TJPA 0046540-95.2012.8.14.0301
PROCESSO N. 2013.3.004582-9. SECRETARIA DA 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA. COMARCA DA CAPITAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVANTE: MUNICIPIO DE BELEM. PROCURADOR MUNICIPAL: BRUNO CEZAR N. DE FREITAS ¿ OAB/PA 11.290. AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. PROMOTORA DE JUSTIÇA: SUELY REGINA AGUIAR DA CRUZ. PROCURADORA DE JUSTIÇA: MARIZA MACHADO DA SILVA LIMA. RELATORA: DESEMBARGADORA DIRACY NUNES ALVES. DECISÃO MONOCRÁTICA MUNICIPIO DE BELEM interpõe AGRAVO DE INSTRUMENTO contra decisão da MMª 3ª Vara de Fazenda de Belém que concedeu liminar para que a municipalidade proceda a imediata regularização dos equipamentos nos prontos-socorros municipais, bem como que efetue o pagamento do saldo restante da dívida existente junto à segunda ré, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) em caso de descumprimento. A municipalidade pugna pela reforma da decisão agravada. Preliminarmente alega: a) seria incabível a concessão de liminar porque é satisfativa e esgota o objeto da ação, na forma do art. 1º, §1º da Lei n. 8.437/92 c/c art. 7º da Lei n. 12.016/2009. No mérito: a) apesar de não terem sido provadas pelo parquet as condições precárias dos equipamentos dos prontos-socorros narradas pela Cooperativa dos Médicos, a prefeitura adquiriu nos meses de maio a setembro de 2012 equipamentos para a manutenção preventiva e corretiva, de modo que se a situação caótica existia ela foi devidamente sanada; b) o débito existente entre o ente público e a Cooperativa dos Anestesiologistas já foi devidamente acordada entre as partes, tendo ocorrido o repasse dos pagamentos relativos aos meses de agosto e setembro de 2012, bem como foi ainda acordado que a Cooperativa permaneceria prestando o serviço até 31 de janeiro de 2013. Devidamente distribuídos, coube-me a relatoria do feito (fl. 352), oportunidade em que me reservei a analisar o pleito liminar após estabelecido o contraditório (fl. 354). Contrarrazões às fls. 356/371. Parecer da douta Procuradoria de Justiça às fls. 404/410. É o relatório. DECIDO. Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso. 1. DA PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR DE CARÁTER SATISFATIVO. Alega a municipalidade que a liminar viola o art.1º, §3º da Lei Federal n. 8.437/1992, norma que veda concessão de liminar que esgote no todo ou em parte o objeto da ação. Pois bem, a demanda não se esgota com a concessão da liminar. Muito pelo contrário. Se trata de ordem cautelar que resguarda direito a saúde que se não atendido de pronto pode ocasionar o perecimento não apenas do direito, mas da própria vida de toda uma coletividade usuária dos pronto s -socorros municipais. Nas palavras do eminente Desembargador Antônio Vinícius Amaro da Silveiro, do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: ¿ o juízo de valor estabelecido interlocutoriamente, ainda que satisfatório, possui natureza eminentemente provisória, o qual só poderá alcançar a imutabilidade por meio de uma valoração definitiva, que advirá apenas com a sentença transitada em julgado, uma vez ultrapassado o contraditório e o devido processo legal. Antes disso, por mais satisfativo que seja seu objeto, ainda será provisório e necessitará sempre de uma confirmação ou mesmo revogação¿. Neste sentido já julgou o Egrégio Tribuna de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE EXAME CLÍNICO. NÃO OCORRÊNCIA DE PERDA DO OBJETO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. ARTIGO 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. DIREITO À SAÚDE. 1. A antecipação dos efeitos da tutela, e o seu efetivo cumprimento, não implica em esgotamento do objeto da ação, mas sim na procedência do pedido, com a confirmação da medida antecipatória deferida. 2. Responsabilidade solidária entre os entes federados pelo fornecimento de medicamentos e demais ações de saúde. Entendimento predominante junto ao Egrégio 2º Grupo Cível, a que pertence esta Colenda 4ª Câmara Cível. 3. A Constituição Federal, em seu art. 196, assegura que "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE. (Apelação Cível Nº 70059057604, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em 24/06/2014) Portanto, rejeito a prefacial. Sem mais preliminares, passo a analisar o mérito da questão. 2. DO MÉRITO. De início, assevero que nesta sede recursal cabe apenas verificar se a decisão guerreada está corretamente alicerçada para o deferimento da tutela antecipada ou não. A liminar deve ser baseada na convicção do magistrado acerca do ¿pericullum in mora¿ e do ¿fumus boni júris¿, os quais devem, necessariamente, caminhar juntos, a fim de que possa utilizar-se do ¿poder-dever¿ de conceder ¿in limine¿ a medida acautelatória. Sobre o tema, o Ilustre jurista paraense Zeno Veloso , nos ensina: ¿(...) Para obter a liminar, o autor deve demonstrar o fumus boni juris (fumaça do bom direito), isto é, a plausibilidade jurídica, a razoabilidade e a pertinência das razões jurídicas que alega, o fundamento do pedido. Mas isto não basta. É preciso evidenciar que, não sendo concedida a liminar, enfim, não sendo suspensa liminarmente a vigência da norma inquinada, com a demora do processamento e do julgamento definitivo da ação, há a probabilidade de ocorrerem transtornos graves, lesões irremediáveis, danos e prejuízos de difícil ou incerta reparação (periculum in mora = perigo na demora). Estes dois pressupostos são cumulativos, devem coexistir, para que a medida cautelar seja concedida (cf. RTJ 125/56)¿. A questão de fundo no presente feito remonta ao pretenso antagonismo entre a tese da Prefeitura Municipal de Belém de que a situação caótica nos prontos-socorros da capital estão perfeitamente sanadas e de outro o Ministério Pública que denuncia a ausência de equipamentos e insumos para o adequado atendimento da população, bem como a então iminente greve dos médicos anestesiologistas, face o atraso reiterado do pagamento a eles devido. Em meu sentir, apesar das alegações da prefeitura municipal entendo que a situação caótica no serviço dos prontos-socorros municipais infelizmente ainda não foi regularizada, face as informações estampadas nos jornais todos os dias, causando a população que dele necessitada diversos prejuízos, violando seu direito fundamental à saúde, tanto que a própria municipalidade expediu o Decreto n. 73.420/2013-PMB, de 11 de janeiro de 2013 (fl. 395) que declarou situação de emergência em saúde pública, no qual reconhece que a rede municipal de saúde ¿se e encontra com sua capacidade de resposta esgotada, sem medicamentos nos prontos socorros e postos¿. A situação narrada nos autos demonstra não apenas grave deficiente material, mas também não pagamento de médicos anestesiologistas, cujo serviço é essencial para a administração da saúde, o que deve, imediatamente, ser solucionado para evitar o agravamento da situação aviltante que a população está submetida. Cabe ao Juiz ao interpretar a norma vigente, a partir de seu livre convencimento, para melhor adequar a realidade aos dispositivos normativos vigentes. Entendo firmemente que os direitos sociais e individuais estabelecidos em nossa Carta Magna não tem apenas conotação programática, de princípio, mas também confere direitos subjetivos à pessoa. No caso em tela temos o art. 6º da Constituição Federal que assim reza: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Portanto, o direito à saúde é consagrado constitucionalmente como algo não apenas utópico, mas exequível e exigível, sendo claramente coerente que aquele que necessita de medicamentos, exames ou procedimentos para a promoção, proteção e recuperação de sua saúde possui direito subjetivo para tanto . Mas não é só. O sistema constitucional vai além quando seu art. 196 prevê que o Estado deve instituir políticas públicas que sejam suficientes e eficazes para a promoção, proteção e recuperação da saúde da pessoa. Neste mesmo sentido já julgou o C. STJ: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. HEPATITE C. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À SAÚDE, À VIDA E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. LAUDO EMITIDO POR MÉDICO NÃO CREDENCIADO PELO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). EXAMES REALIZADOS EM HOSPITAL ESTADUAL. PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. 1. A ordem constitucional vigente, em seu art. 196, consagra o direito à saúde como dever do Estado, que deverá, por meio de políticas sociais e econômicas, propiciar aos necessitados não "qualquer tratamento", mas o tratamento mais adequado e eficaz, capaz de ofertar ao enfermo maior dignidade e menor sofrimento. 2. Sobreleva notar, ainda, que hoje é patente a idéia de que a Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas. Destarte, na aplicação das normas constitucionais, a exegese deve partir dos princípios fundamentais, para os princípios setoriais. E, sob esse ângulo, merece destaque o princípio fundante da República que destina especial proteção a dignidade da pessoa humana. (...) 8. Recurso Ordinário provido, para conceder a segurança pleiteada na inicial, prejudicado o pedido de efeito suspensivo ao presente recurso (fls. 261/262), em razão do julgamento do mérito recursal e respectivo provimento. (RMS 24.197/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 24/08/2010). E não poderia ser diferente as visões de nossas cortes superiores, pois qualquer pleito que vise a fomentar uma existência minimamente decente, não pode ser prescindível, pois garantir a dignidade da pessoa humana é um dos principais alicerces do Estado Democrático de Direito, posto isto, o princípio da reserva do possível não pode ser oposto de forma superior ao princípio do mínimo existencial. Em casos como o dos autos deve ser aplicado o permissivo do §1º-A do art. 557 do CPC, vejamos: Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. Ante o exposto, conheço e nego provimento ao Agravo de Instrumento interposto, nos termos da fundamentação. Belém, 20 de fevereiro de 2015. Desembargadora DIRACY NUNES ALVES Relatora
(2015.00529167-13, Não Informado, Rel. DIRACY NUNES ALVES, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2015-02-23, Publicado em 2015-02-23)
Ementa
PROCESSO N. 2013.3.004582-9. SECRETARIA DA 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA. COMARCA DA CAPITAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVANTE: MUNICIPIO DE BELEM. PROCURADOR MUNICIPAL: BRUNO CEZAR N. DE FREITAS ¿ OAB/PA 11.290. AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. PROMOTORA DE JUSTIÇA: SUELY REGINA AGUIAR DA CRUZ. PROCURADORA DE JUSTIÇA: MARIZA MACHADO DA SILVA LIMA. RELATORA: DESEMBARGADORA DIRACY NUNES ALVES. DECISÃO MONOCRÁTICA MUNICIPIO DE BELEM interpõe AGRAVO DE INSTRUMENTO contra decisão da MMª 3ª Vara de Fazenda de Belém que concedeu liminar para que a municipalidade proceda a imediata regularização dos equipamentos nos prontos-socorros municipais, bem como que efetue o pagamento do saldo restante da dívida existente junto à segunda ré, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) em caso de descumprimento. A municipalidade pugna pela reforma da decisão agravada. Preliminarmente alega: a) seria incabível a concessão de liminar porque é satisfativa e esgota o objeto da ação, na forma do art. 1º, §1º da Lei n. 8.437/92 c/c art. 7º da Lei n. 12.016/2009. No mérito: a) apesar de não terem sido provadas pelo parquet as condições precárias dos equipamentos dos prontos-socorros narradas pela Cooperativa dos Médicos, a prefeitura adquiriu nos meses de maio a setembro de 2012 equipamentos para a manutenção preventiva e corretiva, de modo que se a situação caótica existia ela foi devidamente sanada; b) o débito existente entre o ente público e a Cooperativa dos Anestesiologistas já foi devidamente acordada entre as partes, tendo ocorrido o repasse dos pagamentos relativos aos meses de agosto e setembro de 2012, bem como foi ainda acordado que a Cooperativa permaneceria prestando o serviço até 31 de janeiro de 2013. Devidamente distribuídos, coube-me a relatoria do feito (fl. 352), oportunidade em que me reservei a analisar o pleito liminar após estabelecido o contraditório (fl. 354). Contrarrazões às fls. 356/371. Parecer da douta Procuradoria de Justiça às fls. 404/410. É o relatório. DECIDO. Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso. 1. DA PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR DE CARÁTER SATISFATIVO. Alega a municipalidade que a liminar viola o art.1º, §3º da Lei Federal n. 8.437/1992, norma que veda concessão de liminar que esgote no todo ou em parte o objeto da ação. Pois bem, a demanda não se esgota com a concessão da liminar. Muito pelo contrário. Se trata de ordem cautelar que resguarda direito a saúde que se não atendido de pronto pode ocasionar o perecimento não apenas do direito, mas da própria vida de toda uma coletividade usuária dos pronto s -socorros municipais. Nas palavras do eminente Desembargador Antônio Vinícius Amaro da Silveiro, do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: ¿ o juízo de valor estabelecido interlocutoriamente, ainda que satisfatório, possui natureza eminentemente provisória, o qual só poderá alcançar a imutabilidade por meio de uma valoração definitiva, que advirá apenas com a sentença transitada em julgado, uma vez ultrapassado o contraditório e o devido processo legal. Antes disso, por mais satisfativo que seja seu objeto, ainda será provisório e necessitará sempre de uma confirmação ou mesmo revogação¿. Neste sentido já julgou o Egrégio Tribuna de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE EXAME CLÍNICO. NÃO OCORRÊNCIA DE PERDA DO OBJETO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. ARTIGO 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. DIREITO À SAÚDE. 1. A antecipação dos efeitos da tutela, e o seu efetivo cumprimento, não implica em esgotamento do objeto da ação, mas sim na procedência do pedido, com a confirmação da medida antecipatória deferida. 2. Responsabilidade solidária entre os entes federados pelo fornecimento de medicamentos e demais ações de saúde. Entendimento predominante junto ao Egrégio 2º Grupo Cível, a que pertence esta Colenda 4ª Câmara Cível. 3. A Constituição Federal, em seu art. 196, assegura que "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE. (Apelação Cível Nº 70059057604, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em 24/06/2014) Portanto, rejeito a prefacial. Sem mais preliminares, passo a analisar o mérito da questão. 2. DO MÉRITO. De início, assevero que nesta sede recursal cabe apenas verificar se a decisão guerreada está corretamente alicerçada para o deferimento da tutela antecipada ou não. A liminar deve ser baseada na convicção do magistrado acerca do ¿pericullum in mora¿ e do ¿fumus boni júris¿, os quais devem, necessariamente, caminhar juntos, a fim de que possa utilizar-se do ¿poder-dever¿ de conceder ¿in limine¿ a medida acautelatória. Sobre o tema, o Ilustre jurista paraense Zeno Veloso , nos ensina: ¿(...) Para obter a liminar, o autor deve demonstrar o fumus boni juris (fumaça do bom direito), isto é, a plausibilidade jurídica, a razoabilidade e a pertinência das razões jurídicas que alega, o fundamento do pedido. Mas isto não basta. É preciso evidenciar que, não sendo concedida a liminar, enfim, não sendo suspensa liminarmente a vigência da norma inquinada, com a demora do processamento e do julgamento definitivo da ação, há a probabilidade de ocorrerem transtornos graves, lesões irremediáveis, danos e prejuízos de difícil ou incerta reparação (periculum in mora = perigo na demora). Estes dois pressupostos são cumulativos, devem coexistir, para que a medida cautelar seja concedida (cf. RTJ 125/56)¿. A questão de fundo no presente feito remonta ao pretenso antagonismo entre a tese da Prefeitura Municipal de Belém de que a situação caótica nos prontos-socorros da capital estão perfeitamente sanadas e de outro o Ministério Pública que denuncia a ausência de equipamentos e insumos para o adequado atendimento da população, bem como a então iminente greve dos médicos anestesiologistas, face o atraso reiterado do pagamento a eles devido. Em meu sentir, apesar das alegações da prefeitura municipal entendo que a situação caótica no serviço dos prontos-socorros municipais infelizmente ainda não foi regularizada, face as informações estampadas nos jornais todos os dias, causando a população que dele necessitada diversos prejuízos, violando seu direito fundamental à saúde, tanto que a própria municipalidade expediu o Decreto n. 73.420/2013-PMB, de 11 de janeiro de 2013 (fl. 395) que declarou situação de emergência em saúde pública, no qual reconhece que a rede municipal de saúde ¿se e encontra com sua capacidade de resposta esgotada, sem medicamentos nos prontos socorros e postos¿. A situação narrada nos autos demonstra não apenas grave deficiente material, mas também não pagamento de médicos anestesiologistas, cujo serviço é essencial para a administração da saúde, o que deve, imediatamente, ser solucionado para evitar o agravamento da situação aviltante que a população está submetida. Cabe ao Juiz ao interpretar a norma vigente, a partir de seu livre convencimento, para melhor adequar a realidade aos dispositivos normativos vigentes. Entendo firmemente que os direitos sociais e individuais estabelecidos em nossa Carta Magna não tem apenas conotação programática, de princípio, mas também confere direitos subjetivos à pessoa. No caso em tela temos o art. 6º da Constituição Federal que assim reza: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Portanto, o direito à saúde é consagrado constitucionalmente como algo não apenas utópico, mas exequível e exigível, sendo claramente coerente que aquele que necessita de medicamentos, exames ou procedimentos para a promoção, proteção e recuperação de sua saúde possui direito subjetivo para tanto . Mas não é só. O sistema constitucional vai além quando seu art. 196 prevê que o Estado deve instituir políticas públicas que sejam suficientes e eficazes para a promoção, proteção e recuperação da saúde da pessoa. Neste mesmo sentido já julgou o C. STJ: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. HEPATITE C. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À SAÚDE, À VIDA E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. LAUDO EMITIDO POR MÉDICO NÃO CREDENCIADO PELO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). EXAMES REALIZADOS EM HOSPITAL ESTADUAL. PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. 1. A ordem constitucional vigente, em seu art. 196, consagra o direito à saúde como dever do Estado, que deverá, por meio de políticas sociais e econômicas, propiciar aos necessitados não "qualquer tratamento", mas o tratamento mais adequado e eficaz, capaz de ofertar ao enfermo maior dignidade e menor sofrimento. 2. Sobreleva notar, ainda, que hoje é patente a idéia de que a Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas. Destarte, na aplicação das normas constitucionais, a exegese deve partir dos princípios fundamentais, para os princípios setoriais. E, sob esse ângulo, merece destaque o princípio fundante da República que destina especial proteção a dignidade da pessoa humana. (...) 8. Recurso Ordinário provido, para conceder a segurança pleiteada na inicial, prejudicado o pedido de efeito suspensivo ao presente recurso (fls. 261/262), em razão do julgamento do mérito recursal e respectivo provimento. (RMS 24.197/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 24/08/2010). E não poderia ser diferente as visões de nossas cortes superiores, pois qualquer pleito que vise a fomentar uma existência minimamente decente, não pode ser prescindível, pois garantir a dignidade da pessoa humana é um dos principais alicerces do Estado Democrático de Direito, posto isto, o princípio da reserva do possível não pode ser oposto de forma superior ao princípio do mínimo existencial. Em casos como o dos autos deve ser aplicado o permissivo do §1º-A do art. 557 do CPC, vejamos: Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. Ante o exposto, conheço e nego provimento ao Agravo de Instrumento interposto, nos termos da fundamentação. Belém, 20 de fevereiro de 2015. Desembargadora DIRACY NUNES ALVES Relatora
(2015.00529167-13, Não Informado, Rel. DIRACY NUNES ALVES, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2015-02-23, Publicado em 2015-02-23)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
23/02/2015
Data da Publicação
:
23/02/2015
Órgão Julgador
:
5ª CAMARA CIVEL ISOLADA
Relator(a)
:
DIRACY NUNES ALVES
Número do documento
:
2015.00529167-13
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
Mostrar discussão