TJPI 2010.0001.005845-7
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT. RESSARCIMENTO DE DESPESAS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA E SUPLEMENTAR. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL DA PARTE AUTORA E INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL AFASTADAS. RECONHECIMENTO DO DIREITO DO AUTOR À COMPLEMENTAÇÃO DO VALOR DO SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT, DE ACORDO COM O ART. 3º, “c”, DA LEI 6.194/74. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DO SINISTRO. JUROS DE MORA INCIDENTES A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. O requerimento de encaminhamento do recurso de apelação cível, formulado pelo recorrente ao juiz da causa, para que a apelação seja encaminhada à Turma Recursal, que é o órgão revisional das decisões dos juizados especiais, e não ao Tribunal de Justiça, trata-se, como se sabe, de mera irregularidade processual, que não sofre nenhuma sanção, porquanto pertencente ao grupo das irregularidades processuais sem consequência (V. CINTRA/GRINOVER/DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 2012, p. 377), até porque, à luz do art. 514, III, do CPC, o que deve constar na petição do recurso é o “pedido de nova decisão”, não se constituindo em seu requisito o requerimento da parte para que o recurso seja encaminhado a esse ou aquele tribunal.
2. Além disso, na dicção do art. 250, primeira parte, do CPC, “o erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados”, determinando, porém, o parágrafo único deste dispositivo, “o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa”:
Art. 250 - O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessários, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições legais.
Parágrafo único - Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa.
3. Não há que se falar em prejuízo à parte recorrida nas situações em que, inobstante a ocorrência de irregularidade processual, o recurso esteja sendo processado e julgado pelo Tribunal competente.
4. Restando comprovado, nos autos, que houve o requerimento administrativo por parte do Autor, ora Apelado, para o recebimento do valor do seguro obrigatório DPVAT, relativo ao reembolso de despesas médico-hospitalares, inclusive com o recebimento de parte da indenização devida, não há que se falar em falta de interesse processual.
5. Ademais, o interesse de agir surge da necessidade de se obter a proteção de um direito ameaçado, através da via judicial, quando “não possa obter o mesmo resultado por outro meio extraprocessual” (V. VICENTE GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, 2008, p.85).
6. Como é corrente na doutrina, o exame do interesse de agir passa pela verificação de duas circunstâncias: i) necessidade da tutela judicial, e ii) via processual adequada.
7. Além da necessidade da provocação da tutela jurisdicional, deve haver a adequação do provimento. De acordo com HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, o interesse processual: “a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial”. (V. Curso de Direito Processual Civil, 1997, p.56).
8. Na medida em que o Autor sofreu um acidente de trânsito e não pôde obter, administrativamente, o valor do seguro determinado por lei, restando, apenas, a via judicial, resta patente o interesse processual.
9. Outrossim, há a adequação do provimento pleiteado, vez que o Autor valeu-se do meio processual apto à defesa dos seus direitos em juízo.
10. Os documentos essenciais à propositura da ação não se confundem com os necessários ao deslinde da causa, que dizem respeito à prova dos fatos alegados pelo Autor, e não à admissibilidade da ação inicial. (Precedente do STJ)
11. Não há que se falar em inépcia da inicial, se preenchidos os requisitos contidos no art. 295, parágrafo único, do CPC.
12. Na medida em que restaram comprovadas as despesas com hospital e tratamento médico, em instituição privada, decorrentes lesões sofridas em acidente automobilístico, é devido o pagamento do seguro obrigatório DPVAT ao Autor, ora Apelado, pela seguradora Apelante.
13. Considerando-se que o acidente ocorreu em 09 de dezembro de 2001, a lei aplicável ao presente caso é a vigente na data do sinistro, ou seja a Lei 6.194/74, não havendo como aplicar as disposições das Leis 11.482/2007 e 11.945/2009, haja vista que entraram em vigor após a ocorrência do acidente ocorrido e, portanto, somente podem regular os fatos posteriores à sua vigência, em razão da regra do “tempus regit actum” (Precedentes do TJSP e TJPR).
14. O art. 3º, “c”, da Lei 6.194/74, vigente à época do fato, estabelecia que, no caso de despesas de assistência médica e suplementares devidamente comprovadas, a indenização decorrente do seguro DPVAT seria de até 08 (oito) vezes o valor do salário mínimo vigente.
15. Não há óbice à fixação da indenização em salários mínimos, pois, nos casos de seguro obrigatório DPVAT, o critério para fixação do valor da indenização em salários mínimos serve, tão somente, para quantificar o valor devido, razão pela qual é perfeitamente possível a referida vinculação, não ferindo, deste modo, o art. 7º, IV, da Constituição Federal. (Precedentes do TJPI)
16. A jurisprudência tem decidido, de forma maciça, que a elaboração de regulamentações securitárias pelo Conselho Nacional de Seguros Privados não têm o condão de revogar ou tornar ineficaz o disposto em lei federal.
17. Como é cediço, o referido Conselho tem competência para a regulamentação do comando legal, mas as normas expedidas no exercício desse poder regulamentar, não podem, em nenhuma hipótese, contrariar a lei, porquanto esta é hierarquicamente superior a qualquer resolução ou deliberação advinda do CNSP.
18. Isto posto, com relação ao reembolso das despesas médicas, verifico que se mostra correta a decisão de primeiro grau em atender a pretensão do Autor, ora Apelado, condenando a Bradesco Seguros S/A a ressarci-lo do montante gasto, até o limite estabelecido pela Lei 6.194/74.
19. Nas ações em que se pretende o complemento da indenização decorrente do seguro DPVAT, por se tratar se um ilícito contratual, os juros de mora devem incidir a partir da citação.
20. A correção monetária, no entanto, no caso de indenização de seguro DPVAT, deve “ser atualizada monetariamente a partir da data em que ocorrera o fato gerador do direito ao recebimento da indenização securitária advinda de acidente de trânsito, ou seja, a partir da data da ocorrência do sinistro (...), e não da data em que o apelado promovera a ação visando a complementação da indenização que lhe fora destinada ou da data do pagamento parcial. É que a obrigação se tornara exigível no momento em que se verificara seu fato gerador, devendo a partir de então ser atualizada de forma a ser preservada sua atualidade.” (TJDFT, Apelação Cível 20080111077868, 1ª Turma Cível, Rel. Des. Teófilo Caetano, Julgado em 13/06/2012).
21. Apelação Cível conhecida e improvida.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2010.0001.005845-7 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 18/07/2012 )
Ementa
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT. RESSARCIMENTO DE DESPESAS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA E SUPLEMENTAR. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL DA PARTE AUTORA E INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL AFASTADAS. RECONHECIMENTO DO DIREITO DO AUTOR À COMPLEMENTAÇÃO DO VALOR DO SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT, DE ACORDO COM O ART. 3º, “c”, DA LEI 6.194/74. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DO SINISTRO. JUROS DE MORA INCIDENTES A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. O requerimento de encaminhamento do recurso de apelação cível, formulado pelo recorrente ao juiz da causa, para que a apelação seja encaminhada à Turma Recursal, que é o órgão revisional das decisões dos juizados especiais, e não ao Tribunal de Justiça, trata-se, como se sabe, de mera irregularidade processual, que não sofre nenhuma sanção, porquanto pertencente ao grupo das irregularidades processuais sem consequência (V. CINTRA/GRINOVER/DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 2012, p. 377), até porque, à luz do art. 514, III, do CPC, o que deve constar na petição do recurso é o “pedido de nova decisão”, não se constituindo em seu requisito o requerimento da parte para que o recurso seja encaminhado a esse ou aquele tribunal.
2. Além disso, na dicção do art. 250, primeira parte, do CPC, “o erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados”, determinando, porém, o parágrafo único deste dispositivo, “o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa”:
Art. 250 - O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessários, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições legais.
Parágrafo único - Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa.
3. Não há que se falar em prejuízo à parte recorrida nas situações em que, inobstante a ocorrência de irregularidade processual, o recurso esteja sendo processado e julgado pelo Tribunal competente.
4. Restando comprovado, nos autos, que houve o requerimento administrativo por parte do Autor, ora Apelado, para o recebimento do valor do seguro obrigatório DPVAT, relativo ao reembolso de despesas médico-hospitalares, inclusive com o recebimento de parte da indenização devida, não há que se falar em falta de interesse processual.
5. Ademais, o interesse de agir surge da necessidade de se obter a proteção de um direito ameaçado, através da via judicial, quando “não possa obter o mesmo resultado por outro meio extraprocessual” (V. VICENTE GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, 2008, p.85).
6. Como é corrente na doutrina, o exame do interesse de agir passa pela verificação de duas circunstâncias: i) necessidade da tutela judicial, e ii) via processual adequada.
7. Além da necessidade da provocação da tutela jurisdicional, deve haver a adequação do provimento. De acordo com HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, o interesse processual: “a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial”. (V. Curso de Direito Processual Civil, 1997, p.56).
8. Na medida em que o Autor sofreu um acidente de trânsito e não pôde obter, administrativamente, o valor do seguro determinado por lei, restando, apenas, a via judicial, resta patente o interesse processual.
9. Outrossim, há a adequação do provimento pleiteado, vez que o Autor valeu-se do meio processual apto à defesa dos seus direitos em juízo.
10. Os documentos essenciais à propositura da ação não se confundem com os necessários ao deslinde da causa, que dizem respeito à prova dos fatos alegados pelo Autor, e não à admissibilidade da ação inicial. (Precedente do STJ)
11. Não há que se falar em inépcia da inicial, se preenchidos os requisitos contidos no art. 295, parágrafo único, do CPC.
12. Na medida em que restaram comprovadas as despesas com hospital e tratamento médico, em instituição privada, decorrentes lesões sofridas em acidente automobilístico, é devido o pagamento do seguro obrigatório DPVAT ao Autor, ora Apelado, pela seguradora Apelante.
13. Considerando-se que o acidente ocorreu em 09 de dezembro de 2001, a lei aplicável ao presente caso é a vigente na data do sinistro, ou seja a Lei 6.194/74, não havendo como aplicar as disposições das Leis 11.482/2007 e 11.945/2009, haja vista que entraram em vigor após a ocorrência do acidente ocorrido e, portanto, somente podem regular os fatos posteriores à sua vigência, em razão da regra do “tempus regit actum” (Precedentes do TJSP e TJPR).
14. O art. 3º, “c”, da Lei 6.194/74, vigente à época do fato, estabelecia que, no caso de despesas de assistência médica e suplementares devidamente comprovadas, a indenização decorrente do seguro DPVAT seria de até 08 (oito) vezes o valor do salário mínimo vigente.
15. Não há óbice à fixação da indenização em salários mínimos, pois, nos casos de seguro obrigatório DPVAT, o critério para fixação do valor da indenização em salários mínimos serve, tão somente, para quantificar o valor devido, razão pela qual é perfeitamente possível a referida vinculação, não ferindo, deste modo, o art. 7º, IV, da Constituição Federal. (Precedentes do TJPI)
16. A jurisprudência tem decidido, de forma maciça, que a elaboração de regulamentações securitárias pelo Conselho Nacional de Seguros Privados não têm o condão de revogar ou tornar ineficaz o disposto em lei federal.
17. Como é cediço, o referido Conselho tem competência para a regulamentação do comando legal, mas as normas expedidas no exercício desse poder regulamentar, não podem, em nenhuma hipótese, contrariar a lei, porquanto esta é hierarquicamente superior a qualquer resolução ou deliberação advinda do CNSP.
18. Isto posto, com relação ao reembolso das despesas médicas, verifico que se mostra correta a decisão de primeiro grau em atender a pretensão do Autor, ora Apelado, condenando a Bradesco Seguros S/A a ressarci-lo do montante gasto, até o limite estabelecido pela Lei 6.194/74.
19. Nas ações em que se pretende o complemento da indenização decorrente do seguro DPVAT, por se tratar se um ilícito contratual, os juros de mora devem incidir a partir da citação.
20. A correção monetária, no entanto, no caso de indenização de seguro DPVAT, deve “ser atualizada monetariamente a partir da data em que ocorrera o fato gerador do direito ao recebimento da indenização securitária advinda de acidente de trânsito, ou seja, a partir da data da ocorrência do sinistro (...), e não da data em que o apelado promovera a ação visando a complementação da indenização que lhe fora destinada ou da data do pagamento parcial. É que a obrigação se tornara exigível no momento em que se verificara seu fato gerador, devendo a partir de então ser atualizada de forma a ser preservada sua atualidade.” (TJDFT, Apelação Cível 20080111077868, 1ª Turma Cível, Rel. Des. Teófilo Caetano, Julgado em 13/06/2012).
21. Apelação Cível conhecida e improvida.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2010.0001.005845-7 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 18/07/2012 )Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em conhecer da Apelação, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade, para, rejeitando as preliminares suscitadas, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo in totum a sentença recorrida.
Data do Julgamento
:
18/07/2012
Classe/Assunto
:
Apelação Cível
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)
:
Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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