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Jurisprudência


TJPI 2011.0001.001482-3

Ementa
APELAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA. CONCURSO PÚBLICO. DELEGADO DA POLÍCIA CIVIL DO PIAUÍ. ANULAÇÃO DE QUESTÃO OBJETIVA. PODER JUDICIÁRIO. PARÂMETROS DA LEGALIDADE. ERRO MATERIAL PERCEPTÍVEL DE PLANO. QUSTÃO 44. GABARITO ALTERADO CONTRARIANDO LITERALIDADE DE TEXTO NORMATIVO DE DIPLOMA LEGAL EXIGIDO NA QUESTÃO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA E MOTIVAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. Não há comunhão dos interesses defendidos pela impetrante e os demais candidatos do concurso, pois o presente mandamus visa proteger apenas o direito individual do impetrante de ter revista a pontuação por ele obtida, enquanto que os demais candidatos classificados no concurso não tem mais que mera expectativa de direito. Na hipótese dos autos, contudo, além de não existir lei que imponha a citação dos demais candidatos participantes do certame, trata-se de direito próprio e individual, onde o provimento jurisdicional buscado restringe-se ao reconhecimento da ilegalidade da exclusão de determinado candidato das demais etapas do concurso público para o cargo público de Delegado de Polícia, não atingindo, assim, interesses de terceiros. Em outras palavras, a desnecessidade de citação dos demais participantes do concurso se revela em face da inexistência entre os participantes do certame de qualquer relação jurídica de direito material a ensejar a formação de litisconsórcio passivo necessário; além do que situação contrária implicaria até na falta de execução do direito pleiteado. Portanto, não há que se falar em litisconsórcio passivo necessário, pois não se vislumbra a necessidade de decisão uniforme para todas as partes, na forma do art. 47 do Código de Processo Civil, situação contrária causaria desaconselhável tumulto processual. O tema está consolidado pois, em regra, é vedado ao Poder Judiciário ingerência em atos de concursos públicos, cabendo-lhe apenas o controle de legalidade do ato administrativo, evidenciado no erro material perceptível de plano, quando o pedido está atrelado na anulação de questão de prova objetiva, a exemplo do caso em comento. A banca examinadora divulgou como gabarito oficial que o procedimento sumário, de acordo com o Código de Processo Penal, se aplica “quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima seja a pena superior a dois anos e inferior a quatro anos de detenção.” Entretanto, o Código de Processo Penal prevê no art. 394, § 1º, II que o procedimento será sumário “quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada seja inferior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade.” Portanto, como bem fundamentou o juiz sentenciante, “tendo em vista que a questão pleiteia entendimento conforme o Código de Processo Penal, vislumbra-se que o gabarito oficial, letra ‘B’, afronta o disposto na supracitada legislação, sendo então a questão passível de anulação”. O erro grosseiro se apresenta ainda mais patente porque consta na aludida questão (fl.s 39) resposta em conformidade com o Código de Processo Penal (letra “d). entretanto, a banca organizadora do concurso (Nucepe – Núcleo de Concursos e Promoção de Eventos) ao invés de manter o gabarito divulgado inicialmente, decidiu por “mudar de ‘d’ para ‘b’” o gabarito da questão 44, conforme “retificação do resultado dos recursos contra questões da prova escrita objetiva” (fl.s 48). É certo que o Administrador tem todo o direito de se valer do seu poder discricionário, desde que o mesmo não afronte comandos legais. Entretanto, a possibilidade de controle de legalidade dos atos administrativos pelo poder Judiciário não é matéria nova e já é amplamente reconhecida pela doutrina e jurisprudência. Os atos administrativos referentes aos concursos, em geral, são vinculados, tanto para os administrados quanto para a própria Administração e, de uma análise perfunctória dos fatos apresentados, resta inconteste que não foi observado pela parte recorrida a eficiência na condução do certame. Não se está aqui a tratar de análise mérito administrativo com interferência na discricionariedade da Administração, mas tão somente de verificar a existência de ilegalidades na condução e aplicação do concurso. Havendo flagrante ilegalidade resultante do erro grosseiro no gabarito da questão do concurso, outra alternativa não resta senão manter os termos da sentença hostilizada, o que prestigia, inclusive, o principio do acesso à Justiça, com previsão constitucional no art. 5º, XXXV. De fato, a hipótese trazida legitima a parte autora a buscar socorro no Poder Judiciário, não havendo qualquer ofensa ao princípio constitucional da independência e harmonia dos poderes (CRFB, art. 2º), pois, no Estado de Direito a Administração só pode agir sob a lei. No presente caso, a ilegalidade é evidente, pois a parte recorrida alterou o gabarito violando a literalidade de dispositivo do diploma legal exigido pela própria questão, não se tratando aqui de orientação diversa da utilizada pela banca, seja jurisprudencial, seja doutrinária, pois, repita-se, a questão exigia conhecimento sobre a aplicação do procedimento sumário em conformidade com o Código de Processo Penal, ou seja, é algo que não comporta interpretação, discussão ou divergência de entendimento. Portanto, não se está aqui ocupando o lugar destinado à banca examinadora, mas sim examinando a ilegalidade do ato administrativo que excluiu o recorrido das demais etapas do certame, em decorrência da retificação de gabarito que foi de encontro com dispositivo legal da matéria exigida. Há muito, a jurisprudência do e. STJ se fixou no sentido de que "na hipótese de erro material, considerado aquele perceptível primo ictu oculi, de plano, sem maiores indagações, pode o Poder Judiciário, excepcionalmente, declarar nula questão de prova objetiva de concurso público" (STJ, Recurso Especial nº 722.586-MG, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, Publicado em 03/10/2005). Acrescente-se que sequer há motivação no ato administrativo da recorrida que alterou o gabarito da questão, conforme se verifica no documento de fl.s 48. Consta na retificação do resultado apenas: “matéria conhecimentos específicos em Direito Processual Penal. Mudança de ‘d’ para ‘b’, questão 44”. No caso em comento, portanto, a mudança do gabarito se enquadra dentro do conceito de erro material perceptível de plano, pois a alteração fez constar como correta resposta que não correspondia com o texto do artigo do CPP que trata de procedimento sumário (art. 394, § 1º, II). Importante ressaltar que, com as contrarrazões, o recorrido provou que obteve êxito em todas as etapas posteriores: aptidão física, exame de saúde, exame psicológico, investigação social e curso de formação – (fl.s249/262), estando apto, portanto, a exercer as atribuições do cargo o qual foi aprovado mediante concurso público (CRFB, art. 37, II). (TJPI | Apelação / Reexame Necessário Nº 2011.0001.001482-3 | Relator: Des. Ricardo Gentil Eulálio Dantas | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 17/09/2014 )
Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, à unanimidade, em conhecer da presente Apelação e, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo incólume a sentença recorrida, nos termos do voto do Relator.

Data do Julgamento : 17/09/2014
Classe/Assunto : Apelação / Reexame Necessário
Órgão Julgador : 3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a) : Des. Ricardo Gentil Eulálio Dantas
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