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Jurisprudência


TJPI 2009.0001.002416-0

Ementa
MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. SUPOSTO COMETIMENTO DE CRIME DE HOMICÍDIO POR AGENTE DE POLÍCIA CIVIL. ABERTURA DE INQUÉRITO POLICIAL. ABERTURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. APLICADA PENA DE DEMISSÃO AO SERVIDOR PÚBLICO. ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL, EM RAZÃO DE AUSÊNCIA DE PROVAS DE AUTORIA. INEXISTÊNCIA, IN CASU, DE REPERCUSSÃO DA DECISÃO CRIMINAL NO ANDAMENTO REGULAR DO PAD. ALEGAÇÃO DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA CRIMINAL, POR PARTE DA COMISSÃO PROCESSANTE DO PAD. INEXISTÊNCIA DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA CRIMINAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE PORTARIA DE ABERTURA DE PAD GENÉRICA, SEM ESPECIFICAÇÃO DOS FATOS IMPUTADOS AO ACUSADO. INEXISTÊNCIA DE PORTARIA DE ABERTURA DE PAD GENÉRICA. ESPECIFICADOS, DE FORMA SATISFATÓRIA, NA PORTARIA DE ABERTURA DO PAD, OS FATOS IMPUTADOS AO ACUSADO. REALIZAÇÃO DE 02 (DOIS) EXAMES DE BALÍSTICAS. PRIMEIRO EXAME DE BALÍSTICA REALIZADO PELA POLÍCIA CIVIL. SEGUNDO EXAME DE BALÍSTICA (COMPLEMENTAR), REQUISITADO PELO JUÍZO CRIMINAL, REALIZADO PELA POLÍCIA FEDERAL. RESULTADOS PERICIAIS DIAMETRALMENTE OPOSTOS. POSSIBILIDADE DE USO DE PROVA EMPRESTADA PENAL NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. INDEFERIDO, PELA COMISSÃO PROCESSANTE DO PAD, PEDIDO DE SOBRESTAMENTO DO PAD, ATÉ O RESULTADO DO EXAME DE BALÍSTICA COMPLEMENTAR, REALIZADO PELA POLÍCIA FEDERAL. EXAME DE BALÍSTICA COMPLEMENTAR QUE, SUPOSTAMENTE, PODERIA INOCENTAR O SERVIDOR DO ILÍCITO ADMINISTRATIVO. CERCEAMENTO, NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, DO DIREITO DE DEFESA DO SERVIDOR PÚBLICO. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO, NOTADAMENTE, AO DE CONTRAPROVA. PRESENÇA DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL, A AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. NULIDADE DO PAD, A PARTIR DO MOMENTO EM QUE FOI NEGADO AO IMPETRANTE O SOBRESTAMENTO DO PAD PARA A PRODUÇÃO DE PROVA PENAL, REALIZADA PELA POLÍCIA FEDERAL. DIREITO À REITEGRAÇÃO DO IMPETRANTE AO CARGO DE ORIGEM, SEM PREJUÍZO DE UM NOVO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, COM OBSERVÂNCIA DOS PERMISSIVOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS.CONCESSÃO DA SEGURANÇA PLEITEADA. 1.O princípio do Juiz Natural trata de identificar o órgão jurisdicional competente (art.5°,LIII da CF/88),ou seja,“ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”, o que vem complementado, de perto, pela regra do inciso XXXVIII, isto é, “não haverá juízo ou tribunal de exceção”. 2. O referido princípio, que constitui uma garantia fundamental, vai além da função jurisdicional, estendendo a sua aplicabilidade, inclusive, aos processos realizados pela Administração Pública 3.Princípio do administrador competente, isto é, que nenhum ato, discricionário ou vinculado, pode ser realizado validamente sem que o agente disponha de poder legal para praticá-lo, ( art.5°,LII, da CF) 4.No presente caso, o impetrante alega que a Comissão Processante do Processo Administrativo Disciplinar usurpou a competência do Juiz Criminal, uma vez que se ateve a buscar a autoria do delito da prática de disparo de arma de fogo que culminou na morte da vítima e não concluiu pelo cometimento de ilícito administrativo. 5.Em nenhum momento, durante o andamento do Processo Administrativo, houve por parte da Comissão Processante usurpação da Competência Criminal do Juiz da Causa, porquanto a Comissão apurou os fatos supostamente cometidos pelo impetrante e os enquadrou em violações a deveres e proibições funcionais previstos em Estatutos dos Servidores Civis do Estado do Piauí e no Estatuto dos Policiais Civis do mesmo Estado. 6.E, por fim, em Julgamento de fls.275/278, proferido pelo Governador do Estado do Piauí, este decidiu pela pena de demissão do impetrante, sanção administrativa também prevista no art.148,III da Lei Complementar o Estado do Piauí de n°13/94 e art.67 da Lei Complementar do Estado do Piauí de Nº37/2004. 7.Não existiu, in casu, apuração de crime pela Comissão Processante em Processo Administrativo disciplinar, assim, não se constatou qualquer violação ao princípio do Juiz Natural, 8.E,tampouco, não houve maculação ao princípio da Separação dos Poderes, haja vista que não se observou interferência do Poder Executivo na Competência do Poder Judiciário em julgar infrações penais. 9. A autoridade que aplicou a penalidade de demissão ao servidor efetivo do Estado do Piauí, ora impetrante, foi o Exmo.Governador do Estado do Piauí, portanto, em total conformidade com o que descreve o art. 162 do Estatuto dos Servidores Civis do Estado do Piauí. 10.Portanto, não se atesta violação ao princípio do Juiz Natural em nenhuma das fases do Processo Administrativo Disciplinar de n° 09/GPAD/04. 11.De fato, a responsabilidade administrativa do servidor investigado deverá ser afastada em caso de absolvição criminal, que negue a materialidade ou a autoria do crime ou contravenção, em ação penal que guarda relação com o processo administrativo. 12.Ocorre que, in casu, não houve absolvição criminal do ex-agente de polícia civil, ora impetrante, mas foi deferido o pedido de arquivamento de Inquérito Policial, por ausência de provas quanto à autoria. 13. Se a decisão absolutória afirma a inexistência do fato atribuído ao servidor ou excluiu expressamente da condição de autor do fato, haverá repercussão no âmbito da Administração, ou seja, esta não poderá punir o servidor pelo fato assim decidido na esfera criminal; 14.Se a decisão absolutória, ao contrário, absolver o servidor por insuficiência de provas quanto à autoria, ou porque a prova não foi suficiente para a condenação, a sentença penal absolutória, não influirá na esfera administrativa disciplinar se, além da conduta penal imputada, houver a configuração de ilícito administrativo. 15.Logo, pode o servidor ser absolvido no crime e ser punido na esfera administrativa, nos casos de ausência e insuficiência de provas para a autoria ou para condenação. 16.No caso em deslinde, o arquivamento do inquérito policial se deu por ausência de provas da autoria, assim, inexistirá repercussão, da decisão criminal no âmbito da Administração, ou seja, o que foi decidido na instância penal não vincula a esfera administrativa. 17.Portanto, não tem fundamento a pretensão do impetrante, ao invocar a sua absolvição criminal para afastar a sua responsabilidade administrativa, e, assim, pedir a decretação de nulidade do Processo Administrativo Disciplinar de nº.09/GPAD/04. 18. No que toca à alegação de que a Portaria de abertura do PAD ser genérica e não especificar atos e fatos a serem apurados, essa não tem fundamento de procedência, haja vista que a mencionada portaria descreveu e especificou, satisfatoriamente, os fatos imputados ao acusado, ora Impetrante. 19. Além do mais, somente após o inicio da instrução probatória é que a Comissão Processante poderá fazer o relato circunstanciado das condutas supostamente praticadas pelo servidor indiciado, capitulando as infrações porventura cometidas. 20. Desse modo, a descrição minuciosa dos fatos se faz necessária apenas quando o servidor for indiciado(fase de indiciamento), após a fase instrutória, não sendo imprescindível que conste da portaria de abertura do processo administrativo disciplinar. 21.Com efeito, a referida Portaria, ainda que, hipoteticamente, fizesse referências genéricas aos fatos imputados ao servidor, que não é o caso dos autos, ao invés de narrá-las minuciosamente, não padeceria de nulidade por violar a ampla defesa e o contraditório, visto que tal exigência, também, foi observada na fase de indiciamento, após a instrução. 22. O exame de balística realizado pela Polícia Civil, concluiu que “o projétil questionado(PQ), percorreu o interior do cano da arma de fogo tipo pistola marca Taurus, calibre 40, sequência alfanumérica STK00830”, que supostamente portava o ex-Agente de Polícia Civil, ora impetrante. 23.Em contrapartida, o exame de balística complementar, realizado pela Polícia Federal, requisitado pelo juízo criminal, concluiu que o projétil encaminhado para perícia não apresentou coincidências que permitissem afirmar que o mesmo tinha sido disparado pelo cano da arma analisada, tendo em vista que apresentou discrepâncias na largura dos raiamentos. 24. Verifica-se que os exames balísticos realizados apresentam conclusões diametralmente opostas, no que toca em afirmar de qual arma foi disparado o projétil retirado do corpo da vítima, por essa forma, põe em dúvida a autoria do crime imputado ao impetrante cuja ação violenta teria levado a vítima à morte. 25.Ressalta-se que esse exame de balística complementar, realizado pela Polícia Federal, seria também de fundamento para o pedido de arquivamento do Inquérito Policial, por parte do Ministério Público, e da decisão judicial de arquivamento do referido Inquérito. 26. Assim, resta evidente que a decisão da Comissão Processante em indeferir o pleito de sobrestamento do PAD, até que se obtivesse o resultado do supracitado exame de balística complementar, causou prejuízo ao direito de ampla defesa e do contraditório do impetrante, notadamente, ao de contraprova. 27.Com efeito, verifica-se que a Comissão Processante incorreu em arbitrariedade, no momento que negou ao impetrante o direito de contraprova dos fatos que lhe estavam sendo imputados em processo disciplinar. 28. Evidencia-se, de plano, a irrazoabilidade e desproporcionalidade da decisão da Administração, ao negar a pretensão de sobrestamento do processo disciplinar, até a produção de contraprova, resultante de exame de balística complementar realizado pela Polícia Federal, que poderia eventualmente inocentar o impetrante do ilícito administrativo. 29.Salienta-se ainda que a prova produzida no processo penal, in casu, o referido exame de balística, confeccionado pela Polícia Federal, deveria ter sido admitida no mencionado Processo Administrativo Disciplinar, tendo em vista que a utilização de prova emprestada, validamente produzida em processo criminal, é aceita em Processo Disciplinar. 30.Por essa forma, restou demonstrado que o impetrante teve cerceado seu direito de apresentar contraprova à imputação que lhe estava sendo feita em juízo administrativo, qual seja, o exame balístico complementar, realizado pela Polícia Federal, com base no qual o Ministério Público requereu o arquivamento do Inquérito Policial para apurar quais fatos imputados ao impetrante, e que, eventualmente poderia levar também, ao arquivamento do processo disciplinar 31.Diante disso, é imperioso a nulidade do PAD por não respeitar a plenitude de defesa do impetrante, violando garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório em processos administrativos. 32.Presença de direito líquido e certo ao devido processo legal, ampla defesa e contraditório, com determinação de nulidade do PAD, a partir do momento em que foi negado ao impetrante o sobrestamento do Processo Administrativo Disciplinar para a produção de prova penal pela Polícia Federal. 33.Determinada a imediata reintegração do Impetrante em seu cargo de origem, sem prejuízo de um novo processo administrativo disciplinar, que obedeça aos devidos permissivos legais. 34.Concessão da Segurança pleiteada. (TJPI | Mandado de Segurança Nº 2009.0001.002416-0 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | Tribunal Pleno | Data de Julgamento: 14/04/2016 )
Decisão
Acordam os componentes do Egrégio Tribunal Pleno, à unanimidade, em conceder a segurança, por ter o Impetrante direito líquido e certo ao devido processo legal, ampla defesa e contraditório, determinando a nulidade do processo administrativo disciplinar de n° 09/GPAD/04, a partir do momento em que foi negado ao impetrante o sobrestamento do Processo Administrativo Disciplinar para a produção de prova penal pela Polícia Federal, e, ademais, determinando à autoridade coatora competente a imediata reintegração do Impetrante em seu cargo de origem, sem prejuízo de um novo processo administrativo disciplinar, que obedeça aos devidos permissivos legais, nos termos do voto do Relator.

Data do Julgamento : 14/04/2016
Classe/Assunto : Mandado de Segurança
Órgão Julgador : Tribunal Pleno
Relator(a) : Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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