TJPI 2013.0001.001547-2
CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESPEJO CUMULADA COM COBRANÇA. INADIMPLEMENTO DE ALUGUÉIS POR PARTE DO MUNICÍPIO. APLICABILIDADE DO EFEITO MATERIAL DA REVELIA CONTRA A FEZENDA PÚBLICA. DIREITOS DISPONÍVEIS. POSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E NEGADO PROVIMENTO.
1. A Autora, ora Apelada, ingressou com Ação de Despejo por falta de pagamento c/c cobrança contra o Município de Caracol-PI, ao argumento de que é legítima proprietária de imóvel locado ao Município, para fins de funcionamento do Serviço Móvel de Atendimento de Urgência – SAMU, por um prazo de 05 (cinco) meses. Contudo, o Réu, ora Apelante, encontra-se inadimplente, desde março de 2011, com o pagamento do aluguel e com as contas de luz do imóvel.
2. Apesar de devidamente citado para responder a inicial, no prazo de 60 (sessenta) dias, o Réu, ora Apelante, não se manifestou nos autos, nem no prazo legal, nem intempestivamente.
3. O Juiz a quo julgou procedente a ação com fulcro no art. 330, II, do CPC, e nos art. 9º, II, 62, I, e 63, da Lei nº 8.245/1991.
4. Irresignado com a sentença a quo, o Apelante aduziu a impossibilidade de aplicação de pena de revelia contra a Fazenda Pública e requereu a nulidade da sentença de primeiro grau, e a condenação do INSS nas custas e honorários, na base de 20% (vinte por cento) sobre o valor dado à condenação.
5. No mérito, a questão que deve ser analisada com mais destaque refere-se à aplicabilidade ou não do efeito material da revelia quando a Fazenda resta revel. De plano, a conclusão a que se chega é no sentido de que, em regra, não se aplica a presunção que emerge do artigo 319 do CPC (“Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor”).
6. Tal constatação decorre do fato de que o efeito material da revelia, qual seja, a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, deve ser afastado quando o litígio versar sobre interesses indisponíveis, tais quais aqueles usualmente titularizados pelo Estado.
7. Realmente, os atos administrativos, a par de revelarem nítido viés de indisponibilidade, gozam, como regra, da presunção de legalidade e legitimidade, características que não podem ser afastadas em detrimento da Fazenda Pública apenas e tão-somente por não ter contestado o pedido deduzido na demanda, porquanto incide, na espécie, o teor normativo do artigo 320, II, do CPC.
8. No entanto, o posicionamento atual dos tribunais superiores orienta que os direitos defendidos pela Fazenda Pública em juízo não são sempre indisponíveis. Nos casos em que a Administração Pública litiga em torno de obrigações tipicamente privadas, não há que se falar em “direitos indisponíveis”, de modo a incidir a contenção legal dos efeitos da revelia prevista no art. 320, II, do CPC.
9. Na presente lide, têm-se um contrato de locação firmado entre o Apelante, Fazenda Pública, e Apelada, pessoa física, ao qual será possível aplicar o efeito material da revelia, ou seja, haverá presunção de que os fatos alegados pelo autor contra o Poder Público são verdadeiros.
10. Dessa forma, quando a lide versar sobre direitos disponíveis da Administração Pública, não há razão para se deixar de aplicar o artigo 319 do CPC, porquanto fica afastado o óbice a que alude o inciso II do artigo 320 do mesmo diploma legal.
11. De fato, se a controvérsia versar sobre atos privados ou mesmo contratos atípicos e a Fazenda Pública não apresentar, no prazo legal, a sua contestação, nada impede que se presuma verdadeira a narrativa contida na petição inicial, salvo, frise-se, se presente, no caso concreto, alguma das situações estabelecidas nos incisos I e III do mencionado artigo 320 do CPC.
12. Destaco que houve a comprovação do vínculo contratual com o Poder Público e, ainda, do seu descumprimento, na medida em que a Apelada teve seu nome inscrito em diversos órgãos de proteção de crédito, em virtude do não pagamento de débitos, como contas de luz, pelo Município locatário.
13. De fato, o contrato de locação foi celebrado entre as partes para viger entre 01/07/2011 e 31/12/2011, conforme comprovado pela juntada do instrumento original às fls. 08/10 pela Apelante. Ademais, as contas de energia não pagas juntadas aos autos informam a existência de dívidas relativas ao imóvel do meses de maio de 2011 a outubro de 2012.
14. Entretanto, apesar de o Município ter continuado na posse do imóvel após o término do prazo contratual (conforme se extrai do mandado de imissão na posse determinado pelo juízo a quo), os débitos relativos aos meses de maio e junho de 2011 não são de responsabilidade do Município Apelante, já que anteriores à celebração do contrato de locação. Assim, conforme bem delineado na sentença recorrida, a condenação se restringe ao “pagamento de todos os aluguéis atrasados e acessórios da locação – pagamentos de água, luz, IPTU e demais tributos municipais, conforme contrato -, até a data da entrega das chaves ou da imissão de da autora no imóvel locado”.
15. Verifico, assim, que não há como acatar a alegação de nulidade da sentença pela aplicação dos efeitos materiais da revelia, visto que a lide versa sobre direitos disponíveis, objeto de um contrato de locação celebrado pela Administração Pública com particular em nível de igualdade.
16. Recurso conhecido, ao qual foi negado provimento.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2013.0001.001547-2 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 28/01/2015 )
Ementa
CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESPEJO CUMULADA COM COBRANÇA. INADIMPLEMENTO DE ALUGUÉIS POR PARTE DO MUNICÍPIO. APLICABILIDADE DO EFEITO MATERIAL DA REVELIA CONTRA A FEZENDA PÚBLICA. DIREITOS DISPONÍVEIS. POSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E NEGADO PROVIMENTO.
1. A Autora, ora Apelada, ingressou com Ação de Despejo por falta de pagamento c/c cobrança contra o Município de Caracol-PI, ao argumento de que é legítima proprietária de imóvel locado ao Município, para fins de funcionamento do Serviço Móvel de Atendimento de Urgência – SAMU, por um prazo de 05 (cinco) meses. Contudo, o Réu, ora Apelante, encontra-se inadimplente, desde março de 2011, com o pagamento do aluguel e com as contas de luz do imóvel.
2. Apesar de devidamente citado para responder a inicial, no prazo de 60 (sessenta) dias, o Réu, ora Apelante, não se manifestou nos autos, nem no prazo legal, nem intempestivamente.
3. O Juiz a quo julgou procedente a ação com fulcro no art. 330, II, do CPC, e nos art. 9º, II, 62, I, e 63, da Lei nº 8.245/1991.
4. Irresignado com a sentença a quo, o Apelante aduziu a impossibilidade de aplicação de pena de revelia contra a Fazenda Pública e requereu a nulidade da sentença de primeiro grau, e a condenação do INSS nas custas e honorários, na base de 20% (vinte por cento) sobre o valor dado à condenação.
5. No mérito, a questão que deve ser analisada com mais destaque refere-se à aplicabilidade ou não do efeito material da revelia quando a Fazenda resta revel. De plano, a conclusão a que se chega é no sentido de que, em regra, não se aplica a presunção que emerge do artigo 319 do CPC (“Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor”).
6. Tal constatação decorre do fato de que o efeito material da revelia, qual seja, a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, deve ser afastado quando o litígio versar sobre interesses indisponíveis, tais quais aqueles usualmente titularizados pelo Estado.
7. Realmente, os atos administrativos, a par de revelarem nítido viés de indisponibilidade, gozam, como regra, da presunção de legalidade e legitimidade, características que não podem ser afastadas em detrimento da Fazenda Pública apenas e tão-somente por não ter contestado o pedido deduzido na demanda, porquanto incide, na espécie, o teor normativo do artigo 320, II, do CPC.
8. No entanto, o posicionamento atual dos tribunais superiores orienta que os direitos defendidos pela Fazenda Pública em juízo não são sempre indisponíveis. Nos casos em que a Administração Pública litiga em torno de obrigações tipicamente privadas, não há que se falar em “direitos indisponíveis”, de modo a incidir a contenção legal dos efeitos da revelia prevista no art. 320, II, do CPC.
9. Na presente lide, têm-se um contrato de locação firmado entre o Apelante, Fazenda Pública, e Apelada, pessoa física, ao qual será possível aplicar o efeito material da revelia, ou seja, haverá presunção de que os fatos alegados pelo autor contra o Poder Público são verdadeiros.
10. Dessa forma, quando a lide versar sobre direitos disponíveis da Administração Pública, não há razão para se deixar de aplicar o artigo 319 do CPC, porquanto fica afastado o óbice a que alude o inciso II do artigo 320 do mesmo diploma legal.
11. De fato, se a controvérsia versar sobre atos privados ou mesmo contratos atípicos e a Fazenda Pública não apresentar, no prazo legal, a sua contestação, nada impede que se presuma verdadeira a narrativa contida na petição inicial, salvo, frise-se, se presente, no caso concreto, alguma das situações estabelecidas nos incisos I e III do mencionado artigo 320 do CPC.
12. Destaco que houve a comprovação do vínculo contratual com o Poder Público e, ainda, do seu descumprimento, na medida em que a Apelada teve seu nome inscrito em diversos órgãos de proteção de crédito, em virtude do não pagamento de débitos, como contas de luz, pelo Município locatário.
13. De fato, o contrato de locação foi celebrado entre as partes para viger entre 01/07/2011 e 31/12/2011, conforme comprovado pela juntada do instrumento original às fls. 08/10 pela Apelante. Ademais, as contas de energia não pagas juntadas aos autos informam a existência de dívidas relativas ao imóvel do meses de maio de 2011 a outubro de 2012.
14. Entretanto, apesar de o Município ter continuado na posse do imóvel após o término do prazo contratual (conforme se extrai do mandado de imissão na posse determinado pelo juízo a quo), os débitos relativos aos meses de maio e junho de 2011 não são de responsabilidade do Município Apelante, já que anteriores à celebração do contrato de locação. Assim, conforme bem delineado na sentença recorrida, a condenação se restringe ao “pagamento de todos os aluguéis atrasados e acessórios da locação – pagamentos de água, luz, IPTU e demais tributos municipais, conforme contrato -, até a data da entrega das chaves ou da imissão de da autora no imóvel locado”.
15. Verifico, assim, que não há como acatar a alegação de nulidade da sentença pela aplicação dos efeitos materiais da revelia, visto que a lide versa sobre direitos disponíveis, objeto de um contrato de locação celebrado pela Administração Pública com particular em nível de igualdade.
16. Recurso conhecido, ao qual foi negado provimento.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2013.0001.001547-2 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 28/01/2015 )Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, à unanimidade, em conhecer da presente Apelação, e, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo incólume a sentença recorrida, nos termos do voto do Relator.
Data do Julgamento
:
28/01/2015
Classe/Assunto
:
Apelação Cível
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)
:
Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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