TJPI 2008.0001.003116-0
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO. DISCUSSÃO ACERCA DA PONTUAÇÃO ATRIBUÍDA NA FASE DE TÍTULOS. POSSIBILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO DISCUTIR OS CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DA BANCA EXAMINADORA DO CONCURSO PÚBLICO. NÃO COMPROVAÇÃO DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO. RECURSO CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A legitimidade passiva na ação de mandado de segurança está intimamente ligada à capacidade para desfazer o ato, corrigi-lo, ou, ainda, fazer cessar os seus efeitos, é dizer, neste caso, será legitimada passiva a autoridade que detém atribuição para adotar as medidas tendentes a executar ou corrigir o ato questionado, na linha do art. 6º, §3º, da Lei nº 12.016/2009.
2. Muito embora figure no polo passivo, entende-se que a autoridade coatora não é propriamente ré no procedimento do mandado de segurança, mas mera informante, cabendo a qualidade de parte à pessoa jurídica de direito público, que irá suportar os efeitos decorrentes da decisão de mérito. Assim, “a autoridade coatora, no mandado de segurança, é notificada para prestar informações, cessando sua intervenção, quando oferecidas estas, razão pelo qual a legitimatio ad processum para recorrer da decisão deferitória do mandamus é do representante da pessoa jurídica a que pertence o órgão supostamente coator.” (STJ Processo REsp 842279 / MA .Rel. Min. Luiz Fux. Fonte DJ 24.04.2008).
3. No caso em julgamento, é correta a indicação da banca examinadora do concurso e do prefeito municipal como autoridades coatoras, vez que as consequências decorrentes de eventual decisão que concedesse a segurança não seriam suportadas somente pela primeira, mas também pelo município de Francinópolis/PI, representado pelo segundo, ao qual caberia, em tese, promover a nomeação solicitada pela Apelante.
4. Não há falta de interesse de agir recursal, quando, muito embora a eventual alteração da nota do concurso não acarrete modificação na ordem de classificação dos candidatos, o pedido da Apelante não se esgote na atribuição de novos pontos à sua nota, mas, ao lado disso, também haja pedido de anulação da mudança de pontuação de outro candidato.
5. O mandado de segurança é remédio constitucional previsto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, antes disciplinado pela Lei nº. 1.533/51, e, atualmente, pela Lei nº. 12.016/2009, cabível quando ocorrer a violação a direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus e habeas data, praticada por ilegalidade ou abuso de poder de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
6. Os atos administrativos são balizados pela vinculação e discricionariedade. Por ato vinculado entende-se aquele em que a lei não deixou opções; diante de determinados requisitos, a Administração deve agir de tal ou qual forma. Por sua vez, o ato discricionário caracteriza-se pela adoção de uma ou outra solução segundo critérios de oportunidade, conveniência, justiça, equidade, próprios da autoridade, já que não são definidos pelo legislador.
7. É possível o controle judicial dos atos discricionários, desde que respeitada a discricionariedade administrativa, nos limites em que ela é assegurada à Administração Pública pela lei, de maneira que a discricionariedade administrativa possui limites, não podendo, portanto, o administrador invocar juízo de conveniência e oportunidade para legitimar arbitrariedades, que conduzam o ato administrativo ao campo da ilegalidade.
8. O princípio da legalidade, previsto no caput do artigo 37 da Constituição Federal, assume papel relevante no sentido de moderar a discricionariedade administrativa, legitimando o Judiciário a revisar o ato administrativo discricionário sem que haja intervenção na vontade do administrador, mas, apenas, corrigindo estas arbitrariedades, evidenciadas quando a Administração Pública extrapola seus limites.
9. No tocante à possibilidade do Poder Judiciário, em controle de legalidade, discutir os critérios de avaliação da banca examinadora do concurso público, este Eg. Tribunal já tem o entendimento de que o controle jurisdicional se faz plenamente possível, quando o jurisdicionado não busca reexame do conteúdo das questões formuladas ou dos critérios de correção das provas, mas somente o controle de legalidade do ato de atribuição de pontuação ao candidato, como uma atividade que já não é discricionária, mas vinculada. Precedentes do TJPI.
10. Ainda que o concurso, como processo administrativo, fosse composto exclusivamente de atos discricionários, não haveria impedimento ao controle jurisdicional da legalidade, em sentido amplo, como controle de juridicidade. É que a própria discricionariedade também se submete ao controle jurisdicional, quanto aos aspectos atinentes a sua conformidade ao Direito como um todo, isto é, ao ordenamento jurídico, numa verificação de sua juridicidade, que é a sua compatibilidade com a Constituição, com o postulado da proporcionalidade e com as normas infraconstitucionais.
11. A interpretação sistemática do art. 5º, XXXV e do art. 37, da CF – que impõem, respectivamente, a inafastabilidade da jurisdição e que a administração pública obedeça aos princípios da “legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” – leva a concluir pela existência de uma norma constitucional que franqueia ao administrado provocar o Judiciário para que realize o controle jurisdicional da discricionariedade administrativa.
12. Para Cassio Scarpinella Bueno, “na linha evolutiva sustentada pelo Professor Alvim sobre as diversas etapas do controle jurisdicional dos atos administrativos, faz-se necessário acentuar, por fim, que hoje o que se espera do Poder Judiciário no que se refere a este tema é um Judiciário forte, combativo, eficiente, no âmbito de uma postura de máxima eficiência processual e dos resultados do processo para atingimento pleno do apaziguamento social. E [,] dentro desta postura, antigas lições que correlacionam o rótulo 'discricionariedade' a uma zona de afastamento do controle jurisdicional devem ser, definitivamente, afastadas.” (v. Inafastabilidade do controle judicial da Administração, em Carlos Ari Sundfeld [coord.] e outros, Direito Processual Público: a Fazenda Pública em Juízo, 2003, p. 248).
13. No caso dos autos, não restou demonstrado documentalmente o direito líquido e certo da Apelante aos dois pontos requeridos, nem que o outro candidato não tenha direito aos pontos que lhe foram atribuídos, de maneira que a reforma das pontuações atribuídas demandaria dilação probatória, impossível na via do mandado de segurança.
14. A juntada de documentos pelo Impetrante não é admitida depois de prestadas as informações pela autoridade coatora, em razão da própria natureza da ação de mandado de segurança, salvo nas hipóteses em que o documento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, ou ainda se o próprio documento for superveniente às informações (art. 6°, §§ 1° e 2°, da Lei n° 12.016/2009).
15. Recurso conhecido e improvido.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2008.0001.003116-0 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 04/02/2015 )
Ementa
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO. DISCUSSÃO ACERCA DA PONTUAÇÃO ATRIBUÍDA NA FASE DE TÍTULOS. POSSIBILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO DISCUTIR OS CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DA BANCA EXAMINADORA DO CONCURSO PÚBLICO. NÃO COMPROVAÇÃO DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO. RECURSO CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A legitimidade passiva na ação de mandado de segurança está intimamente ligada à capacidade para desfazer o ato, corrigi-lo, ou, ainda, fazer cessar os seus efeitos, é dizer, neste caso, será legitimada passiva a autoridade que detém atribuição para adotar as medidas tendentes a executar ou corrigir o ato questionado, na linha do art. 6º, §3º, da Lei nº 12.016/2009.
2. Muito embora figure no polo passivo, entende-se que a autoridade coatora não é propriamente ré no procedimento do mandado de segurança, mas mera informante, cabendo a qualidade de parte à pessoa jurídica de direito público, que irá suportar os efeitos decorrentes da decisão de mérito. Assim, “a autoridade coatora, no mandado de segurança, é notificada para prestar informações, cessando sua intervenção, quando oferecidas estas, razão pelo qual a legitimatio ad processum para recorrer da decisão deferitória do mandamus é do representante da pessoa jurídica a que pertence o órgão supostamente coator.” (STJ Processo REsp 842279 / MA .Rel. Min. Luiz Fux. Fonte DJ 24.04.2008).
3. No caso em julgamento, é correta a indicação da banca examinadora do concurso e do prefeito municipal como autoridades coatoras, vez que as consequências decorrentes de eventual decisão que concedesse a segurança não seriam suportadas somente pela primeira, mas também pelo município de Francinópolis/PI, representado pelo segundo, ao qual caberia, em tese, promover a nomeação solicitada pela Apelante.
4. Não há falta de interesse de agir recursal, quando, muito embora a eventual alteração da nota do concurso não acarrete modificação na ordem de classificação dos candidatos, o pedido da Apelante não se esgote na atribuição de novos pontos à sua nota, mas, ao lado disso, também haja pedido de anulação da mudança de pontuação de outro candidato.
5. O mandado de segurança é remédio constitucional previsto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, antes disciplinado pela Lei nº. 1.533/51, e, atualmente, pela Lei nº. 12.016/2009, cabível quando ocorrer a violação a direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus e habeas data, praticada por ilegalidade ou abuso de poder de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
6. Os atos administrativos são balizados pela vinculação e discricionariedade. Por ato vinculado entende-se aquele em que a lei não deixou opções; diante de determinados requisitos, a Administração deve agir de tal ou qual forma. Por sua vez, o ato discricionário caracteriza-se pela adoção de uma ou outra solução segundo critérios de oportunidade, conveniência, justiça, equidade, próprios da autoridade, já que não são definidos pelo legislador.
7. É possível o controle judicial dos atos discricionários, desde que respeitada a discricionariedade administrativa, nos limites em que ela é assegurada à Administração Pública pela lei, de maneira que a discricionariedade administrativa possui limites, não podendo, portanto, o administrador invocar juízo de conveniência e oportunidade para legitimar arbitrariedades, que conduzam o ato administrativo ao campo da ilegalidade.
8. O princípio da legalidade, previsto no caput do artigo 37 da Constituição Federal, assume papel relevante no sentido de moderar a discricionariedade administrativa, legitimando o Judiciário a revisar o ato administrativo discricionário sem que haja intervenção na vontade do administrador, mas, apenas, corrigindo estas arbitrariedades, evidenciadas quando a Administração Pública extrapola seus limites.
9. No tocante à possibilidade do Poder Judiciário, em controle de legalidade, discutir os critérios de avaliação da banca examinadora do concurso público, este Eg. Tribunal já tem o entendimento de que o controle jurisdicional se faz plenamente possível, quando o jurisdicionado não busca reexame do conteúdo das questões formuladas ou dos critérios de correção das provas, mas somente o controle de legalidade do ato de atribuição de pontuação ao candidato, como uma atividade que já não é discricionária, mas vinculada. Precedentes do TJPI.
10. Ainda que o concurso, como processo administrativo, fosse composto exclusivamente de atos discricionários, não haveria impedimento ao controle jurisdicional da legalidade, em sentido amplo, como controle de juridicidade. É que a própria discricionariedade também se submete ao controle jurisdicional, quanto aos aspectos atinentes a sua conformidade ao Direito como um todo, isto é, ao ordenamento jurídico, numa verificação de sua juridicidade, que é a sua compatibilidade com a Constituição, com o postulado da proporcionalidade e com as normas infraconstitucionais.
11. A interpretação sistemática do art. 5º, XXXV e do art. 37, da CF – que impõem, respectivamente, a inafastabilidade da jurisdição e que a administração pública obedeça aos princípios da “legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” – leva a concluir pela existência de uma norma constitucional que franqueia ao administrado provocar o Judiciário para que realize o controle jurisdicional da discricionariedade administrativa.
12. Para Cassio Scarpinella Bueno, “na linha evolutiva sustentada pelo Professor Alvim sobre as diversas etapas do controle jurisdicional dos atos administrativos, faz-se necessário acentuar, por fim, que hoje o que se espera do Poder Judiciário no que se refere a este tema é um Judiciário forte, combativo, eficiente, no âmbito de uma postura de máxima eficiência processual e dos resultados do processo para atingimento pleno do apaziguamento social. E [,] dentro desta postura, antigas lições que correlacionam o rótulo 'discricionariedade' a uma zona de afastamento do controle jurisdicional devem ser, definitivamente, afastadas.” (v. Inafastabilidade do controle judicial da Administração, em Carlos Ari Sundfeld [coord.] e outros, Direito Processual Público: a Fazenda Pública em Juízo, 2003, p. 248).
13. No caso dos autos, não restou demonstrado documentalmente o direito líquido e certo da Apelante aos dois pontos requeridos, nem que o outro candidato não tenha direito aos pontos que lhe foram atribuídos, de maneira que a reforma das pontuações atribuídas demandaria dilação probatória, impossível na via do mandado de segurança.
14. A juntada de documentos pelo Impetrante não é admitida depois de prestadas as informações pela autoridade coatora, em razão da própria natureza da ação de mandado de segurança, salvo nas hipóteses em que o documento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, ou ainda se o próprio documento for superveniente às informações (art. 6°, §§ 1° e 2°, da Lei n° 12.016/2009).
15. Recurso conhecido e improvido.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2008.0001.003116-0 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 04/02/2015 )Decisão
ACORDAM os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, à unanimidade, em conhecer da presente Apelação, e, após rejeitar as preliminares suscitadas, negar-lhe provimento, em face da ausência de direito líquido e certo à nomeação e posse de Maria da Conceição Rodrigues Moura para o cargo de enfermeira, mantendo incólume a sentença recorrido, nos termos do voto do Relator.
Data do Julgamento
:
04/02/2015
Classe/Assunto
:
Apelação Cível
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)
:
Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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