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Jurisprudência


TJPA 0026488-78.2012.8.14.0301

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ PROCESSO Nº 00264887820128140301 ÓRGÃO JULGADOR: 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA RECURSO: APELAÇÃO CÍVEL COMARCA: BELÉM (4ª VARA DA FAZENDA) APELANTE: ESTADO DO PARÁ (PROCURADORA DO ESTADO RENATA DE CASSIA CARDOSO DE MAGALHÃES) APELADO: PEDRO SILVA DE OLIVEIRA (DEFENSOR PÚBLICO RODRIGO CERQUEIRA DE MIRANDA) RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO DECISÃO MONOCRÁTICA          Trata-se de apelação cível interposta ESTADO DO PARÁ, por intermédio da Procuradora do Estado Renata de Cássia Cardoso Magalhães, em face da decisão proferida pelo Juízo de Direito da 4ª Vara da Fazenda da Comarca de Belém, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer ajuizada por PEDRO SILVA DE OLIVEIRA.          Por meio da decisão apelada, o sentenciante julgou procedente o pedido formulado na inicial, ratificando os termos da tutela antecipada deferida, para que o Estado do Pará forneça o medicamento JANUVIA 100 mg, enquanto se fizer necessário para o tratamento do recorrido, que é portador de Diabetes Mellitos Descompensado.          Em suas razões recursais, o apelante alega, inicialmente, que é parte ilegítima da demanda, ao argumento de que a obrigação de fornecer os medicamentos da assistência farmacêutica básica é do Município.          Aduz que o artigo 196 da Constituição Federal utilizado como fundamento para o deferimento do pedido não detém o alcance e a dimensão que lhe vem sendo atribuído, tratando-se de norma de eficácia limitada, cujos limites são determinados pela política nacional de saúde pública definida pela legislação ordinária que não pode ser desconsiderada pelo Poder Judiciário.          Discorre acerca dos princípios que regem o Sistema Único de Saúde - SUS, dentre os quais destaca a universalidade do acesso e o caráter democrático descentralizado da administração, explicando que esse princípio prevê atribuições próprias para cada esfera de governo, redistribuindo as responsabilidades pelas ações e serviços de saúde e orientando a regulamentação do sistema pautada pela municipalização na implementação das ações.          Sustenta que a sentença que atribuiu a responsabilidade ao Estado do Pará deve ser reformada, na medida em que compete ao Município de Belém o fornecimento do tratamento de saúde demandado, pois o referido Município aderiu ao Sistema de ¿Gestão Plena¿ dos recursos recebidos pelo Estado do Pará e pelo Fundo Nacional de Saúde, mormente diante da Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde - NOB-SUS/1996.          Aduz, ainda, que não pode o Estado do Pará ser responsabilizado pelo fornecimento do tratamento ao assistido, porque o Município de Belém vem recebendo os repasses de verbas estaduais e federais para viabilização da Gestão Plena de seu Sistema de Saúde.          Complementa ser incabível a condenação do Ente Estadual no que concerne aos honorários advocatícios, vez que sendo o patrocínio da Defensoria Pública, ou seja, em face da Fazenda Pública que a remunera, não há que se falar em pagamento da verba em tela, conforme entendimento da Súmula 421 do STJ.          Por fim, requer o total provimento do apelo para reforma da sentença recorrida afastando a condenação imposta ao Estado do Pará.          O recurso foi recebido apenas no efeito devolutivo, conforme decisão de fl. 123.          Contrarrazões às fls. 124/135 pela manutenção integral da sentença e não provimento da apelação.          Encaminhado a esta Egrégia Corte de Justiça, coube-me a relatoria do feito, quando determinei sua remessa ao parecer do custos legis.          Manifestação do Ministério Público às fls. 141/146 pelo conhecimento e improvimento do recurso.          É o relatório. Decido.          Passo, pois, a decidir monocraticamente, conforme estabelece o artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil.          O recurso preenche todos os requisitos para sua admissibilidade, principalmente porque seu manejo apresenta-se tempestivo e de acordo com hipótese prevista na lei processual civil.          Em apertada síntese, verifica-se que a controvérsia posta em debate diz respeito à condenação do Estado do Pará, ora apelante, ao fornecimento do tratamento de saúde pleiteado, em detrimento do Município de Belém que participa do Sistema de Gestão Plena e recebe repasse de verbas, importando a decisão recorrida em descumprimento aos termos do Plano de Gestão de Saúde Pública, merecendo, portanto, reforma.          Contudo, verifico que não prosperam essas alegações do recorrente, eis que a sentença do juízo de primeiro grau se apresenta escorreita e em conformidade com a Jurisprudência consolidada das Cortes Superiores de Justiça.          Com efeito, ¿O Superior Tribunal de Justiça, em reiterados precedentes, tem decidido que o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária dos entes federados, de forma que qualquer deles possui legitimidade para figurar no polo passivo de demanda que objetive o acesso a meios e medicamentos para tratamento de saúde¿ (AgRg no AREsp 201.746/CE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 19/12/2014).          No mesmo sentido destaco os seguintes julgados do STJ: AgRg no AREsp 664.926/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 12/05/2015, DJe 18/05/2015, AgRg no AREsp 659.156/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 28/04/2015, DJe 14/05/2015.          Na hipótese dos autos, o fornecimento do medicamento JANUVIA é fundamental à sobrevivência do assistido e a resistência por parte do Estado apresenta-se em descompasso com os princípios elencados de forma cristalina na Constituição Federal, sob pena de causar manifesto prejuízo ao direito à saúde da parte.          Além disso, é necessário ressaltar que o direito à saúde é assegurado constitucionalmente e o dever de prestação de sua assistência, consoante o disposto no artigo 23, inciso II, da Constituição Federal é compartilhado entre todos os entes da Administração Direta, quais sejam a União, os Estados e os Municípios, sendo todos solidariamente responsáveis.          Assim, resta claro o dever do Estado em assegurar a todos o acesso aos meios de preservação da saúde e, diante das circunstâncias do caso em análise, verifico a necessidade de o Poder Público fornecer o tratamento de que necessita o assistido, já que restou perfeitamente demonstrado pelas provas trazidas aos autos a imprescindibilidade do tratamento postulado e o risco de vida a ser suportado caso não o tivesse obtido.          Como se não bastasse a expressa disposição no texto constitucional, em recente decisão publicada no DJe de 13/03/2015, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do REXT 855178, de relatoria do Min. Luiz Fux, pela sistemática da Repercussão Geral, reafirmou sua jurisprudência no sentido de que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente, conforme se infere da ementa do julgado abaixo transcrita: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015)          Restou também consignado no aludido julgado que eventuais questões acerca de repasse de verbas atinentes ao SUS devem ser dirimidas administrativamente, ou em ação judicial própria, não merecendo, portanto, amparo as alegações do recorrente de que o Município de Marituba é quem deve ser responsabilizado pelo tratamento da parte.          Outros precedentes da Suprema Corte na mesma direção: RE 869979, AgR, Relator(a):  Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 28/04/2015, DJe 13/05/2015; ARE 814878, AgR, Relator(a):  Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe 31/03/2015 e RE 810603 AgR, Relator(a):  Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 19/08/2014, DJe 27/08/2014.          Por derradeiro, no que concerne à alegação de que a previsão constitucional do artigo 196 não detém o alcance que vem sendo atribuído nas diversas demandas judiciais postas em análise pelo Poder Judiciário, esta não há como ser acolhida, uma vez que este dispositivo consagra o direito à saúde como dever do Estado, que deverá, por meio de políticas sociais e econômicas, propiciar aos necessitados o tratamento mais adequado e eficaz; norma constitucional que apesar de programática não exime o recorrente do dever de prestar o atendimento necessário aos hipossuficientes.          Ademais, não se pode deixar de ressaltar que hoje é patente a idéia de que a Constituição Federal não se resume a um amontoado de princípios meramente ilustrativo; esta reclama efetividade real de suas normas não se sustentando, portanto, a assertiva de que o artigo 196 da Carta Magna não garante nem fundamenta o deferimento do pedido à parte interessada. No mesmo sentido, destaco o seguinte julgado da Suprema Corte: (...)A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos. O fornecimento gratuito de tratamentos e medicamentos necessários à saúde de pessoas hipossuficientes é obrigação solidária de todos os entes federativos, podendo ser pleiteado de qualquer deles, União, Estados, Distrito Federal ou Municípios (Tema 793). O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS, desde que reste comprovação de que não haja nela opção de tratamento eficaz para a enfermidade. Precedentes. (...). Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 831385 AgR, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 17/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 31-03-2015 PUBLIC 06-04-2015)          Por outro lado, situação diversa é a que concerne à condenação dos honorários advocatícios, tem razão o recorrente.          Digo isso porque o recorrido estava sendo patrocinado pela Defensoria Pública Estadual, ou seja, atuou em face da pessoa jurídica de direito público ao qual pertence, atraindo a proibição contida na Súmula 421 do e. STJ, verbis: ¿Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença.¿          Assim sendo, diante entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça, refletido Súmula antes mencionada, entendo necessário observar o art. 557, §1º-A, do CPC, que assim dispõe: ¿Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. § 1o-A Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso.¿          Em razão do dispositivo supracitado e por verificar no caso dos autos a parte da decisão que condenou o recorrente ao pagamento dos honorários advocatícios é manifestamente contrária à súmula do STJ, a presente decisão monocrática apresenta-se necessária.          Ante o exposto, com fulcro no que dispõe o art. 557, §1º-A, do CPC, dou parcial provimento ao recurso de apelação, exclusivamente para afastar a condenação aos honorários advocatícios, mantendo-se os demais termos da diretiva apelada.          Após o decurso do prazo recursal sem qualquer manifestação, certifique-se o trânsito em julgado e dê-se a baixa no LIBRA com a consequente remessa dos autos ao juízo de origem.            Belém, 26 de fevereiro de 2016.             Des. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO             Relator (2016.00700647-12, Não Informado, Rel. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2016-03-01, Publicado em 2016-03-01)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 01/03/2016
Data da Publicação : 01/03/2016
Órgão Julgador : 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA
Relator(a) : LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO
Número do documento : 2016.00700647-12
Tipo de processo : Apelação
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