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Jurisprudência


TJPI 2009.0001.000920-1

Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. PRELIMINARES. INSTRUÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL COM RELAÇÃO NOMINAL DAS EMPRESAS SUBSTITUÍDAS PELO SINDICATO IMPETRANTE. ART. 2º-A, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 9.494/97. INAPLICABILIDADE AO MANDADO DE SEGURANÇA. PRECEDENTES DO STF. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM. NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 166, DO CTN, E DA SÚMULA 546 DO STF. INDICAÇÃO ERRÔNEA DA AUTORIDADE COATORA NÃO IMPLICA ILEGITIMIDADE QUANDO ESTA PERTENCE À MESMA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIDO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DA HIPÓTESE DA SÚMULA 266, STF (MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA “LEI EM TESE”). EXISTÊNCIA DE ATOS CONCRETOS E PREPARATÓRIOS DA AUTORIDADE COATORA. 1. A exigência inscrita no art. 2º-A da Lei nº 9.494/97, de instrução da petição inicial com a relação nominal dos associados da impetrante e da indicação dos seus respectivos endereços, não se aplica ao mandado de segurança coletivo, pois não encontra amparo no art. 5º, LXX, da CF/88. 2. A comprovação pelo autor de que suportou o encargo financeiro do ICMS, ou de que foi autorizado pelo contribuinte de fato a receber o respectivo indébito tributário, só é necessária no caso do exercício em juízo de pretensão de restituição, creditamento ou compensação do indébito de ICMS, na forma do art. 166, do CTN, e da Súmula 546 do STF, mas, caso não se trate de um destes casos, tal comprovação não será essencial à configuração da legitimidade ad causam. 3. Pelo art. 1.568, do Decreto Estadual nº 13.500/2008, o Gerente de Arrecadação da SEFAZ-PI possui atribuição de verificar a regularidade do pagamento do ICMS e proceder as anotações pertinentes, de modo que não obstante o procedimento administrativo de apuração do ICMS, realizado no âmbito do SEFAZ-PI, conte também com a participação de outros órgãos componentes desta Secretaria, não há como negar que aquele tem poderes para adotar as medidas tendentes a corrigir o ato impugnado no mandado de segurança. 4. A indicação equivocada da autoridade coatora não implica ilegitimidade passiva nos casos em que o equívoco é facilmente perceptível e aquela erroneamente apontada pertence à mesma pessoa jurídica de direito público, ainda mais quando o ato coator foi encampado pelo próprio impetrado. Precedentes do STJ. 5. “Nos termos da jurisprudência do STJ, 'não se pode confundir mandado de segurança preventivo com mandado de segurança impetrado contra lei em tese [...] Isto porque a natureza preventiva do mandamus decorre da constatação da incidência da norma jurídica, uma vez ocorrente seu suporte fático, sendo o direito ameaçado por ato coator iminente [...] Por seu turno, no writ dirigido contra lei em tese, a situação de fato, que enseja a incidência da norma jurídica, ainda não restou configurada' (REsp 860.538/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 18/9/2008, DJe 16/10/2008)”.(STJ - AgRg no AREsp 543.226/PE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/11/2015, DJe 10/12/2015). 6. Para o STJ, “o mandado de segurança preventivo exige efetiva ameaça decorrente de atos concretos ou preparatórios por parte da autoridade indigitada coatora” (STJ - AgRg no MS 20.839/DF, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/08/2014, DJe 03/09/2014), como ocorreu no caso dos autos, em que a autoridade coatora já realizou anteriormente atos concretos de cobrança tributária. MÉRITO. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ESTIPULAÇÃO DE VALORES A SEREM UTILIZADOS COMO BASE DE CÁLCULO DE ICMS COBRADO POR SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA (OU PARA FRENTE). DISTINÇÃO ENTRE BASE DE CÁLCULO NORMATIVA E BASE DE CÁLCULO FÁTICA (OU BASE DE CÁLCULO E BASE CALCULADA). NECESSIDADE DE PREVISÃO ESPECÍFICA, EM LEI ESTADUAL, DOS CRITÉRIOS NORTEADORES DA OPERAÇÃO PRESUNTIVA QUE PERMITE CHEGAR-SE À BASE CALCULADA PRESUMIDA DO ICMS POR SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA OU “PARA FRENTE”. LC Nº 87/1996, ART. 8º, II E §§ 4º e 6º. LEI ESTADUAL Nº 4.257/1989. FIXAÇÃO POR DECRETO. REGIME DE PAUTA FISCAL. SÚMULA 431, DO STJ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 7.. Segundo o regime de responsabilidade tributária por substituição progressiva (ou “para frente” ou, ainda, “subsequente”), a lei, de modo expresso, imputa a responsabilidade pelo crédito tributário a “terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação”, o que é autorizado pelo art. 128 do CTN. 8. A EC nº 03/1993 incorporou, de modo expresso, ao ordenamento constitucional, a possibilidade de utilização da substituição tributária “para frente”, ao introduzir o §7º, ao art. 150, da CF/88, pelo qual “a lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”. 9. Ao reconhecer a constitucionalidade do art. 150, §7º, da CF/88, no julgamento da ADIn nº 1.851-AL, o STF consignou que “a circunstância de ser presumido o fato gerador não constitui óbice à exigência antecipada do tributo, dado tratar-se de sistema instituído pela própria Constituição, encontrando-se regulamentado por lei complementar que, para definir-lhe a base de cálculo, se valeu de critério de estimativa que a aproxima o mais possível da realidade” (STF, ADI 1851, Relator(a):  Min. ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 08/05/2002, DJ 22-11-2002 PP-00055 EMENT VOL-02092-01 PP-00139 REPUBLICAÇÃO: DJ 13-12-2002 PP-00060). 10. No caso específico do ICMS, o art. 155, §2º, XII, “b”, da CF/88, exige também que as disposições sobre o regime de substituição tributária sejam previstas em lei complementar, o que foi cumprido com a edição da LC nº 87/1996 (Lei Kandir), que disciplinou, em caráter geral, diversos aspectos do ICMS, inclusive sobre substituição tributária referente ao ICMS, e, neste ponto, autoriza a legislação estadual a atribuir responsabilidade por substituição “em relação a mercadorias, bens ou serviços” que eleger (art. 6º, § 2º), inclusive quanto ao crédito resultante da incidência do imposto sobre “operações ou prestações (…) subsequentes” (art. 6º, § 1º). 11. Com base nessa autorização concedida pela lei complementar nacional, a Lei Estadual nº 4.257/1989, em seu art. 16, II, atribui responsabilidade por substituição ao “distribuidor, (…) comerciante atacadista ou transportador, quanto ao imposto devido nas operações subsequentes”. 12. A natureza do ICMS de tributo indireto e a regra constitucional da não-cumulatividade permitem dizer que a forma do cálculo da base de cálculo presumida deste imposto, no regime de substituição tributária progressiva tem efeito não só em relação ao substituto tributário (distribuidores, transportadores e comerciantes atacadistas, na forma do art. 16, II, da Lei Estadual nº 4.257/1989), como também repercutirá na esfera patrimonial dos substituídos tributários, ocupantes de posições posteriores da cadeia econômica, como é o caso as empresas varejistas associadas ao sindicato Apelante. 13. Em Direito Tributário, a base de cálculo do tributo denota dois aspectos conceituais distintos, quais sejam a base de cálculo normativa e a base de cálculo fática. Enquanto a primeira é o aspecto do fato descrito na hipótese de incidência, apto a possibilitar a mensuração da intensidade do comportamento previsto abstratamente, a segunda é o correspondente atributo do fato gerador, concretamente aferível, pelo lançamento tributário. 14. A substituição tributária progressiva ou “para frente”, no ICMS, segundo o próprio STJ, consiste em uma “técnica de arrecadação (…) em que o contribuinte-substituto (…) antecipa o montante relativo à operação subseqüente (a ser realizada pelo substituído)” (STJ, REsp 1027786/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/03/2008, DJe 04/03/2009), o que impõe o estabelecimento de regras que, integrando a base de cálculo normativa, possam orientar a presunção de uma base de cálculo fática, para a tributação de um fato gerador que sequer aconteceu. 15. Na cobrança do ICMS por substituição tributária progressiva ou “para frente”, a base de cálculo normativa desse imposto está prevista abstratamente em lei formal – art. 8º, II e §§ 4º e 6º, da Lei Complementar nº 87/1996, c/c o art. 25, II e § 4º, da Lei Estadual nº 4.257/1989 – e pode ser obtido por dois métodos diversos, a saber: i) pelo método do somatório, no qual se procede à soma de uma série de parcelas – a saber, valor da operação, seguro, frete, etc., além de uma “margem de valor agregado, inclusive lucro” (LC nº 87/1996, art. 8º, II e § 4º); ou, substitutivamente, ii) pelo método da estimativa do “preço a consumidor final usualmente praticado no mercado considerado, (…) em condições de livre concorrência” (LC nº 87/1996, art. 8º, § 6º). 16. As regras que disciplinam a realização da operação presuntiva da base de cálculo fática do ICMS deverão ser veiculadas pela lei de cada Estado da federação, por força do que dispõem os §§ 4º e 6º do art. 8º da Lei Complementar nº 87/1996, segundo os quais a margem de valor agregado – no método do somatório (LC nº 87/1996, art. 8º, § 4º) – e o preço a consumidor final (LC nº 87/1996, art. 8º, § 6º) – no método da estimativa – devem ser fixados segundo critérios “previstos em lei”. 17. O STJ traçou com firmeza a distinção entre a pauta fiscal, locução que reservada para designar a imposição arbitrária do “valor da base de cálculo do tributo em caráter geral”, sem obediência a critério legais, e a “fixação da base de cálculo por operação presumida”, a qual, diferentemente, decorre de “procedimento administrativo legitimante, [com] controle [por parte] do contribuinte e adequação aos critérios instituídos na LC 87/96” (STJ, REsp 1192409/SE, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 01/07/2010). 18. A lei do Estado do Piauí que disciplina o ICMS – Lei Estadual nº 4.257/1989 – não prevê critérios para a presunção da base calculada desse imposto, tal como exigido pelos §§ 4º e 6º do art. 8º da LC nº 87/1996, na medida em que seu art. 25 é uma mera reprodução do referido dispositivo da lei nacional do ICMS. É dizer, a lei estadual piauiense que cuida do ICMS simplesmente não especificou os critérios exigidos pela LC nº 87/1996, mas limitou-se a reproduzir os parâmetros traçados genericamente nesta lei complementar nacional. 19. A previsão dos critérios exigidos pela LC nº 87/1996, para o cálculo da base de cálculo presumida do ICMS, devem ser fixados por lei formal e não por ato infralegal, como ocorreu no caso piuiense, por meio do Decreto Estadual nº 9.227/1994. Dessa maneira, a estipulação de valores, com base neste Decreto caracteriza pauta fiscal, no modelo repudiado pela Súmula nº 431 do STJ. 20. Recurso conhecido e provido. (TJPI | Apelação Cível Nº 2009.0001.000920-1 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 20/07/2016 )
Decisão
ACORDAM os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, à unanimidade, em conhecer da Apelação Cível, para afastar a preliminares de descumprimento do 2º-A, da Lei nº 9.494/97; de ilegitimidade ativa e passiva e de impetração de mandado de segurança contra “lei em tese”; e, no mérito, lhe dar provimento, para modificar a sentença recursada e conceder a segurança pleiteada pelo sindicato Apelante, na inicial do mandado de segurança, em razão da ilegalidade decorrente da adoção de regime de pauta fiscal pela Lei Estadual nº 4.257/1989, na aferição da base de cálculo presumida do ICMS, no regime de substituição tributária progressiva, por ofensa ao § 6º do art. 8º da LC nº 87/1996 e à Súmula 431 do STJ, nos termos do voto do Relator.

Data do Julgamento : 20/07/2016
Classe/Assunto : Apelação Cível
Órgão Julgador : 3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a) : Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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