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Jurisprudência


TJPA 0047343-10.2014.8.14.0301

Ementa
D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo ESTADO DO PARÁ, pessoa jurídica de direito público interno, por intermédio de sua procuradora, com pedido de Efeito Suspensivo, contra decisão do Juízo a quo da 1ª Vara de Fazenda de Belém, que deferiu o pedido de liminar requerido nos autos da AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR (Processo Nº: 0047343-10.2014.8.14.03.01), proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. Em suas razões recursais, narra o agravante que o agravado ajuizou Ação Civil Pública, com pedido de tutela judicial de urgência em favor de Terezinha de Jesus Moura Rolim dos Santos, pleiteando fornecimento do medicamento Sildefanila (20mg), na dosagem prescrita pelo médico. Narrou, também, que o Juízo a quo concedeu a liminar, nos termos requeridos pela Autora, cominando em multa pessoal diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por descumprimento da decisão. Pelo qual, o agravante vem pleitear que a decisão liminar deve ser reformada. Alegou, ademais, que a liminar expedida merece ser cassada, pela impossibilidade de fixação de multa diária na figura do gestor público, não sendo possível aguardar eventual interposição de apelação para deduzir estas razões. Assim, ao final, requereu a concessão do Efeito Suspensivo, para sustar imediatamente os efeitos da decisão ora recorrida. No mérito, ouvido o agravado, requereu o total provimento do recurso em analise, com a cassação definitiva da decisão combatida. Coube-me a relatoria em 15/10/2014. Vieram-me conclusos os autos. DECIDO Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso e passo a apreciá-lo. Compulsando os autos do presente recurso, pretende o agravante a suspensão da decisão vergastada que abaixo segue: (...) Assim, não garantir a assistência médica pleiteada é uma forma de desrespeito a vida do envolvido. Não seria ético tampouco legal permitir a convivência da parte autora sem o tratamento adequado a sua enfermidade, capaz de minimizar seu sofrimento. Assim, com lastro no art. 273 c/c art. 12 da Lei nº 7.347/85, defiro os efeitos da liminar requerida na inicial, para determinar ao requerido o seguinte: a) Forneça gratuitamente, continuamente, regularmente e na quantidade prevista nas respectivas prescrições médicas, o medicamento SILDENAFILA 20 mg, a Sra. TEREZINHA DE JESUS MOURA ROLIM DOS SANTOS, no prazo de 48h (quarenta e oito horas), sob pena de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por cada dia de atraso a ser suportado pelo representante legal do requerido. No caso em exame, observo que o Juízo a quo deferiu a medida em caráter liminar, por entender estarem presentes todos os requisitos à antecipação da tutela, uma vez que não há dúvidas quanto ao estado de saúde da requerente, bem como da necessidade de utilização do medicamento prescrito, a fim de garantir melhoras a sua saúde. Inicialmente, registro que a regra constitucional do art. 196, da Carta Magna, atribui ao Estado (lato sensu) a proteção à saúde de todos, como se nota: Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Independentemente da esfera institucional, compete ao Poder Público, solidária e conjuntamente, dar efetividade à prerrogativa constitucional atinente ao direito à saúde. Corroborando esse entendimento, o STF já decidiu: SAÚDE - AQUISIÇÃO E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - DOENÇA RARA. Incumbe ao Estado (gênero) proporcionar meios visando a alcançar a saúde, especialmente quando envolvida criança e adolescente. O Sistema Único de Saúde torna a responsabilidade linear alcançando a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios (RE 19592/RS, STF, Segunda Turma, Relator Ministro Marco Aurélio, por unanimidade, DJ 31.03.2000). É extremamente importante registrar, ainda, que "O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A interpretação da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional inconseqüente. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. Distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes. O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade." (RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Como bem pontuou o Ministro Celso de Mello (STA 175-AgR/CE, Informativo do STF nº 582), O alto significado social e o irrecusável valor constitucional de que se reveste o direito à saúde não podem ser menosprezados pelo Estado, sob pena de grave e injusta frustração de um inafastável compromisso constitucional, que tem, no aparelho estatal, o seu precípuo destinatário. O objetivo perseguido pelo legislador constituinte, em tema de proteção ao direito à saúde, traduz meta cuja não-realização qualificar-se-á como uma censurável situação de inconstitucionalidade por omissão imputável ao Poder Público, ainda mais se se tiver presente que a Lei Fundamental da República delineou, nessa matéria, um nítido programa a ser (necessariamente) implementado mediante adoção de políticas públicas conseqüentes e responsáveis. (...) Isso significa que a intervenção jurisdicional, justificada pela ocorrência de arbitrária recusa governamental em conferir significação real ao direito à saúde, tornar-se-á plenamente legítima (sem qualquer ofensa, portanto, ao postulado da separação de poderes), sempre que se impuser, nesse processo de ponderação de interesses e de valores em conflito, a necessidade de fazer prevalecer a decisão política fundamental que o legislador constituinte adotou em tema de respeito e de proteção ao direito à saúde. (...) Na realidade, o cumprimento do dever político-constitucional consagrado no art. 196 da Lei Fundamental do Estado, consistente na obrigação de assegurar, a todos, a proteção à saúde, representa fator, que, associado a um imperativo de solidariedade social, impõe-se ao Poder Público, qualquer que seja a dimensão institucional em que atue no plano de nossa organização federativa. É preciso destacar, ainda, que o dever estatal de atribuir efetividade aos direitos fundamentais, de índole social, qualifica-se como expressiva limitação à discricionariedade administrativa. Na esteira do entendimento consolidado do Pretório Excelso, cumpre assinalar que a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse, como prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o mandamento constitucional, frustrando-lhe, arbitrariamente, a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante. Afinal, ponderou o eminente Ministro aposentado do STF Joaquim Barbosa que "Consolidou-se a jurisprudência desta Corte no sentido de que, embora o art. 196 da Constituição de 1988 traga norma de caráter programático, o Município não pode furtar-se do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde por todos os cidadãos. Se uma pessoa necessita, para garantir o seu direito à saúde, de tratamento médico adequado, é dever solidário da União, do Estado e do Município providenciá-lo." (STF, AI 550.530-AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 26-6-2012, Segunda Turma, DJE de 16-8-2012.) Fixadas essas premissas constitucionais que tangenciam a matéria e revelam sua importância, o agravante impugnou a cominação de astreintes no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser suportado pelo representante legal do requerido (Governador), na medida em que seria pessoa estranha à relação processual, bem como a contrariedade de tal cominação em face da jurisprudência consolidada. Com efeito, assiste razão ao agravante, na medida em que a jurisprudência se alinha no sentido da impossibilidade de cominação de multa por descumprimento de ordem judicial em face de agente público, admitindo-se a cominação tão somente em desfavor da pessoa jurídica que integra o conceito de Fazenda Pública, in verbis: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA CONTRA O ESTADO DE SERGIPE E A FUNDAÇÃO HOSPITALAR DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DAS TESES VEICULADAS NO RECURSO ESPECIAL. SÚMULA 211/STJ. MULTA PREVISTA NO ART. 461, §§ 4º E 5º, DO CPC. IMPOSIÇÃO AO AGENTE PÚBLICO QUE NÃO FIGUROU COMO PARTE NO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. AFRONTA AO DIREITO DE AMPLA DEFESA. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1 - O Tribunal de origem, apesar de instado a fazê-lo por meio dos competentes embargos de declaração, não se pronunciou sobre as teses versadas no presente recurso. Nesse contexto, caberia à parte recorrente, nas razões do apelo especial, indicar ofensa ao art. 535 do CPC, alegando a existência de possível omissão, providência da qual não se desincumbiu. Incide, pois, o óbice da Súmula 211/STJ. 2 - Ainda que assim não fosse, o entendimento exposto no acórdão impugnado se amolda à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, firmada no sentido de que o agente público não pode ser pessoalmente condenado ao pagamento de astreintes se não figurou como parte na relação processual em que imposta a cominação, sob pena de afronta ao direito constitucional de ampla defesa. Precedentes. 3 - Recurso especial a que se nega provimento. (grifei) (STJ - REsp: 1433805 SE 2013/0221482-0, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 16/06/2014, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/06/2014) ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APLICAÇÃO DE MULTA PREVISTA NO ART. 461, §§ 4º E 5º, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO AO GESTOR PÚBLICO POR NÃO SER PARTE NO FEITO. 1. Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, em se tratando de obrigação de fazer, é permitido ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa cominatória ao devedor (astreintes), mesmo contra a Fazenda Pública. 2. Não é possível, contudo, a extensão ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda Pública em decorrência da sua não participação efetiva no processo. Entendimento contrário acabaria por violar os princípios do contraditório e da ampla defesa. Agravo regimental improvido. (grifei) (AgRg no AREsp 196.946/SE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 16/05/2013). PROCESSUAL CIVIL. ASTREINTES. ART. 461, § 4º, DO CPC. REDIRECIONAMENTO A QUEM NÃO FOI PARTE NO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Na origem, foi ajuizada Ação Civil Pública para compelir o Estado de Sergipe ao fornecimento de alimentação a presos provisórios recolhidos em Delegacias, tendo sido deferida antecipação de tutela com fixação de multa diária ao Secretário de Estado da Justiça e Cidadania, tutela essa confirmada na sentença e na Apelação Cível, que foi provida apenas para redirecionar as astreintes ao Secretário de Segurança Pública. 2. Na esteira do entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, admite-se a aplicação da sanção prevista no art. 461, § 4º do CPC à Fazenda Pública para assegurar o cumprimento da obrigação, não sendo possível, todavia, estendê-la ao agente político que não participara do processo e, portanto, não exercitara seu constitucional direito de ampla defesa. Precedentes. 3. In casu, a Ação Civil Pública fora movida contra o Estado de Sergipe - e não contra o Secretário de Estado -, de modo que, nesse contexto, apenas o ente público demandado está legitimado a responder pela multa cominatória. 4. Recurso Especial provido. (STJ, T2 - Segunda Turma, REsp 1315719 / SE, RECURSO ESPECIAL 2012/0058150-5, rel. Min. Herman Benjamin, 27/08/2013. Quanto ao montante fixado, o STJ entende que o valor atribuído à multa diária por descumprimento de ordem judicial deve ser razoável e proporcional ao valor da obrigação principal, admitindo-se, todavia, redução do montante que afeiçoar-se despropositado. (grifei) (AgRg no AREsp 363280 / RS AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0204806-2, rel. Min. João Otávio de Noronha, 19/11/2013). E a seguinte decisão monocrática no mesmo tom: agravo em recurso especial nº 530.705/TO (2014/0140158-8), de 4 de agosto de 2014, relatoria do Ministro Herman Benjamin. Diante disso, é necessário reafirmar a índole fundamental do direito objeto da controvérsia e a urgência efetiva de compelir o ente estatal a optar pelo cumprimento da decisão judicial. É pacífico, pois, como se mostrou, o entendimento do STJ que admite a imposição da multa cominatória prevista no art. 461, §4º, do CPC à Fazenda Pública, não sendo possível, contudo, estendê-la ao agente político que não participou do processo e, portanto, não exercitou seu constitucional direito de ampla defesa. Ademais, as medidas coercitivas previstas no art. 461, do Código de Processo Civil possuem aplicação restrita à pessoa jurídica de direito público ré, não atingindo seus representantes legais. À luz desses fundamentos, impõe-se o provimento da irresignação para afastar a imposição da multa ao representante legal do requerido (Governador), cujo pagamento, na hipótese de descumprimento, deverá ser feito pela Fazenda Pública Estadual. ANTE O EXPOSTO, com base no art. 557, §1º-A, do CPC e de tudo mais que nos autos consta, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO AO PRESENTE AGRAVO DE INSTRUMENTO para excluir da decisão recorrida a parte em que comina multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por descumprimento da ordem judicial ao Representante Legal do requerido (Governador), devendo esta ser imposta em face do Estado do Pará (Pessoa Jurídica de Direito Público), tudo nos moldes e limites da fundamentação lançada, que passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse totalmente transcrita. P.R.I. Belém, 28 de outubro de 2014. JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JÚNIOR RELATOR JUIZ CONVOCADO (2014.04635159-19, Não Informado, Rel. JOSE ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR - JUIZ CONVOCADO - JUIZ CONVOCADO, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-10-28, Publicado em 2014-10-28)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 28/10/2014
Data da Publicação : 28/10/2014
Órgão Julgador : 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : JOSE ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR - JUIZ CONVOCADO - JUIZ CONVOCADO
Número do documento : 2014.04635159-19
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
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