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Jurisprudência


TJPA 0024224-88.2012.8.14.0301

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ GABINETE DA DESEMBARGADORA DIRACY NUNES ALVES PROCESSO N. 0024224-88.2012.8.14.0301. SECRETARIA DA 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA APELAÇÃO CÍVEL. COMARCA DA CAPITAL. APELANTE: SILVANA ANDRADE DE SOUZA FRANCO. ADVOGADA: ELIZETE MARIA FERNANDES PASTANA RAMOS - OAB/PA 5971. APELADA: BV FINANCEIRA S/A CFI. ADVOGADA: CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES - OAB/PA 13.846-A E OUTROS. RELATORA: DESEMBARGADORA DIRACY NUNES ALVES. DECISÃO MONOCRÁTICA      Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por SILVANA ANDRADE DE SOUZA FRANCO em face de sentença prolatada pelo Juízo da 12ª Vara Cível de Belém que, nos autos de ação revisional de contrato de financiamento c/c repetição de indébito c/c pedido de tutela antecipada, julgou parcialmente procedente o pedido inicial para apenas afastar a incidência de comissão de permanência no contrato, porque cumulada com juros moratórios.      Irresignada, interpôs recurso de Apelação (fls. 116/122) alegando que o princípio, do pacta sunt servanda precisa ser relativizado diante das normas presentes no Código de Defesa do Consumidor, de modo que a sentença foi açodada porque não determinou a realização de perícia contábil, necessária para apuração das irregularidades apontadas. Requer que sejam analisados os pedidos constantes na inicial.      O recurso foi recebido em seu duplo efeito (fl. 13).      Contrarrazões às fls.133/155, pugnando pela manutenção da sentença.      Devidamente remetidos os autos a esta Egrégia Corte, coube-me a sua relatoria após distribuição (fl. 167).      Julgamento realizado sem observar a ordem cronológica, em face do permissivo do art. 12, §2º, III do CPC/2015.      É o breve relatório.      DECIDO.      Conheço do recurso porque preenchidos os requisitos de admissibilidade.      I- DA PRELIMINAR DE NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA - PERICIA.      Alega a recorrente que a sentença foi açodada porque necessária a produção de prova mediante perícia contábil, a qual demonstraria a abusividade contratual.       A questão posta em análise é verificar se o processo possui provas nos autos suficientes para que o Juízo possa estabelecer seu posicionamento. Em verdade, cabe ao juiz, destinatário das provas, decidir sobre a necessidade ou não da sua realização. A pesquisa será livre dentro da linha de seu raciocínio, dando o valor que julga ter cada uma delas. A produção de provas, portanto, constitui direito da parte, mas comporta temperamento ao critério da prudente discrição do magistrado que preside o feito, com base em fundamental juízo de valor acerca de sua utilidade e necessidade.      O juiz vela pela celeridade e instrumentalização do processo, evitando a ocorrência de provas inúteis, principalmente quando a sua análise prescinde de outros fatores estranhos aos já constantes nos autos, podendo ser plenamente analisada. Se o Juízo está satisfeito com as provas produzidas não há necessidade de realização de outras, valorizando assim o princípio da celeridade processual e razoável duração do processo. Esse entendimento é respaldado pelo art. 370 do CPC/2015, que assim dispõe: Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do processo. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias.      Neste sentido há jurisprudência do C. STJ: AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. RESTITUIÇÃO DO FUNDO DE RESERVA DE POUPANÇA. EXECUÇÃO DA SENTENÇA. PERÍCIA ATUARIAL. INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. I - Tendo concluído o Colegiado estadual que a apuração do valor da condenação não depende da realização de perícia atuarial, sendo possível sua obtenção por simples cálculos, não poderá a questão ser revista nesta sede excepcional sem o reexame das circunstâncias fáticas da causa, o que é vedado em âmbito de especial, a teor do enunciado 7 da Súmula desta Corte. II - Situação que não configura cerceamento de defesa, por estar a questão submetida ao princípio do livre convencimento do Juiz, consideradas as circunstâncias de cada caso concreto. Agravo improvido. (AgRg no Ag 688088/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/10/2008, DJe 23/10/2008)      Diante deste cenário, é permitido ao Juiz após verificar os fatos alegados na contestação apresentada estabelecer a necessidade ou não de prova testemunhal, pericial ou juntada de documentos posteriores. No caso específico dos autos o Juízo compreendeu que a instrução é suficiente e que se trata de matéria de direito.      Sem preliminares ou prejudiciais de mérito, passo a analisar o mérito da demanda. II - MÉRITO.       a) DA RELATIVIZAÇÃO DOS CONTRATOS DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO.       A questão da relativização dos contratos de financiamentos de veículos é fato claro nas cortes superiores, neste sentido já julgou o Superior Tribunal de Justiça em diversas oportunidades, tais como o AgRg no REsp n. 1.422.547/RS, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe de 14/03/2014; AgRg no AREsp n. 349.273/RN, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJe de 07/10/2013 e AgRg no REsp n. 1.245.399/SC, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, DJe de 04/03/2013, entre outros, tanto que o Juízo de Piso relativizou o contrato.       Quanto o efeito devolutivo presente no novo Código de Processo Civil, previsto no art. 1.013, §1º, entendo que apesar de ter sido feito de forma superficial, requereu a recorrente o deferimento de todas as parcelas tidas como abusivas em sua inicial, neste sentido nos ensina Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha: ¿Quanto à extensão, o grau de devolutividade é definido pelo recorrente no pedido recursal. Significa dizer que, ao deduzir o pedido de nova decisão, o recorrente delimita a extensão da devolutividade, a fim de que o tribunal possa julgar o recurso. O recorrente definirá o capítulo da sentença apelada que ele pretende seja reexaminado pelo tribunal.¿ (DIDIER JR., Fredie. CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e Processo nos Tribunais. vol. 3. 13ª ed. Salvador: JusPodivm, 2016. f. 177).      Deste modo, passo a analisar cada um dos elementos indicados como abusivos pela recorrente desde a sua inicial.       a.1) abusividade da taxa de juros.       Entende a recorrente que a taxa de juros praticada no contrato é abusiva, porque não estaria atrelado aos juros praticados pelo mercado.       A questão não merece maiores digressões, pois já foi devidamente analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, na metodologia dos recursos repetitivos: ¿(...) ORIENTAÇÃO. 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada- art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto¿. (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).      Deste modo, a abusividade dos juros remuneratórios, contratados com as instituições financeiras que compreendem o Sistema Financeiro Nacional, apenas pode ser reconhecida após comparação com a taxa média de mercado estabelecida pelo Banco Central, bem como as regras do Código de Defesa do Consumidor (Súmula n. 297 do STJ), no sentido de não se permitir a vantagem excessiva dos bancos em desfavor dos consumidores (artigos 39, inciso V, e 51, inciso IV). Uma vez constatado excesso na taxa praticada, cabível a revisão judicial. Neste sentido vem julgando o STJ já também em outras oportunidades, sempre considerando a taxa de juros remuneratórios como abusiva, quando discrepante da média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, à época da contratação. Vejamos: AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO REVISIONAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO AFASTADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. TAXA MÉDIA DE MERCADO. CABIMENTO. SÚMULA N. 294 DO STJ. NÃO-CUMULAÇÃO COM JUROS REMUNERATÓRIOS, CORREÇÃO MONETÁRIA, JUROS MORATÓRIOS E MULTA MORATÓRIA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. 1. A alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado. (sublinhei) 2. É lícita a cobrança de comissão de permanência após o vencimento da dívida, devendo ser observada a taxa média dos juros de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa de juros contratada para o período da normalidade (Súmula n. 294 do STJ). 3. Satisfeita a pretensão da parte recorrente, desaparece o interesse de agir. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 960.880 - RS (2007¿0138353-5 -.RELATOR MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, julgado em 03.12.2009).   PROCESSO CIVIL. CONTRATO BANCÁRIO. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. SÚMULA 7¿STJ. I - No paradigmático REsp 1.061.530¿RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, restou pacificado que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios da Lei de Usura (Decreto 22.626¿33) e que a sua fixação acima do patamar de 12%, por si só, não denota abusividade - hipótese em que é admitida a revisão do percentual. II - Constatada a significativa exorbitância na taxa praticada pela instituição financeira em comparação à média do mercado, não cabe a esta Corte, in casu, promover sua reavaliação, em homenagem à Súmula 7¿STJ. (sublinhei) III - Agravo regimental improvido .(AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 936.099 - RJ (2007¿0066386-2) Relator MINISTRO PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ¿BA) , julgado em 17.11.2009).      No caso dos autos, para a modalidade contratual em tela, vê-se que a taxa média apurada pelo Banco Central, no mês da celebração do contrato (04/2008, fl. 24), era de 29,81% ao ano (SGS - Sistema Gerenciador de Séries Temporais - v2.1)1. Contudo, a taxa anual estabelecida no contrato foi 33,22% ao ano (fl. 24), merecendo assim o contrato ser revisionado para minoração da taxa de juros para 29,81% ao ano. Portanto, merece reforma a sentença vergastada quanto ao ponto, nos termos da fundamentação. a.2) DOS JUROS CAPITALIZADOS       Alega o recorrente que é vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada, entendendo que esta pratica é ilegal.      O posicionamento do STJ é claro e consistente a respeito do tema. Ele vem admitindo a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual nos contratos celebrados após a edição da MP 1.963-17, de 30 de março de 2000, reeditada sob o nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001, desde que pactuada. Nesse sentido, o Recurso Especial Repetitivo Nº 973.827- RS, julgado em 08.08.2012, in verbis: CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO. 1. A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros. 2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de "taxa de juros simples" e "taxa de juros compostos", métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933. 3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada". 4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios. 5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado de inadimplência, que decorre da falta de demonstração da abusividade das cláusulas contratuais questionadas. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido. (REsp 973827/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 24/09/2012)      Deste modo, como a lei especial se sobrepõe à lei geral, o STJ já decidiu que não se aplica ao caso a regra geral do artigo 591 do Novo Código Civil, uma vez que as entidades integrantes do Sistema Financeiro Nacional estão sujeitas ao artigo 5º das referidas Medidas Provisórias, que possui caráter de lei especial, nos termos dos julgados do STJ. Em contratos formalizados após a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, a capitalização mensal não é ilegal e abusiva, bastando mera leitura da taxa de juros mensal e anual, quando a taxa anual supera a mera soma de doze taxas mensais.      No caso dos autos, segundo o quadro resumo de fl. 39 a taxa mensal de juros foi fixada em 2,42%, ao passo que a anual o foi em 33,22%, valor que supera doze vezes a taxa mensal que totalizaria 29,04%.      Portanto não há abusividade na capitalização dos juros.      a.3) ilegalidade das taxas de emissão de boletos e análise de crédito      Quanto as taxas de COBRANÇA DE TARIFA DE CADASTRO E TARIFA DE EMISSÃO DE CARNÊ não há maiores digressões.      O Superior Tribunal de Justiça publicou a Súmula n. 565, em 24/02/2016, segundo a qual ¿A pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, é válida apenas nos contratos bancários anteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/04/2008¿.      Verifica-se que o contrato celebrado entre as partes foi assinado em 30/04/2008 e, por consequência, a cobrança de tarifa de cadastro e de emissão de carnê são inválidas, consideradas abusivas.      III- DO DISPOSITIVO.      Ante o exposto, conheço do recurso e o julgo parcialmente procedente para modificar a sentença vergastada nos seguintes pontos:      a) revisionar a taxa de juros para 29,81% ao ano, conforme posicionamento do STJ.      b) excluir a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), conforme Súmula 565 do STJ.      Redimensiono os honorários advocatícios. Em razão da sucumbência reciproca fixo os honorários sucumbenciais em 50% para cada uma das partes, bem como condeno o recorrente a pagar R$500,00 (quinhentos reais) de honorários ao advogado do recorrido, condenação esta que fica suspensa em razão da assistência judiciária e condeno o banco a pagar R$1.000,00 (mil reais) para o advogado do recorrente.      É como voto.      Belém, 7 de julho de 2016. Desembargadora DIRACY NUNES ALVES RELATORA 1 Disponível em https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries (2016.02716983-21, Não Informado, Rel. DIRACY NUNES ALVES, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2016-07-11, Publicado em 2016-07-11)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 11/07/2016
Data da Publicação : 11/07/2016
Órgão Julgador : 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA
Relator(a) : DIRACY NUNES ALVES
Número do documento : 2016.02716983-21
Tipo de processo : Apelação
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