TJPA 0042119-91.2014.8.14.0301
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ PROCESSO Nº 00421199120148140301 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO RECURSO: REMESSA NECESSÁRIA/APELAÇÃO CÍVEL COMARCA DE BELÉM (VARA ÚNICA DA FAZENDA PÚBLICA DE BELÉM) APELANTE: MUNICÍPIO DE BELÉM - SESMA (PROCURADORA MUNICIPAL: REGINA MARIA DE C.C. BRANCO - OAB/PA N 4293) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO (PROMOTORA DE JUSTIÇA: IONÁ SILVA DE SOUSA NUNES) INTERESSADO: HAROLDO HENRIQUE FIGUEIRA MAIA RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO ¿EMENTA: REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. IDOSO. LAUDO MÉDICO COMPROBATÓRIO DA NECESSIDADE DE MEDICAMENTO. DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE. INCABÍVEL A DENUNCIAÇÃO DA LIDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS PELO DEVER DE PRESTAR ASSISTÊNCIA À SAÚDE. PRECEDENTE STF PELA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL (RE 855178). MEDICAMENTO FORA DA LISTA DO SUS. IMPRESCINDIBILIDADE COMPROVADA. DEFERIMENTO COM BASE NO TEXTO CONSTITUCIONAL. ARTIGO 196 DA CF/88. RECONHECIMENTO DO DIREITO À SAÚDE. APELO IMPROVIDO POR SER CONTRÁRIO À JURISPRUDENCIA DA SUPREMA CORTE, INCLUSIVE PELA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. APELO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA INTEGRALMENTE. 1 - Preliminar de denunciação da lide ao Estado do Pará. ¿O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente¿. (RE 855178 RG, pela sistemática da Repercussão Geral). Preliminar rejeitada. 2 - O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS. Ausência de comprovação pelo apelante da possibilidade de substituição do medicamento ao interessado. Precedentes STF. 3 - É consolidado o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual a falta de previsão orçamentária não impede a concessão de provimento judicial que objetiva dar efetividade aos direitos fundamentais. 4 - Recurso improvido e sentença mantida em remessa necessária.¿ DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de remessa necessária e apelação cível interposta pelo MUNICÍPIO DE BELÉM, nos autos da ação civil pública que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, em favor do interessado HAROLDO HENRIQUE FIGUEIRA MAIA, contra decisão proferida pelo juízo da Vara Única da Fazenda Pública da Comarca de Belém que julgou procedentes os pedidos para condenar o apelante a fornecer o medicamento Xarelto 20 mg (Rivaroxaban) ao interessado com alto risco de evento vascular, conforme prescrições médicas. A demanda foi proposta objetivando o fornecimento do referido medicamento em favor do interessado, em razão de ser portador de hipertensão arterial sistêmica com episódios de arritmia e risco de acidente vascular, conforme laudos médicos juntados dos autos, sem recursos para o custeio do tratamento necessário, necessitando fazer uso diário da medicação de forma contínua. Inconformado com a sentença de procedência, alega o apelante que em razão da medicação requerida se tratar de medicamento excepcional e não constar das listas oficiais de dispensação, impõe-se à administração sua aquisição por meio de processo específico, razão pela qual requer o chamamento do Estado do Pará à lide na forma do artigo 70, III, do CPC, atual 125, II do CPC/2015. Aduz que não houve por parte do autor a renovação do receituário médico indicando a continuidade do tratamento pleiteado e que conforme os Enunciados nºs. 2 e 3 do CNJ acerca da ¿judicialização da saúde¿, a liminar outrora deferida deveria ter sido revogada, o que consequentemente afeta o mérito da sentença apelada. Argumenta a ausência de prova inequívoca dos requisitos autorizadores da tutela de urgência por estar o medicamento pleiteado fora do padrão do SUS, eis que não obstante o descrito na inicial, não há nos autos qualquer evidência irrefutável da urgência e da não eficácia do medicamento VARFARINA disponível no SUS para o tratamento de hipertensão arterial sistêmica, sem justificativa para preterição deste pelo medicamento prescrito ao interessado. No mérito, faz comentários acerca da estrutura de verdadeira federação do SUS - Sistema Único de Saúde, argumentando que compete ao Estado do Pará por meio da Secretaria Estadual de Saúde - SESPA atender a ordem judicial dos autos, conforme a Lei Orgânica de Saúde, devendo o Município de Belém ser excluído da lide ante sua ilegitimidade passiva. Argumenta que a duplicidade de serviços para um mesmo fim é vedada pelo SUS, por isso que a competência de cada ente federado é perfeitamente delimitada, não se podendo admitir que o ente Municipal seja tido como responsável sem sequer perquirir de quem é a competência efetiva pelo pedido feito na inicial. Defende a natureza programática do artigo 196 da CF/88, dependendo de normatividade posterior. Assevera a prevalência do interesse público sobre o particular e a falta de dotação orçamentária para custeio do tratamento do interessado. Requer seja revogada a medida liminar deferida por haver possibilidade de irreversibilidade do provimento antecipado, além da ofensa ao artigo 1º, §3º da Lei Federal nº 8437/1992 pois esgota todo o objeto da ação. Assim, requer o conhecimento e provimento do apelo para reforma total da sentença em razão da falta de renovação de receituário médico, julgando no mérito improcedente o pedido; seja determinado ao apelado a renovação dos receituário médicos de forma periódica para demonstração da permanência do tratamento e, caso seja mantida a decisão, seja verificada a possibilidade de fornecimento do medicamento VAFARINA disponível no SUS em substituição ao medicamento RIVAROXABANA fora do padrão do SUS, tendo em vista as equivalências para tratamento do apelado. Contrarrazões às fls. 133/148. Encaminhados a esta Egrégia Corte de Justiça, coube-me a relatoria do feito, quando recebi a apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos do despacho de fl. 151. Remetidos os autos à Procuradoria de Justiça, esta se manifestou às fls. 153/154 pelo conhecimento e não provimento do recurso de apelação e do reexame necessário, devendo ser confirmada a sentença de piso. É o relatório. Decido. Presente os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e da remessa necessária e da análise de ambos entendo que a sentença reexaminada não merece reparos. Compulsando os autos, entendo que comportam julgamento monocrático, conforme estabelece o artigo 932, IV, b e VIII, do CPC/2015 c/c 133, XI, d, do Regimento Interno deste Tribunal. Em apertada síntese, verifica-se que a controvérsia posta em debate diz respeito à condenação do Município de Belém, ora apelante, ao fornecimento do medicamento Xarelto 20mg, alegando, preliminarmente, a denunciação da lide ao Estado do Pará, e, no mérito, a incompetência do Município para o fornecimento pretendido e violação às normas orçamentárias e ao princípio da separação de poderes. Contudo, verifico que não prosperam as alegações do recorrente, eis que a sentença do juízo de primeiro grau se apresenta escorreita e em conformidade com a Jurisprudência consolidada das Cortes Superiores de Justiça. Inicialmente, quanto à preliminar de denunciação da lide ao Estado do Pará, com fulcro no artigo 70, III, do CPC/73, sob o argumento de ser o ente estatal responsável solidário pelo fornecimento da medicação almejada de alta complexidade e não constante da lista do RENAME, não vislumbro razão ao apelante. Com efeito, há previsão constitucional da solidariedade entre a União, Estados, Municípios e Distrito Federal, tratando-se de direito à saúde e/ou integridade física dos seus cidadãos, sendo facultado o direcionamento do pedido a qualquer um dos entes federados, portanto, incabível a denunciação da lide. De igual modo, ¿O Superior Tribunal de Justiça, em reiterados precedentes, tem decidido que o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária dos entes federados, de forma que qualquer deles possui legitimidade para figurar no polo passivo de demanda que objetive o acesso a meios e medicamentos para tratamento de saúde¿ (AgRg no AREsp 201.746/CE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 19/12/2014). Precedentes STJ: AgRg no AREsp 664.926/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 12/05/2015, DJe 18/05/2015, AgRg no AREsp 659.156/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 28/04/2015, DJe 14/05/2015. Como se não bastasse a expressa disposição no texto constitucional, em recente decisão publicada no DJe de 13/03/2015, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do REXT 855178, de relatoria do Min. Luiz Fux, pela sistemática da Repercussão Geral, reafirmou sua jurisprudência no sentido de que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente, conforme se infere da ementa do julgado abaixo transcrita: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015) Na hipótese dos autos, o fornecimento do medicamento é fundamental à efetivação do direito à saúde do interessado e a resistência por parte do Município de Belém apresenta-se em descompasso com os princípios elencados de forma cristalina na Constituição Federal. Além disso, é necessário ressaltar que o direito à saúde é assegurado constitucionalmente e o dever de prestação de sua assistência, consoante o disposto no artigo 23, inciso II, da Constituição Federal é compartilhado entre todos os entes da Administração Direta, quais sejam a União, os Estados e os Municípios, sendo todos solidariamente responsáveis, não merecendo qualquer censura a decisão apelada e reexaminada. Restou também consignado no aludido julgado da Suprema Corte pela sistemática da Repercussão Geral (RE 855178 RG) que eventuais questões acerca de repasse de verbas atinentes ao SUS devem ser dirimidas administrativamente, ou em ação judicial própria, não merecendo, portanto, amparo as alegações do recorrente de que o Estado do Pará é quem deve ser responsabilizado pelo fornecimento do medicamento à parte. Outros precedentes da Suprema Corte na mesma direção: RE 869979, AgR, Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 28/04/2015, DJe 13/05/2015; ARE 814878, AgR, Relator(a): Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe 31/03/2015 e RE 810603 AgR, Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 19/08/2014, DJe 27/08/2014. Ilustrativamente: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE (ART. 196, CF). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. CHAMAMENTO AO PROCESSO. DESLOCAMENTO DO FEITO PARA JUSTIÇA FEDERAL. MEDIDA PROTELATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O artigo 196 da CF impõe o dever estatal de implementação das políticas públicas, no sentido de conferir efetividade ao acesso da população à redução dos riscos de doenças e às medidas necessárias para proteção e recuperação dos cidadãos. 2. O Estado deve criar meios para prover serviços médico-hospitalares e fornecimento de medicamentos, além da implementação de políticas públicas preventivas, mercê de os entes federativos garantirem recursos em seus orçamentos para implementação das mesmas. (arts. 23, II, e 198, § 1º, da CF). 3. O recebimento de medicamentos pelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios. Isto por que, uma vez satisfeitos tais requisitos, o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividade ao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar a devida prestação jurisdicional. 4. In casu, o chamamento ao processo da União pelo Estado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-se meio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para o restabelecimento da saúde da recorrida. 5. Agravo regimental no recurso extraordinário desprovido. (RE 607381 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 31/05/2011, DJe-116 DIVULG 16-06-2011 PUBLIC 17-06-2011 EMENT VOL-02546-01 PP-00209 RTJ VOL-00218-01 PP-00589) Sendo assim, descabe o pedido de denunciação da lide, razão pela qual, com fundamento no julgamento do RE 855178 pela sistemática da Rep Geral, rejeito a preliminar e passo ao mérito. Quanto ao mérito, melhor sorte não socorre ao apelante. A decisão apelada e reexaminada não merece qualquer censura, pois além de devidamente fundamentada no texto constitucional, apresenta-se em perfeita sintonia com a jurisprudência das Cortes Superiores. No caso em tela, resta indubitável o dever do Município em assegurar o fornecimento ao assistido do medicamento necessário à manutenção de sua existência digna, já que restou perfeitamente demonstrado pelas provas trazidas aos autos a imprescindibilidade do mesmo. Com efeito, o autor comprovou indubitavelmente a necessidade da medicação descrita na petição inicial, além da sua hipossuficiência financeira para adquiri-la. Dessa forma, cumpre ao ente público demandado o seu fornecimento. Os relatórios e receituários médicos apresentados (fls.30/31) são provas pré-constituídas suficientes ao atendimento do pedido do autor. A medicação foi prescrita por profissional capacitado e vinculado ao Sistema Único de Saúde, presumindo-se que tenha conhecimentos técnico-científicos para tanto, bem como se subentende que tenha conhecimento de métodos diversos de tratamento e tenha optado pelo mais indicado ao caso em questão. Assim, mesmo que não seja padronizada, deve ser fornecida. Procura-se, assim, preservar o bem maior, que é a vida do autor. Deve ser atendido o princípio maior que é o da dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, inciso III, da Carta Magna, com reflexo no direito à saúde que não pode ser indissociável daquele, com previsão nos artigos 6° e 196 da CF/88. Além do mais, a previsão constitucional do artigo 196 consagra o direito à saúde como dever dos Entes Estatais, que deverão, por meio de políticas sociais e econômicas, propiciar aos necessitados o tratamento mais adequado e eficaz; norma constitucional que apesar de programática não exime o recorrente do dever de prestar o atendimento necessário ao hipossuficiente. Ressalte-se, ainda, que hoje é patente a idéia de que a Constituição Federal não se resume a um amontoado de princípios meramente ilustrativo; esta reclama efetividade real de suas normas. No mesmo sentido, destaco o seguinte julgado da Suprema Corte: (...)A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos. O fornecimento gratuito de tratamentos e medicamentos necessários à saúde de pessoas hipossuficientes é obrigação solidária de todos os entes federativos, podendo ser pleiteado de qualquer deles, União, Estados, Distrito Federal ou Municípios (Tema 793). O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS, desde que reste comprovação de que não haja nela opção de tratamento eficaz para a enfermidade. Precedentes. (...). Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 831385 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 17/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 31-03-2015 PUBLIC 06-04-2015) De notar, também, que a complexa divisão das responsabilidades no Sistema Único de Saúde não tem o condão de eximir o recorrente do dever imposto pela ordem constitucional, sendo sua a responsabilidade em atender àqueles que, como o ora apelado, não possuem condições financeiras de adquirir medicamentos por meios próprios. Outrossim, ancorado no precedente do Supremo Tribunal Federal pela sistemática da repercussão geral cuja a ementa foi anteriormente transcrita, a responsabilidade solidária dos entes para fornecimento do medicamento pleiteado afasta a argumentação do apelo de incompetência do Município recorrente. Ademais, não prosperam os argumentos de que não há competência do município para fornecimento de medicamento por não constar na lista do RENAME, devendo o pedido seja rejeitado. Por outro lado, não há como ser acolhida a alegação de que não houve a comprovação da urgência no fornecimento do medicamento pleiteado, pois nos laudos médicos e documentos juntados com a inicial há indicação de risco de eventos vasculares e consequentemente de morte do interessado, muito menos de que não houve demonstração suficiente para justificar a preterição do medicamento disponível pelo SUS em relação ao prescrito, uma vez que em nenhum momento nos autos, principalmente na contestação, houve qualquer alegação acerca da substituição do medicamento prescrito pelo profissional médico credenciado ao Sistema Único de Sáude por outro constante das listas padronizadas. Sequer houve a oferta da medicação VARFARINA, muito menos a comprovação de que a mesma teria a mesma eficácia no tratamento do interessado, sem intimação do apelado para manifestação quanto à substituição tão somente agora alegada. Verdadeira inovação recursal que não merece acolhimento, diante da comprovação por documentos médicos da necessidade do medicamento deferido e de nenhuma comprovação da substituição eficaz para o caso específico do autor, não tendo o apelante demonstrado a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado, não podendo recair sobre o magistrado a possibilidade de facultar substituição do fármaco, não havendo como o mesmo conhecer de eventuais riscos, eventuais efeitos colaterais, que um medicamento diverso poderia trazer ao assistido, mesmo o apelante alegando que o princípios ativos são os mesmos. Até porque a lista do RENAME é exemplificativa e não pode servir de fundamento para limitação do exercício do direito à saúde. Nesse sentido, a jurisprudência da C. STF: EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTO NÃO PADRONIZADO. FORNECIMENTO PELO PODER PÚBLICO. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos. 2. O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS, desde que reste comprovação de que não haja nela opção de tratamento eficaz para a enfermidade. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 926469 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 07/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-128 DIVULG 20-06-2016 PUBLIC 21-06-2016) ¿Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. RE 855.178-RG. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO FORA DA LISTA DO SUS. POSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. INOCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.¿ (ARE 831915 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/04/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 03-05-2016 PUBLIC 04-05-2016) Assim, entendo deva ser mantida a sentença que reconheceu ser devido o fornecimento de medicamento - ainda que não constante de protocolo e listas do SUS com base no art. 196 da Constituição Federal, sobretudo porque, diante da ponderação do direito à saúde com os demais princípios constitucionais que lhe são contrapostos, bem como da conclusão do laudo médico, ficou demonstrada a indispensabilidade do medicamento para a manutenção da vida e saúde do paciente, idoso maior de 60 anos e hipertenso, de modo que normas de inferior hierarquia não prevalecem em relação ao direito constitucional à saúde e à vida, ainda mais diante da prova concreta trazida aos autos pelo apelado e nenhuma contraprova pelo apelante. Não prospera de igual modo a alegação do apelante de que vedada a inclusão no orçamento de dispositivo estranho à previsão da receita e fixação da despesa, pois tratando-se na espécie de direito à saúde, direito social que figura entre os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal, impende ao recorrente cumpri-la independentemente de previsão orçamentária específica. Corroborando o raciocínio apresentado, colaciono o seguinte julgado do Superior Tribunal Justiça: ¿PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. (...) AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TRATAMENTO DE SAÚDE. DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. FALTA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. IMPEDIMENTO AO PROVIMENTO DA AÇÃO. INEXISTÊNCIA. EFETIVAÇÃO DE DIREITO FUNDAMENTAL. PRECEDENTES DESTA CORTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 83/STJ. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. (...) IV - O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico segundo o qual é possível o manejo de ação civil pública pelo Ministério Público para a defesa de direitos individuais indisponíveis, por coadunar-se com as suas funções institucionais. V - Esta Corte tem orientação consolidada no sentido de que o funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, sendo qualquer deles, em conjunto ou isoladamente, parte legítima para figurar no polo passivo de demanda que objetive a garantia de acesso a medicamentos ou a realização de tratamento médico. VI - É consolidado o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual a falta de previsão orçamentária não impede a concessão de provimento judicial que objetiva dar efetividade aos direitos fundamentais.(...) X - Agravo Interno improvido. (AgInt no REsp 1234968/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 21/11/2017) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. A FALTA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA NÃO CONSTITUI ÓBICE À CONCESSÃO DE PROVIMENTO JUDICIAL QUE DÊ EFETIVIDADE A DIREITOS FUNDAMENTAIS. AGRAVO REGIMENTAL DO MUNICÍPIO DE UBERABA/MG DESPROVIDO. (...) 3. A falta de previsão orçamentária não constitui óbice à concessão de provimento judicial que dê efetividade a direitos fundamentais, uma vez que as limitações orçamentárias não podem servir de escudo para recusas de cumprimento de obrigações prioritárias. Precedente: AgRg no REsp. 1.136.549/RS, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 21.6.2010. 4. Agravo Regimental do MUNICÍPIO DE UBERABA/MG desprovido. (AgRg no AREsp 649.229/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 06/04/2017) Nesse particular, não se deve olvidar a prevalência da tutela ao direito subjetivo à saúde sobre o interesse público, que, no caso, consubstancia-se na preservação da saúde em detrimento dos princípios do Direito Financeiro ou Administrativo. Diferente do que alega o apelante, não se trata de privilegiar um usuário em detrimento de todos os demais, mas de reconhecer que as necessidades de saúde de todos devem ser prontamente atendidas pelo Poder Público, de modo que a nenhuma lesão de direito deve ser recusada a tutela jurisdicional. Não obstante as dificuldades do sistema público de saúde em bem atender a toda a demanda, tem o cidadão o direito de exigir que as suas necessidades de saúde sejam prontamente atendidas, especialmente para evitar que se agravem. No que tange a alegação de falta de renovação de receituário médico nos autos, também não há como ser acolhida como forma de afastar a condenação ao fornecimento do medicamento, pois não há qualquer comprovação de que o apelante tenha solicitado ao interessado a renovação de seu receituário médico, não havendo que se falar em negativa de disponibilização deste por parte do paciente, muito menos de falta de interesse, até porque no caso, os documentos médicos apontam a necessidade de uso contínuo do medicamento. No que concerne à alegação de satisfatividade da medida liminar deferida, entendo que agiu acertadamente o juiz de piso ao deferir a liminar, na medida em que o caso reflete demanda envolvendo direito fundamental à vida e saúde, garantido pela Carta Magna, e que por isso mesmo predomina sobre as demais regras. Destaco, ainda, que a vedação de liminar contra atos do poder público que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação, é regra relativa, sobretudo quando se confronta com o direito à vida, como ocorre na situação em causa. Assim, admissível se afigura, em caráter excepcional, o deferimento de medida satisfativa contra a Fazenda Pública, pois, ao efetuar juízo de ponderação, impõe-se que seja assegurado o direito à vida, a exemplo do julgado: EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA INAUDITA ALTERA PARS. PACIENTE PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA EM MÉDICO ESPECIALIZADO. ALEGADA SATISFATIVIDADE DA LIMINAR DEFERIDA. NÃO CABIMENTO. O PERIGO DA DEMORA MILITA A FAVOR DO PACIENTE. DO SUSTENTADO NECESSÁRIO CHAMAMENTO Á LIDE DA UNIÃO E DO ESTADO DO PARÁ. IMPROCEDÊNCIA. OS ENTES FEDERATIVOS PODEM SER DEMANDADOS EM CONJUNTO OU ISOLADAMENTE, DADA A EXISTÊNCIA DA SOLIDARIEDADE ENTRE OS MESMOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. . 1. A iminência de dano irreparável ou de difícil reparação decorre da gravidade da doença que acomete o paciente, portador de necessidades especiais, a medida em que, o tratamento cirúrgico indicado visa salvaguardar a sua vida e proporcionar um adequado tratamento ao caso apresentado 2. Demais disso, o perigo na demora milita a favor da Autor/Recorrido, uma vez que o seu estado de saúde e a necessidade urgente de ser realizado o tratamento cirúrgico não podem aguardar a tutela definitiva, sem haver perigo de dano de difícil reparação. 3. Encontra-se consolidado em nossas Cortes Superiores o entendimento no sentido de que o estado, o município e a União são legitimados passivos solidários, conforme determina o texto constitucional, sendo dever do Poder Público, a garantia à saúde pública, o que significa dizer que podem ser demandados em conjunto, ou isoladamente, como ocorreu na hipótese em julgamento, dada a existência da solidariedade entre os mesmos. 4. Recurso conhecido e improvido. Decisão unânime. (2016.02390605-37, 161.078, Rel. NADJA NARA COBRA MEDA, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-06-16, Publicado em 2016-06-17) De outra banda, no tocante à alegação de que para o cumprimento da liminar há a necessidade de instauração de processo administrativo, também não merece prosperar, pois tal justificativa é irrelevante para a negativa de assistência, haja vista que o Município deve buscar os meios de efetivação da tutela emergencial, utilizando os meios de coerção cabíveis e, até mesmo a compra direta do medicamento, em caso de demora excessiva, em razão do caráter de urgência da medida, com fundamento no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93 que autoriza a dispensa da licitação para a hipótese, pois o retardamento do fornecimento do medicamento pode resultar na inutilidade do provimento judicial. Desse modo, irrepreensíveis os fundamentos da sentença uma vez que amparada no dever constitucional de efetivação do direito à saúde e à proteção do idoso pelo poder público, conforme jurisprudência pacífica da Suprema Corte, em alguns pontos inclusive sob a sistemática da Repercussão Geral e do Superior Tribunal de Justiça, nos termos da fundamentação acima exposta, razão pela qual, entendo necessário observar o art. 932 do CPC/2015. Sentença igualmente mantida em remessa necessária. Ante o exposto, com fulcro no que dispõe o art. 932, incisos IV, b e VIII, do CPC/2015 c/c 133, XI, b e d, do RITJPA, nego provimento ao recurso de apelação e à remessa necessária, para manter a sentença em todos os seus termos. Após o decurso do prazo recursal sem qualquer manifestação, certifique-se o trânsito em julgado e dê-se a baixa no LIBRA com a consequente remessa dos autos ao juízo de origem. Belém, 14 de dezembro de 2017. Des. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO Relator
(2017.05392197-13, Não Informado, Rel. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2018-01-17, Publicado em 2018-01-17)
Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ PROCESSO Nº 00421199120148140301 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO RECURSO: REMESSA NECESSÁRIA/APELAÇÃO CÍVEL COMARCA DE BELÉM (VARA ÚNICA DA FAZENDA PÚBLICA DE BELÉM) APELANTE: MUNICÍPIO DE BELÉM - SESMA (PROCURADORA MUNICIPAL: REGINA MARIA DE C.C. BRANCO - OAB/PA N 4293) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO (PROMOTORA DE JUSTIÇA: IONÁ SILVA DE SOUSA NUNES) INTERESSADO: HAROLDO HENRIQUE FIGUEIRA MAIA RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO ¿ REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. IDOSO. LAUDO MÉDICO COMPROBATÓRIO DA NECESSIDADE DE MEDICAMENTO. DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE. INCABÍVEL A DENUNCIAÇÃO DA LIDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS PELO DEVER DE PRESTAR ASSISTÊNCIA À SAÚDE. PRECEDENTE STF PELA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL (RE 855178). MEDICAMENTO FORA DA LISTA DO SUS. IMPRESCINDIBILIDADE COMPROVADA. DEFERIMENTO COM BASE NO TEXTO CONSTITUCIONAL. ARTIGO 196 DA CF/88. RECONHECIMENTO DO DIREITO À SAÚDE. APELO IMPROVIDO POR SER CONTRÁRIO À JURISPRUDENCIA DA SUPREMA CORTE, INCLUSIVE PELA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. APELO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA INTEGRALMENTE. 1 - Preliminar de denunciação da lide ao Estado do Pará. ¿O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente¿. (RE 855178 RG, pela sistemática da Repercussão Geral). Preliminar rejeitada. 2 - O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS. Ausência de comprovação pelo apelante da possibilidade de substituição do medicamento ao interessado. Precedentes STF. 3 - É consolidado o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual a falta de previsão orçamentária não impede a concessão de provimento judicial que objetiva dar efetividade aos direitos fundamentais. 4 - Recurso improvido e sentença mantida em remessa necessária.¿ DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de remessa necessária e apelação cível interposta pelo MUNICÍPIO DE BELÉM, nos autos da ação civil pública que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, em favor do interessado HAROLDO HENRIQUE FIGUEIRA MAIA, contra decisão proferida pelo juízo da Vara Única da Fazenda Pública da Comarca de Belém que julgou procedentes os pedidos para condenar o apelante a fornecer o medicamento Xarelto 20 mg (Rivaroxaban) ao interessado com alto risco de evento vascular, conforme prescrições médicas. A demanda foi proposta objetivando o fornecimento do referido medicamento em favor do interessado, em razão de ser portador de hipertensão arterial sistêmica com episódios de arritmia e risco de acidente vascular, conforme laudos médicos juntados dos autos, sem recursos para o custeio do tratamento necessário, necessitando fazer uso diário da medicação de forma contínua. Inconformado com a sentença de procedência, alega o apelante que em razão da medicação requerida se tratar de medicamento excepcional e não constar das listas oficiais de dispensação, impõe-se à administração sua aquisição por meio de processo específico, razão pela qual requer o chamamento do Estado do Pará à lide na forma do artigo 70, III, do CPC, atual 125, II do CPC/2015. Aduz que não houve por parte do autor a renovação do receituário médico indicando a continuidade do tratamento pleiteado e que conforme os Enunciados nºs. 2 e 3 do CNJ acerca da ¿judicialização da saúde¿, a liminar outrora deferida deveria ter sido revogada, o que consequentemente afeta o mérito da sentença apelada. Argumenta a ausência de prova inequívoca dos requisitos autorizadores da tutela de urgência por estar o medicamento pleiteado fora do padrão do SUS, eis que não obstante o descrito na inicial, não há nos autos qualquer evidência irrefutável da urgência e da não eficácia do medicamento VARFARINA disponível no SUS para o tratamento de hipertensão arterial sistêmica, sem justificativa para preterição deste pelo medicamento prescrito ao interessado. No mérito, faz comentários acerca da estrutura de verdadeira federação do SUS - Sistema Único de Saúde, argumentando que compete ao Estado do Pará por meio da Secretaria Estadual de Saúde - SESPA atender a ordem judicial dos autos, conforme a Lei Orgânica de Saúde, devendo o Município de Belém ser excluído da lide ante sua ilegitimidade passiva. Argumenta que a duplicidade de serviços para um mesmo fim é vedada pelo SUS, por isso que a competência de cada ente federado é perfeitamente delimitada, não se podendo admitir que o ente Municipal seja tido como responsável sem sequer perquirir de quem é a competência efetiva pelo pedido feito na inicial. Defende a natureza programática do artigo 196 da CF/88, dependendo de normatividade posterior. Assevera a prevalência do interesse público sobre o particular e a falta de dotação orçamentária para custeio do tratamento do interessado. Requer seja revogada a medida liminar deferida por haver possibilidade de irreversibilidade do provimento antecipado, além da ofensa ao artigo 1º, §3º da Lei Federal nº 8437/1992 pois esgota todo o objeto da ação. Assim, requer o conhecimento e provimento do apelo para reforma total da sentença em razão da falta de renovação de receituário médico, julgando no mérito improcedente o pedido; seja determinado ao apelado a renovação dos receituário médicos de forma periódica para demonstração da permanência do tratamento e, caso seja mantida a decisão, seja verificada a possibilidade de fornecimento do medicamento VAFARINA disponível no SUS em substituição ao medicamento RIVAROXABANA fora do padrão do SUS, tendo em vista as equivalências para tratamento do apelado. Contrarrazões às fls. 133/148. Encaminhados a esta Egrégia Corte de Justiça, coube-me a relatoria do feito, quando recebi a apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos do despacho de fl. 151. Remetidos os autos à Procuradoria de Justiça, esta se manifestou às fls. 153/154 pelo conhecimento e não provimento do recurso de apelação e do reexame necessário, devendo ser confirmada a sentença de piso. É o relatório. Decido. Presente os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e da remessa necessária e da análise de ambos entendo que a sentença reexaminada não merece reparos. Compulsando os autos, entendo que comportam julgamento monocrático, conforme estabelece o artigo 932, IV, b e VIII, do CPC/2015 c/c 133, XI, d, do Regimento Interno deste Tribunal. Em apertada síntese, verifica-se que a controvérsia posta em debate diz respeito à condenação do Município de Belém, ora apelante, ao fornecimento do medicamento Xarelto 20mg, alegando, preliminarmente, a denunciação da lide ao Estado do Pará, e, no mérito, a incompetência do Município para o fornecimento pretendido e violação às normas orçamentárias e ao princípio da separação de poderes. Contudo, verifico que não prosperam as alegações do recorrente, eis que a sentença do juízo de primeiro grau se apresenta escorreita e em conformidade com a Jurisprudência consolidada das Cortes Superiores de Justiça. Inicialmente, quanto à preliminar de denunciação da lide ao Estado do Pará, com fulcro no artigo 70, III, do CPC/73, sob o argumento de ser o ente estatal responsável solidário pelo fornecimento da medicação almejada de alta complexidade e não constante da lista do RENAME, não vislumbro razão ao apelante. Com efeito, há previsão constitucional da solidariedade entre a União, Estados, Municípios e Distrito Federal, tratando-se de direito à saúde e/ou integridade física dos seus cidadãos, sendo facultado o direcionamento do pedido a qualquer um dos entes federados, portanto, incabível a denunciação da lide. De igual modo, ¿O Superior Tribunal de Justiça, em reiterados precedentes, tem decidido que o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária dos entes federados, de forma que qualquer deles possui legitimidade para figurar no polo passivo de demanda que objetive o acesso a meios e medicamentos para tratamento de saúde¿ (AgRg no AREsp 201.746/CE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 19/12/2014). Precedentes STJ: AgRg no AREsp 664.926/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 12/05/2015, DJe 18/05/2015, AgRg no AREsp 659.156/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 28/04/2015, DJe 14/05/2015. Como se não bastasse a expressa disposição no texto constitucional, em recente decisão publicada no DJe de 13/03/2015, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do REXT 855178, de relatoria do Min. Luiz Fux, pela sistemática da Repercussão Geral, reafirmou sua jurisprudência no sentido de que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente, conforme se infere da ementa do julgado abaixo transcrita: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015) Na hipótese dos autos, o fornecimento do medicamento é fundamental à efetivação do direito à saúde do interessado e a resistência por parte do Município de Belém apresenta-se em descompasso com os princípios elencados de forma cristalina na Constituição Federal. Além disso, é necessário ressaltar que o direito à saúde é assegurado constitucionalmente e o dever de prestação de sua assistência, consoante o disposto no artigo 23, inciso II, da Constituição Federal é compartilhado entre todos os entes da Administração Direta, quais sejam a União, os Estados e os Municípios, sendo todos solidariamente responsáveis, não merecendo qualquer censura a decisão apelada e reexaminada. Restou também consignado no aludido julgado da Suprema Corte pela sistemática da Repercussão Geral (RE 855178 RG) que eventuais questões acerca de repasse de verbas atinentes ao SUS devem ser dirimidas administrativamente, ou em ação judicial própria, não merecendo, portanto, amparo as alegações do recorrente de que o Estado do Pará é quem deve ser responsabilizado pelo fornecimento do medicamento à parte. Outros precedentes da Suprema Corte na mesma direção: RE 869979, AgR, Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 28/04/2015, DJe 13/05/2015; ARE 814878, AgR, Relator(a): Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe 31/03/2015 e RE 810603 AgR, Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 19/08/2014, DJe 27/08/2014. Ilustrativamente: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE (ART. 196, CF). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. CHAMAMENTO AO PROCESSO. DESLOCAMENTO DO FEITO PARA JUSTIÇA FEDERAL. MEDIDA PROTELATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O artigo 196 da CF impõe o dever estatal de implementação das políticas públicas, no sentido de conferir efetividade ao acesso da população à redução dos riscos de doenças e às medidas necessárias para proteção e recuperação dos cidadãos. 2. O Estado deve criar meios para prover serviços médico-hospitalares e fornecimento de medicamentos, além da implementação de políticas públicas preventivas, mercê de os entes federativos garantirem recursos em seus orçamentos para implementação das mesmas. (arts. 23, II, e 198, § 1º, da CF). 3. O recebimento de medicamentos pelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios. Isto por que, uma vez satisfeitos tais requisitos, o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividade ao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar a devida prestação jurisdicional. 4. In casu, o chamamento ao processo da União pelo Estado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-se meio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para o restabelecimento da saúde da recorrida. 5. Agravo regimental no recurso extraordinário desprovido. (RE 607381 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 31/05/2011, DJe-116 DIVULG 16-06-2011 PUBLIC 17-06-2011 EMENT VOL-02546-01 PP-00209 RTJ VOL-00218-01 PP-00589) Sendo assim, descabe o pedido de denunciação da lide, razão pela qual, com fundamento no julgamento do RE 855178 pela sistemática da Rep Geral, rejeito a preliminar e passo ao mérito. Quanto ao mérito, melhor sorte não socorre ao apelante. A decisão apelada e reexaminada não merece qualquer censura, pois além de devidamente fundamentada no texto constitucional, apresenta-se em perfeita sintonia com a jurisprudência das Cortes Superiores. No caso em tela, resta indubitável o dever do Município em assegurar o fornecimento ao assistido do medicamento necessário à manutenção de sua existência digna, já que restou perfeitamente demonstrado pelas provas trazidas aos autos a imprescindibilidade do mesmo. Com efeito, o autor comprovou indubitavelmente a necessidade da medicação descrita na petição inicial, além da sua hipossuficiência financeira para adquiri-la. Dessa forma, cumpre ao ente público demandado o seu fornecimento. Os relatórios e receituários médicos apresentados (fls.30/31) são provas pré-constituídas suficientes ao atendimento do pedido do autor. A medicação foi prescrita por profissional capacitado e vinculado ao Sistema Único de Saúde, presumindo-se que tenha conhecimentos técnico-científicos para tanto, bem como se subentende que tenha conhecimento de métodos diversos de tratamento e tenha optado pelo mais indicado ao caso em questão. Assim, mesmo que não seja padronizada, deve ser fornecida. Procura-se, assim, preservar o bem maior, que é a vida do autor. Deve ser atendido o princípio maior que é o da dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, inciso III, da Carta Magna, com reflexo no direito à saúde que não pode ser indissociável daquele, com previsão nos artigos 6° e 196 da CF/88. Além do mais, a previsão constitucional do artigo 196 consagra o direito à saúde como dever dos Entes Estatais, que deverão, por meio de políticas sociais e econômicas, propiciar aos necessitados o tratamento mais adequado e eficaz; norma constitucional que apesar de programática não exime o recorrente do dever de prestar o atendimento necessário ao hipossuficiente. Ressalte-se, ainda, que hoje é patente a idéia de que a Constituição Federal não se resume a um amontoado de princípios meramente ilustrativo; esta reclama efetividade real de suas normas. No mesmo sentido, destaco o seguinte julgado da Suprema Corte: (...)A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos. O fornecimento gratuito de tratamentos e medicamentos necessários à saúde de pessoas hipossuficientes é obrigação solidária de todos os entes federativos, podendo ser pleiteado de qualquer deles, União, Estados, Distrito Federal ou Municípios (Tema 793). O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS, desde que reste comprovação de que não haja nela opção de tratamento eficaz para a enfermidade. Precedentes. (...). Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 831385 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 17/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 31-03-2015 PUBLIC 06-04-2015) De notar, também, que a complexa divisão das responsabilidades no Sistema Único de Saúde não tem o condão de eximir o recorrente do dever imposto pela ordem constitucional, sendo sua a responsabilidade em atender àqueles que, como o ora apelado, não possuem condições financeiras de adquirir medicamentos por meios próprios. Outrossim, ancorado no precedente do Supremo Tribunal Federal pela sistemática da repercussão geral cuja a ementa foi anteriormente transcrita, a responsabilidade solidária dos entes para fornecimento do medicamento pleiteado afasta a argumentação do apelo de incompetência do Município recorrente. Ademais, não prosperam os argumentos de que não há competência do município para fornecimento de medicamento por não constar na lista do RENAME, devendo o pedido seja rejeitado. Por outro lado, não há como ser acolhida a alegação de que não houve a comprovação da urgência no fornecimento do medicamento pleiteado, pois nos laudos médicos e documentos juntados com a inicial há indicação de risco de eventos vasculares e consequentemente de morte do interessado, muito menos de que não houve demonstração suficiente para justificar a preterição do medicamento disponível pelo SUS em relação ao prescrito, uma vez que em nenhum momento nos autos, principalmente na contestação, houve qualquer alegação acerca da substituição do medicamento prescrito pelo profissional médico credenciado ao Sistema Único de Sáude por outro constante das listas padronizadas. Sequer houve a oferta da medicação VARFARINA, muito menos a comprovação de que a mesma teria a mesma eficácia no tratamento do interessado, sem intimação do apelado para manifestação quanto à substituição tão somente agora alegada. Verdadeira inovação recursal que não merece acolhimento, diante da comprovação por documentos médicos da necessidade do medicamento deferido e de nenhuma comprovação da substituição eficaz para o caso específico do autor, não tendo o apelante demonstrado a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado, não podendo recair sobre o magistrado a possibilidade de facultar substituição do fármaco, não havendo como o mesmo conhecer de eventuais riscos, eventuais efeitos colaterais, que um medicamento diverso poderia trazer ao assistido, mesmo o apelante alegando que o princípios ativos são os mesmos. Até porque a lista do RENAME é exemplificativa e não pode servir de fundamento para limitação do exercício do direito à saúde. Nesse sentido, a jurisprudência da C. STF: DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTO NÃO PADRONIZADO. FORNECIMENTO PELO PODER PÚBLICO. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos. 2. O Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS, desde que reste comprovação de que não haja nela opção de tratamento eficaz para a enfermidade. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 926469 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 07/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-128 DIVULG 20-06-2016 PUBLIC 21-06-2016) ¿ AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. RE 855.178-RG. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO FORA DA LISTA DO SUS. POSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. INOCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.¿ (ARE 831915 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/04/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 03-05-2016 PUBLIC 04-05-2016) Assim, entendo deva ser mantida a sentença que reconheceu ser devido o fornecimento de medicamento - ainda que não constante de protocolo e listas do SUS com base no art. 196 da Constituição Federal, sobretudo porque, diante da ponderação do direito à saúde com os demais princípios constitucionais que lhe são contrapostos, bem como da conclusão do laudo médico, ficou demonstrada a indispensabilidade do medicamento para a manutenção da vida e saúde do paciente, idoso maior de 60 anos e hipertenso, de modo que normas de inferior hierarquia não prevalecem em relação ao direito constitucional à saúde e à vida, ainda mais diante da prova concreta trazida aos autos pelo apelado e nenhuma contraprova pelo apelante. Não prospera de igual modo a alegação do apelante de que vedada a inclusão no orçamento de dispositivo estranho à previsão da receita e fixação da despesa, pois tratando-se na espécie de direito à saúde, direito social que figura entre os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal, impende ao recorrente cumpri-la independentemente de previsão orçamentária específica. Corroborando o raciocínio apresentado, colaciono o seguinte julgado do Superior Tribunal Justiça: ¿PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. (...) AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TRATAMENTO DE SAÚDE. DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. FALTA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. IMPEDIMENTO AO PROVIMENTO DA AÇÃO. INEXISTÊNCIA. EFETIVAÇÃO DE DIREITO FUNDAMENTAL. PRECEDENTES DESTA CORTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 83/STJ. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. (...) IV - O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico segundo o qual é possível o manejo de ação civil pública pelo Ministério Público para a defesa de direitos individuais indisponíveis, por coadunar-se com as suas funções institucionais. V - Esta Corte tem orientação consolidada no sentido de que o funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, sendo qualquer deles, em conjunto ou isoladamente, parte legítima para figurar no polo passivo de demanda que objetive a garantia de acesso a medicamentos ou a realização de tratamento médico. VI - É consolidado o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual a falta de previsão orçamentária não impede a concessão de provimento judicial que objetiva dar efetividade aos direitos fundamentais.(...) X - Agravo Interno improvido. (AgInt no REsp 1234968/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 21/11/2017) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. A FALTA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA NÃO CONSTITUI ÓBICE À CONCESSÃO DE PROVIMENTO JUDICIAL QUE DÊ EFETIVIDADE A DIREITOS FUNDAMENTAIS. AGRAVO REGIMENTAL DO MUNICÍPIO DE UBERABA/MG DESPROVIDO. (...) 3. A falta de previsão orçamentária não constitui óbice à concessão de provimento judicial que dê efetividade a direitos fundamentais, uma vez que as limitações orçamentárias não podem servir de escudo para recusas de cumprimento de obrigações prioritárias. Precedente: AgRg no REsp. 1.136.549/RS, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 21.6.2010. 4. Agravo Regimental do MUNICÍPIO DE UBERABA/MG desprovido. (AgRg no AREsp 649.229/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 06/04/2017) Nesse particular, não se deve olvidar a prevalência da tutela ao direito subjetivo à saúde sobre o interesse público, que, no caso, consubstancia-se na preservação da saúde em detrimento dos princípios do Direito Financeiro ou Administrativo. Diferente do que alega o apelante, não se trata de privilegiar um usuário em detrimento de todos os demais, mas de reconhecer que as necessidades de saúde de todos devem ser prontamente atendidas pelo Poder Público, de modo que a nenhuma lesão de direito deve ser recusada a tutela jurisdicional. Não obstante as dificuldades do sistema público de saúde em bem atender a toda a demanda, tem o cidadão o direito de exigir que as suas necessidades de saúde sejam prontamente atendidas, especialmente para evitar que se agravem. No que tange a alegação de falta de renovação de receituário médico nos autos, também não há como ser acolhida como forma de afastar a condenação ao fornecimento do medicamento, pois não há qualquer comprovação de que o apelante tenha solicitado ao interessado a renovação de seu receituário médico, não havendo que se falar em negativa de disponibilização deste por parte do paciente, muito menos de falta de interesse, até porque no caso, os documentos médicos apontam a necessidade de uso contínuo do medicamento. No que concerne à alegação de satisfatividade da medida liminar deferida, entendo que agiu acertadamente o juiz de piso ao deferir a liminar, na medida em que o caso reflete demanda envolvendo direito fundamental à vida e saúde, garantido pela Carta Magna, e que por isso mesmo predomina sobre as demais regras. Destaco, ainda, que a vedação de liminar contra atos do poder público que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação, é regra relativa, sobretudo quando se confronta com o direito à vida, como ocorre na situação em causa. Assim, admissível se afigura, em caráter excepcional, o deferimento de medida satisfativa contra a Fazenda Pública, pois, ao efetuar juízo de ponderação, impõe-se que seja assegurado o direito à vida, a exemplo do julgado: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA INAUDITA ALTERA PARS. PACIENTE PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA EM MÉDICO ESPECIALIZADO. ALEGADA SATISFATIVIDADE DA LIMINAR DEFERIDA. NÃO CABIMENTO. O PERIGO DA DEMORA MILITA A FAVOR DO PACIENTE. DO SUSTENTADO NECESSÁRIO CHAMAMENTO Á LIDE DA UNIÃO E DO ESTADO DO PARÁ. IMPROCEDÊNCIA. OS ENTES FEDERATIVOS PODEM SER DEMANDADOS EM CONJUNTO OU ISOLADAMENTE, DADA A EXISTÊNCIA DA SOLIDARIEDADE ENTRE OS MESMOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. . 1. A iminência de dano irreparável ou de difícil reparação decorre da gravidade da doença que acomete o paciente, portador de necessidades especiais, a medida em que, o tratamento cirúrgico indicado visa salvaguardar a sua vida e proporcionar um adequado tratamento ao caso apresentado 2. Demais disso, o perigo na demora milita a favor da Autor/Recorrido, uma vez que o seu estado de saúde e a necessidade urgente de ser realizado o tratamento cirúrgico não podem aguardar a tutela definitiva, sem haver perigo de dano de difícil reparação. 3. Encontra-se consolidado em nossas Cortes Superiores o entendimento no sentido de que o estado, o município e a União são legitimados passivos solidários, conforme determina o texto constitucional, sendo dever do Poder Público, a garantia à saúde pública, o que significa dizer que podem ser demandados em conjunto, ou isoladamente, como ocorreu na hipótese em julgamento, dada a existência da solidariedade entre os mesmos. 4. Recurso conhecido e improvido. Decisão unânime. (2016.02390605-37, 161.078, Rel. NADJA NARA COBRA MEDA, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-06-16, Publicado em 2016-06-17) De outra banda, no tocante à alegação de que para o cumprimento da liminar há a necessidade de instauração de processo administrativo, também não merece prosperar, pois tal justificativa é irrelevante para a negativa de assistência, haja vista que o Município deve buscar os meios de efetivação da tutela emergencial, utilizando os meios de coerção cabíveis e, até mesmo a compra direta do medicamento, em caso de demora excessiva, em razão do caráter de urgência da medida, com fundamento no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93 que autoriza a dispensa da licitação para a hipótese, pois o retardamento do fornecimento do medicamento pode resultar na inutilidade do provimento judicial. Desse modo, irrepreensíveis os fundamentos da sentença uma vez que amparada no dever constitucional de efetivação do direito à saúde e à proteção do idoso pelo poder público, conforme jurisprudência pacífica da Suprema Corte, em alguns pontos inclusive sob a sistemática da Repercussão Geral e do Superior Tribunal de Justiça, nos termos da fundamentação acima exposta, razão pela qual, entendo necessário observar o art. 932 do CPC/2015. Sentença igualmente mantida em remessa necessária. Ante o exposto, com fulcro no que dispõe o art. 932, incisos IV, b e VIII, do CPC/2015 c/c 133, XI, b e d, do RITJPA, nego provimento ao recurso de apelação e à remessa necessária, para manter a sentença em todos os seus termos. Após o decurso do prazo recursal sem qualquer manifestação, certifique-se o trânsito em julgado e dê-se a baixa no LIBRA com a consequente remessa dos autos ao juízo de origem. Belém, 14 de dezembro de 2017. Des. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO Relator
(2017.05392197-13, Não Informado, Rel. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2018-01-17, Publicado em 2018-01-17)
Data do Julgamento
:
17/01/2018
Data da Publicação
:
17/01/2018
Órgão Julgador
:
2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a)
:
LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO
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