TJPI 2013.0001.003412-0
CIVIL. PR0CESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE CORREÇÃO DO VALOR DA CAUSA - CONHECIDA E PROVIDA. PRELIMINAR DE PRECLUSÃO DOS CÁLCULOS REALIZADOS PELA CONTADORIA JUDICIAL - REJEITADA. MÉRITO: O DIREITO DO CONSUMIDOR ADERENTE DE REVER AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. TEORIA DE BASE OBJETIVA DO CONTRATO.
A LEGALIDADE DA CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS REMUNERATÓRIOS NO VALOR FINANCIADO, DESDE QUE PREVISTO CONTRATUALMENTE. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TAXA DE JUROS EM PATAMAR SUPERIOR A 12% AO ANO, DESDE QUE LIMITADO À TAXA MÉDIA DO MERCADO - BACEN. A ILEGALIDADE DA COBRANÇA DA MULTA CONTRATUAL FIXADA DESDE QUE INCIDA UMA ÚNICA VEZ E LIMITADA À 2% DO VALOR DA PRESTAÇÃO. A REPETIÇÃO DE INDÉBITO SOMENTE TEM VEZ QUANDO ALÉM DA SIMPLES COBRANÇA, HOUVE O EFETIVO PAGAMENTO EM VALOR INDEVIDO. O DIREITO DO CONSUMIDOR EM PERMANECER NA POSSE DO BEM FINANCIADO EM PERMANECER NA POSSE DO BEM ATÉ O FINAL DO LITÍGIO E DE NÃO TER SEU NOME INSCRITO NOS ÓRGÃOS RESTRITIVOS DE CRÉDITO, ESPECIALMENTE QUANDO CONSIGNA EM JUÍZO O VALOR QUE ENTENDE SER DEVIDO. A QUITAÇÃO DO FINANCIAMENTO, EM RAZÃO DA CONSIGNAÇÃO, SOMENTE SE OPERA QUANDO O PLEITO DO CONSUMIDOR É ATENDIDO NA MESMA PROPORÇÃO DO VALOR CONSIGNADO. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E
PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O valor da causa, em deViandas revisionais, deve ser o valor controvertido no contrato oe financiamento impugnado, nos moldes da parte final do art. 202, II do CPC/2015, no qual se lê que: \"o valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: (...) II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida\".
2. A jurisprudência já era firme no sentido de que deve o juiz atuar de ofício na correção do valor da causa (STJ, 2ª Turma, AgRg no REsp 1.457.167/PE, rel. Min. Herman Benjamin, j. 26-08-2014, DJe 25-09-2014), \"até porque as custas calculadas tomando por base o valor da causa são revertidas ao Estado, sendo missão do juiz atuar, ainda que de ofício, para evitar que o Fisco seja lesado (STJ, AgRg no REsp 1.096.573/RJ, 2ª Turma, rel. Min. Castro Meira, j. 05-02-2009, DJe 02-03-2009)\" (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 458).
3. Ademais, esse entendimento foi consolidado no Novo Código de Processo Civil que, em seu art. 292, § 3º, autoriza o Magistrado a corrigir, \"de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes\".
4. Havendo pedido expresso do causídico para que as publicações ocorram em nome de determinado patrono, a intimação, via Diário de Justiça, em nome de outro advogado, invalida a intimação e afasta eventual preclusão sobre a matéria objeto do despacho/decisão.
5. O verbete sumular nº 297, do Superior Tribunal de Justiça, expressamente prevê que \"o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras\".
6. O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, em seu art. 6º, V, preceitua, como direito básico do consumidor: \"a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas\".
7. Assim, em sentido estrito, a revisão de cláusulas contratuais tem como pressuposto básico a ocorrência de fatos supervenientes que tornem as prestações devidas excessivamente onerosas.
8. Apesar de ser assegurada, a todos, a liberdade de contratar, deve-se sempre observar a função social do contrato (art. 421, CC/2002) e os princípios de probidade e da boa-fé (art. 422, CC/2002), que devem nortear tanto a celebração quanto a execução dos contratos, sendo que, por expressa previsão legal, as clásulas ambíguas ou contraditórias, em contrato de adesão, devem ser interpretadas de forma mais favorável ao aderente (art. 423, CC/2002) - ou, in casu, ao consumidor.
9. Essa mesma lógica se repete na primeira parte do art. 6º, V, do CDC, que garante aos consumidores, como um direito básico, a modificação das clásulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais: \"a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas\".
10. Nesses termos, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais consignou que \"após o advento da Constituição Federal/88 e do Código de Defesa do Consumidor, os contratos não mais se sujeitam à revisão somente em decorrência de fatos supervenientes, imprevisíveis a um dos contratantes (Teoria da Imprevisão), mas também em razão da necessidade de submissão às diretrizes constitucionais de proteção ao consumidor\" (TJ-MG - AC: 10231120408647001 MG, Relator: José de Carvalho Barbosa, Data de Julgamento: 30/01/2014, Câmaras Cíveis / 13ª C MARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/02/2014).
11. Nesse teor, a simples alegação de ofensa ao Código de Defesa do Consumidor face à exigência de encargos excessivos e abusivos basta para o processamento da ação, sendo que \"a prova da abusividade ou onerosidade excessiva pode ocorrer durante a instrução do feito, não sendo exigível como condição \"sine qua non\", para a propositura da ação, a sua apresentação junto com a inicial\" (TJ-MG - AC: 10231120408647001 MG, Relator: José de Carvalho Barbosa, Data de Julgamento: 30/01/2014, Câmaras Cíveis / 13ª C MARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/02/2014).
12. Seguindo essa lógica, o Superior Tribunal de Justiça cuidou de distinguir a teoria da imprevisão, que justifica a revisão contratual em sentido estrito, da teoria da base objetiva do contrato, que possibilita a revisão contratual em sentido amplo, asseverendo que o marco distintivo entre essas duas reside, justamente, na prescindibilidade, ou não, da ocorrência de fatos novos para que haja a revisão. Precedentes do STJ.
13. No âmbito da atividade bancária, os juros correspondem ao preço que o cliente paga, a título de contraprestação, pelos serviços financeiros utilizados. Isso porque o capital/crédito é a principal matéria-prima da atividade bancária e o preço a ser pago, pelos clientes, em razão da sua utilização, se consubstanciam nos juros.
14. Ocorre que, em respeito às diretrizes constitucionais de proteção ao consumidor, devem as instituições financeiras, de uma maneira geral, ao disponibilizarem seus produtos, agir no mercado de forma responsável, uma vez que, \"a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social\" (art. 170 da CRFB/88).
15. Ademais, é dever do Estado, como agente normativo e regulador da atividade econômica, reprimir \"o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros\" (art. 173, § 4º, da CRFB/88).
16. Isso porque o eventual superendividamento do povo brasileiro acaba por macular os objetivos principais da República Federativa do Brasil, especialmente no tocante à construção de uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, da CRFB/88), à garantia do desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CRFB/88) e à erredicação da pobreza e da marginalização, bem como à redução das desigualdades sociais e regionais (art. 3º, III, da CRFB/88).
17. Assim, quando da aquisição do crédito, deve o financiado, que é consumidor, ser orientado e informado adequadamente, até porque a transparência é, segundo o Código de Defesa do Consumidor, princípio regente das relações de consumo, tal como previsto no art. 4º, caput, art. 6º, III, e art. 46 do CDC.
18. Daí porque o Superior Tribunal de Justiça fixou a tese de que \"é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada — artigo 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto\" (Tema de Julgados Repetitivos nº 27 - STJ).
19. Ressalva-se, contudo, que não se aplica, aos financiamento bancários, as disposições do Decreto nº 22.626/1933 nem se considera abusivadade, apta a ensejar a revisão contratual, o simples fato de se cobrar juros superiores a 12% ao ano ou de haver a capitalização de juros (juros compostos), conforme prevê as Súmulas nº 596 do STF e nº 541 do STJ e precedentes do E. TJPI: Apelação Cível Nº 2011.0001.002782-9 | Relator: Des. Haroldo Oliveira Rehem | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 25/01/2017; Apelação Cível Nº 2012.0001.005414-0 | Relator: Des. Fernando Carvalho Mendes | 1ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 22/03/2016; Apelação Cível Nº 2011.0001.003038-5 | Relator: Des. Brandão de Carvalho | 2ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 04/10/2016; Apelação Cível Nº 2015.0001.009134-3 | Relator: Des. Fernando Lopes e Silva Neto | 4ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 19/07/2016.
20. Assim, conclui-se que a verificação da abusividade, ou não, dos juros remuneratórios superiores a 12% ao ano passa pela análise dos seguintes requisitos: a um, ter sido o contrato celebrado após a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, cuja entrada em vigor se deu em 31.03.2000; a dois, haver expressa previsão contratual sobre a taxa de juros aplicada; e, a três, não ser a taxa de juros superior à praticada pela média do mercado.
21. Quanto à comissão de permanência, o Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento, no verbete sumular nº 472, de que é possível e legal sua cobrança \"durante o período da inadimplência, à taxa média de juros do mercado, limitada ao percentual previsto no contrato, e desde que não cumulada com outros encargos moratórios\". Nesse sentido, são precedentes do E. TJPI: Apelação Cível Nº 2013.0001.002354-7 | Relator: Des. José Ribamar Oliveira | 2ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 15/12/2016; Apelação Cível Nº 2014.0001.000468-5 | Relator: Des. Fernando Lopes e Silva Neto | 4ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 29/11/2016; Apelação Cível Nº 2014.0001.000320-6 | Relator: Des. Ricardo Gentil Eulálio Dantas | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 09/03/2016; Apelação Cível Nº 2013.0001.006843-9 | Relator: Des. Haroldo Oliveira Rehem | 1ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 21/07/2015.
22. De mais a mais, o Código de Defesa do Consumidor, com alteração promovida pela Lei nº 9.298/1996, passou a prever que é legítima a cobrança de multa de mora no patamar de até 2% do valor da prestação, como se lê no art. 52, § 1º do CDC: As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação.
23. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, editou a súmula nº 285 para reforçar essa previsão legal no tocante aos contratos bancários: \"Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do Consumidor incide a multa moratória nele prevista\". E, nesse sentido, são precedentes do E. TJPI: Apelação Cível Nº 2013.0001.002354-7 | Relator: Des. José Ribamar Oliveira | 2ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 15/12/2016; Apelação Cível Nº 2013.0001.008768-9 | Relator: Des. Raimundo Eufrásio Alves Filho | 1ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 27/09/2016; Apelação Cível Nº 2012.0001.005892-2 | Relator: Des. Ricardo Gentil Eulálio Dantas | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 02/12/2015.
24. Conforme prevê o art. 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, quando ele for: \"cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável\".
25. O direito de se consignar em juízo as parcelas controvertidos no montante em que entenda ser devido tem fulcro nos arts. 335 e ss. do CC/02 e nos arts. 539 e ss. do CPC/15. Todavia, sendo esse encontrado outro valor para esse montante, haverá uma diferença a ser paga e sobre ela deverá incidir correção monetária e juros de mora, nos termos do art. 540 do CPC/2015 e art. 337 do CC/2002.
26. A ação revisional c/c ação consignatória enseja “ampla discussão quanto ao débito e seu valor, bem como outras questões que eventualmente forem colocadas à apreciação\" (STJ, EDcl no REsp 11140/RN, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15/12/1992, DJ 08/03/1993, p. 3119), e não uma imposição ao credor do valor consignado pela parte devedora.
27. Assim, a consignação das parcelas incontroversas é suficiente para afastar a mora debendi, de modo a garantir a posse do bem em poder do devedor, até julgamento final da demanda. (Precedentes TJPI).
28. Sendo uma das partes sucumbente de forma mínima do pedido, deve a outra responder pela integralidade das despesas e das custas processuais (art. 86, parágrafo único do CPC/15).
29. Apelação Cível conhecida e parcialmente provida.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2013.0001.003412-0 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 15/03/2017 )
Ementa
CIVIL. PR0CESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE CORREÇÃO DO VALOR DA CAUSA - CONHECIDA E PROVIDA. PRELIMINAR DE PRECLUSÃO DOS CÁLCULOS REALIZADOS PELA CONTADORIA JUDICIAL - REJEITADA. MÉRITO: O DIREITO DO CONSUMIDOR ADERENTE DE REVER AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. TEORIA DE BASE OBJETIVA DO CONTRATO.
A LEGALIDADE DA CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS REMUNERATÓRIOS NO VALOR FINANCIADO, DESDE QUE PREVISTO CONTRATUALMENTE. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TAXA DE JUROS EM PATAMAR SUPERIOR A 12% AO ANO, DESDE QUE LIMITADO À TAXA MÉDIA DO MERCADO - BACEN. A ILEGALIDADE DA COBRANÇA DA MULTA CONTRATUAL FIXADA DESDE QUE INCIDA UMA ÚNICA VEZ E LIMITADA À 2% DO VALOR DA PRESTAÇÃO. A REPETIÇÃO DE INDÉBITO SOMENTE TEM VEZ QUANDO ALÉM DA SIMPLES COBRANÇA, HOUVE O EFETIVO PAGAMENTO EM VALOR INDEVIDO. O DIREITO DO CONSUMIDOR EM PERMANECER NA POSSE DO BEM FINANCIADO EM PERMANECER NA POSSE DO BEM ATÉ O FINAL DO LITÍGIO E DE NÃO TER SEU NOME INSCRITO NOS ÓRGÃOS RESTRITIVOS DE CRÉDITO, ESPECIALMENTE QUANDO CONSIGNA EM JUÍZO O VALOR QUE ENTENDE SER DEVIDO. A QUITAÇÃO DO FINANCIAMENTO, EM RAZÃO DA CONSIGNAÇÃO, SOMENTE SE OPERA QUANDO O PLEITO DO CONSUMIDOR É ATENDIDO NA MESMA PROPORÇÃO DO VALOR CONSIGNADO. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E
PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O valor da causa, em deViandas revisionais, deve ser o valor controvertido no contrato oe financiamento impugnado, nos moldes da parte final do art. 202, II do CPC/2015, no qual se lê que: \"o valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: (...) II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida\".
2. A jurisprudência já era firme no sentido de que deve o juiz atuar de ofício na correção do valor da causa (STJ, 2ª Turma, AgRg no REsp 1.457.167/PE, rel. Min. Herman Benjamin, j. 26-08-2014, DJe 25-09-2014), \"até porque as custas calculadas tomando por base o valor da causa são revertidas ao Estado, sendo missão do juiz atuar, ainda que de ofício, para evitar que o Fisco seja lesado (STJ, AgRg no REsp 1.096.573/RJ, 2ª Turma, rel. Min. Castro Meira, j. 05-02-2009, DJe 02-03-2009)\" (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 458).
3. Ademais, esse entendimento foi consolidado no Novo Código de Processo Civil que, em seu art. 292, § 3º, autoriza o Magistrado a corrigir, \"de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes\".
4. Havendo pedido expresso do causídico para que as publicações ocorram em nome de determinado patrono, a intimação, via Diário de Justiça, em nome de outro advogado, invalida a intimação e afasta eventual preclusão sobre a matéria objeto do despacho/decisão.
5. O verbete sumular nº 297, do Superior Tribunal de Justiça, expressamente prevê que \"o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras\".
6. O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, em seu art. 6º, V, preceitua, como direito básico do consumidor: \"a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas\".
7. Assim, em sentido estrito, a revisão de cláusulas contratuais tem como pressuposto básico a ocorrência de fatos supervenientes que tornem as prestações devidas excessivamente onerosas.
8. Apesar de ser assegurada, a todos, a liberdade de contratar, deve-se sempre observar a função social do contrato (art. 421, CC/2002) e os princípios de probidade e da boa-fé (art. 422, CC/2002), que devem nortear tanto a celebração quanto a execução dos contratos, sendo que, por expressa previsão legal, as clásulas ambíguas ou contraditórias, em contrato de adesão, devem ser interpretadas de forma mais favorável ao aderente (art. 423, CC/2002) - ou, in casu, ao consumidor.
9. Essa mesma lógica se repete na primeira parte do art. 6º, V, do CDC, que garante aos consumidores, como um direito básico, a modificação das clásulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais: \"a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas\".
10. Nesses termos, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais consignou que \"após o advento da Constituição Federal/88 e do Código de Defesa do Consumidor, os contratos não mais se sujeitam à revisão somente em decorrência de fatos supervenientes, imprevisíveis a um dos contratantes (Teoria da Imprevisão), mas também em razão da necessidade de submissão às diretrizes constitucionais de proteção ao consumidor\" (TJ-MG - AC: 10231120408647001 MG, Relator: José de Carvalho Barbosa, Data de Julgamento: 30/01/2014, Câmaras Cíveis / 13ª C MARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/02/2014).
11. Nesse teor, a simples alegação de ofensa ao Código de Defesa do Consumidor face à exigência de encargos excessivos e abusivos basta para o processamento da ação, sendo que \"a prova da abusividade ou onerosidade excessiva pode ocorrer durante a instrução do feito, não sendo exigível como condição \"sine qua non\", para a propositura da ação, a sua apresentação junto com a inicial\" (TJ-MG - AC: 10231120408647001 MG, Relator: José de Carvalho Barbosa, Data de Julgamento: 30/01/2014, Câmaras Cíveis / 13ª C MARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/02/2014).
12. Seguindo essa lógica, o Superior Tribunal de Justiça cuidou de distinguir a teoria da imprevisão, que justifica a revisão contratual em sentido estrito, da teoria da base objetiva do contrato, que possibilita a revisão contratual em sentido amplo, asseverendo que o marco distintivo entre essas duas reside, justamente, na prescindibilidade, ou não, da ocorrência de fatos novos para que haja a revisão. Precedentes do STJ.
13. No âmbito da atividade bancária, os juros correspondem ao preço que o cliente paga, a título de contraprestação, pelos serviços financeiros utilizados. Isso porque o capital/crédito é a principal matéria-prima da atividade bancária e o preço a ser pago, pelos clientes, em razão da sua utilização, se consubstanciam nos juros.
14. Ocorre que, em respeito às diretrizes constitucionais de proteção ao consumidor, devem as instituições financeiras, de uma maneira geral, ao disponibilizarem seus produtos, agir no mercado de forma responsável, uma vez que, \"a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social\" (art. 170 da CRFB/88).
15. Ademais, é dever do Estado, como agente normativo e regulador da atividade econômica, reprimir \"o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros\" (art. 173, § 4º, da CRFB/88).
16. Isso porque o eventual superendividamento do povo brasileiro acaba por macular os objetivos principais da República Federativa do Brasil, especialmente no tocante à construção de uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, da CRFB/88), à garantia do desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CRFB/88) e à erredicação da pobreza e da marginalização, bem como à redução das desigualdades sociais e regionais (art. 3º, III, da CRFB/88).
17. Assim, quando da aquisição do crédito, deve o financiado, que é consumidor, ser orientado e informado adequadamente, até porque a transparência é, segundo o Código de Defesa do Consumidor, princípio regente das relações de consumo, tal como previsto no art. 4º, caput, art. 6º, III, e art. 46 do CDC.
18. Daí porque o Superior Tribunal de Justiça fixou a tese de que \"é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada — artigo 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto\" (Tema de Julgados Repetitivos nº 27 - STJ).
19. Ressalva-se, contudo, que não se aplica, aos financiamento bancários, as disposições do Decreto nº 22.626/1933 nem se considera abusivadade, apta a ensejar a revisão contratual, o simples fato de se cobrar juros superiores a 12% ao ano ou de haver a capitalização de juros (juros compostos), conforme prevê as Súmulas nº 596 do STF e nº 541 do STJ e precedentes do E. TJPI: Apelação Cível Nº 2011.0001.002782-9 | Relator: Des. Haroldo Oliveira Rehem | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 25/01/2017; Apelação Cível Nº 2012.0001.005414-0 | Relator: Des. Fernando Carvalho Mendes | 1ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 22/03/2016; Apelação Cível Nº 2011.0001.003038-5 | Relator: Des. Brandão de Carvalho | 2ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 04/10/2016; Apelação Cível Nº 2015.0001.009134-3 | Relator: Des. Fernando Lopes e Silva Neto | 4ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 19/07/2016.
20. Assim, conclui-se que a verificação da abusividade, ou não, dos juros remuneratórios superiores a 12% ao ano passa pela análise dos seguintes requisitos: a um, ter sido o contrato celebrado após a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, cuja entrada em vigor se deu em 31.03.2000; a dois, haver expressa previsão contratual sobre a taxa de juros aplicada; e, a três, não ser a taxa de juros superior à praticada pela média do mercado.
21. Quanto à comissão de permanência, o Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento, no verbete sumular nº 472, de que é possível e legal sua cobrança \"durante o período da inadimplência, à taxa média de juros do mercado, limitada ao percentual previsto no contrato, e desde que não cumulada com outros encargos moratórios\". Nesse sentido, são precedentes do E. TJPI: Apelação Cível Nº 2013.0001.002354-7 | Relator: Des. José Ribamar Oliveira | 2ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 15/12/2016; Apelação Cível Nº 2014.0001.000468-5 | Relator: Des. Fernando Lopes e Silva Neto | 4ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 29/11/2016; Apelação Cível Nº 2014.0001.000320-6 | Relator: Des. Ricardo Gentil Eulálio Dantas | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 09/03/2016; Apelação Cível Nº 2013.0001.006843-9 | Relator: Des. Haroldo Oliveira Rehem | 1ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 21/07/2015.
22. De mais a mais, o Código de Defesa do Consumidor, com alteração promovida pela Lei nº 9.298/1996, passou a prever que é legítima a cobrança de multa de mora no patamar de até 2% do valor da prestação, como se lê no art. 52, § 1º do CDC: As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação.
23. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, editou a súmula nº 285 para reforçar essa previsão legal no tocante aos contratos bancários: \"Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do Consumidor incide a multa moratória nele prevista\". E, nesse sentido, são precedentes do E. TJPI: Apelação Cível Nº 2013.0001.002354-7 | Relator: Des. José Ribamar Oliveira | 2ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 15/12/2016; Apelação Cível Nº 2013.0001.008768-9 | Relator: Des. Raimundo Eufrásio Alves Filho | 1ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 27/09/2016; Apelação Cível Nº 2012.0001.005892-2 | Relator: Des. Ricardo Gentil Eulálio Dantas | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 02/12/2015.
24. Conforme prevê o art. 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, quando ele for: \"cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável\".
25. O direito de se consignar em juízo as parcelas controvertidos no montante em que entenda ser devido tem fulcro nos arts. 335 e ss. do CC/02 e nos arts. 539 e ss. do CPC/15. Todavia, sendo esse encontrado outro valor para esse montante, haverá uma diferença a ser paga e sobre ela deverá incidir correção monetária e juros de mora, nos termos do art. 540 do CPC/2015 e art. 337 do CC/2002.
26. A ação revisional c/c ação consignatória enseja “ampla discussão quanto ao débito e seu valor, bem como outras questões que eventualmente forem colocadas à apreciação\" (STJ, EDcl no REsp 11140/RN, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15/12/1992, DJ 08/03/1993, p. 3119), e não uma imposição ao credor do valor consignado pela parte devedora.
27. Assim, a consignação das parcelas incontroversas é suficiente para afastar a mora debendi, de modo a garantir a posse do bem em poder do devedor, até julgamento final da demanda. (Precedentes TJPI).
28. Sendo uma das partes sucumbente de forma mínima do pedido, deve a outra responder pela integralidade das despesas e das custas processuais (art. 86, parágrafo único do CPC/15).
29. Apelação Cível conhecida e parcialmente provida.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2013.0001.003412-0 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 15/03/2017 )Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, à unanimidade, em conhecer da presente Apelação, e, afastando a prejudicial de preclusão, dar-lhe provimento, para: a) declarar a legalidade da cobrança, pelo Banco Apelante, da taxa de juros contratualmente fixada no patamar de 17,5845800% ao ano; b) condenar a Apelada ao pagamento da diferença das parcelas do financiamento consignadas a menor, sobre as quais devem incidir correção monetária e juros de mora; c) declarar a legalidade da cobrança da multa moratória no limite de 2%, nas parcelas pagas em atraso pela Apelada; e, ao lado disso, excluir do contrato impugnado a cobrança de comissão de permanência e condenar o Banco Apelante a pagar, em dobro, à Apelada o valor de R$ 23,31 (vinte e três reais e trinta e um centavos), acrescido de correção monetária e juros; corrigindo, ademais, o valor da causa, antes arbitrado em R$ 490,98 (quatrocentos e noventa reais e noventa e oito centavos), para R$ 8.872,18 (oito mil e oitocentos e setenta e dois reais e dezoito centavos), determinando o complemento das custas iniciais (doc. de fls. 60) e do preparo recursal (doc. de fls. 183) pela Apelada, vencida no julgamento deste recurso, com fulcro na parte final do art. 292, § 3º, do CPC/2015; e condenar a Apelada no ressarcimento das custas processuais pagas pelo Banco Apelante e pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 10% sobre o valor ainda devido ao Banco Apelante; asseverando, por fim, que a Autora, ora Apelada, tem direito de, até o final da execução, permanecer na posse do bem e de não ter seu nome inscrito em órgãos restritivos de crédito, nos termos do voto do Relator.
Data do Julgamento
:
15/03/2017
Classe/Assunto
:
Apelação Cível
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)
:
Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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