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Jurisprudência


TJPI 06.000717-6

Ementa
DIREITO DO CONSUMIDOR. DIREITO BANCÁRIO. APLICAÇÃO DO CDC ÀS RELAÇÕES ENTRE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E USUÁRIOS DOS SEUS SERVIÇOS. TAXA DE JUROS. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. LEGALIDADE. COBRANÇA INDEVIDA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. 1. A Egrégia Terceira Câmara Especializada Cível do TJ-PI, em acórdão de minha relatoria, já assentou que as normas de direito do consumidor aplicam-se às relações jurídicas travadas entre as instituições financeiras e os usuários de seus serviços, por força da orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, sumulada no enunciado de nº 297, segundo o qual “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”, em razão da indubitável vulnerabilidade jurídica e informacional que acomete os usuários desse tipo de serviço, no contexto daquelas relações negociais (Súmula do STJ, n° 297). 2. “As relações entre as Instituições Bancárias e os seus clientes estão sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, com base na súmula 297 do STJ, tendo em vista a vulnerabilidade jurídica e informacional dos usuários desse tipo de serviço.” (TJ-PI, 3ª Câmara Especializada Cível, AC nº 2008.0001.001423-0, Rel. Des. FRANCISCO LANDIM, j. 07.04.2010). 3. A jurisprudência dominante do STF, sumulada no enunciado de nº 596, já assentou que “AS DISPOSIÇÕES DO DECRETO nº 22.626/1933 [que restringem as taxas de juros a 12% (doze por cento) ao ano] NÃO SE APLICAM ÀS TAXAS DE JUROS E AOS OUTROS ENCARGOS COBRADOS NAS OPERAÇÕES REALIZADAS POR INSTITUIÇÕES PÚBLICAS OU PRIVADAS, QUE INTEGRAM O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL” (Súmula do STF, n° 596). 4. A jurisprudência do STJ segue a orientação firmada naquele enunciado sumular do STF, para afirmar que “os juros remuneratórios cobrados pelas instituições financeiras não sofrem as limitações da Lei da Usura [que restringem as taxas de juros a 12% (doze por cento) ao ano], nos termos da Súmula 596 do STF”. Portanto, eventual redução judicial dos juros apenas se justifica se comprovado o abuso, que, por sua vez, não se configura pela mera pactuação da taxa de juros em percentual superior a 12% (doze por cento) ao ano (STJ, AgRg no REsp 1066206/MS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/08/2010, DJe 10/09/2010). Precedentes do STJ. 6. No que tange à possibilidade de capitalização mensal de juros, a jurisprudência do STJ se posicionou pela utilização de duas regras distintas, que são aplicadas conforme um critério cronológico, que toma como referencial o início da vigência da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, que se deu em 31.03.2000. Segundo a jurisprudência do STJ, em contratos celebrados antes da entrada em vigor daquele ato normativo, não se admite a capitalização de juros por período inferior a um ano. Já em contratos celebrados depois da entrada em vigor daquele ato normativo, admite-se a capitalização de juros por período inferior a um ano, ou seja, admite-se a capitalização mensal de juros. Precedentes do STJ. 7. Tal entendimento decorre do fato de que a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em seu art. 5º, caput, dispôs que “nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”. Tal Medida Provisória foi reeditada sob o nº 2.170-36/2001, e está em vigência graças ao art. 2º da Emenda Constitucional n° 32/2001, segundo o qual “as medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional”. 8. Assim, em observância à norma do supracitado art. 5º da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, reeditada sob o nº 2.170-36/2001, e em vigência graças ao art. 2º da Emenda Constitucional n° 32/2001, o STJ se mantém resoluto no posicionamento de admitir “a capitalização mensal de juros somente nos contratos firmados em data posterior à entrada em vigor da MP n. 1.963-17/2000, reeditada sob o n. 2.170-36/2001” (STJ, AgRg no REsp 803.180/SP, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 14/09/2010, DJe 22/09/2010). Precedentes do STJ. 9. A aplicação da sanção do parágrafo único do art. 42 do CDC, na doutrina do Ministro Antônio Herman V. Benjamin, requer a verificação, no caso concreto, da presença de “três pressupostos objetivos e um subjetivo (= 'engano justificável')”, sendo que “no plano objetivo, a multa civil (sic) só é possível nos casos de cobrança de dívida; além disso, a cobrança deve ser extrajudicial; finalmente, deve ela ter por origem uma dívida de consumo” (Cláudia Lima Marques, Antônio Herman V. Benjamin e Leonardo Roscoe Bessa, Manual de Direito do Consumidor, 2009, p. 236, nº 34 – os destaques gráficos em negrito foram acrescidos). 10. Na verdade, são 5 (cinco) os pressupostos objetivos exigidos pelo parágrafo único do art. 42 do CDC, para que se possa aplicar a sanção ali prevista: i) é preciso que a “quantia” cobrada seja indevida; e, como o próprio autor observa, “há necessidade de que o consumidor tenha, de fato, pago indevidamente” (Cláudia Lima Marques, Antônio Herman V. Benjamin e Leonardo Roscoe Bessa, Manual de Direito do Consumidor, 2009, p. 237, nº 36 – os destaques gráficos em negrito foram acrescidos). 11. Ainda na análise da disciplina que o STJ tem ministrado, na apreciação de casos concretos, às hipóteses de anulação de cláusulas contratuais ilegais – principalmente no que diz com a capitalização mensal de juros –, constata-se que a Corte Superior reconhece, “como consequência lógica do pleito revisional” (STJ, REsp 602068/RS, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/09/2004, DJ 21/03/2005 p. 212), o direito dos usuários de serviços bancários à “compensação/repetição simples do indébito de valores pagos em virtude de cláusulas ilegais, em razão do princípio que veda o enriquecimento injustificado do credor” (STJ, AgRg no REsp 1052209/MG, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2009, DJe 04/08/2009). Precedentes do STJ. 12. Se a cobrança indevida resulta de “engano justificável” por parte do credor, afasta-se a repetição do indébito em dobro. Contudo, trata-se de matéria de defesa, de modo que cabe ao fornecedor alegar a ocorrência de tal “engano justificável”. 13. Nas hipóteses em que o fornecedor não alega, em nenhum momento do processo, engano justificável, de sua parte, na cobrança do indébito, mas apenas sustenta a legalidade da cobrança, e tal tese se mostra improcedente, não há razão para afastar a repetição do indébito em dobro. 14. A jurisprudência do STJ indica que a desnecessidade de “prova do erro(,) no pagamento de contrato bancário(,) para autorizar a repetição do indébito” tem por fundamento, ainda, o fato de que “há de se presumir que o pagamento decorreu de exigência do credor” (STJ, REsp 468268/RS, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 22/04/2003, DJ 30/06/2003 p. 259). Até porque, “não é razoável considerar que tal pagamento a mais tenha sido feito conscientemente pelo devedor, a título de liberalidade concedida ao banco” (STJ, REsp 468268/RS, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 22/04/2003, DJ 30/06/2003 p. 259) - ponderação que adquire relevo ainda maior em casos nos quais o credor, valendo-se de sua posição, privilegiada no contexto da relação jurídica travada com o devedor, aprovisiona os valores diretamente da conta corrente deste. 15. O reconhecimento da ilegalidade da capitalização mensal de juros, bem como da cobrança indevida por parte da instituição financeira, impõe a aplicação da sanção prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC. 16. Apelação conhecida e provida. (TJPI | Apelação Cível Nº 06.000717-6 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 06/10/2010 )
Decisão
ACORDAM os componentes da 3ª Câmara Especializada Cível do Tribunal de Justiça do Estado, por votação unânime, conhecer da apelação, para, no mérito, conceder provimento, a fim de reformar a sentença e, com isso: i) reconhecer que as normas de direito do consumidor aplicam-se à relação jurídica que se discute no presente recurso, por força da Súmula nº 297 do STJ; ii) declarar a nulidade da cláusula que estipulou capitalização mensal de juros; iii) condenar o Réu (ora Apelado) à “repetição do indébito, por valor igual ao dobro” da quantia indevidamente cobrada da Autora (ora Apelante), “acrescido de correção monetária e juros legais”, calculados a partir da data do pagamento indevido (art. 42, parágrafo único, do CDC), nos termos do voto do Exmo. Des. Relator.

Data do Julgamento : 06/10/2010
Classe/Assunto : Apelação Cível
Órgão Julgador : 3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a) : Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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