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Jurisprudência


TJPI 06.001383-4

Ementa
REMESSA DE OFÍCIO. Apelação cível. PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. Legitimidade do estado para integrar o pólo passivo de ação de reintegração de servidor público. RECURSO IMPROVIDO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. REJEIÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. QUESTÃO IRRELAVANTE PARA O DESLINDE DA CAUSA. PROGRAMA DE DESLIGAMENTO VOLUNTÁRIO. ANÁLISE DA COAÇÃO NO CASO CONCRETO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO APTO A MACULAR A VONTADE DO SERVIDOR. EXISTÊNCIA. NECESSIDADE DE PROVA DO DEFEITO DO NEGÓCIO JURÍDICO PELA PARTE AUTORA. OCORRÊNCIA. ANULAÇÃO DO ATO DEMISSÓRIO. REINTEGRAÇÃO DA SERVIDORA PÚBLICA. EFEITOS PATRIMONIAIS RETROATIVOS AO ATO DEMISSÓRIO IMPUGNADO. A AUSÊNCIA DE LABOR NÃO AFASTA O RECEBIMENTO DAS VERBAS SALARIAIS. CONHECIMENTO. IMPROVIMENTO. 1. É certo que a EMATER, por ser uma autarquia estadual, criada pela Lei nº 4.572/93, tem personalidade jurídica própria, dotada de autonomia administrativa e financeira, patrimônio e receita próprios, conforme art. 1º, da mencionada lei. 2. Desta forma, com a transformação da EMATER em autarquia, através da Lei Estadual n° 4.572/93, os então servidores públicos, antes submetidos ao regime celetista, ao tempo em que a EMATER ainda estava constituída como empresa pública, ficaram submetidos ao regime estatutário. 3. Assim, na qualidade de servidores públicos, é de ser aplicada a Lei Complementar nº 13/1994 (que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Piauí, das autarquias e das fundações públicas estaduais), que em seu art. 7º determina que o provimento dos cargos públicos das autarquias será realizado por ato do Governador do Estado, in verbis: Art. 7º - No âmbito do Poder Executivo, o provimento dos cargos públicos, inclusive das autarquias e fundações públicas, far-se-á por ato do Governador do Estado, permitida a delegação de competência. 4. Assim, compete ao Chefe do Poder Executivo, dentre outras atribuições, a reintegração de ex-servidor público de autarquia estadual, motivo pelo qual não há como olvidar a sua legitimidade para figurar no pólo passivo de ação ordinária que vise à reintegração de servidor público. 5. Na linha deste raciocínio, muito embora autônomas, as autarquias encontram-se vinculadas ao Governo Estadual, na medida em que não teriam competência para nomear, nem tampouco reintegrar servidor público, e, assim sendo, seria ilógica a permanência da autarquia estadual – EMATER, sozinha, no pólo passivo de uma ação judicial que visa à reintegração de servidor em cargo público. (TJDFT, 19980110160049EIC, Relator DÁCIO VIEIRA, 1ª Câmara Cível, julgado em 25/10/2000, DJ 02/10/2002 p. 21) 6. Uma vez não decorrido o prazo de 5 (cinco) anos entre a data do ato ou fato do qual se originou o direito, e a data do ajuizamento da ação, não há que se falar em ocorrência da prescrição qüinqüenal. 7. Como o último dia do prazo está incluído no prazo, como é do art. 184, do CPC, é certo que quem ingressa em juízo no último dia do prazo processual, não estará agindo a destempo, porque, afinal, no último dia deste prazo, ainda não se consumou a prescrição da pretensão: Art. 184. Salvo disposição em contrário, computar-se-ão os prazos, excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento 8.A propositura da ação, dentro do qüinqüênio legal, é causa de interrupção da prescrição, por força de citação válida do réu para a causa, a teor do art. 219, §§ 1º e 2º, do CPC. 9. A prescrição é interrompida pela citação válida, retroagindo à data da propositura da ação, já que entendimento diverso deste poderia causar prejuízo ao autor, haja vista a possibilidade de consumação da prescrição entre a data da propositura da inicial e a data do despacho do juiz determinando a citação da outra parte, pois “possibilitaria que a parte fosse penalizada pela eventual demora do juiz em proferir o 'cite-se', ou seja, pela falha do próprio mecanismo judiciário, o que é inadmissível” (V. Antonio Carlos Marcato e outros, Código de Processo Civil Interpretado, 2008, p. 610) 10. Está assente na jurisprudência do STJ, interpretando o art. 263, do CPC, ao prescrever que “considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja (…) simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara”, que a data da propositura da ação não é a data da efetiva distribuição do feito em juízo (STJ, 2ª T., Resp 931.741, Min. Eliana Calmon, j. 4.04.08, d.je 18.04.08), mas se considera proposta a ação no dia em que foi protocolada no cartório a petição inicial da causa. (STJ-Bol.AASP 2.473/3.913: 3ª T., Resp 598.798) (Theotonio Negrão, Código Civil, 2011, nota art. 263:2a, p.115) 11. A questão da constitucionalidade de lei é matéria de ordem pública, assim deve ser analisada de ofício pelo juiz e a qualquer tempo. 12. O Poder Legislativo, através do Decreto Legislativo n° 121/98, invadiu competência outorgada ao Poder Executivo e ao Poder Judiciário, na medida em que exerceu controle sobre atos concretos do Poder Executivo, expedidos no regular exercício da sua função típica de administração de seu pessoal, o que viola a independência e harmonia dos Poderes da República, consagrada no art. 2º da CF e, simetricamente, no art. 4º, inciso II da Constituição do Estado do Piauí: Art. 4º – O Estado rege–se, nas relações jurídicas e nas suas atividades político–administrativas, pelos seguintes princípios: (Omissis) II – independência e harmonia dos Poderes; 13. Essa violação ao princípio da independência e harmonia dos Poderes da República, consagrada no art. 2º da CF e, simetricamente, no art. 4º, inciso II da Constituição do Estado do Piauí, ocorreu, na espécie sub judice, pela invasão de competências constitucionais próprias dos Poderes Executivo e Judiciário, por parte do Poder Legislativo. Com a edição do Decreto Legislativo de n° 121/98, e a consequente anulação de atos concretos da administração estadual, o Poder Legislativo praticou ato próprio: i) do Poder Executivo, sobre quem pesa o poder-dever de exercer sua autotutela; e ii) do Poder Judiciário, a quem incumbe exercer o controle jurisdicional, através da emição de juízo de constitucionalidade e legalidade dos atos, quando provocado por aqueles devidamente legitimados e através das vias processuais adequadas. 14. Para a verificação da existência ou não de coação, qual seja, no caso concreto, um vício do consentimento apto a macular a manifestação de vontade do servidor que adere ao Programa de Desligamento Voluntário, é necessária a prova do defeito no negócio jurídico pelo servidor público. (TJMG, Apelação Cível / Reexame Necessário Nº 1.0024.01.114300-5/001, 2ª Câmara Cível, Relator: Des. Jarbas Ladeira, Julgado em 22/11/2005, DJ 07/12/2005). 15. O Código Civil pátrio dispõe em seu art. 151, que a caracterização da coação nas declarações de vontade negocial (ainda que de cunho administrativo) deve ser revestida de temor de dano iminente e considerável à própria pessoa, a sua família, ou aos seus bens, in verbis: Art. 151. A coação, para viciar a declaração de vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens. 16. A coação a que se refere o artigo acima transcrito é a coação moral, capaz de viciar a vontade, que tem como pressuposto “o temor (metus) de um mal”, não sendo, portanto, “qualquer ameaça hábil a configurar coação, devendo preencher os seguintes requisistos: a) gravidade; b) incutir no paciente temor fundado; c) tratar-se de dano iminente; d) o dano terá de ser considerável; e) ser a ameaça injusta; e f) ser causa determinante do negócio.” (V. Nestor Duarte, Código Civil Comentado, 2007, p. 151) 17. Deste modo, entendo que o receio de demissão preeenche os requisitos da coação contidos no art. 151, caput, do CC/02, na medida em que é grave, sendo capaz de incutir no servidor temor fundado de um dano iminente e considerável. Além de ser, indubitavelmente, uma ameaça injusta e causa determinante do negócio jurídico. 18. Em se tratando de violência moral, conforme leciona J. M. Carvalho Santos, "o declarante age coato, mas ainda assim com um certo concurso da inteligência e da vontade, embora esta vontade se ache diminuída na liberdade de eleição". ( V.Código Civil Brasileiro Interpretado, 1985, p. 355) 19. Assim, é anulável o ato cujo consentimento está viciado pela coação.(Precedentes do TJSC e TJCE). 20. Reconhecida a ilegalidade do ato demissório, este deve ser anulado, com a consequente reintegração do servidor no cargo que ocupava anteriormente, o que acarreta a restauração de todos os direitos a que fazia jus quando do exercício regular do cargo. (V. Hely Lopes Meirelles , Direito Administrativo Brasileiro, 2002, p. 437). 21. Portanto, tendo em vista que o ato administrativo, que concluiu pela demissão do servidor público do cargo que ocupava, deve ser tornado sem efeito, caberá à Administração efetuar o pagamento dos valores correspondentes ao período em que o servidor esteve, ilegalmente, afastado, já que se trata de direito de quem, obrigatoriamente, deveria estar integrando o quadro funcional do Administração Pública. (Precedentes do TJRS e do STJ). 22. No tocante aos efeitos patrimoniais da reintegração do servidor público no cargo anteriormente ocupado, o servidor deve ser ressarcido pelo período em que permaneceu afastado por ato ilegal da Administração Pública, com data retroativa à data da publicação do ato demissório. (STJ, RMS 19.498/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 22/03/2010, pesquisa realizada no sítio eletrônico: www.stj.jus.br, em 04/03/2011). 23. O fato de não ter havido prestação de serviço público, ou “qualquer labor” funcional, por parte do servidor público não afasta o direito à percepção das verbas salariais correspondentes ao período em que esteve ilegalmente afastado, já que é devida a restituição do servidor público ao status quo ante, com a devida reposição integral dos direitos a que faria jus se estivesse em pleno exercício do cargo. (STJ, AgRg no Resp 826829/RJ, Sexta Turma – STJ, rel. Min. Hamilton Carvalhido, 27/11/2007, pesquisa realizada no sítio eletrônico: www.stj.jus.br, em 04/03/2011). 24. Remessa de ofício e Apelação Cível conhecidas e improvidas. (TJPI | Remessa de Ofício/Apelação Nº 06.001383-4 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 13/04/2011 )
Decisão
“Acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado, por votação unânime, e de acordo com o Parecer Ministerial, em conhecer da Remessa de Ofício e da Apelação Cível, mas para negar-lhes provimento, mantendo a sentença apelada em todos os seus termos.”

Data do Julgamento : 13/04/2011
Classe/Assunto : Remessa de Ofício/Apelação
Órgão Julgador : 3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a) : Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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