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Jurisprudência


TJPI 2014.0001.001890-8

Ementa
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL – APELAÇÃO CRIMINAL – ESTUPRO DE VULNERÁVEL (ART. 217-A, §1º, DO CP) – CONDENAÇÃO – RECURSO EXCLUSIVAMENTE MINISTERIAL – NULIDADES – AUSÊNCIA DE RESPOSTA ESCRITA E DE NOMEAÇÃO DE DEFENSOR PARA O ATO – VIOLAÇÃO AOS ARTS. 396 E 396-A DO CPP – AUSÊNCIA DE DEFESA – NULIDADE ABSOLUTA – PREJUÍZO DEMONSTRADO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO – DECISÃO UNÂNIME. 1 Caso em que o réu/recorrido não ofertou defesa escrita (art. 396, caput, do CPP) e, tampouco, foi-lhe nomeado um defensor para o ato (art. 396-A, §2º, do CPP), também deixando escoar “in albis” o prazo para apresentar rol de testemunhas. Designada audiência e iniciada a instrução, foi encerrada tão comente com a colheita do seu interrogatório, sem constar da respectiva ata a formulação de perguntas pela defesa constituída. Após isso, sobreveio a primeira manifestação técnica, de forma oral, consignada na ata como “Defesa Prévia”, a qual, implicitamente, anuiu com a acusação, ao utilizar-se dos termos: “o réu admitiu a prática do crime”, “não restando nenhum fato incontroverso sobre a prática desse crime” e “nenhuma prova há a apresentar”. Embora restrita ao pleito de “em caso de condenação, a aplicação de pena em seus graus mínimos”, não veiculou qualquer fundamento fático-jurídico contrário à condenação e, tampouco, para fins de mitigação da pena, assim como nas alegações finais orais, limitadas ao pleito de “dosimetria de pena favorável ao acusado onde deverão ser considerados o (sic) atenuante da confissão espontânea”. Também não solicitou diligências, não interpôs recurso e, em contrarrazões, limitou-se ao pleito de progressão de regime; 2 A apresentação da resposta escrita, que antes da Lei 11.719/08 era tida como mera faculdade da defesa, atualmente revela-se obrigatória e imprescindível, por imperativo legal. Após o advento da referida lei, o recebimento da denúncia passou a tratar-se de ato complexo, a ser exercido em duas fases distintas. Recebida a denúncia e determinada a citação do acusado para apresentação de resposta defensiva (art. 396 do CPP), deve, posteriormente, manifestar-se acerca da manutenção da decisão, em atenção às teses defensivas levantadas (art. 397 do CPP). Assim, somente quando não verificar ser caso de absolvição sumária, designará a audiência de instrução. Via reversa, a ausência da prévia análise das teses defensivas gera nulidade, por evidente o prejuízo suportado pela defesa. Precedentes do STJ; 3 Consoante jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a inexistência de pedido expresso de absolvição, limitado à mera aplicação da pena no mínimo legal, não acarreta a automática anulação do processo (HC 109189, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, 1ªT., j.22/04/2014; RHC 107197, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, 1ªT., j.11/03/2014). Por outro lado, tais precedentes enaltecem a estratégia de defesa escolhida pelo patrono, de forma a resguardar a credibilidade da pretensão de penalidade menos rigorosa, sobretudo, diante de um conjunto probatório robusto e indene de dúvidas acerca da condenação. Assim, a postulação no vazio da absolvição realmente pode configurar temeridade tática, diante da confissão judicial corroborada por outros elementos de prova. Os julgados partem da premissa de que o réu foi devidamente assistido pela defesa técnica, tanto que citam, como razão de decidir, inclusive na ementa, outro precedente da Corte Excelsa, no qual a defesa técnica efetivamente fundamenta o seu pedido de aplicação da pena menos severa, ao apresentar, como base de sustentação, as qualidades pessoais do acusado extraída de oitiva testemunhal (RE 205260, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, 1ªT., j.23/11/2004); 4 O caso dos autos, por outro lado, revela que o pedido de dosimetria menos severa se esvazia diante da inexistência de oitiva judicial. Aliás, a defesa sequer apresentou o rol de testemunhas. Portanto, não haveria base de sustentação para o pedido. Mesmo a instrução limitou-se à colheita do interrogatório do réu, tendo a postura contemplativa da defesa se estendido a este ato, já que não consta da ata da audiência a formulação de perguntas. Somente após o réu ter confessado o delito em juízo é que, finalmente, ocorreu a primeira manifestação da defesa técnica nos autos. O prejuízo já era manifesto. A estratégia não poderia ser outra. O pedido de absolvição configuraria temeridade tática; 5 Ainda que se mantivesse a condenação, com base na existência de confissão judicial ratificada por elemento indiciário, em completa negligência à patente ausência de defesa experimentada na espécie, evidenciada pela conjuntura fático-processual, estar-se-ia, na verdade, escamoteando do processo penal a sua visão como instrumento de efetivação das garantias constitucionais, promovendo uma falsa legitimação a partir da indevida constituição, ao defraudar sua instrumentalidade constitucional; 6 Independentemente de ser (ou não) estratégia defensiva, ao Judiciário impõe-se o controle do efetivo exercício da ampla defesa, justamente o “plus” que a destaca (e vai além) do contraditório, limitado à garantia de participação. Dessa forma, diante da inexistência defesa efetiva, deve o julgador nomear-lhe defensor para o ato. (Eugênio Pacelli de Oliveira, in Curso de processo penal, 19ª ed., São Paulo: Atlas, 2015, p.45); 7 As circunstâncias do caso concreto, ademais, não indicam se tratar de estratégia da defesa técnica, visando ulterior declaração de nulidade. Com efeito, sequer foi por ela arguida, em momento algum do processo, sendo que as nulidades vêm sido ventiladas pela acusação. No mais, consta dos autos, inclusive ratificado na sentença, que o réu se encontra recolhido ao cárcere desde a data da prisão em flagrante, em 12/06/2011. Assim, considerando que as sentenças, objeto de nulidades, vem fixando a reprimenda em 08 (oito) anos, de consequência, estando preso há mais de 05 (cinco) anos, estaria em vias de cumprimento integral dessa pena. Eventual estratégia defensiva, nestes moldes, restaria inócua; 8 Conjuntura que indica patente falta de defesa, em evidente prejuízo suportado pelo acusado, vício de nulidade absoluta, inclusive cognoscível “ex officio”. Inteligência do art. 563 do CPP. Incidência da Súmula 523 do STF. Precedentes do STF e do STJ; 9 Recurso conhecido e provido, para reconhecer a nulidade absoluta, concedida de ofício em maior extensão, para alcançar o momento em que transcorreu “in albis” o prazo do réu preso para apresentar resposta defensiva e rol de testemunhas, bem como, para determinar a expedição de alvará de soltura em seu favor, salvo se estiver preso por outro motivo, sob o compromisso de comparecer a todos os atos processuais para os quais for intimado, dentre outras medidas cautelares passíveis de alteração pelo juízo singular. (TJPI | Apelação Criminal Nº 2014.0001.001890-8 | Relator: Des. Pedro de Alcântara Macêdo | 1ª Câmara Especializada Criminal | Data de Julgamento: 22/03/2017 )
Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 1ª Câmara Especializada Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, à unanimidade, em conhecer do recurso e dar-lhe provimento para reconhecer vício de nulidade absoluta, por violação ao princípio da ampla defesa, concedido de ofício em maior extensão, com contaminação dos atos posteriores, desde o momento do transcurso in albis do prazo para o réu preso apresentar resposta defensiva e rol de testemunhas, devendo o juízo de origem providenciar que ele seja pessoalmente intimado para, querendo, no prazo de 10 (dez) dias (art. 396, caput, do CPP), constituir novo advogado de sua confiança, com o fim de patrocinar a sua defesa, incluídos nesse prazo a oferta de resposta defensiva e apresentação de rol de testemunhas, sob pena de nomeação de defensor para o ato (art. 396-A, §2º, do CPP). Revogam a prisão em flagrante a ele imposta e, sob o compromisso de comparecer a todos os atos processuais para os quais for intimado, determino a expedição do competente alvará de soltura em seu favor, salvo se estiver preso por outro motivo, comunicando-se, ato contínuo, à autoridade coatora, para os fins de direito. Determinam, ainda, com fundamento no art. 319, I, IV e V, do Código de Processo Penal, c/c o art. 282 do mesmo diploma legal, que o recorrido compareça mensalmente ao juízo singular com o fim de informar e justificar suas atividades, ficando proibido de se ausentar da Comarca, salvo autorização expressa em contrário, até o término da instrução criminal, devendo, ainda, recolher-se à sua residência até às 20 (vinte) horas, inclusive aos sábados e domingos, advertindo-lhe que o descumprimento de quaisquer das medidas impostas poderá implicar na decretação de sua prisão pelo juízo de primeiro grau, caso não seja possível a imposição de outras medidas cautelares menos gravosa, todas passíveis de alteração pelo juízo singular a qualquer tempo. Intimem-se, inclusive o réu pessoalmente. Após o trânsito em julgado, devolvam os autos à origem, nos termos do voto do Relator e em dissonância com o parecer do Ministério Público Superior

Data do Julgamento : 22/03/2017
Classe/Assunto : Apelação Criminal
Órgão Julgador : 1ª Câmara Especializada Criminal
Relator(a) : Des. Pedro de Alcântara Macêdo
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