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Jurisprudência


TJPA 0078753-82.2015.8.14.0000

Ementa
PROCESSO N.º 00787538220158140000 5º CÂMARA CIVEL ISOLADA AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE BELÉM AGRAVADO: GEANNE MARCELA ROCHA DE JESUS RELATOR: JUIZ CONVOCADO JOSÉ ROBERTO P. M. BEZERRA JUNIOR DECISÃO MONOCRÁTICA       Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo MUNICÍPIO DE BELÉM contra decisão proferida pelo Juízo da 1º Vara da Fazenda de Belém, nos autos da Ação ordinária com pedido de tutela antecipada ajuizada por GEANE MARCELA ROCHA DE JESUS, no seguinte teor: ¿(...)Assim, com lastro no art. 273 do CPC, defiro liminarmente os efeitos da tutela requerida na inicial, para determinar ao MUNICÍPIO DE BELÉM que realize consulta com médico do Sistema Único de Saúde - SUS, na especialidade de psiquiatria, em número de consultas de acordo com o diagnóstico médico, no prazo de 24h (vinte e quatro horas), sob pena de aplicaç¿o de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por cada dia de descumprimento. (...)¿       Nas suas razões, sustenta o ente público a ilegitimidade do Município de Belém para custear o tratamento médico, cabendo ao Estado a responsabilidade de prestação da saúde pública. No mais, assevera que a administração pública está adstrita a sua disponibilidade orçamentária, de modo que não pode investir além do limite orçamentário.       Portanto, requer a concessão do efeito suspensivo da decisão agravada, uma vez que não se encontram presentes os requisitos necessários para concessão da tutela antecipada. E no final, o provimento do recurso, reformando a decisão recorrida.       Juntou documentos de fls. 17/46.       Desnecessário a requisição de informações ao juízo a quo, bem como a intimação do agravado para apresentação das contrarrazões.       É o relatório.       O presente recurso suporta o julgamento imediato nos termos no art. 557, caput do Código de Processo Civil de 1973.       Examinando as alegações aventadas, vê-se que a irresignação recursal não comporta provimento.       Descabe falar em ilegitimidade do Município de Belém para a causa, mormente porque a Constituição Federal, em seu artigo 198, instituiu o Sistema Único de Saúde (SUS), integrado por todos os entes federativos, como meio de viabilizar e otimizar as ações e serviços públicos de saúde, preconizando, em seu inciso I, que cada esfera do governo tem competência diretiva, e prevendo, inclusive, que os Estados e Municípios também deverão contribuir para o seu financiamento (Art. 198. - § 1º O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.).      Com efeito, as três esferas da Federação têm legitimidade para figurar no polo passivo das ações que tenham por base a existência de obrigações relativas à saúde, qualquer que seja o pedido em si.      Nesse sentido é o entendimento dos Tribunais Superiores que vêm admitindo a responsabilidade solidária dos entes federativos, quando se trata do dever de prestação de saúde, como se infere da leitura dos seguintes arestos: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PRELIMINAR DE REPERCUSSÃO GERAL. FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE. ÔNUS DO RECORRENTE. DIREITO À SAÚDE. DETERMINAÇÃO DE FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MÉDICO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. JURISPRUDÊNCIA REAFIRMADA SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL NO JULGAMENTO DO RE 855.178-RG (REL. MIN. LUIZ FUX, TEMA 793). AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.  (ARE 814878 AgR, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 17/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 31-03-2015 PUBLIC 06-04-2015) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DEVER DO ESTADO. SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. 1. O fornecimento de tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado e deve ser prestado de forma solidária entre os entes da federação. Precedentes: ARE 772.150/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 17/10/2013, RE 716.777-AgR/RS, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJ 16/5/2013, e ARE-AgR 744.223, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 11/9/2013. 2. In casu, o acórdão originariamente recorrido assentou: ¿PACIENTE PORTADORA DE DOENÇA ONCOLÓGICA NEOPLASIA MALIGNA DE BAÇO PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS DIREITO À VIDA E À SAÚDE NECESSIDADE IMPERIOSA DE SE PRESERVAR, POR RAZÕES DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO, A INTEGRIDADE DESSE DIREITO ESSENCIAL FORNECIMENTO GRATUITO DE MEIOS INDISPENSÁVEIS AO TRATAMENTO E À PRESERVAÇÃO DA SAÚDE DE PESSOAS CARENTES DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) PRECEDENTES (STF) RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS PESSOAS POLÍTICAS QUE INTEGRAM O ESTADO FEDERAL BRASILEIRO CONSEQUENTE POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DA AÇÃO CONTRA UM, ALGUNS OU TODOS OS ENTES ESTATAIS RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.¿ 3. Agravo regimental DESPROVIDO. (RE 717290 AgR, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 18/03/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-067 DIVULG 03-04-2014 PUBLIC 04-04-2014)       No caso, conforme a narrativa da petição inicial da ação originária (fls. 20/25), GEANE é portadora de patologia neurológica de transtorno mental e comportamental devido ao uso de cocaína (CID F14.2). E segundo relato pessoal, há 10 (dez) anos convive com a dependência química de drogas ilícitas, e após uma crise, foi encaminhada ao Hospital das Clínicas e atendida na Unidade de Urgência e Emergência, tendo sido consultada por um médico psiquiatra e encaminhada para dar inicio ao tratamento de desdrogatização no CAPS - Centro de Atendimento Psicossocial de Álcool e Drogas, contudo não foi atendida por médico psiquiatra e nem por psicólogo, uma vez que todas as consultas foram desmarcadas seguidas vezes, conforme cartão de Aprazamento (fl. 31).               Nesse sentido, corroborando as alegações da agravada, a Defensoria Pública encaminhou oficio de número 71/2015, acostado às fls. 34/34-verso, em que requereu administrativamente a realização da consulta com médico psiquiátrico a fim de dar continuidade no tratamento de desdrogatização. Contudo, não obeteve resposta da Secretaria Municipal de Saúde do Município de Belém. Sendo assim, é imperioso o atendimento médico psiquiátrico postulado.       Ora, sem dúvida que uma das principais linhas de atendimento do SUS é o fornecimento de tratamento médico. A questão debatida neste recurso diz com o fato de o Município de Belém sustentar não ser responsável pelo atendimento hospitalar pleiteado, a qual aduz ser de responsabilidade do Estado.       Entretanto, não lhe assiste razão, pois tanto o Município de Belém quanto o Estado do Pará são partes legítimas passivas em demandas que versem sobre atendimentos na área de saúde mental e drogadição, mormente por ser o Município gestor do CAPS, órgão que presta os primeiros atendimentos nessa área, inclusive na esfera ambulatorial, dispondo de meios para dar os encaminhamentos necessários.       A propósito, trago arresto do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acerca da responsabilidade dos entes públicos no fornecimento de atendimento médico-hospitalar aos pacientes que sofrem de transtornos mentais, vejamos: APELAÇÃO CÍVEL. INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA. TRATAMENTO AO ALCOOLISMO. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. PRINCÍPIOS DA RESERVA DO POSSÍVEL, DA UNIVERSALIDADE, DA ISONOMIA E DA IGUALDADE. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO. 1. A responsabilidade pelo fornecimento de tratamento e internação compulsória é solidária entre União, Estados e Municípios. Eventual deliberação a respeito da repartição de responsabilidade compete unicamente aos entes federativos, a ser realizada em momento oportuno, não podendo o particular ter limitado seu direito à saúde, garantido constitucionalmente, por ato da Administração Pública. 2. Eventuais limitações ou dificuldades orçamentárias não podem servir de pretexto para negar o direito à saúde e à vida, dada a prevalência do direito reclamado. 3. Não há falar, igualmente, em ofensa aos princípios da universalidade, da isonomia e da igualdade, posto que o Judiciário apenas está a ordenar o cumprimento dos dispositivos da Constituição Federal, violados quando da negativa da Administração. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70064984750, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 02/07/2015) (grifei) APELAÇÃO CÍVEL. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. Não há como ser acolhida a alegação de ilegitimidade passiva, porquanto, interpretado o art. 196 da CF à luz do seu art. 23, II, e art. 241 da Constituição Estadual, tem-se a responsabilidade solidária dos entes federativos. DIREITO À SAÚDE ASSEGURADO PELA CONSTITUIÇÃO. Comprovada a necessidade de internação por dependência alcoólica, é ser determinada a medida, a fim de garantir a segurança do usuário e de seus familiares. O direito à saúde de forma gratuita se enquadra como direito e garantia fundamental, sendo dever do Estado (artigo 196 da Constituição Federal). AFASTARAM A PRELIMINAR E, NO MÉRITO, NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível Nº 70064077373, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 02/07/2015) (grifei) APELAÇÃO CÍVEL. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. TRATAMENTO CONTRA DEPENDÊNCIA QUÍMICA. OBRIGAÇÃO E SOLIDARIEDADE DOS ENTES PÚBLICOS. O Estado, em todas as suas esferas de poder, deve assegurar o direito à vida e à saúde, fornecendo gratuitamente o tratamento médico cuja família não tem condições de custear. Responsabilidade solidária, estabelecida nos artigos 196 e 227 da Constituição Federal, podendo o autor da ação exigir, em conjunto ou separadamente, o cumprimento da obrigação por qualquer dos entes públicos, independentemente da regionalização e hierarquização do serviço público de saúde. AUSENCIA DE CONDENAÇÃO DO ESTADO AO PAGAMENTO DAS DESPESAS JUDICIAIS. NÃO CONHECIDO O RECURSO NO PONTO. Apelação do Estado conhecida em parte, desprovidos ambos os recursos. (Apelação Cível Nº 70064126410, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 24/06/2015) (grifei)       Com efeito, não há falar em afronta ao princípio da reserva do possível, porquanto o Poder Judiciário tem o dever de reparar lesão ou ameaça de lesão a direito, nos termos do art. 5º, XXXV, da CF, no caso em testilha, a negativa/omissão do agravante em prestar atendimento médico especializado requerido.      Diante dos elementos constantes dos autos, conclui-se que há argumentos plausíveis a justificar o deferimento da medida pleiteada.      No entanto, a multa diária, fixada em caso de inadimplemento da determinação judicial, encontra-se exacerbada, e como preceitua o § 6º, do art. 461 do CPC, o juiz poderá de ofício modificar o valor da multa.      Assim, diminuo ex officio o valor da cominatória de R$-10.000,00 (dez mil reais) por dia para o valor de R$-300,00 (trezentos reais por dia de atraso), até o limite de R$-10.000,00 (dez mil reais) em caso de descumprimento da ordem judicial, ressalvando que a multa diária poderá ser revista pelo juízo a quo, no curso da instrução do processo originário, caso o quantum imposto se apresente insuficiente ou excessivo na espécie.      Pelo exposto, conheço do recesso e NEGO-LHE PROVIMENTO, nos termos do art. 557, caput do CPC/73, confirmando a Decisão proferida em tutela antecipada de fls. 36/39, que determinou que o Agravante realize consulta com médico do Sistema Único de Saúde - SUS, na especialidade psiquiatria, em número de consultas de acordo com o diagnóstico do médico, no prazo de 24h, modificando de ofício o valor da multa à luz do disposto no art. 461, §6º do CPC, para o valor de R$-300,00 (trezentos reais por dia de atraso), até o limite de R$-10.000,00 (dez mil reais) em caso de descumprimento da ordem judicial, ressalvando que a multa diária poderá ser revista pelo juízo a quo, no curso da instrução do processo originário, caso o quantum imposto se apresente insuficiente ou excessivo na espécie, nos termos do voto.      Após o trânsito em julgado, retornem-se os autos ao juízo de Piso.      Publique-se. Registre-se. Intimem-se.      Belém, 16 de dezembro de 2015.            JOSÉ ROBERTO P. M. BEZERRA JÚNIOR            RELATOR - JUIZ CONVOCADO (2015.04787172-25, Não Informado, Rel. CELIA REGINA DE LIMA PINHEIRO, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2015-12-18, Publicado em 2015-12-18)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 18/12/2015
Data da Publicação : 18/12/2015
Órgão Julgador : 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : CELIA REGINA DE LIMA PINHEIRO
Número do documento : 2015.04787172-25
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
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