TJPI 2017.0001.000068-1
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE TUTELA CAUTELAR EM CARÁTER INCIDENTAL. INDEFERIMENTO DO PLEITO DE INTERNAÇÃO DA FILHA DA AGRAVANTE. DIAGNÓSTICO DE SÍNDROME DE DEPENDÊNCIA. COMPROVAÇÃO POR LAUDO MÉDICO. PRELIMINARES SUSCITADAS PELO AGRAVADO DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA ESTADUAL E DA COMPOSIÇÃO DO PÓLO PASSIVO; DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR E DE NÃO DEMONSTRAÇÃO DA NEGATIVA DO ESTADO E DE INADMISSIBILIDADE PELO DESCUMPRIMENTO DO ART. 1.018, DO CPC. REJEIÇÃO. MÉRITO. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. GARANTIAS FUNDAMENTAIS DE ACORDO COM A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. ART. 196, DA CF. NECESSIDADE DE INTERNAÇÃO PARA TRATAMENTO DE DEPENDENTE QUÍMICO E CARÊNCIA FINANCEIRA. INTERNAÇÃO PREFERENCIALMENTE NO SUS OU HOSPITAIS PÚBLICOS, ALTERNATIVAMENTE EM CLÍNICA PARTICULAR. ART. 24, DA LEI Nº 8.080/1990. PROVIMENTO DO RECURSO.
I- A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que quaisquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para suportar vertente judicial que vindique o acesso à medicação por pessoas desprovidas de recursos financeiros, pois, o Sistema Único de Saúde (SUS) é integrado e não simplesmente fracionado pelos aludidos entes políticos, consoante atesta os arts. 196 e 198, §1º, da CF, entendimento palmilhado pelo STF.
II- Em razão disso (solidariedade dos entes públicos), não há que se falar em incompetência absoluta do Estado do Piauí para tolerar a internação e atendimento psiquiátrico a dependente químico em unidade de saúde pública, consoante a plena aplicabilidade das Súmulas nºs. 02 e 06 do TJPI.
III- In casu, no que pertine que a Agravante não tenha demonstrado a negativa por parte da Agravada, em proceder com a internação da sua filha por dependência química, é cediço que não se pode exigir o esgotamento da instância administrativa para que surja o acesso à Justiça mediante o direito de ação, sob pena de se afrontar o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional, nos termo do art. 5º, XXXIV, XXXV, da CF, sendo esse o entendimento firmado pela jurisprudência pátria.
IV- Ademais, a internação compulsória da filha da Agravante em uma unidade pública de saúde, sem a citação do Estado do Piauí, fulminaria todo o procedimento de nulidade, razão pela qual necessária a presença do Agravado no polo passivo, cumprindo ressaltar que o Agravado se manifestou contrário a internação (fls. 39-42), demonstrando sua resistência ao pedido.
V- Noutro giro, frise-se que o ordenamento jurídico prescreve o dever de comunicação da interposição do AI ao juízo a quo, atribuindo-lhe, expressamente, a natureza de requisito de admissibilidade do recurso, conforme previsto no art. 1.018, do CPC, verificando-se, ainda, que a Lei processual exige que o Agravado argua e prove o descumprimento deste requisito.
VI- Induvidosamente, no caso em espeque, o Agravado não se desincumbira de comprovar, por certidão da Secretaria da Vara, que a Agravante, até a data de 23.01.2017, não tinha requerido a juntada da cópia da petição do AI, do comprovante de sua interposição e da relação dos documentos que instruíram o recurso, considerando-se que a interposição se deu em 22.12.2016.
VII- Analisando-se o mérito, observa-se que a decisão liminar enfrentada no presente AI determinou ao Agravado que procedesse a internação compulsória de LUANA ADRIELY ALMEIDA SILVA, preferencialmente, no Hospital do Mocambinho, ao constaatr que se trata de pessoa portadora de transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas, diagnosticado como Síndrome da dependência (CID- 10 F19.2), conforme documentos anexados aos autos.
VIII- Por conseguinte, resta legitimada a pretensão da Agravante pelo disposto no art. 196, da CF, e, por sua vez, a Lei nº. 10.216/01 que dispõe sobre proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, em seu art. 9°, trata da internação compulsória a ser determinada por via judicial.
IX- Nesse passo, diante do contexto probatório dos autos, fundamenta o deferimento da internação compulsória da paciente, em benefício de sua própria integridade física e moral, daqueles que com ela convivem, pois, sendo certo que a garantia da saúde, mediante adoção de medidas que atenuem ou impeçam risco de doença, ou seu agravamento, um direito de todos e dever do Estado, nos termos dos arts. 6° e 196, da CF, devida se torna a internação compulsória de LUANA ADRIELY ALMEIDA SILVA, como meio de salvaguardar sua incolumidade física e mental e, por conseguinte, concretizar, efetivamente, o constitucional Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
X- Em arremate, não merece vingar a vetusta tese da reserva do possível, argüida de forma genérica, lacônica e abstrata, desvencilhada da expressão, in concreto, da impossibilidade do adimplemento financeiro pela entidade pública, nos termos do entendimento sumulado deste Tribunal de Justiça Súmula 01, do TJPI
XI- Logo, não se mostra razoável a omissão do Poder Público em fornecer o tratamento imprescindível à manutenção da incolumidade psíquica/psicológica do jovem que sofre de doença severa, o que justifica o deferimento do pleito pelo Juiz a quo, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana, valor consagrado como um dos fundamentos da República.
XII- Recurso conhecido, em harmonia com o parecer do Ministério Público Superior, em mesa, e provido, confirmando os efeitos da decisão cautelar de fls.62/71.
XIII- Decisão por votação unânime.
(TJPI | Agravo de Instrumento Nº 2017.0001.000068-1 | Relator: Des. Raimundo Eufrásio Alves Filho | 1ª Câmara de Direito Público | Data de Julgamento: 19/04/2018 )
Ementa
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE TUTELA CAUTELAR EM CARÁTER INCIDENTAL. INDEFERIMENTO DO PLEITO DE INTERNAÇÃO DA FILHA DA AGRAVANTE. DIAGNÓSTICO DE SÍNDROME DE DEPENDÊNCIA. COMPROVAÇÃO POR LAUDO MÉDICO. PRELIMINARES SUSCITADAS PELO AGRAVADO DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA ESTADUAL E DA COMPOSIÇÃO DO PÓLO PASSIVO; DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR E DE NÃO DEMONSTRAÇÃO DA NEGATIVA DO ESTADO E DE INADMISSIBILIDADE PELO DESCUMPRIMENTO DO ART. 1.018, DO CPC. REJEIÇÃO. MÉRITO. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. GARANTIAS FUNDAMENTAIS DE ACORDO COM A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. ART. 196, DA CF. NECESSIDADE DE INTERNAÇÃO PARA TRATAMENTO DE DEPENDENTE QUÍMICO E CARÊNCIA FINANCEIRA. INTERNAÇÃO PREFERENCIALMENTE NO SUS OU HOSPITAIS PÚBLICOS, ALTERNATIVAMENTE EM CLÍNICA PARTICULAR. ART. 24, DA LEI Nº 8.080/1990. PROVIMENTO DO RECURSO.
I- A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que quaisquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para suportar vertente judicial que vindique o acesso à medicação por pessoas desprovidas de recursos financeiros, pois, o Sistema Único de Saúde (SUS) é integrado e não simplesmente fracionado pelos aludidos entes políticos, consoante atesta os arts. 196 e 198, §1º, da CF, entendimento palmilhado pelo STF.
II- Em razão disso (solidariedade dos entes públicos), não há que se falar em incompetência absoluta do Estado do Piauí para tolerar a internação e atendimento psiquiátrico a dependente químico em unidade de saúde pública, consoante a plena aplicabilidade das Súmulas nºs. 02 e 06 do TJPI.
III- In casu, no que pertine que a Agravante não tenha demonstrado a negativa por parte da Agravada, em proceder com a internação da sua filha por dependência química, é cediço que não se pode exigir o esgotamento da instância administrativa para que surja o acesso à Justiça mediante o direito de ação, sob pena de se afrontar o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional, nos termo do art. 5º, XXXIV, XXXV, da CF, sendo esse o entendimento firmado pela jurisprudência pátria.
IV- Ademais, a internação compulsória da filha da Agravante em uma unidade pública de saúde, sem a citação do Estado do Piauí, fulminaria todo o procedimento de nulidade, razão pela qual necessária a presença do Agravado no polo passivo, cumprindo ressaltar que o Agravado se manifestou contrário a internação (fls. 39-42), demonstrando sua resistência ao pedido.
V- Noutro giro, frise-se que o ordenamento jurídico prescreve o dever de comunicação da interposição do AI ao juízo a quo, atribuindo-lhe, expressamente, a natureza de requisito de admissibilidade do recurso, conforme previsto no art. 1.018, do CPC, verificando-se, ainda, que a Lei processual exige que o Agravado argua e prove o descumprimento deste requisito.
VI- Induvidosamente, no caso em espeque, o Agravado não se desincumbira de comprovar, por certidão da Secretaria da Vara, que a Agravante, até a data de 23.01.2017, não tinha requerido a juntada da cópia da petição do AI, do comprovante de sua interposição e da relação dos documentos que instruíram o recurso, considerando-se que a interposição se deu em 22.12.2016.
VII- Analisando-se o mérito, observa-se que a decisão liminar enfrentada no presente AI determinou ao Agravado que procedesse a internação compulsória de LUANA ADRIELY ALMEIDA SILVA, preferencialmente, no Hospital do Mocambinho, ao constaatr que se trata de pessoa portadora de transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas, diagnosticado como Síndrome da dependência (CID- 10 F19.2), conforme documentos anexados aos autos.
VIII- Por conseguinte, resta legitimada a pretensão da Agravante pelo disposto no art. 196, da CF, e, por sua vez, a Lei nº. 10.216/01 que dispõe sobre proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, em seu art. 9°, trata da internação compulsória a ser determinada por via judicial.
IX- Nesse passo, diante do contexto probatório dos autos, fundamenta o deferimento da internação compulsória da paciente, em benefício de sua própria integridade física e moral, daqueles que com ela convivem, pois, sendo certo que a garantia da saúde, mediante adoção de medidas que atenuem ou impeçam risco de doença, ou seu agravamento, um direito de todos e dever do Estado, nos termos dos arts. 6° e 196, da CF, devida se torna a internação compulsória de LUANA ADRIELY ALMEIDA SILVA, como meio de salvaguardar sua incolumidade física e mental e, por conseguinte, concretizar, efetivamente, o constitucional Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
X- Em arremate, não merece vingar a vetusta tese da reserva do possível, argüida de forma genérica, lacônica e abstrata, desvencilhada da expressão, in concreto, da impossibilidade do adimplemento financeiro pela entidade pública, nos termos do entendimento sumulado deste Tribunal de Justiça Súmula 01, do TJPI
XI- Logo, não se mostra razoável a omissão do Poder Público em fornecer o tratamento imprescindível à manutenção da incolumidade psíquica/psicológica do jovem que sofre de doença severa, o que justifica o deferimento do pleito pelo Juiz a quo, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana, valor consagrado como um dos fundamentos da República.
XII- Recurso conhecido, em harmonia com o parecer do Ministério Público Superior, em mesa, e provido, confirmando os efeitos da decisão cautelar de fls.62/71.
XIII- Decisão por votação unânime.
(TJPI | Agravo de Instrumento Nº 2017.0001.000068-1 | Relator: Des. Raimundo Eufrásio Alves Filho | 1ª Câmara de Direito Público | Data de Julgamento: 19/04/2018 )Decisão
Acordam os componentes da Egrégia 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, à unanimidade, EM CONHECER DO AGRAVO DE INSTRUMENTO, por atender aos requisitos legais de sua admissibilidade, em harmonia com o parecer do Ministério Público Superior, em mesa, e DERAM-LHE PROVIMENTO, CONFIRMANDO os EFEITOS da DECISÃO CAUTELAR de fls.62/71. Custas ex legis.
Data do Julgamento
:
19/04/2018
Classe/Assunto
:
Agravo de Instrumento
Órgão Julgador
:
1ª Câmara de Direito Público
Relator(a)
:
Des. Raimundo Eufrásio Alves Filho
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