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Jurisprudência


TJPI 2011.0001.006716-5

Ementa
AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA PROCESSAR E JULGAR LIDE RELATIVA À EXPEDIÇÃO DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DE ENSINO MÉDIO DE COLÉGIO PARTICULAR. ART. 17, III, DA LEI Nº 9.394/96. CUMPRIMENTO DE CARGA HORÁRIA MÍNIMA E APROVAÇÃO EM PROCESSO SELETIVO DE INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR PELO ALUNO. MÉRITO EDUCACIONAL. IRRELEVÂNCIA DA CARGA HORÁRIA MÍNIMA EXIGIDA LEGALMENTE EM 03 (TRÊS) ANOS COMPLETOS. ART. 35, CAPUT, DA LDB. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. MANUTENÇÃO DO EFEITO SUSPENSIVO CONCEDIDO. CONHECIMENTO. PROVIMENTO. 1. Para a fixação da competência, conforme jurisprudência do STJ, bem como deste E. TJPI, deve-se considerar a pessoa jurídica de direito público que delegou a atividade, sendo competente: i) a Justiça Federal, quando houver delegação por parte da União; e ii) a Justiça Estadual, quando houver delegação por parte do Estado ou do Município. 2. O art. 17, III, da Lei nº 9.394/96, dispõe que as instituições de ensino médio, criadas e mantidas pela iniciativa privada, estão compreendidas no sistema de ensino dos Estados, o que demonstra, claramente, que exercem função estadual delegada: “Art. 17. Os sistemas de ensino dos Estados e do Distrito Federal compreendem: I - as instituições de ensino mantidas, respectivamente, pelo Poder Público estadual e pelo Distrito Federal; II - as instituições de educação superior mantidas pelo Poder Público municipal; III - as instituições de ensino fundamental e médio criadas e mantidas pela iniciativa privada; IV - os órgãos de educação estaduais e do Distrito Federal, respectivamente.” 3. A competência para processar e julgar o feito relativo à expedição de certificado de conclusão do ensino médio de colégio particular é da Justiça Estadual, a teor do art. 17, III, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96. 4. Os arts. 24, I, c/c 35 da Lei nº 9.394/96 determinam que a educação básica no nível médio terá carga horária mínima anual de 800 (oitocentas) horas, por um período de, no mínimo, 3 (três) anos: “Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns: I - a carga horária mínima anual será de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver; [...].”. “Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, [...].”. 5. Na medida em que tais dispositivos implicam em restrições a um direito fundamental, devem ser submetidos à regra da proporcionalidade, de modo a “fazer com que nenhuma restrição a direitos fundamentais tome dimensões desproporcionais.”, como adverte VIRGÍLIO AFONSO DA SILVA (O proporcional e o razoável, em Revista dos Tribunais nº 728, 2002, p. 24, nº 1). 6. Ora, a partir desta perspectiva, diante do comando normativo insculpido no art. 24, inc. I, da Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), segundo o qual “a carga horária mínima anual será de oitocentas horas (…)”, não se pode ignorar que, ao traçar uma carga horária mínima anual, o objetivo da norma, à toda evidência, é o de exigir que o aluno, para a conclusão do ensino médio, dedique uma determinada quantidade de tempo, imprescindível ao desenvolvimento das habilidades necessárias à formação básica, característica do ensino médio, que deve ser proporcionada a todo cidadão. 7. Contudo, se a exigência da carga horária mínima de 2.400 (duas mil e quatrocentas) horas/aula se mostra razoável, diante dos objetivos constitucionais que persegue, o mesmo não se pode dizer quanto à imposição de que esta carga horária seja cumprida, inflexivelmente, ao longo de três anos letivos. 8. Isto porque esta imposição de que a carga horária total seja cumprida inflexivelmente ao longo de três anos não se afigura como uma medida que é apta a fomentar o objetivo constitucional de efetivação do dever do Estado para com educação. Isto porque o fator temporal relevante, no que diz com o sucesso das atividades pedagógicas, é o cumprimento de uma determinada carga horária, distribuída em períodos letivos que proporcionem um aprendizado paulatino, de acordo com as limitações cognoscitivas do aluno médio. Porém, exigir que essa carga horária mínima seja, inflexivelmente, desenvolvida ao longo de 3 (três) anos letivos integrais não constitui, em si mesma, uma medida apta à promoção de uma educação de qualidade. 9. Ao cumprir a carga horária mínima e obter aprovação em processo seletivo de Instituição de Ensino Superior, o aluno demonstra, de modo cabal, que desenvolveu tais habilidades e competências. Nessas circunstâncias, o aluno ostenta inegável mérito educacional, o que torna irrelevante que o cumprimento da carga horária exigida legalmente tenha se dado ao longo de dois anos e meio (2,5 anos), e não em três anos completos (3 anos). 10. Atento a esta realidade, em “uma leitura crítico-compreensiva” do art. 35 da LDB – pelo qual o ensino médio teria “duração mínima de três anos” – MOACI ALVES CARNEIRO destaca que “a possibilidade de uma organização variável do Ensino Médio, em termos de duração de anos, é pedagógica e socialmente adequada, considerando o imperativo de a escola [e todo o sistema educacional] respeitar as necessidades básicas de aprendizagem do aluno.” (MOACI ALVES CARNEIRO, LDB fácil – uma leitura crítico-compreensiva artigo a artigo, 2011, p. 284). 11. Este respeito às necessidades básicas de aprendizagem do aluno corresponde, em última análise, a uma postura de compatibilização entre os enunciados textuais dos arts. 24, inc. I, e 35, ambos da Lei nº 9.394/1996, com a Constituição Federal, de modo atribuí-los um sentido normativo que seja razoável e proporcional, sem indevida restrição ao direito fundamental de “acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um”, que está positivamente consagrado no inc. V, do mesmo art. 208, da CF/88. 12. É dever do Estado promover e incentivar a educação, bem como garantir o acesso aos níveis mais elevados do ensino, nos termos dos arts. 205 e 208, V, da CF: “Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”. “Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: [...]; V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; [...].”. 13. Ademais, e na mesma linha, faz-se necessário interpretar, teleologicamente, a regra do art. 35, da LDB, no sentido de conciliá-la com todo o sistema jurídico e com os fins da Constituição Federal, que garante o direito à educação e ao acesso a seus níveis mais elevados, segundo a capacidade intelectual de cada um. 14. A exigência de cursar o ensino médio por um período mínimo de 3 (três) anos não pode impedir que o aluno obtenha o Certificado pretendido, quando provado i) o cumprimento de quantidade de horas/aula bem superior ao mínimo exigido e ii) a capacidade intelectual para o ingresso no Ensino Superior, com a demonstração de que adquiriu os conhecimentos relacionados a todo o Ensino Médio. 15. Recurso conhecido e provido. (TJPI | Agravo de Instrumento Nº 2011.0001.006716-5 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 05/12/2012 )
Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, pelo conhecimento e provimento do Agravo de Instrumento para reformar a decisão agravada, mantendo, por conseguinte, o efeito suspensivo concedido às fls. 28/32, em todos os seus termos.

Data do Julgamento : 05/12/2012
Classe/Assunto : Agravo de Instrumento
Órgão Julgador : 3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a) : Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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