TJPA 0049598-38.2014.8.14.0301
Processo nº 2014.3.031756-6 Secretaria da 3ª Câmara Cível Isolada Comarca de Belém/PA Agravo de Instrumento Agravante: Presidente do Instituto de Previdência e Assistência Municipal de Belém - IPAMB Agravante: Município de Belém Advogado: Daniel Paes Ribeiro Junior ¿ Procurador Municipal Agravado: Dhiego Thourão Pereira Advogado: Elielson Nazareno Cardoso de Souza Relator: Des. Roberto Gonçalves de Moura Ementa: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR DEFERIDA PELO JUÍZO ¿A QUO¿. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO MUNICÍPIO. PLEITO DE ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RAZÕES DISSOCIADAS DA DECISÃO IMPUGNADA. ARGUIÇÃO DE DECADÊNCIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. TEMA NÃO APRECIADO PELO JUÍZO DE ORIGEM. INVIABILIDADE DE APRECIAÇÃO DE TAL PONTO PELA CORTE REVISORA (SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA). CONTRIBUIÇÃO COMPULSÓRIA PARA O CUSTEIO DE ASSISTÊNCIA. IPAMB. A JURISPRUDÊNCIA DO STF É PACÍFICA DO SENTIDO DE QUE É VEDADO AOS ENTES MUNICIPAIS E ESTADUAIS INSTITUIR CONTRIBUIÇÃO PARA ASSISTÊNCIA À SAÚDE A SER PAGA PELOS SEUS SERVIDORES DE FORMA COMPULSÓRIA. 1 ¿ A prejudicial de mérito arguida, conquanto matéria de ordem pública, não deve ser analisada nesta sede recursal, pois não foi objeto de apreciação pelo juiz ¿a quo¿, sendo certo que seu exame, agora implicaria em supressão de instância e a afronta ao princípio do duplo grau de jurisdição 2 - ¿Os Estados-Membros não podem contemplar como benefícios, de modo obrigatório em relação aos seus servidores, sob pena de mácula à Constituição do Brasil, por afronta à legislação fundamental que a União fez editar no desempenho legítimo de sua competência (Lei 9.717/1998), serviços de assistência médica, hospitalar, odontológica social e farmacêutica¿. Precedente do STF. ADI 3106. 3 - Agravo de Instrumento a que se nega seguimento monocraticamente, nos termos do art. 557, caput do CPC. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento , com pedido de efeito suspensivo , interposto pelo INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA DO MUNICÍPIO BELÉM ¿ IPAMB e pelo MUNICÍPIO DE BELÉM , contra decisão proferida pelo MM. Juízo 1 ª Vara da Fazenda de Belém (fls. 1 7/18 ), que , após analisar o pedido do autor formulado na inicial de Mandado de Segurança , concedeu a liminar requerida, no sentido de que o Presidente do IPAMB suspenda a cobrança a título de custeio d o Plano de Assistência Básica à Saúde ¿ PBASS incidente sobre a remuneração do servidor impetr ante /ora agravado. Em suas razões (fls. 0 2 /1 3 ), os agravantes, após breve exposição dos fatos, alegam, primeiramente, a ocorrência de nulidade, sustentando ausência de intimação da Procuradoria do Município de Belém, pelo que defende a anulação da sentença monocrática proferida pelo juízo ¿ a quo ¿. Argumentam sobre o indeferimento da inicial m andamental. Alegam a inadequação da via eleita, aduzindo o não cabimento do mandado de segurança em face de lei em tese. Asseveram que a decisão interlocutória é nitidamente satisfativa e, por isso, merece ser reformada , vez que corresponde ao próprio mérito da ação, o que seria vedado, citando decisão do STJ. Sustentam a decadência do direito à impetração do mandado de segurança. Defendem a impossibilidade de concessão de efeito patrimonial em mandado de segurança. A firma m ter sido realizada ampla discussão com os servidores municipais por meio de seminários, debates e fóruns distritais t rata ndo sobre o Plano de Assistência, esclarecendo que a contribuição que ora se discute foi instituída através de Assembleia Geral dos servidores públicos municipais, e posteriormente foi instituída por lei, logo não pode a Agravada alegar violação a direito. Argumentam que inexiste ilegalidade e irregularidade, e que, no presente caso, deve prevalecer a supremacia do interesse público na saúde. Destacam que o Município, diante da sua autonomia, possui a competência para criar um sistema próprio para a assistência à saúde de seus servidores, o que demonstra a legitimidade da Lei Municipal nº 7.984/1999. Afirmam que a manutenção da decisão agravada irá gerar prejuízos graves e de difícil reparação não só para o IPAMB como também para os segurados do Plano de Assistência Básica à Saúde e Social ¿ PABSS. Pugnam pela concessão do efeito suspensivo, afirmando que não estariam preenchidos os requisitos autorizadores para a concessão da liminar. Ao final, requereram o provimento para cassar a decisão combatida. Acostaram documentos (fls. 14/26). Coube-me a relatoria do feito por distribuição (v. fl. 27). É o relatório. DECIDO. Conheço do presente agravo de instrumento, porquanto presentes os requisitos necessários à sua admissibilidade. Primeiramente, cumpre destacar que a decisão agravada limitou-se a deferir, em sede liminar, tão somente a suspensão da cobrança a título de custeio do Plano de Assistência Básica à Saúde dos Servidores, descrita na Lei Municipal n° 7.984/99, da remuneração do agravado/impetrante, todavia os agravantes, em suas razões recursais, pleiteiam a anulação da sentença monocrática, apresentando argumentos no sentido de existência de nulidade processual, tendo em vista a ausência de intimação da Procuradoria do Município de Belém. Percebe-se, portanto, que, neste ponto, os Agravantes não impugnaram especificamente os fundamentos utilizados na decisão agravada, apresentando razões recursais dissociadas da decisão impugnada, vez que não há falar em anulação de sentença no caso em apreço, logo não merece agasalho tal argumentação. No que pertine à prejudicial de mérito de decadência para a impetração da ação mandamental, conquanto matéria de ordem pública, não deve ser analisada nesta sede recursal, já que não foi objeto de apreciação pelo juízo ¿a quo¿, sendo certo que o exame neste momento desse ponto, implicaria em supressão de instância e afronta ao princípio do duplo grau de jurisdição. Desde logo, incumbe-me frisar que, em análise aos fundamentos do presente recurso, verifica-se estar em confronto com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal. Vejamos: Segundo prescreve o art. 46 da Lei Municipal de Belém nº 7.984, de 30 de dezembro de 1999: ¿Art. 46. A contribuição para o custeio da assistência à saúde terá caráter obrigatório para os servidores indicados no art. 25 desta Lei, sendo cobrada no percentual de quatro por cento da remuneração, excluída a gratificação natalina.¿ Como se observa, a Contribuição Social para o custeio da assistência à saúde dos servidores públicos municipais fora instituída de forma compulsória através de uma lei municipal, fato este que não se harmoniza com o postulado constitucional previsto no art. 149 da Constituição Federal Brasileira, que prevê: ¿Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais , de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios INSTITUIRÃO CONTRIBUIÇÃO, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, DO REGIME PREVIDENCIÁRIO de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União.¿ (grifei). Sabe-se que a Contribuição Social detém natureza tributária e como todo tributo tem caráter compulsório, na forma do prescrito no art. 3°, do CTN. Por igual, os serviços da seguridade social, que serão custeados pelas respectivas contribuições sociais, subdividem-se em três espécies, quais sejam: assistência social, previdência e saúde, na forma do que prevê o art. 194, da Constituição Federal. De uma breve leitura do art. 149 da CF, verifica-se que o texto constitucional estabeleceu competência exclusiva da União para instituir contribuição social. A exceção prevista aos Estados, Distrito Federal e Município para instituírem a contribuição social (art. 149, §1º do CF) refere-se apenas a instituição de contribuição para o custeio da previdência social, não permitindo a instituição de contribuição à saúde e a assistência social, uma vez que não há previsão implícita na Constituição Federal em matéria de competência tributária. Chega-se a esse entendimento a partir do desenvolvimento da lógica jurídica, a justificar a conclusão a que se chegou sobre a impossibilidade de o ente municipal obrigar o recolhimento da referida contribuição à saúde. Pois bem, esta análise tem como ponto de partida a questão da competência constitucionalmente fixada para legislar sobre previdência e proteção e defesa da saúde (art. 24, XII c/c com o art. 30 II, da CRFB) e, em via de consequência, aos limites desta competência fixados aos Estados-membros, ao Distrito Federal e aos Municípios para regular a matéria. A competência legislativa, no caso, segundo o art. 24, XII, da CRFB, é concorrente para legislar sobre proteção à saúde, que, por sua vez, se divide em duas espécies: a) cumulativa e b) não-cumulativa. Na primeira delas, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios têm plena liberdade para legislar, inexistindo limites prévios ao exercício desta competência. Já em relação à competência concorrente não-cumulativa, há uma verdadeira concorrência material de competências (concorrências coexistentes dentro um mesmo campo material), reservando-se um nível superior ao ente federativo União, à qual é atribuída a competência para o estabelecimento de normas gerais, reservando-se aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (em relação a este ente, esta competência suplementar veio estabelecida no art. 30, II, da CRFB) a complementação da matéria. Essa complementação da matéria, a cargo dos Estados e dos Municípios é a denominada competência suplementar dos entes federativos, a qual, por seu turno, subdivide-se em: b.1) complementar; e b.2) supletiva. A competência suplementar complementar é aquela em que os entes federativos diversos da União estão impedidos de legislar pormenorizadamente sobre o tema até que ela, a União, edite norma geral sobre a matéria. A competência suplementar supletiva, prevista nos §§ 3° e 4°, do art. 24, da CRFB, é aquela em que os entes estaduais, o Distrito Federal e os Municípios (por força do art. 30, II, da CRFB) podem legislar mesmo sem a existência da lei federal fixando as normas gerais, até que sobrevenha a legislação federal fixando-as. Ou seja, decorre ela da inércia da União Federal em estabelecer normas gerais sobre aquele mesmo campo material de competências. Subsistirá, desta forma, aos Estados e aos Municípios, enquanto não sobrevenha a legislação federal regulando a matéria, uma competência legislativa plena, que poderá ter sua eficácia suspensa, caso seja incompatível com a posterior lei federal, a qual passará a estabelecer as regras gerais. No que tange ao dispositivo constitucional analisado (art. 24, XII, da CRFB), já definiu o Supremo Tribunal Federal em diversos julgamentos, tratar-se de competência supletiva suplementar, pela qual os entes Estaduais e Municipais (estes por força de sua competência residual prevista no art. 30, II, como frisado acima) estão adstritos aos parâmetros fixados na Constituição da República e na legislação infraconstitucional federal. Quanto ao disciplinamento constitucional, viu-se que este se deu por intermédio do art. 149, § 1° da CF, que impõe, como demonstrado acima, apenas a obrigatoriedade de recolhimento da contribuição social em relação à área de previdência social; excluindo-se, de forma intencional, o financiamento dos serviços de saúde administrados por estes entes. Cumpre frisar que este silêncio constitucional em relação à área da saúde deve ser considerado, no caso, como sendo intencional, ou seja, trata-se, nos dizeres da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, de um silêncio eloquente, conforme restou consignado por seu órgão Plenário no julgamento da ADIN 3.106. Impende, neste particular, transcrever o trecho do voto do Relator o Ministro Eros Grau, acolhido à unanimidade: ¿Por outro lado, não tenho como admitir que a Constituição do Brasil tenha conferido, de forma implícita, competência ao Estado-membro para atuar nessa seara, o que me faz concluir no sentido de que o preceito impugnado viola, ao instituir contribuição compulsória, o §1° do art. 149, da Constituição¿ (ADI 3.106, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 14-4-2010, Plenário, DJE de 24-9-2010). Outra razão de ordem jurídica para se inadmitir a criação implícita de tributo, funda-se no princípio da legalidade estrita que permeia a seara tributária, ou seja, calcando-se o Direito Tributário neste princípio, seria desarrazoado pensar que a Constituição Federal teria criado competência implícita para que qualquer dos entes federativos (mesmo a União Federal) instituíssem contribuições sociais ligadas à saúde. Neste sentido, extrai-se outro trecho do voto do Relator Eros Grau na ADIN 3106, acima referida, no ponto em que refere à impossibilidade de instituição de contribuição social (ou seja, imposição da contribuição de forma compulsória) por parte dos entes federativos na área da saúde: ¿Vê-se para logo que os Estados-Membros não podem contemplar como benefícios, de modo obrigatório em relação aos seus servidores, sob pena de mácula à Constituição do Brasil, por afronta à legislação fundamental que a União fez editar no desempenho legítimo de sua competência (Lei 9.717/1998), serviços de assistência médica, hospitalar, odontológica social e farmacêutica¿. É ilegítima, portanto, do ponto de vista constitucional, por afronta direta ao § 1°, do art. 149, da Carta Magna, a instituição de contribuição social para o custeio da saúde dos servidores pelo Município de Belém, na forma do estabelecido no art. 46, da Lei Municipal nº 7.984, de 30 de dezembro de 1999. Não se quer dizer, com isso, que é vedada a instituição de qualquer serviço de saúde municipal que tenha como destinatários os servidores municipais de Belém. Apenas intenta-se afirmar, que tal cobrança não poderá ocorrer de forma obrigatória; não podendo, assim, ser revestida de feição tributária, por desobediência ao art. 3°, do CTN. Ora, caso entendêssemos que estes valores cobrados têm feição tributária, outro mandamento que emana da Constituição Federal, além do já mencionado no art. 149, § 1° (impossibilidade de se instituir contribuição social para a saúde de forma implícita), seria violado, qual seja, o previsto nos art. 195, § 4° c/c o art. 154, I, que estabelecem que somente a União poderá instituir contribuições sociais de forma residual, ou seja, fora daquelas hipóteses previstas na Carta Magna. Sobre o que fora exposto, destacamos a lição do eminente tributarista e Desembargador do E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região Leandro Paulsen, o qual, ao comentar o referido dispositivo constitucional (art. 149, § 1°), assevera: ¿A outorga de competência se restringe à manutenção de regime de previdência dos servidores. Sob a redação original, estava prevista a competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios para a instituição de contribuição para o custeio de sistemas de previdência e assistência social. Destacava-se, então, que, em havendo nítida diferenciação na constituição federal entre previdência, assistência e saúde, conforme se vê do capítulo que trata da seguridade social, não estava autorizada a instituição de contribuição para financiamento de serviços de saúde prestados ao servidor. Com a redação dada pela EC 41/2003, não houve alargamento da competência; pelo contrário, ficou restrita à manutenção do regime previdenciário¿. A jurisprudência do órgão Plenário do STF é pacífica no sentido de declarar a inconstitucionalidade de Leis Estaduais que atribuem caráter compulsório à cobrança por parte dos respectivos entes políticos. Nesse sentido, citamos o julgamento do RE. 573.540, julgado em 14.04.2010: ¿CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DOS SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA, HOSPITALAR, ODONTOLÓGICA E FARMACEÚTICA. ART. 85 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 62/2002, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. NATUREZA TRIBUTÁRIA. COMPULSORIEDADE. DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS. ROL TAXATIVO. INCOMPETÊNCIA DO ESTADO-MEMBRO. INCONSTITUCIONALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO. I - É nítida a natureza tributária da contribuição instituída pelo art. 85 da Lei Complementar nº 64/2002, do Estado de Minas Gerais, haja vista a compulsoriedade de sua cobrança. II - O art. 149, caput, da Constituição atribui à União a competência exclusiva para a instituição de contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais e econômicas. Essa regra contempla duas exceções, contidas no arts. 149, § 1º, e 149-A da Constituição. À exceção desses dois casos, aos Estados-membros não foi atribuída competência para a instituição de contribuição, seja qual for a sua finalidade. III - A competência, privativa ou concorrente, para legislar sobre determinada matéria não implica automaticamente a competência para a instituição de tributos. Os entes federativos somente podem instituir os impostos e as contribuições que lhes foram expressamente outorgados pela Constituição. IV - Os Estados-membros podem instituir apenas contribuição que tenha por finalidade o custeio do regime de previdência de seus servidores. A expressão "regime previdenciário" não abrange a prestação de serviços médicos, hospitalares, odontológicos e farmacêuticos. (RE 573540, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2010, DJe-105 DIVULG 10-06-2010 PUBLIC 11-06-2010 EMENT VOL-02405-04 PP-00866 RT v. 99, n. 900, 2010, p. 175-184). Sobreveio, então, após decisão acima, o julgamento do mérito, pelo Plenário do STF, da ADIN 3.106, que pacificou a jurisprudência do Supremo acerca da questão, ao decidir pela inconstitucionalidade do vocábulo "compulsoriamente", previsto nos §§ 4º e 5º do artigo 85, da LC 64, do Estado de Minas Gerais, que restou assim ementado: ¿AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 79 e 85 DA LEI COMPLEMENTAR N. 64, DE 25 DE MARÇO DE 2002, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. IMPUGNAÇÃO DA REDAÇÃO ORIGINAL E DA REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI COMPLEMENTAR N. 70, DE 30 DE JULHO DE 2003, AOS PRECEITOS. IPSEMG. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL DOS SERVIDORES DO ESTADO DE MINAS GERAIS. BENEFÍCIIOS PREVIDENCIÁRIOS E APOSENTADORIA ASSEGURADOS A SERVIDORES NÃO-TITULARES DE CARGO EFETIVO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO § 13 DO ARTIGO 40 E NO § 1º DO ARTIGO 149 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. 1. Artigo 85, caput, da LC n. 64 estabelece que "o IPSEMG prestará assistência médica, hospitalar e odontológica, bem como social, farmacêutica e complementar aos segurados referidos no art. 3º e aos servidores não titulares de cargo efetivo definidos no art. 79, extensiva a seus dependentes". A Constituição de 1988 --- art. 149, § 1º --- define que "os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefícios destes, de sistemas de previdência e assistência social". O preceito viola o texto da Constituição de 1988 ao instituir contribuição compulsória. Apenas os servidores públicos titulares de cargos efetivos podem estar compulsoriamente filiados aos regimes próprios de previdência. Inconstitucionalidade da expressão "definidos no art. 79" contida no artigo 85, caput, da LC 64/02. 2. Os Estados-membros não podem contemplar de modo obrigatório em relação aos seus servidores, sob pena de mácula à Constituição do Brasil, como benefícios, serviços de assistência médica, hospitalar, odontológica, social, e farmacêutica. O benefício será custeado mediante o pagamento de contribuição facultativa aos que se dispuserem a dele fruir. 3. O artigo 85 da lei impugnada institui modalidade complementar do sistema único de saúde --- "plano de saúde complementar". Contribuição voluntária. Inconstitucionalidade do vocábulo "compulsoriamente" contido no § 4º e no § 5º do artigo 85 da LC 64/02, referente à contribuição para o custeio da assistência médica, hospitalar, odontológica e farmacêutica. 4. (...). 5. Pedido julgado parcialmente procedente para declarar a inconstitucionalidade: [i] da expressão "definidos no art. 79" --- artigo 85, caput, da LC 64/02 [tanto na redação original quanto na redação conferida pela LC 70/03], ambas do Estado de Minas Gerais. [ii] do vocábulo "compulsoriamente" --- §§ 4º e 5º do artigo 85 [tanto na redação original quanto na redação conferida pela LC 70/03], ambas do Estado de Minas Gerais¿. (ADI 3106, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2010, DJe-179 DIVULG 23-09-2010 PUBLIC 24-09-2010 EMENT VOL-02416-01 PP-00159). Extrai-se da ementa acima a clara inconstitucionalidade da cobrança compulsória de quantia para a manutenção do serviço ligado à saúde de quaisquer dos entes tributantes, posto que o art. 149, § 1° da CF apenas permite a instituição pelos Estados e Municípios de contribuição social para custear a manutenção da rede previdenciária de seus respectivos servidores; não atribuindo, de forma alguma, competência implícita a estas unidades federativas para a criação de contribuições destinadas a custear a assistência à saúde dos seus servidores. Friso, por fim, que após este paradigmático julgado, sobrevieram inúmeras decisões do Colendo STF no mesmo sentido da inconstitucionalidade das leis estaduais e municipais que estabelecem a cobrança compulsória de benefícios para o custeio da assistência à saúde dos servidores públicos. Dentre estes julgados citam-se: ¿AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LEI ESTADUAL 7.672/82. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR PRESTADA AOS SERVIDORES. CONTRIBUIÇÃO PARA CUSTEIO DOS BENEFÍCIOS PRESTADOS. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA COBRANÇA COMPULSÓRIA. ART. 149, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO. PRESUNÇÃO DE EXIGIBILIDADE DOS VALORES INDEVIDAMENTE PAGOS. PRECEDENTES: ADI 3.106 E RE 573.540. Agravo regimental a que se nega provimento¿. (RE 632035 AgR, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 08/02/2011, DJe-061 DIVULG 30-03-2011 PUBLIC 31-03-2011 EMENT VOL-02493-01 PP-00211); e ¿EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO COMPULSÓRIA AO FUNDO MÉDICO HOSPITALAR. INCOMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO. AGRAVO IMPROVIDO. I - O Plenário desta Corte, ao apreciar o RE 573.540/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes, decidiu que falece aos Estados-membros e Municípios competência para criar contribuição compulsória destinada ao custeio de serviços médicos, hospitalares, farmacêuticos e odontológicos prestados aos seus servidores. II - Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se nega provimento¿. (AI 772702 ED, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 01/02/2011, DJe-036 DIVULG 22-02-2011 PUBLIC 23-02-2011 EMENT VOL-02469-02 PP-00427). Assim, depreende-se que inconsistentes as razões do agravo de instrumento, pois já se encontra pacífico no âmbito do Supremo Tribunal Federal que é vedado aos Entes de Federação (Estados, Distrito Federal e Municípios) instituir contribuição compulsória para o custeio de assistência a saúde. O ¿caput¿ do art. 557, do Código de Processo Civil preceitua: ¿Art. 557 ¿ O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.¿ (grifei) Ante o exposto, com fundamento no art. 557, do CPC, nego seguimento ao presente recurso, por estar manifestamente em confronto com jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Belém (PA), 04 de dezembro de 2014. DES. ROBERTO GONÇALVES DE MOURA, RELATOR 1 C:\Users\alberto.figueiredo\Desktop\Feitos 2014\- 3ª Isolada Civel - 2014\- Agravo de Instrumento\Decisão monocrática final\Negado Seguimento\0082. Proc. 2014.3.031004-9 Ipamb. Contribuição Compulsória -29.doc 1
(2014.04713459-53, Não Informado, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-12-10, Publicado em 2014-12-10)
Ementa
Processo nº 2014.3.031756-6 Secretaria da 3ª Câmara Cível Isolada Comarca de Belém/PA Agravo de Instrumento Agravante: Presidente do Instituto de Previdência e Assistência Municipal de Belém - IPAMB Agravante: Município de Belém Advogado: Daniel Paes Ribeiro Junior ¿ Procurador Municipal Agravado: Dhiego Thourão Pereira Advogado: Elielson Nazareno Cardoso de Souza Relator: Des. Roberto Gonçalves de Moura PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR DEFERIDA PELO JUÍZO ¿A QUO¿. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO MUNICÍPIO. PLEITO DE ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RAZÕES DISSOCIADAS DA DECISÃO IMPUGNADA. ARGUIÇÃO DE DECADÊNCIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. TEMA NÃO APRECIADO PELO JUÍZO DE ORIGEM. INVIABILIDADE DE APRECIAÇÃO DE TAL PONTO PELA CORTE REVISORA (SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA). CONTRIBUIÇÃO COMPULSÓRIA PARA O CUSTEIO DE ASSISTÊNCIA. IPAMB. A JURISPRUDÊNCIA DO STF É PACÍFICA DO SENTIDO DE QUE É VEDADO AOS ENTES MUNICIPAIS E ESTADUAIS INSTITUIR CONTRIBUIÇÃO PARA ASSISTÊNCIA À SAÚDE A SER PAGA PELOS SEUS SERVIDORES DE FORMA COMPULSÓRIA. 1 ¿ A prejudicial de mérito arguida, conquanto matéria de ordem pública, não deve ser analisada nesta sede recursal, pois não foi objeto de apreciação pelo juiz ¿a quo¿, sendo certo que seu exame, agora implicaria em supressão de instância e a afronta ao princípio do duplo grau de jurisdição 2 - ¿Os Estados-Membros não podem contemplar como benefícios, de modo obrigatório em relação aos seus servidores, sob pena de mácula à Constituição do Brasil, por afronta à legislação fundamental que a União fez editar no desempenho legítimo de sua competência (Lei 9.717/1998), serviços de assistência médica, hospitalar, odontológica social e farmacêutica¿. Precedente do STF. ADI 3106. 3 - Agravo de Instrumento a que se nega seguimento monocraticamente, nos termos do art. 557, caput do CPC. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento , com pedido de efeito suspensivo , interposto pelo INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA DO MUNICÍPIO BELÉM ¿ IPAMB e pelo MUNICÍPIO DE BELÉM , contra decisão proferida pelo MM. Juízo 1 ª Vara da Fazenda de Belém (fls. 1 7/18 ), que , após analisar o pedido do autor formulado na inicial de Mandado de Segurança , concedeu a liminar requerida, no sentido de que o Presidente do IPAMB suspenda a cobrança a título de custeio d o Plano de Assistência Básica à Saúde ¿ PBASS incidente sobre a remuneração do servidor impetr ante /ora agravado. Em suas razões (fls. 0 2 /1 3 ), os agravantes, após breve exposição dos fatos, alegam, primeiramente, a ocorrência de nulidade, sustentando ausência de intimação da Procuradoria do Município de Belém, pelo que defende a anulação da sentença monocrática proferida pelo juízo ¿ a quo ¿. Argumentam sobre o indeferimento da inicial m andamental. Alegam a inadequação da via eleita, aduzindo o não cabimento do mandado de segurança em face de lei em tese. Asseveram que a decisão interlocutória é nitidamente satisfativa e, por isso, merece ser reformada , vez que corresponde ao próprio mérito da ação, o que seria vedado, citando decisão do STJ. Sustentam a decadência do direito à impetração do mandado de segurança. Defendem a impossibilidade de concessão de efeito patrimonial em mandado de segurança. A firma m ter sido realizada ampla discussão com os servidores municipais por meio de seminários, debates e fóruns distritais t rata ndo sobre o Plano de Assistência, esclarecendo que a contribuição que ora se discute foi instituída através de Assembleia Geral dos servidores públicos municipais, e posteriormente foi instituída por lei, logo não pode a Agravada alegar violação a direito. Argumentam que inexiste ilegalidade e irregularidade, e que, no presente caso, deve prevalecer a supremacia do interesse público na saúde. Destacam que o Município, diante da sua autonomia, possui a competência para criar um sistema próprio para a assistência à saúde de seus servidores, o que demonstra a legitimidade da Lei Municipal nº 7.984/1999. Afirmam que a manutenção da decisão agravada irá gerar prejuízos graves e de difícil reparação não só para o IPAMB como também para os segurados do Plano de Assistência Básica à Saúde e Social ¿ PABSS. Pugnam pela concessão do efeito suspensivo, afirmando que não estariam preenchidos os requisitos autorizadores para a concessão da liminar. Ao final, requereram o provimento para cassar a decisão combatida. Acostaram documentos (fls. 14/26). Coube-me a relatoria do feito por distribuição (v. fl. 27). É o relatório. DECIDO. Conheço do presente agravo de instrumento, porquanto presentes os requisitos necessários à sua admissibilidade. Primeiramente, cumpre destacar que a decisão agravada limitou-se a deferir, em sede liminar, tão somente a suspensão da cobrança a título de custeio do Plano de Assistência Básica à Saúde dos Servidores, descrita na Lei Municipal n° 7.984/99, da remuneração do agravado/impetrante, todavia os agravantes, em suas razões recursais, pleiteiam a anulação da sentença monocrática, apresentando argumentos no sentido de existência de nulidade processual, tendo em vista a ausência de intimação da Procuradoria do Município de Belém. Percebe-se, portanto, que, neste ponto, os Agravantes não impugnaram especificamente os fundamentos utilizados na decisão agravada, apresentando razões recursais dissociadas da decisão impugnada, vez que não há falar em anulação de sentença no caso em apreço, logo não merece agasalho tal argumentação. No que pertine à prejudicial de mérito de decadência para a impetração da ação mandamental, conquanto matéria de ordem pública, não deve ser analisada nesta sede recursal, já que não foi objeto de apreciação pelo juízo ¿a quo¿, sendo certo que o exame neste momento desse ponto, implicaria em supressão de instância e afronta ao princípio do duplo grau de jurisdição. Desde logo, incumbe-me frisar que, em análise aos fundamentos do presente recurso, verifica-se estar em confronto com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal. Vejamos: Segundo prescreve o art. 46 da Lei Municipal de Belém nº 7.984, de 30 de dezembro de 1999: ¿Art. 46. A contribuição para o custeio da assistência à saúde terá caráter obrigatório para os servidores indicados no art. 25 desta Lei, sendo cobrada no percentual de quatro por cento da remuneração, excluída a gratificação natalina.¿ Como se observa, a Contribuição Social para o custeio da assistência à saúde dos servidores públicos municipais fora instituída de forma compulsória através de uma lei municipal, fato este que não se harmoniza com o postulado constitucional previsto no art. 149 da Constituição Federal Brasileira, que prevê: ¿Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais , de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios INSTITUIRÃO CONTRIBUIÇÃO, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, DO REGIME PREVIDENCIÁRIO de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União.¿ (grifei). Sabe-se que a Contribuição Social detém natureza tributária e como todo tributo tem caráter compulsório, na forma do prescrito no art. 3°, do CTN. Por igual, os serviços da seguridade social, que serão custeados pelas respectivas contribuições sociais, subdividem-se em três espécies, quais sejam: assistência social, previdência e saúde, na forma do que prevê o art. 194, da Constituição Federal. De uma breve leitura do art. 149 da CF, verifica-se que o texto constitucional estabeleceu competência exclusiva da União para instituir contribuição social. A exceção prevista aos Estados, Distrito Federal e Município para instituírem a contribuição social (art. 149, §1º do CF) refere-se apenas a instituição de contribuição para o custeio da previdência social, não permitindo a instituição de contribuição à saúde e a assistência social, uma vez que não há previsão implícita na Constituição Federal em matéria de competência tributária. Chega-se a esse entendimento a partir do desenvolvimento da lógica jurídica, a justificar a conclusão a que se chegou sobre a impossibilidade de o ente municipal obrigar o recolhimento da referida contribuição à saúde. Pois bem, esta análise tem como ponto de partida a questão da competência constitucionalmente fixada para legislar sobre previdência e proteção e defesa da saúde (art. 24, XII c/c com o art. 30 II, da CRFB) e, em via de consequência, aos limites desta competência fixados aos Estados-membros, ao Distrito Federal e aos Municípios para regular a matéria. A competência legislativa, no caso, segundo o art. 24, XII, da CRFB, é concorrente para legislar sobre proteção à saúde, que, por sua vez, se divide em duas espécies: a) cumulativa e b) não-cumulativa. Na primeira delas, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios têm plena liberdade para legislar, inexistindo limites prévios ao exercício desta competência. Já em relação à competência concorrente não-cumulativa, há uma verdadeira concorrência material de competências (concorrências coexistentes dentro um mesmo campo material), reservando-se um nível superior ao ente federativo União, à qual é atribuída a competência para o estabelecimento de normas gerais, reservando-se aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (em relação a este ente, esta competência suplementar veio estabelecida no art. 30, II, da CRFB) a complementação da matéria. Essa complementação da matéria, a cargo dos Estados e dos Municípios é a denominada competência suplementar dos entes federativos, a qual, por seu turno, subdivide-se em: b.1) complementar; e b.2) supletiva. A competência suplementar complementar é aquela em que os entes federativos diversos da União estão impedidos de legislar pormenorizadamente sobre o tema até que ela, a União, edite norma geral sobre a matéria. A competência suplementar supletiva, prevista nos §§ 3° e 4°, do art. 24, da CRFB, é aquela em que os entes estaduais, o Distrito Federal e os Municípios (por força do art. 30, II, da CRFB) podem legislar mesmo sem a existência da lei federal fixando as normas gerais, até que sobrevenha a legislação federal fixando-as. Ou seja, decorre ela da inércia da União Federal em estabelecer normas gerais sobre aquele mesmo campo material de competências. Subsistirá, desta forma, aos Estados e aos Municípios, enquanto não sobrevenha a legislação federal regulando a matéria, uma competência legislativa plena, que poderá ter sua eficácia suspensa, caso seja incompatível com a posterior lei federal, a qual passará a estabelecer as regras gerais. No que tange ao dispositivo constitucional analisado (art. 24, XII, da CRFB), já definiu o Supremo Tribunal Federal em diversos julgamentos, tratar-se de competência supletiva suplementar, pela qual os entes Estaduais e Municipais (estes por força de sua competência residual prevista no art. 30, II, como frisado acima) estão adstritos aos parâmetros fixados na Constituição da República e na legislação infraconstitucional federal. Quanto ao disciplinamento constitucional, viu-se que este se deu por intermédio do art. 149, § 1° da CF, que impõe, como demonstrado acima, apenas a obrigatoriedade de recolhimento da contribuição social em relação à área de previdência social; excluindo-se, de forma intencional, o financiamento dos serviços de saúde administrados por estes entes. Cumpre frisar que este silêncio constitucional em relação à área da saúde deve ser considerado, no caso, como sendo intencional, ou seja, trata-se, nos dizeres da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, de um silêncio eloquente, conforme restou consignado por seu órgão Plenário no julgamento da ADIN 3.106. Impende, neste particular, transcrever o trecho do voto do Relator o Ministro Eros Grau, acolhido à unanimidade: ¿Por outro lado, não tenho como admitir que a Constituição do Brasil tenha conferido, de forma implícita, competência ao Estado-membro para atuar nessa seara, o que me faz concluir no sentido de que o preceito impugnado viola, ao instituir contribuição compulsória, o §1° do art. 149, da Constituição¿ (ADI 3.106, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 14-4-2010, Plenário, DJE de 24-9-2010). Outra razão de ordem jurídica para se inadmitir a criação implícita de tributo, funda-se no princípio da legalidade estrita que permeia a seara tributária, ou seja, calcando-se o Direito Tributário neste princípio, seria desarrazoado pensar que a Constituição Federal teria criado competência implícita para que qualquer dos entes federativos (mesmo a União Federal) instituíssem contribuições sociais ligadas à saúde. Neste sentido, extrai-se outro trecho do voto do Relator Eros Grau na ADIN 3106, acima referida, no ponto em que refere à impossibilidade de instituição de contribuição social (ou seja, imposição da contribuição de forma compulsória) por parte dos entes federativos na área da saúde: ¿Vê-se para logo que os Estados-Membros não podem contemplar como benefícios, de modo obrigatório em relação aos seus servidores, sob pena de mácula à Constituição do Brasil, por afronta à legislação fundamental que a União fez editar no desempenho legítimo de sua competência (Lei 9.717/1998), serviços de assistência médica, hospitalar, odontológica social e farmacêutica¿. É ilegítima, portanto, do ponto de vista constitucional, por afronta direta ao § 1°, do art. 149, da Carta Magna, a instituição de contribuição social para o custeio da saúde dos servidores pelo Município de Belém, na forma do estabelecido no art. 46, da Lei Municipal nº 7.984, de 30 de dezembro de 1999. Não se quer dizer, com isso, que é vedada a instituição de qualquer serviço de saúde municipal que tenha como destinatários os servidores municipais de Belém. Apenas intenta-se afirmar, que tal cobrança não poderá ocorrer de forma obrigatória; não podendo, assim, ser revestida de feição tributária, por desobediência ao art. 3°, do CTN. Ora, caso entendêssemos que estes valores cobrados têm feição tributária, outro mandamento que emana da Constituição Federal, além do já mencionado no art. 149, § 1° (impossibilidade de se instituir contribuição social para a saúde de forma implícita), seria violado, qual seja, o previsto nos art. 195, § 4° c/c o art. 154, I, que estabelecem que somente a União poderá instituir contribuições sociais de forma residual, ou seja, fora daquelas hipóteses previstas na Carta Magna. Sobre o que fora exposto, destacamos a lição do eminente tributarista e Desembargador do E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região Leandro Paulsen, o qual, ao comentar o referido dispositivo constitucional (art. 149, § 1°), assevera: ¿A outorga de competência se restringe à manutenção de regime de previdência dos servidores. Sob a redação original, estava prevista a competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios para a instituição de contribuição para o custeio de sistemas de previdência e assistência social. Destacava-se, então, que, em havendo nítida diferenciação na constituição federal entre previdência, assistência e saúde, conforme se vê do capítulo que trata da seguridade social, não estava autorizada a instituição de contribuição para financiamento de serviços de saúde prestados ao servidor. Com a redação dada pela EC 41/2003, não houve alargamento da competência; pelo contrário, ficou restrita à manutenção do regime previdenciário¿. A jurisprudência do órgão Plenário do STF é pacífica no sentido de declarar a inconstitucionalidade de Leis Estaduais que atribuem caráter compulsório à cobrança por parte dos respectivos entes políticos. Nesse sentido, citamos o julgamento do RE. 573.540, julgado em 14.04.2010: ¿CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DOS SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA, HOSPITALAR, ODONTOLÓGICA E FARMACEÚTICA. ART. 85 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 62/2002, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. NATUREZA TRIBUTÁRIA. COMPULSORIEDADE. DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS. ROL TAXATIVO. INCOMPETÊNCIA DO ESTADO-MEMBRO. INCONSTITUCIONALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO. I - É nítida a natureza tributária da contribuição instituída pelo art. 85 da Lei Complementar nº 64/2002, do Estado de Minas Gerais, haja vista a compulsoriedade de sua cobrança. II - O art. 149, caput, da Constituição atribui à União a competência exclusiva para a instituição de contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais e econômicas. Essa regra contempla duas exceções, contidas no arts. 149, § 1º, e 149-A da Constituição. À exceção desses dois casos, aos Estados-membros não foi atribuída competência para a instituição de contribuição, seja qual for a sua finalidade. III - A competência, privativa ou concorrente, para legislar sobre determinada matéria não implica automaticamente a competência para a instituição de tributos. Os entes federativos somente podem instituir os impostos e as contribuições que lhes foram expressamente outorgados pela Constituição. IV - Os Estados-membros podem instituir apenas contribuição que tenha por finalidade o custeio do regime de previdência de seus servidores. A expressão "regime previdenciário" não abrange a prestação de serviços médicos, hospitalares, odontológicos e farmacêuticos. (RE 573540, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2010, DJe-105 DIVULG 10-06-2010 PUBLIC 11-06-2010 EMENT VOL-02405-04 PP-00866 RT v. 99, n. 900, 2010, p. 175-184). Sobreveio, então, após decisão acima, o julgamento do mérito, pelo Plenário do STF, da ADIN 3.106, que pacificou a jurisprudência do Supremo acerca da questão, ao decidir pela inconstitucionalidade do vocábulo "compulsoriamente", previsto nos §§ 4º e 5º do artigo 85, da LC 64, do Estado de Minas Gerais, que restou assim ementado: ¿AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 79 e 85 DA LEI COMPLEMENTAR N. 64, DE 25 DE MARÇO DE 2002, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. IMPUGNAÇÃO DA REDAÇÃO ORIGINAL E DA REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI COMPLEMENTAR N. 70, DE 30 DE JULHO DE 2003, AOS PRECEITOS. IPSEMG. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL DOS SERVIDORES DO ESTADO DE MINAS GERAIS. BENEFÍCIIOS PREVIDENCIÁRIOS E APOSENTADORIA ASSEGURADOS A SERVIDORES NÃO-TITULARES DE CARGO EFETIVO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO § 13 DO ARTIGO 40 E NO § 1º DO ARTIGO 149 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. 1. Artigo 85, caput, da LC n. 64 estabelece que "o IPSEMG prestará assistência médica, hospitalar e odontológica, bem como social, farmacêutica e complementar aos segurados referidos no art. 3º e aos servidores não titulares de cargo efetivo definidos no art. 79, extensiva a seus dependentes". A Constituição de 1988 --- art. 149, § 1º --- define que "os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefícios destes, de sistemas de previdência e assistência social". O preceito viola o texto da Constituição de 1988 ao instituir contribuição compulsória. Apenas os servidores públicos titulares de cargos efetivos podem estar compulsoriamente filiados aos regimes próprios de previdência. Inconstitucionalidade da expressão "definidos no art. 79" contida no artigo 85, caput, da LC 64/02. 2. Os Estados-membros não podem contemplar de modo obrigatório em relação aos seus servidores, sob pena de mácula à Constituição do Brasil, como benefícios, serviços de assistência médica, hospitalar, odontológica, social, e farmacêutica. O benefício será custeado mediante o pagamento de contribuição facultativa aos que se dispuserem a dele fruir. 3. O artigo 85 da lei impugnada institui modalidade complementar do sistema único de saúde --- "plano de saúde complementar". Contribuição voluntária. Inconstitucionalidade do vocábulo "compulsoriamente" contido no § 4º e no § 5º do artigo 85 da LC 64/02, referente à contribuição para o custeio da assistência médica, hospitalar, odontológica e farmacêutica. 4. (...). 5. Pedido julgado parcialmente procedente para declarar a inconstitucionalidade: [i] da expressão "definidos no art. 79" --- artigo 85, caput, da LC 64/02 [tanto na redação original quanto na redação conferida pela LC 70/03], ambas do Estado de Minas Gerais. [ii] do vocábulo "compulsoriamente" --- §§ 4º e 5º do artigo 85 [tanto na redação original quanto na redação conferida pela LC 70/03], ambas do Estado de Minas Gerais¿. (ADI 3106, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2010, DJe-179 DIVULG 23-09-2010 PUBLIC 24-09-2010 EMENT VOL-02416-01 PP-00159). Extrai-se da ementa acima a clara inconstitucionalidade da cobrança compulsória de quantia para a manutenção do serviço ligado à saúde de quaisquer dos entes tributantes, posto que o art. 149, § 1° da CF apenas permite a instituição pelos Estados e Municípios de contribuição social para custear a manutenção da rede previdenciária de seus respectivos servidores; não atribuindo, de forma alguma, competência implícita a estas unidades federativas para a criação de contribuições destinadas a custear a assistência à saúde dos seus servidores. Friso, por fim, que após este paradigmático julgado, sobrevieram inúmeras decisões do Colendo STF no mesmo sentido da inconstitucionalidade das leis estaduais e municipais que estabelecem a cobrança compulsória de benefícios para o custeio da assistência à saúde dos servidores públicos. Dentre estes julgados citam-se: ¿AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LEI ESTADUAL 7.672/82. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR PRESTADA AOS SERVIDORES. CONTRIBUIÇÃO PARA CUSTEIO DOS BENEFÍCIOS PRESTADOS. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA COBRANÇA COMPULSÓRIA. ART. 149, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO. PRESUNÇÃO DE EXIGIBILIDADE DOS VALORES INDEVIDAMENTE PAGOS. PRECEDENTES: ADI 3.106 E RE 573.540. Agravo regimental a que se nega provimento¿. (RE 632035 AgR, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 08/02/2011, DJe-061 DIVULG 30-03-2011 PUBLIC 31-03-2011 EMENT VOL-02493-01 PP-00211); e ¿EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO COMPULSÓRIA AO FUNDO MÉDICO HOSPITALAR. INCOMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO. AGRAVO IMPROVIDO. I - O Plenário desta Corte, ao apreciar o RE 573.540/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes, decidiu que falece aos Estados-membros e Municípios competência para criar contribuição compulsória destinada ao custeio de serviços médicos, hospitalares, farmacêuticos e odontológicos prestados aos seus servidores. II - Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se nega provimento¿. (AI 772702 ED, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 01/02/2011, DJe-036 DIVULG 22-02-2011 PUBLIC 23-02-2011 EMENT VOL-02469-02 PP-00427). Assim, depreende-se que inconsistentes as razões do agravo de instrumento, pois já se encontra pacífico no âmbito do Supremo Tribunal Federal que é vedado aos Entes de Federação (Estados, Distrito Federal e Municípios) instituir contribuição compulsória para o custeio de assistência a saúde. O ¿caput¿ do art. 557, do Código de Processo Civil preceitua: ¿Art. 557 ¿ O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.¿ (grifei) Ante o exposto, com fundamento no art. 557, do CPC, nego seguimento ao presente recurso, por estar manifestamente em confronto com jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Belém (PA), 04 de dezembro de 2014. DES. ROBERTO GONÇALVES DE MOURA, RELATOR 1 C:\Users\alberto.figueiredo\Desktop\Feitos 2014\- 3ª Isolada Civel - 2014\- Agravo de Instrumento\Decisão monocrática final\Negado Seguimento\0082. Proc. 2014.3.031004-9 Ipamb. Contribuição Compulsória -29.doc 1
(2014.04713459-53, Não Informado, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-12-10, Publicado em 2014-12-10)
Data do Julgamento
:
10/12/2014
Data da Publicação
:
10/12/2014
Órgão Julgador
:
3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
ROBERTO GONCALVES DE MOURA
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