TJPI 2010.0001.002828-3
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE COMPLEMENTAÇÃO DE SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM, FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL DA PARTE AUTORA E INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL AFASTADAS. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDE DA LEI N.º 11.482/2007 REJEITADA - LEI QUE NÃO PADECE DE VÍCIO MATERIAL OU FORMAL. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL PELA LEI N.º 11.482/2007. RECONHECIMENTO DO DIREITO DOS AUTORES À COMPLEMENTAÇÃO DO VALOR DO SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT, DE ACORDO COM O ART. 3º DA LEI 6.194/74, ALTERADO PELA LEI 11.482/2007. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DO SINISTRO. JUROS DE MORA INCIDENTES A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O requerimento de encaminhamento do recurso de apelação cível, formulado pelo recorrente ao juiz da causa, para que a apelação seja encaminhada à Turma Recursal, que é o órgão revisional das decisões dos juizados especiais, e não ao Tribunal de Justiça, trata-se, como se sabe, de mera irregularidade processual, que não sofre nenhuma sanção, porquanto pertencente ao grupo das irregularidades processuais sem consequência (V. CINTRA/GRINOVER/DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 2012, p. 377), até porque, à luz do art. 514, III, do CPC, o que deve constar na petição do recurso é o “pedido de nova decisão”, não se constituindo em seu requisito o requerimento da parte para que o recurso seja encaminhado a esse ou aquele tribunal.
2. Além disso, na dicção do art. 250, primeira parte, do CPC, “o erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados”, determinando, porém, o parágrafo único deste dispositivo, “o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa”:
Art. 250 - O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessários, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições legais.
Parágrafo único - Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa.
3. Não há que se falar em prejuízo à parte recorrida nas situações em que, inobstante a ocorrência de irregularidade processual, o recurso esteja sendo processado e julgado pelo Tribunal competente.
4. No tocante à legitimidade ativa para pleitear a indenização do seguro obrigatório DPVAT, o caput do art. 4º da Lei nº. 6.194/74, com as alterações advindas da da Lei nº 11.482, de 2007, estabelece que o pagamento da verba indenizatória do seguro, por morte, será paga de acordo com o art. 792 do Código Civil, in verbis:
Art. 4º.A indenização no caso de morte será paga de acordo com o disposto no art. 792 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. (Redação dada pela Lei nº 11.482, de 2007).
5. Referido artigo da lei civil determina que na falta de indicação do beneficiário, o capital segurado será pago metade ao cônjuge, não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem de vocação hereditária, como se lê:
Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.
Parágrafo único. Na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão beneficiários os que provarem que a morte do segurado os privou dos meios necessários à subsistência.
6. A esposa da vítima e os seus filhos, na qualidade de herdeiros necessários, legitimam-se a postular, quanto ao quinhão cabível a cada um, a indenização integral ou o complemento do que houver sido comprovadamente pago na via administrativa, nos termos do art. 792 do CC/2002.
7. O recebimento, pelo segurado, de parte do valor do seguro obrigatório – DPVAT, não a impede a cobrança da diferença entre o valor legalmente previsto e o indenizado, posto que o recebimento do valor indenizatório, bem como a quitação passada ao beneficiário, pela seguradora, referem-se apenas ao montante já recebido.
8. A propósito, a jurisprudência, tanto do Superior Tribunal de Justiça, quanto a deste Tribunal, já pacificaram o entendimento no sentido de que o recibo vale pela quantia que nele contida, sem excluir pretensão futura por eventual saldo.
9. A quitação efetuada administrativamente, nos casos de seguros DPVAT, não tem o condão de extinguir a obrigação, nas hipóteses em que a seguradora descumpriu a lei ou o contrato, razão pela qual o pagamento realizado em valor inferior ao disposto na lei, ou no contrato, na esfera administrativa, não é obstáculo ao ajuizamento da ação judicial para pleitear a complementação da diferença do valor que a parte segurada entenda devido.
10. Nesta linha, o interesse de agir surge da necessidade de se obter a proteção de um direito ameaçado, através da via judicial, quando “não possa obter o mesmo resultado por outro meio extraprocessual” (V. VICENTE GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, 2008, p.85).
11. Como é corrente na doutrina, o exame do interesse de agir passa pela verificação de duas circunstâncias: i) necessidade da tutela judicial, e ii) via processual adequada.
12. Além da necessidade da provocação da tutela jurisdicional, deve haver a adequação do provimento. De acordo com HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, o interesse processual: “a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial”. (V. Curso de Direito Processual Civil, 1997, p.56).
13. Os documentos essenciais à propositura da ação não se confundem com os necessários ao deslinde da causa, que dizem respeito à prova dos fatos alegados pelo autor, e não à admissibilidade da ação inicial. (Precedente do STJ)
14. Não há que se falar em inépcia da inicial, se preenchidos os requisitos contidos no art. 295, parágrafo único, do CPC.
15. A Lei 6.194/1974, que dispõe sobre o Seguro Obrigatório DPVAT, foi modificada em 29.12.2006 pela MP n.º 340, convertida na Lei n° 11.482, de 31/05/2007, que entrou em vigor em 31 de maio de 2007, no tocante aos procedimentos e aos valores devidos a título de indenização aos beneficiários do seguro obrigatório – DPVAT.
16. O art. 3º da Lei 6.194/1974, antes da edição da Lei 11.482/2007, estabelecia que na hipótese de morte, o valor da indenização deveria ser correspondente a 40 (quarenta) vezes o valor do maior salário mínimo vigente no País, in verbis:
Art. 3º Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no artigo 2º compreendem as indenizações por morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica e suplementares, nos valores que se seguem, por pessoa vitimada:
a) - 40 (quarenta) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - no caso de morte;
b) - Até 40 (quarenta) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - no caso de invalidez permanente;
c) - Até 8 (oito) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - como reembolso à vítima - no caso de despesas de assistência médica e suplementares devidamente comprovadas.
17. O art. 8º da Lei 11.482/2007, entretanto, modificou o art. 3º da Lei 6.194/1974, passando a estabelecer que, os danos pessoais cobertos pelo seguro obrigatório DPVAT, nos casos de morte, devem observar o limite de até R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais), como se lê:
Art. 3o Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no art. 2o desta Lei compreendem as indenizações por morte, por invalidez permanente, total ou parcial, e por despesas de assistência médica e suplementares, nos valores e conforme as regras que se seguem, por pessoa vitimada:
(...)
I - R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais) - no caso de morte; (Incluído pela Lei nº 11.482, de 2007)
18.Com as modificações introduzidas pela Lei 11.482/2007, surgiram controvérsias jurídicas acerca da sua inconstitucionalidade formal, haja vista a ausência dos requisitos de relevância e urgência, para a edição da Medida Provisória 340/2006, previstos no art. 62, caput, da CF, e, ainda, controvérsias a respeito da inconstitucionalidade material da referida lei, baseada nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da vedação ao retrocesso social.
19. No tocante ao primeiro aspecto, não há inconstitucionalidade formal, por ausência dos requisitos de relevância e urgência, para edição da Medida Provisória 340/2006, convertida na Lei 11.482/07, já que, desse modo, os eventuais vícios restaram sanados com a conversão, prejudicando o debate acerca da relevância e urgência no Judiciário, na medida em que, por força da separação dos poderes, os requisitos constitucionais legitimadores da edição de medidas provisórias só deve ocorrer excepcionalmente, no Poder Judiciário. (Precedente STJ)
20. Nesta linha, de lado as situações excepcionais, não cabe ao Poder Judiciário controlar os critérios de relevância e de urgência, uma vez que constituem matéria inserida no âmbito da discricionariedade do chefe do Poder Executivo Nacional. (TJMG, Apelação Cível 1.0701.09.265907-0/001, Rel. Des.(a) Elpídio Donizetti, 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/05/2010, publicação da súmula em 21/05/2010)
21. De outro lado, no tocante a alegada a inconstitucionalidade material da Lei 11.482/07, o principal argumento é a existência de substancial retrocesso no tocante às garantias constitucionais adquiridas pela sociedade, uma vez que, com a fixação de valores estáticos, haveria clara desvantagem para o beneficiário do seguro DPVAT. Os adeptos dessa corrente, fundamentados nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e vedação ao retrocesso social sustentam que o Estado só deve agir para melhorar progressivamente as condições de vida dos administrados, sendo-lhe defeso suprimir garantias essenciais já implementadas em prol da dignidade da pessoa humana.
22. A maioria da jurisprudência segue o entendimento pela constitucionalidade da Lei 11.482/07, por entenderem que a estipulação da indenização em valores fixos não ofende aos preceitos constitucionais. Nessa linha de raciocínio, ausente violação ao conteúdo substancial da Constituição Federal, não há que se falar em vício material. (Precedentes TJSP e TJSE)
23. É de ser afastada a alegação de inconstitucionalidade da Lei 11.482/2007, por ofender o princípio da dignidade da pessoa humana, (art. 1 °, IH, da CF), o direito a justa indenização por ato ilícito (art. 5º, X, da CF) e o processo legislativo (art. 62, caput, da CF). (TJSP, Ap. c/ Rev. Nº 990.09.291963-6, 30ª Câmara, Rel. Des. LINO MACHADO, j. 13/01/2010).
24. Verificada a morte da vítima em decorrência de acidente de trânsito e levando em conta a data do sinistro, o pagamento de indenização relativa ao seguro obrigatório - DPVAT deve obedecer ao limite de R$ 13.500,00, nos termos do art. 3º, I, da Lei 6.194/1974, alterado pela Lei 11.482/2007.
25. O recebimento parcial da indenização do seguro DPVAT, por morte da vítima, não inibe a cobrança da diferença até o montante estabelecido em lei, por constituir norma cogente de proteção conferida pelo Estado.(STJ, REsp 619.324/RJ, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 24/05/2010).
26. Nas ações em que se pretende o complemento da indenização decorrente do seguro DPVAT, por se tratar se um ilícito contratual, os juros de mora devem incidir a partir da citação.
27. A correção monetária, no entanto, no caso de indenização de seguro DPVAT, deve “ser atualizada monetariamente a partir da data em que ocorrera o fato gerador do direito ao recebimento da indenização securitária advinda de acidente de trânsito, ou seja, a partir da data da ocorrência do sinistro (...), e não da data em que o apelado promovera a ação visando a complementação da indenização que lhe fora destinada ou da data do pagamento parcial. É que a obrigação se tornara exigível no momento em que se verificara seu fato gerador, devendo a partir de então ser atualizada de forma a ser preservada sua atualidade.” (TJDFT, Apelação Cível 20080111077868, 1ª Turma Cível, Rel. Des. Teófilo Caetano, Julgado em 13/06/2012).
28. Honorários Advocatícios reduzidos ao percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, já que referido percentual se mostra razoável e adequado em relação aos parâmetros traçados pelo CPC, sopesando os elementos indicados no art. 20, §3º, do CPC.
29. Apelação Cível conhecida e parcialmente provida.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2010.0001.002828-3 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 18/07/2012 )
Ementa
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE COMPLEMENTAÇÃO DE SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM, FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL DA PARTE AUTORA E INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL AFASTADAS. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDE DA LEI N.º 11.482/2007 REJEITADA - LEI QUE NÃO PADECE DE VÍCIO MATERIAL OU FORMAL. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL PELA LEI N.º 11.482/2007. RECONHECIMENTO DO DIREITO DOS AUTORES À COMPLEMENTAÇÃO DO VALOR DO SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT, DE ACORDO COM O ART. 3º DA LEI 6.194/74, ALTERADO PELA LEI 11.482/2007. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DO SINISTRO. JUROS DE MORA INCIDENTES A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O requerimento de encaminhamento do recurso de apelação cível, formulado pelo recorrente ao juiz da causa, para que a apelação seja encaminhada à Turma Recursal, que é o órgão revisional das decisões dos juizados especiais, e não ao Tribunal de Justiça, trata-se, como se sabe, de mera irregularidade processual, que não sofre nenhuma sanção, porquanto pertencente ao grupo das irregularidades processuais sem consequência (V. CINTRA/GRINOVER/DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 2012, p. 377), até porque, à luz do art. 514, III, do CPC, o que deve constar na petição do recurso é o “pedido de nova decisão”, não se constituindo em seu requisito o requerimento da parte para que o recurso seja encaminhado a esse ou aquele tribunal.
2. Além disso, na dicção do art. 250, primeira parte, do CPC, “o erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados”, determinando, porém, o parágrafo único deste dispositivo, “o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa”:
Art. 250 - O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessários, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições legais.
Parágrafo único - Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa.
3. Não há que se falar em prejuízo à parte recorrida nas situações em que, inobstante a ocorrência de irregularidade processual, o recurso esteja sendo processado e julgado pelo Tribunal competente.
4. No tocante à legitimidade ativa para pleitear a indenização do seguro obrigatório DPVAT, o caput do art. 4º da Lei nº. 6.194/74, com as alterações advindas da da Lei nº 11.482, de 2007, estabelece que o pagamento da verba indenizatória do seguro, por morte, será paga de acordo com o art. 792 do Código Civil, in verbis:
Art. 4º.A indenização no caso de morte será paga de acordo com o disposto no art. 792 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. (Redação dada pela Lei nº 11.482, de 2007).
5. Referido artigo da lei civil determina que na falta de indicação do beneficiário, o capital segurado será pago metade ao cônjuge, não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem de vocação hereditária, como se lê:
Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.
Parágrafo único. Na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão beneficiários os que provarem que a morte do segurado os privou dos meios necessários à subsistência.
6. A esposa da vítima e os seus filhos, na qualidade de herdeiros necessários, legitimam-se a postular, quanto ao quinhão cabível a cada um, a indenização integral ou o complemento do que houver sido comprovadamente pago na via administrativa, nos termos do art. 792 do CC/2002.
7. O recebimento, pelo segurado, de parte do valor do seguro obrigatório – DPVAT, não a impede a cobrança da diferença entre o valor legalmente previsto e o indenizado, posto que o recebimento do valor indenizatório, bem como a quitação passada ao beneficiário, pela seguradora, referem-se apenas ao montante já recebido.
8. A propósito, a jurisprudência, tanto do Superior Tribunal de Justiça, quanto a deste Tribunal, já pacificaram o entendimento no sentido de que o recibo vale pela quantia que nele contida, sem excluir pretensão futura por eventual saldo.
9. A quitação efetuada administrativamente, nos casos de seguros DPVAT, não tem o condão de extinguir a obrigação, nas hipóteses em que a seguradora descumpriu a lei ou o contrato, razão pela qual o pagamento realizado em valor inferior ao disposto na lei, ou no contrato, na esfera administrativa, não é obstáculo ao ajuizamento da ação judicial para pleitear a complementação da diferença do valor que a parte segurada entenda devido.
10. Nesta linha, o interesse de agir surge da necessidade de se obter a proteção de um direito ameaçado, através da via judicial, quando “não possa obter o mesmo resultado por outro meio extraprocessual” (V. VICENTE GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, 2008, p.85).
11. Como é corrente na doutrina, o exame do interesse de agir passa pela verificação de duas circunstâncias: i) necessidade da tutela judicial, e ii) via processual adequada.
12. Além da necessidade da provocação da tutela jurisdicional, deve haver a adequação do provimento. De acordo com HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, o interesse processual: “a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial”. (V. Curso de Direito Processual Civil, 1997, p.56).
13. Os documentos essenciais à propositura da ação não se confundem com os necessários ao deslinde da causa, que dizem respeito à prova dos fatos alegados pelo autor, e não à admissibilidade da ação inicial. (Precedente do STJ)
14. Não há que se falar em inépcia da inicial, se preenchidos os requisitos contidos no art. 295, parágrafo único, do CPC.
15. A Lei 6.194/1974, que dispõe sobre o Seguro Obrigatório DPVAT, foi modificada em 29.12.2006 pela MP n.º 340, convertida na Lei n° 11.482, de 31/05/2007, que entrou em vigor em 31 de maio de 2007, no tocante aos procedimentos e aos valores devidos a título de indenização aos beneficiários do seguro obrigatório – DPVAT.
16. O art. 3º da Lei 6.194/1974, antes da edição da Lei 11.482/2007, estabelecia que na hipótese de morte, o valor da indenização deveria ser correspondente a 40 (quarenta) vezes o valor do maior salário mínimo vigente no País, in verbis:
Art. 3º Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no artigo 2º compreendem as indenizações por morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica e suplementares, nos valores que se seguem, por pessoa vitimada:
a) - 40 (quarenta) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - no caso de morte;
b) - Até 40 (quarenta) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - no caso de invalidez permanente;
c) - Até 8 (oito) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - como reembolso à vítima - no caso de despesas de assistência médica e suplementares devidamente comprovadas.
17. O art. 8º da Lei 11.482/2007, entretanto, modificou o art. 3º da Lei 6.194/1974, passando a estabelecer que, os danos pessoais cobertos pelo seguro obrigatório DPVAT, nos casos de morte, devem observar o limite de até R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais), como se lê:
Art. 3o Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no art. 2o desta Lei compreendem as indenizações por morte, por invalidez permanente, total ou parcial, e por despesas de assistência médica e suplementares, nos valores e conforme as regras que se seguem, por pessoa vitimada:
(...)
I - R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais) - no caso de morte; (Incluído pela Lei nº 11.482, de 2007)
18.Com as modificações introduzidas pela Lei 11.482/2007, surgiram controvérsias jurídicas acerca da sua inconstitucionalidade formal, haja vista a ausência dos requisitos de relevância e urgência, para a edição da Medida Provisória 340/2006, previstos no art. 62, caput, da CF, e, ainda, controvérsias a respeito da inconstitucionalidade material da referida lei, baseada nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da vedação ao retrocesso social.
19. No tocante ao primeiro aspecto, não há inconstitucionalidade formal, por ausência dos requisitos de relevância e urgência, para edição da Medida Provisória 340/2006, convertida na Lei 11.482/07, já que, desse modo, os eventuais vícios restaram sanados com a conversão, prejudicando o debate acerca da relevância e urgência no Judiciário, na medida em que, por força da separação dos poderes, os requisitos constitucionais legitimadores da edição de medidas provisórias só deve ocorrer excepcionalmente, no Poder Judiciário. (Precedente STJ)
20. Nesta linha, de lado as situações excepcionais, não cabe ao Poder Judiciário controlar os critérios de relevância e de urgência, uma vez que constituem matéria inserida no âmbito da discricionariedade do chefe do Poder Executivo Nacional. (TJMG, Apelação Cível 1.0701.09.265907-0/001, Rel. Des.(a) Elpídio Donizetti, 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/05/2010, publicação da súmula em 21/05/2010)
21. De outro lado, no tocante a alegada a inconstitucionalidade material da Lei 11.482/07, o principal argumento é a existência de substancial retrocesso no tocante às garantias constitucionais adquiridas pela sociedade, uma vez que, com a fixação de valores estáticos, haveria clara desvantagem para o beneficiário do seguro DPVAT. Os adeptos dessa corrente, fundamentados nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e vedação ao retrocesso social sustentam que o Estado só deve agir para melhorar progressivamente as condições de vida dos administrados, sendo-lhe defeso suprimir garantias essenciais já implementadas em prol da dignidade da pessoa humana.
22. A maioria da jurisprudência segue o entendimento pela constitucionalidade da Lei 11.482/07, por entenderem que a estipulação da indenização em valores fixos não ofende aos preceitos constitucionais. Nessa linha de raciocínio, ausente violação ao conteúdo substancial da Constituição Federal, não há que se falar em vício material. (Precedentes TJSP e TJSE)
23. É de ser afastada a alegação de inconstitucionalidade da Lei 11.482/2007, por ofender o princípio da dignidade da pessoa humana, (art. 1 °, IH, da CF), o direito a justa indenização por ato ilícito (art. 5º, X, da CF) e o processo legislativo (art. 62, caput, da CF). (TJSP, Ap. c/ Rev. Nº 990.09.291963-6, 30ª Câmara, Rel. Des. LINO MACHADO, j. 13/01/2010).
24. Verificada a morte da vítima em decorrência de acidente de trânsito e levando em conta a data do sinistro, o pagamento de indenização relativa ao seguro obrigatório - DPVAT deve obedecer ao limite de R$ 13.500,00, nos termos do art. 3º, I, da Lei 6.194/1974, alterado pela Lei 11.482/2007.
25. O recebimento parcial da indenização do seguro DPVAT, por morte da vítima, não inibe a cobrança da diferença até o montante estabelecido em lei, por constituir norma cogente de proteção conferida pelo Estado.(STJ, REsp 619.324/RJ, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 24/05/2010).
26. Nas ações em que se pretende o complemento da indenização decorrente do seguro DPVAT, por se tratar se um ilícito contratual, os juros de mora devem incidir a partir da citação.
27. A correção monetária, no entanto, no caso de indenização de seguro DPVAT, deve “ser atualizada monetariamente a partir da data em que ocorrera o fato gerador do direito ao recebimento da indenização securitária advinda de acidente de trânsito, ou seja, a partir da data da ocorrência do sinistro (...), e não da data em que o apelado promovera a ação visando a complementação da indenização que lhe fora destinada ou da data do pagamento parcial. É que a obrigação se tornara exigível no momento em que se verificara seu fato gerador, devendo a partir de então ser atualizada de forma a ser preservada sua atualidade.” (TJDFT, Apelação Cível 20080111077868, 1ª Turma Cível, Rel. Des. Teófilo Caetano, Julgado em 13/06/2012).
28. Honorários Advocatícios reduzidos ao percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, já que referido percentual se mostra razoável e adequado em relação aos parâmetros traçados pelo CPC, sopesando os elementos indicados no art. 20, §3º, do CPC.
29. Apelação Cível conhecida e parcialmente provida.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2010.0001.002828-3 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 18/07/2012 )Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em conhecer do recurso de Apelação Cível, para dar-lhe parcial provimento, reformando a sentença monocrática apelada, assegurando o direito dos Apelados ao recebimento do valor remanescente da indenização do seguro DPVAT, por morte, no valor de R$ 3.375,00 (três mil trezentos e setenta e cinco reais), correspondente a diferença entre o valor pago administrativamente, pela Seguradora Apelante, aos beneficiários e o valor legalmente previsto, conforme o art. 3º, I, da Lei 6.194/1974, alterado pela Lei 11.482/2007, com correção monetária a partir do evento danoso e juros de mora contados da citação e honorários advocatícios arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.
Data do Julgamento
:
18/07/2012
Classe/Assunto
:
Apelação Cível
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)
:
Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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