. REGIME. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. (..) 2. Inquéritos e ações penais em curso não podem evidenciar os maus antecedentes ou a personalidade desfavorável do agente, sob pena de malferimento ao princípio da não culpabilidade. Súmula n. 444 do STJ. 3. O juiz sentenciante não fez sequer menção à folha de antecedentes criminais do agente e muito menos indicou condenação com trânsito em julgado capaz de justificar a exasperação da pena-base. 4. As circunstâncias atenuantes não podem acarretar redução da pena em patamar inferior ao mínimo legal previsto, em respeito à vedação contida na Súmula n. 231 do STJ. (...) 11. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, a fim de reduzir ao mínimo legal a pena-base e o aumento da reprimenda procedido na terceira etapa da dosimetria. (HC 216.676/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 02/03/2016)               No que diz respeito aos motivos do crime, a vetorial foi valorada negativamente sob o seguinte fundamento: (...)Por sua vez, o motivo do crime também deve permanecer valorado de forma desfavorável ao apelante, tendo em vista que o réu conscientemente fez declarações falsas, ao omitir registros de entrada e saída de mercadorias, em documentos fiscais com o intuito de fraudar o Erário(...)               Pois bem.               Conforme consta no decreto condenatório às fls. 163/170, o réu foi condenado pelo crime tipificado no art. 1º, inciso II, da Lei 8.137/90 que preleciona: ¿Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; (...)¿ - grifo meu.               Logo, conclui-se que a fraude ao erário é elemento inerente ao tipo penal, não podendo ser valorada negativamente nas circunstâncias do art. 59, CP, sob pena de configuração de bis in nidem. É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos. HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO FISCAL. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CULPABILIDADE ELEVADA. UTILIZAÇÃO DE ELEMENTARES DO TIPO. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. DESFAVORABILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA E IDÔNEA. EXASPERAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL EM PARTE JUSTIFICADA.CONSTRANGIMENTO ILEGAL PARCIALMENTE EVIDENCIADO. 1. Não há como admitir como elevada a culpabilidade dos agentes ao argumento de terem cometido fraude contra a fiscalização tributária como meio de auferir maiores lucros, pois são circunstâncias inerentes ao próprio tipo penal violado (art. 1º, II e V, da Lei 8.137/90). 2. As consequências do crime, considerado o prejuízo da vítima, no caso o Fisco, é justificativa suficiente para elevar a pena na primeira etapa da dosimetria. Precedentes deste STJ. 3. Ordem concedida parcialmente para, afastada a valoração negativa da circunstância judicial da culpabilidade, redimensionar a pena de cada paciente definitivamente para 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, e pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença condenatória e do acórdão impugnado. (HC 154.729/PE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 28/02/2012, DJe 08/03/2012)               Portanto, considerando que o acórdão vergastado aparentemente está em dissonância com o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, o presente recurso especial merece ser admitido pela alínea 'a' do permissivo constitucional, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade.               Diante do exposto, dou seguimento ao recurso especial.               À Secretaria competente para as providências de praxe.               Belém, 13/06/2016 Desembargador RICARDO FERREIRA NUNES Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará Página de 6 a.p (2016.02412157-80, Não Informado, Rel. MILTON AUGUSTO DE BRITO NOBRE, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PENAL, Julgado em 2016-06-21, Publicado em 2016-06-21)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 21/06/2016
Data da Publicação : 21/06/2016
Órgão Julgador : 2ª TURMA DE DIREITO PENAL
Relator(a) : MILTON AUGUSTO DE BRITO NOBRE
Número do documento : 2016.02412157-80
Tipo de processo : Apelação
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