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Jurisprudência


TJPI 06.003033-0

Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR FATO TIPIFICADO COMO CRIME. REGRA GERAL DA INDEPENDÊNCIA DA JURISDIÇÃO CIVIL E CRIMINAL. EXCEÇÕES. SUSPENSÃO DO PROCESSO CIVIL POR PENDÊNCIA DE AÇÃO PENAL. FACULDADE DO JULGADOR. DESPACHO DE ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL NÃO OBSTA A RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL. 1. O próprio Código Civil de 1916, em seu art. 1.525, expressamente consagra a independência da jurisdição civil e criminal, ao preceituar que “a responsabilidade civil é independente da criminal”, segundo a qual a responsabilidade civil, por fato tipificado como crime, independe da responsabilidade penal. 2. A regra da independência da jurisdição civil e criminal apenas sofre mitigação no caso de se ter resolvido, na esfera criminal, as questões acerca da existência e da autoria do fato, por decisão final irrecorrível. Nesta hipótese, segundo esse preceito, não se pode mais questionar, no cível, nem a existência do fato, nem a sua autoria, porquanto decididas no juízo criminal. 3. Há, ainda, a teor dos arts. 65 e 66 do CPP, este segundo interpretado a contrario sensu, outras duas hipóteses em que as decisões produzidas na esfera criminal impedirão a discussão de determinadas questões na esfera civil, quais sejam: i) o reconhecimento da configuração de uma das excludentes de ilicitude; ii) o reconhecimento categórico de inexistência material do ato ilícito. 4. Não ocorridas nenhuma das três hipóteses acima referidas, vigora a regra da independência da jurisdição civil e criminal. Tanto assim que, de acordo com o art. 67 do CPP, também não impedem a propositura de ação civil: i) o arquivamento de inquérito; ii) a existência de decisão que reconheça a extinção da punibilidade; ou iii) a existência de sentença absolutória que reconhece a atipicidade do fato imputado. 6. Não caracterizada nenhuma das hipóteses previstas no art. 1.525, segunda parte, do CC, ou nos arts. 65 e 66 do CPP, vigora a independência da jurisdição civil e criminal, estabelecida no art. 1.525, primeira parte, do CC, que apenas é relativizada ou mitigada nos casos previstos naqueles dispositivos, como leciona Cláudio Luiz Bueno de Godoy: - “O dispositivo [art. 935 do CC/2002], de idêntica previsão ao que o antecedeu, na legislação revogada [art. 1.525 do CC/1916], repete a consagração da independência da jurisdição civil e criminal, quando movimentadas para a apuração de um mesmo fato penalmente típico, com repercussão indenizatória. Tal independência, porém, é relativa ou mitigada, dado que, se(,) no juízo criminal, em que a exigência probatória é mais rígida, se delibera, de forma peremptória, sobre a existência material do fato ou sobre sua autoria, bem como sobre excludentes de ilicitude (art. 65 do CPP), nada mais, a respeito, pode ser discutido no cível.”. (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, em Código Civil Comentado, Cezar Peluso (coord.), 2010, p. 933 – destaques gráficos em negrito acrescidos). 7. Vigora a independência da jurisdição civil e criminal, nos casos em que sequer se tenha instaurado processo penal, inexistindo qualquer decisão, na esfera criminal, acerca da existência material do fato, ou de sua tipicidade e autoria, nem sobre a configuração de uma das hipóteses de exclusão da ilicitude. Não havendo decisão, no juízo criminal, a esse respeito, a regra da independência da jurisdição civil e criminal vigora plenamente, sem qualquer relativização ou mitigação. 8. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça afirma que a suspensão do processo civil, na pendência de ação penal, é mera faculdade do julgador, justamente em razão da regra da independência da jurisdição civil e criminal: - “É princípio elementar a independência entre as esferas cíveis e criminais, podendo um mesmo fato gerar ambos os efeitos, não sendo, portanto, obrigatória a suspensão do curso da ação civil até o julgamento definitivo daquela de natureza penal. Deste modo, o juízo cível não pode impor ao lesado, sob o fundamento de prejudicialidade, aguardar o trânsito em julgado da sentença penal.” (STJ, REsp 347915/AM, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 16/10/2007, DJ 29/10/2007, p. 238). 9. A não-obrigatoriedade de suspensão do processo até a conclusão da ação penal, bem como a possibilidade de aferição da responsabilidade civil, independentemente da apuração de responsabilidade penal, ganham força nas hipóteses em que o processo penal sequer tenha sido instaurado, em razão do arquivamento do inquérito policial. 10. Por imposição da regra da independência da jurisdição, que é plenamente aplicável à espécie, tem-se que a aferição da responsabilidade civil é independente da apuração da responsabilidade penal. E, assim sendo, pouco importa se as investigações levadas a cabo pela polícia judiciária foram inconclusivas, ou se o inquérito policial foi arquivado. Nada disso elimina a possibilidade de responsabilização civil. 11. Pelo contrário, o arquivamento do inquérito policial, e a consequente inexistência de decisão na esfera criminal, apenas preserva a possibilidade de a pessoa lesada, através das vias processuais adequadas, demandar, na esfera cível, o ressarcimento por eventuais danos que haja experimentado, cabendo-lhe apenas demonstrar a configuração da responsabilidade civil daquele a quem se imputa o fato. 12. Não é outro o resultado da aplicação da norma que se extrai do art. 67, inciso I, do CPP, segundo o qual “não impedirão igualmente a propositura da ação civil (…) o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação”. 13. - “Inquérito policial. Arquivamento. O arquivamento do inquérito policial é feito por decisão que não examina o mérito, porque não chegou a ser instaurado o processo penal. Assim, essa sentença não tem nenhuma influência no juízo cível, conforme determina o CPP 67 I (…).” (Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, Código Civil Comentado, 2010, p. 759, nº 8). 14. Tal entendimento encontra amparo jurisprudencial em precedente da relatoria do Min. Alfredo Buzaid, segundo o qual “NÃO IMPEDE A PROPOSITURA DA AÇÃO CIVIL O DESPACHO DE ARQUIVAMENTO DO INQUERITO (CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, ART. 67, I)” (STF, RE 98430, Relator(a): Min. ALFREDO BUZAID, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/09/1983, DJ 07-10-1983 PP-15430 EMENT VOL-01311-03 PP-00680 RTJ VOL-00108-03 PP-01221). DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SAQUES POR AMPREGADO DE BANCO, NÃO AUTORIZADOS PELOS CLIENTES. RESSARCIMENTO PELO BANCO. CARACTERIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO FUNCIONÁRIO. DIREITO DO BANCO DE REAVER A QUANTIA RESSARCIDA AOS CLIENTES. 1. Considera-se configurada a responsabilidade civil subjetiva de empregado de banco que tenha feito saques não autorizados pelos clientes, nas hipóteses em que se fizerem presentes os seguintes elementos: i) conduta de funcionário que tenha realizado saques indevidos, sem autorização dos clientes; ii) dano, experimentado por instituição financeira, consistente nos valores que teve de subtrair de seu patrimônio, a fim de restituir os clientes que haviam sido lesados pelos saques indevidos, realizados por funcionário; iii) nexo de causalidade entre a conduta de funcionário e o dano ao patrimônio da instituição financeira, representado pelo fato de que, realizados os saques indevidos pelo funcionário, teve o banco de restituir seus clientes, e, com isso, aqueles saques irregulares causaram redução patrimonial ao Apelado; iv) culpa lato sensu, consistente no dolo, isto é, na intencionalidade que conduziu a conduta do agente, na realização de saques, que só voluntária e espontaneamente podem ser realizados. Art. 159 do CC. 2. A configuração da responsabilidade civil fica ainda mais clara nas hipóteses em que o Banco, como empregador e, portanto, como responsável civil pela reparação dos danos causados por seus empregados, ressarcir seus clientes, assumindo posição jurídica que lhe possibilite “reaver, daquele por quem pagou, o que houver pago”, conforme dispõe o art. 1.521, inciso III, c/c art. 1.524, ambos do CC. 3. Apelação conhecida e parcialmente provida. (TJPI | Apelação Cível Nº 06.003033-0 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 10/11/2010 )
Decisão
ACORDAM os componentes da 3ª Câmara Especializada Cível do Tribunal de Justiça do Estado, por votação unânime, em conhecer da Apelação, e lhe dar parcial provimento, para manter a sentença recorrida, parcialmente, com fundamento nos arts. 159, 1.521, III c/c 1.524, todos do Código Civil de 1916, modificando na parte relativa à correção monetária que deve ter incidência à partir da sentença condenatória, e aplicação de juros de 0,5% (meio por cento) ao mês, de acordo com o art. 1.062, do Código Civil de 1916, nos termos do voto do Exm.º Des. Relator.

Data do Julgamento : 10/11/2010
Classe/Assunto : Apelação Cível
Órgão Julgador : 3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a) : Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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