TJPA 0025577-68.2008.8.14.0301
PROCESSO N.º 20143026955-1 SECRETARIA DA 2º CÂMARA CÍVEL ISOLADA APELANTE: ESTADO DO PARÁ PROCURADOR DO ESTADO: JOSÉ RUBENS BARREIRO DE LEÃO APELADO: MARCOS DAVID TOBELEM ADGOVADO: BRUNO NATAN ABRAHAM BENCHIMOL OAB/PA N.º 12.998 RELATOR: JUIZ CONVOCADO JOSÉ ROBERTO P. M. BEZERRA JÚNIOR DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Reexame Necessário e Recurso de Apelação interposto pelo ESTADO DO PARÁ contra a sentença de fls. 196/203, que, nos autos da Ação de Reclamação Trabalhista proposta por Marcos David Tobelem, julgou parcialmente procedente os pedidos da inicial para condenar o réu a pagar ao autor os valores referentes aos depósitos do FGTS, excluindo-se as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação, acrescida de correção monetária pelo índice do INPC/IBGE, a contar da data que deveriam ter sido pagos e juros de mora a contar da data do trânsito em julgado da sentença, a ser calculado pelo indicie aplicado à caderneta de poupança, em atendimento ao disposto no art. 1º-F, da Lei n.º 9.494/97, devendo ser abatido os descontos legais. O Estado do Pará, em suas razões recusais (fls. 204/2018), sustenta, preliminarmente, que o autor da ação não requereu em petição inicial a nulidade do contrato de trabalho celebrado com o réu, logo não poderia julgar procedente a ação, ocasionando um julgamento extra petita. Assim, pleiteia a improcedência, sob pena de violação do art. 168 e 460 do CPC. Alega ainda a não aplicação dos recentes entendimentos adotados pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, uma vez que não se enquadram ao caso em exame. Por conseguinte, aduz que o vínculo mantido com o servidor temporário possui natureza administrativa, incompatível, portanto, o depósito do FGTS, tipo benefício trabalhista, que protege o trabalhador contra a despedida arbitrária, em substituição à antiga estabilidade. O recurso foi recebido no duplo efeito (fl. 220). Em contrarrazões, o apelado Marcos David Tobelem indica, à fl. 98, que requereu a nulidade do contrato, bem como esclareceu que faz jus ao benefício trabalhista. Nesta instância, o Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e provimento do Recurso de Apelação, afim de que seja reformada a sentença atacada e, por conseguinte, seja julgada improcedente a ação (fls. 230/235). É o relatório. DECIDO. Presente os pressupostos de admissibilidade, conheço do reexame necessário e do recurso de apelação. Ab initio, impende consignar que a demanda, inicialmente, foi proposta perante a Justiça do Trabalho, sendo certo que foi reconhecida a incompetência daquela Especializada conforme decisão de fls. 57. Feitas essas considerações, esclareço que se trata de reclamatória trabalhista, promovida com intuito de recebimento de verbas provenientes de contrato firmado entre o autor e o Estado do Pará. Na peça inicial, o apelado Marcos David Tobelem narrou que foi contratado pelo Estado para exercer a função de Agente Prisional, lotado na Superintendência do Sistema Penal do Estado do Pará, o que ocorreu no período de fevereiro de 2005 até 15 de abril de 2008. Discorre que trabalhava em jornada de 24 horas de trabalho por 48 horas de descanso, contudo, somente consta adicional noturno em seus contracheques no mês de março de 2008, restando sem pagamento ao adicional nos demais meses de contrato. Também não teve sua CTPS anotada, bem como não foi recolhido seu FGTS. Por fim, relata que não foi pago qualquer quantia a título de rescisão. Assim, requereu a nulidade do contrato de trabalho administrativo temporário, assinatura da CTPS, sendo ainda determinada a notificação do INSS para fins de direito, a condenação do reclamado ao pagamento do FGTS de todo o pacto, e seu levantamento em favor do autor no importe de R$-4.078,92, indenização com base nas verbas trabalhistas devidas, totalizando R$-15.071,77. Ao sentenciar, a MM. Juiz de primeiro grau julgou parcialmente procedente os pedidos iniciais, reconhecendo a nulidade do contrato de trabalho firmado entre as partes e condenando o Estado ao depósito do FGTS. PRELIMINAR: AUSÊNCIA DO PEDIDO DE NULIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO Inicialmente, faz-se imprescindível analisar a alegação do Estado do Pará quanto à ausência de pedido de nulidade do contrato de trabalho firmado entre as partes, argumentando que o autor da ação não requereu em momento algum a nulidade do referido contrato, não podendo ser conhecido de ofício. Compulsando os autos, verifica-se a total improcedência do pedido formulado pelo Estado, posto que o autor claramente requereu a nulidade do contrato de trabalho (fl. 06), bem como reforçou tal pedido quando emendou a inicial à fl. 98. Portanto, rejeito a preliminar. Passo ao mérito. A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso IX, autorizou, excepcionalmente, à Administração Pública a contratação temporária de servidores, sem concurso público, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Com efeito, a Constituição deixou a cargo da Administração Pública estabelecer as regras acerca do prazo de vigência do contrato, das atividades a serem exercidas, atribuições, responsabilidades, e dos direitos e deveres dos servidores contratados, submetendo-os ao regime jurídico especial mais conhecido por regime especial de direito administrativo, instituído por lei específica. No caso em apreço, verifica-se que o apelado foi contratado em regime temporário para exercer a função de Agente Penitenciário, não deixando dúvidas quanto à caracterização da relação de trabalho, mormente diante do tempo em que o autor exerceu a sua função, admitido em fevereiro de 2005 até 15 de abril de 2008. O autor permaneceu trabalhando por mais de três anos descaracterizando, portanto, a contratação temporária e burlando a obrigatoriedade do concurso público. Assim, fica evidente a autorização de declaração de nulidade do contrato dito como ¿temporário¿ para garantir o direito ao recebimento das verbas de FGTS, conforme disciplina o art. 19-A da Lei n.º 8.036/90, vejamos: ¿Art. 19-A. É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)¿ Assim, andou bem o magistrado de primeiro grau ao reconhecer a nulidade do contrato, uma vez que o réu, ora apelante, não apresentou qualquer argumento acerca da urgência e da excepcionalidade do interesse público da contratação do autor. Não havendo notícias, ainda, de qualquer situação ou circunstância ocorrida no Estado que tenha tornado urgentes tal contratação, impedindo a realização de concurso público. Desta forma, diversamente do que assevera o recorrente, trata-se de hipótese de trabalhador que teve o contrato de trabalho com a Administração declarado nulo em razão da inobservância da regra constitucional insculpida no art. 37, II, da Constituição da República, Por oportuno, e para ilustrar, transcrevo o conteúdo do art. 37, II, III, e §2º, da Constituição: "Art. 37. Omissis. (...) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração. III - o prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período; (...) §2º A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei." A presente questão já se encontra pacificada pelo E. Supremo Tribunal Federal. Com efeito, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 596478, o Pretório Excelso reconheceu a repercussão geral da matéria, asseverando ser constitucional o art. 19-A, da Lei nº 8.036/90, que dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) na conta de trabalhador que teve seu contrato com a Administração Pública declarado nulo, em decorrência de não aprovação prévia em concurso público, como determina o art. 37, § 2º, da Constituição Federal. Explicita ainda o julgado da Corte Suprema que tal direito é assegurado ao trabalhador, apenas quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. Assim restou ementado aquele decisum: EMENTA Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento . ( RE 596478 , Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013 EMENT VOL-02679-01 PP-00068) . (Grifei). Em que pese a origem deste Recurso Extraordinário ter sido proveniente da Justiça do Trabalho de Roraima, o cerne da questão diz respeito aos efeitos da decretação de nulidade do contrato celebrado entre o Particular e a Administração Pública, contratado sem concurso público, não tendo discutido a respeito do regime de trabalho ao qual o trabalhador estava submetido. Desse modo, entendo que tal precedente jurisprudencial se aplica ao caso em análise, posto que a parte foi contratada pela Administração Pública, em regime previsto no art. 37, inciso IX, da CF/88, e cujo contrato foi declarado nulo, em virtude de inobservância dos preceitos constitucionais, sendo-lhe devido o pagamento do FGTS. O E. Superior Tribunal de Justiça já sedimentou entendimento nessa direção: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. CONTRATO TEMPORÁRIO SEM CONCURSO PÚBLICO. DEPÓSITO DE FGTS. OBRIGATORIEDADE. PRETENSÃO DE PREQUESTIONAMENTO DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL PARA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE VÍCIOS NO JULGADO. (...) 4. O STF entende que "é devida a extensão dos direitos sociais previstos no art. 7º da Constituição Federal a servidor contratado temporariamente, nos moldes do art. 37, inciso IX, da referida Carta da República, notadamente quando o contrato é sucessivamente renovado" (AI 767.024-AgR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe 24.4.2012). 5. O STJ firmou, sob o rito do art. 543-C do CPC, entendimento no sentido de que a declaração de nulidade do contrato de trabalho, em razão da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público, equipara-se à ocorrência de culpa recíproca, gerando para o trabalhador o direito ao levantamento das quantias depositadas na sua conta vinculada ao FGTS (REsp 1.110.848/RN, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Seção, DJe 3.8.2009). 6. Por expressa previsão legal, é devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário (art. 19-A da Lei 8.036/90, incluído pela MP 2.164-41/2001). (...) Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgRg no REsp 1440935/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 12/06/2014). (Grifei). A jurisprudência deste C. Tribunal de Justiça também se alinha a essa interpretação: APELAÇÕES CÍVEIS. FGTS. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO REJEITADA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. INEXISTÊNCIA. ART.19-A DA LEI Nº 8.036/1990. PRESCRIÇÃO TRINTENAL. SERVIDOR PÚBLICO CONTRATADO DE FORMA TEMPORÁRIA. BASE DE CÁLCULO. ART.15 DA LEI Nº 8.036/1990. JUROS DE MORA. ART. 1º-F DA LEI Nº 11.960/2009. (...) 2. O Excelso Supremo Tribunal Federal, em julgamento do Recurso Extraordinário n° 596478, no qual se reconheceu repercussão geral, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra constitucional que estabelece prévia aprovação em concurso público. 3. Assim sendo, resta patente o direito que possui a apelada quanto ao pagamento dos depósitos de FGTS, ante a constitucionalidade do art. 19-A da Lei n° 8.036/1990. 4. Quanto a base de cálculo para cômputo dos valores devidos a título de FGTS, deve ser adotada a remuneração do servidor temporário, na forma do artigo 15 da Lei nº 8.036/1990. (...). (201130140176, 131652, Rel. JOSE MARIA TEIXEIRA DO ROSARIO, Órgão Julgador 4ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 31/03/2014, Publicado em 22/04/2014). (Grifei). Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. FGTS. SERVIDOR TEMPORÁRIO. AUSÊNCIA DE CONCURSO PUBLICO. CONTRATO NULO. CULPA RECÍPROCA. DIREITO AOS DEPÓSITOS DO FGTS. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STF E PELO STJ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (...) II - A nulidade, na esfera administrativa, que pode ser declarada pela própria Administração Pública ou pelo Judiciário, opera efeitos ex tunc. Significa dizer que o ato é nulo desde a sua celebração. Assim sendo, desde o ingresso dos servidores no âmbito da Administração Pública, o vínculo não se concretizou, existindo entre eles, tão-somente, uma relação de fato que, no entanto, gera efeitos jurídicos. III - Em relação ao FGTS, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 596478, no qual reconheceu repercussão geral, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra constitucional que estabelece prévia aprovação em concurso público, nos termos do art. 19 da lei nº 8.036/90. Já está pacificado, também, no Superior Tribunal de Justiça que, ainda que nulo o contrato de trabalho do servidor temporário, ele terá direito ao recolhimento do FGTS, devido pelo período em que prestou serviços à Administração Pública. IV - Diante do entendimento mais recente do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo tribunal Federal, não há mais dúvida, portanto, de que o servidor contratado de forma temporária pela Administração Pública, ou seja, sem prévia aprovação em concurso público, tem direito ao recolhimento dos depósitos do FGTS, em razão de ser considerada, como decorrência da nulidade do contrato, a culpa recíproca, que garante ao servidor o direito aos referidos depósitos. V - Diante do exposto, conheço do recurso de apelação e dou-lhe provimento, para reformar a sentença, condenando o réu a pagar ao autor os valores referentes aos depósitos do FGTS do período compreendido entre 01 de março de 1991 a 31 de julho de 2008. (201330187796, 129382, Rel. GLEIDE PEREIRA DE MOURA, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 10/02/2014, Publicado em 12/02/2014). (Grifei). Por fim, quanto ao pedido de honorários de sucumbência formulado em contrarrazões, entendo que não merece ser conhecido, uma vez que a insurgência só poderia ser examinada por este E. Tribunal se tivesse sido articulada pela via adequada, que no caso seria o recurso de apelação. ANTE O EXPOSTO, com base no art. 557, do CPC e de tudo mais que nos autos consta, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL EM REEXAME NECESSÁRIO, NEGO-LHE PROVIMENTO, confirmando a sentença vergastada, tudo nos moldes e limites da fundamentação lançada, que passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse totalmente transcrita. Oficie-se ao juízo a quo comunicando a presente decisão. P.R.I. Belém, 10 de fevereiro de 2015. JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JÚNIOR RELATOR/JUIZ CONVOCADO
(2015.00459201-03, Não Informado, Rel. JOSE ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR - JUIZ CONVOCADO - JUIZ CONVOCADO, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-02-12, Publicado em 2015-02-12)
Ementa
PROCESSO N.º 20143026955-1 SECRETARIA DA 2º CÂMARA CÍVEL ISOLADA APELANTE: ESTADO DO PARÁ PROCURADOR DO ESTADO: JOSÉ RUBENS BARREIRO DE LEÃO APELADO: MARCOS DAVID TOBELEM ADGOVADO: BRUNO NATAN ABRAHAM BENCHIMOL OAB/PA N.º 12.998 RELATOR: JUIZ CONVOCADO JOSÉ ROBERTO P. M. BEZERRA JÚNIOR DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Reexame Necessário e Recurso de Apelação interposto pelo ESTADO DO PARÁ contra a sentença de fls. 196/203, que, nos autos da Ação de Reclamação Trabalhista proposta por Marcos David Tobelem, julgou parcialmente procedente os pedidos da inicial para condenar o réu a pagar ao autor os valores referentes aos depósitos do FGTS, excluindo-se as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação, acrescida de correção monetária pelo índice do INPC/IBGE, a contar da data que deveriam ter sido pagos e juros de mora a contar da data do trânsito em julgado da sentença, a ser calculado pelo indicie aplicado à caderneta de poupança, em atendimento ao disposto no art. 1º-F, da Lei n.º 9.494/97, devendo ser abatido os descontos legais. O Estado do Pará, em suas razões recusais (fls. 204/2018), sustenta, preliminarmente, que o autor da ação não requereu em petição inicial a nulidade do contrato de trabalho celebrado com o réu, logo não poderia julgar procedente a ação, ocasionando um julgamento extra petita. Assim, pleiteia a improcedência, sob pena de violação do art. 168 e 460 do CPC. Alega ainda a não aplicação dos recentes entendimentos adotados pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, uma vez que não se enquadram ao caso em exame. Por conseguinte, aduz que o vínculo mantido com o servidor temporário possui natureza administrativa, incompatível, portanto, o depósito do FGTS, tipo benefício trabalhista, que protege o trabalhador contra a despedida arbitrária, em substituição à antiga estabilidade. O recurso foi recebido no duplo efeito (fl. 220). Em contrarrazões, o apelado Marcos David Tobelem indica, à fl. 98, que requereu a nulidade do contrato, bem como esclareceu que faz jus ao benefício trabalhista. Nesta instância, o Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e provimento do Recurso de Apelação, afim de que seja reformada a sentença atacada e, por conseguinte, seja julgada improcedente a ação (fls. 230/235). É o relatório. DECIDO. Presente os pressupostos de admissibilidade, conheço do reexame necessário e do recurso de apelação. Ab initio, impende consignar que a demanda, inicialmente, foi proposta perante a Justiça do Trabalho, sendo certo que foi reconhecida a incompetência daquela Especializada conforme decisão de fls. 57. Feitas essas considerações, esclareço que se trata de reclamatória trabalhista, promovida com intuito de recebimento de verbas provenientes de contrato firmado entre o autor e o Estado do Pará. Na peça inicial, o apelado Marcos David Tobelem narrou que foi contratado pelo Estado para exercer a função de Agente Prisional, lotado na Superintendência do Sistema Penal do Estado do Pará, o que ocorreu no período de fevereiro de 2005 até 15 de abril de 2008. Discorre que trabalhava em jornada de 24 horas de trabalho por 48 horas de descanso, contudo, somente consta adicional noturno em seus contracheques no mês de março de 2008, restando sem pagamento ao adicional nos demais meses de contrato. Também não teve sua CTPS anotada, bem como não foi recolhido seu FGTS. Por fim, relata que não foi pago qualquer quantia a título de rescisão. Assim, requereu a nulidade do contrato de trabalho administrativo temporário, assinatura da CTPS, sendo ainda determinada a notificação do INSS para fins de direito, a condenação do reclamado ao pagamento do FGTS de todo o pacto, e seu levantamento em favor do autor no importe de R$-4.078,92, indenização com base nas verbas trabalhistas devidas, totalizando R$-15.071,77. Ao sentenciar, a MM. Juiz de primeiro grau julgou parcialmente procedente os pedidos iniciais, reconhecendo a nulidade do contrato de trabalho firmado entre as partes e condenando o Estado ao depósito do FGTS. PRELIMINAR: AUSÊNCIA DO PEDIDO DE NULIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO Inicialmente, faz-se imprescindível analisar a alegação do Estado do Pará quanto à ausência de pedido de nulidade do contrato de trabalho firmado entre as partes, argumentando que o autor da ação não requereu em momento algum a nulidade do referido contrato, não podendo ser conhecido de ofício. Compulsando os autos, verifica-se a total improcedência do pedido formulado pelo Estado, posto que o autor claramente requereu a nulidade do contrato de trabalho (fl. 06), bem como reforçou tal pedido quando emendou a inicial à fl. 98. Portanto, rejeito a preliminar. Passo ao mérito. A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso IX, autorizou, excepcionalmente, à Administração Pública a contratação temporária de servidores, sem concurso público, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Com efeito, a Constituição deixou a cargo da Administração Pública estabelecer as regras acerca do prazo de vigência do contrato, das atividades a serem exercidas, atribuições, responsabilidades, e dos direitos e deveres dos servidores contratados, submetendo-os ao regime jurídico especial mais conhecido por regime especial de direito administrativo, instituído por lei específica. No caso em apreço, verifica-se que o apelado foi contratado em regime temporário para exercer a função de Agente Penitenciário, não deixando dúvidas quanto à caracterização da relação de trabalho, mormente diante do tempo em que o autor exerceu a sua função, admitido em fevereiro de 2005 até 15 de abril de 2008. O autor permaneceu trabalhando por mais de três anos descaracterizando, portanto, a contratação temporária e burlando a obrigatoriedade do concurso público. Assim, fica evidente a autorização de declaração de nulidade do contrato dito como ¿temporário¿ para garantir o direito ao recebimento das verbas de FGTS, conforme disciplina o art. 19-A da Lei n.º 8.036/90, vejamos: ¿Art. 19-A. É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)¿ Assim, andou bem o magistrado de primeiro grau ao reconhecer a nulidade do contrato, uma vez que o réu, ora apelante, não apresentou qualquer argumento acerca da urgência e da excepcionalidade do interesse público da contratação do autor. Não havendo notícias, ainda, de qualquer situação ou circunstância ocorrida no Estado que tenha tornado urgentes tal contratação, impedindo a realização de concurso público. Desta forma, diversamente do que assevera o recorrente, trata-se de hipótese de trabalhador que teve o contrato de trabalho com a Administração declarado nulo em razão da inobservância da regra constitucional insculpida no art. 37, II, da Constituição da República, Por oportuno, e para ilustrar, transcrevo o conteúdo do art. 37, II, III, e §2º, da Constituição: "Art. 37. Omissis. (...) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração. III - o prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período; (...) §2º A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei." A presente questão já se encontra pacificada pelo E. Supremo Tribunal Federal. Com efeito, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 596478, o Pretório Excelso reconheceu a repercussão geral da matéria, asseverando ser constitucional o art. 19-A, da Lei nº 8.036/90, que dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) na conta de trabalhador que teve seu contrato com a Administração Pública declarado nulo, em decorrência de não aprovação prévia em concurso público, como determina o art. 37, § 2º, da Constituição Federal. Explicita ainda o julgado da Corte Suprema que tal direito é assegurado ao trabalhador, apenas quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. Assim restou ementado aquele decisum: EMENTA Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento . ( RE 596478 , Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013 EMENT VOL-02679-01 PP-00068) . (Grifei). Em que pese a origem deste Recurso Extraordinário ter sido proveniente da Justiça do Trabalho de Roraima, o cerne da questão diz respeito aos efeitos da decretação de nulidade do contrato celebrado entre o Particular e a Administração Pública, contratado sem concurso público, não tendo discutido a respeito do regime de trabalho ao qual o trabalhador estava submetido. Desse modo, entendo que tal precedente jurisprudencial se aplica ao caso em análise, posto que a parte foi contratada pela Administração Pública, em regime previsto no art. 37, inciso IX, da CF/88, e cujo contrato foi declarado nulo, em virtude de inobservância dos preceitos constitucionais, sendo-lhe devido o pagamento do FGTS. O E. Superior Tribunal de Justiça já sedimentou entendimento nessa direção: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. CONTRATO TEMPORÁRIO SEM CONCURSO PÚBLICO. DEPÓSITO DE FGTS. OBRIGATORIEDADE. PRETENSÃO DE PREQUESTIONAMENTO DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL PARA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE VÍCIOS NO JULGADO. (...) 4. O STF entende que "é devida a extensão dos direitos sociais previstos no art. 7º da Constituição Federal a servidor contratado temporariamente, nos moldes do art. 37, inciso IX, da referida Carta da República, notadamente quando o contrato é sucessivamente renovado" (AI 767.024-AgR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe 24.4.2012). 5. O STJ firmou, sob o rito do art. 543-C do CPC, entendimento no sentido de que a declaração de nulidade do contrato de trabalho, em razão da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público, equipara-se à ocorrência de culpa recíproca, gerando para o trabalhador o direito ao levantamento das quantias depositadas na sua conta vinculada ao FGTS (REsp 1.110.848/RN, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Seção, DJe 3.8.2009). 6. Por expressa previsão legal, é devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário (art. 19-A da Lei 8.036/90, incluído pela MP 2.164-41/2001). (...) Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgRg no REsp 1440935/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 12/06/2014). (Grifei). A jurisprudência deste C. Tribunal de Justiça também se alinha a essa interpretação: APELAÇÕES CÍVEIS. FGTS. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO REJEITADA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. INEXISTÊNCIA. ART.19-A DA LEI Nº 8.036/1990. PRESCRIÇÃO TRINTENAL. SERVIDOR PÚBLICO CONTRATADO DE FORMA TEMPORÁRIA. BASE DE CÁLCULO. ART.15 DA LEI Nº 8.036/1990. JUROS DE MORA. ART. 1º-F DA LEI Nº 11.960/2009. (...) 2. O Excelso Supremo Tribunal Federal, em julgamento do Recurso Extraordinário n° 596478, no qual se reconheceu repercussão geral, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra constitucional que estabelece prévia aprovação em concurso público. 3. Assim sendo, resta patente o direito que possui a apelada quanto ao pagamento dos depósitos de FGTS, ante a constitucionalidade do art. 19-A da Lei n° 8.036/1990. 4. Quanto a base de cálculo para cômputo dos valores devidos a título de FGTS, deve ser adotada a remuneração do servidor temporário, na forma do artigo 15 da Lei nº 8.036/1990. (...). (201130140176, 131652, Rel. JOSE MARIA TEIXEIRA DO ROSARIO, Órgão Julgador 4ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 31/03/2014, Publicado em 22/04/2014). (Grifei). APELAÇÃO CÍVEL. FGTS. SERVIDOR TEMPORÁRIO. AUSÊNCIA DE CONCURSO PUBLICO. CONTRATO NULO. CULPA RECÍPROCA. DIREITO AOS DEPÓSITOS DO FGTS. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STF E PELO STJ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (...) II - A nulidade, na esfera administrativa, que pode ser declarada pela própria Administração Pública ou pelo Judiciário, opera efeitos ex tunc. Significa dizer que o ato é nulo desde a sua celebração. Assim sendo, desde o ingresso dos servidores no âmbito da Administração Pública, o vínculo não se concretizou, existindo entre eles, tão-somente, uma relação de fato que, no entanto, gera efeitos jurídicos. III - Em relação ao FGTS, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 596478, no qual reconheceu repercussão geral, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra constitucional que estabelece prévia aprovação em concurso público, nos termos do art. 19 da lei nº 8.036/90. Já está pacificado, também, no Superior Tribunal de Justiça que, ainda que nulo o contrato de trabalho do servidor temporário, ele terá direito ao recolhimento do FGTS, devido pelo período em que prestou serviços à Administração Pública. IV - Diante do entendimento mais recente do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo tribunal Federal, não há mais dúvida, portanto, de que o servidor contratado de forma temporária pela Administração Pública, ou seja, sem prévia aprovação em concurso público, tem direito ao recolhimento dos depósitos do FGTS, em razão de ser considerada, como decorrência da nulidade do contrato, a culpa recíproca, que garante ao servidor o direito aos referidos depósitos. V - Diante do exposto, conheço do recurso de apelação e dou-lhe provimento, para reformar a sentença, condenando o réu a pagar ao autor os valores referentes aos depósitos do FGTS do período compreendido entre 01 de março de 1991 a 31 de julho de 2008. (201330187796, 129382, Rel. GLEIDE PEREIRA DE MOURA, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 10/02/2014, Publicado em 12/02/2014). (Grifei). Por fim, quanto ao pedido de honorários de sucumbência formulado em contrarrazões, entendo que não merece ser conhecido, uma vez que a insurgência só poderia ser examinada por este E. Tribunal se tivesse sido articulada pela via adequada, que no caso seria o recurso de apelação. ANTE O EXPOSTO, com base no art. 557, do CPC e de tudo mais que nos autos consta, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL EM REEXAME NECESSÁRIO, NEGO-LHE PROVIMENTO, confirmando a sentença vergastada, tudo nos moldes e limites da fundamentação lançada, que passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse totalmente transcrita. Oficie-se ao juízo a quo comunicando a presente decisão. P.R.I. Belém, 10 de fevereiro de 2015. JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JÚNIOR RELATOR/JUIZ CONVOCADO
(2015.00459201-03, Não Informado, Rel. JOSE ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR - JUIZ CONVOCADO - JUIZ CONVOCADO, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-02-12, Publicado em 2015-02-12)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
12/02/2015
Data da Publicação
:
12/02/2015
Órgão Julgador
:
2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
JOSE ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR - JUIZ CONVOCADO - JUIZ CONVOCADO
Número do documento
:
2015.00459201-03
Tipo de processo
:
Apelação / Remessa Necessária
Mostrar discussão