TJRR 10050046381
CÂMARA ÚNICA
TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 001005004638-1
1º APELANTE: FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA
ADVOGADO: EDNALDO GOMES VIDAL
2º APELANTE: FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS
DEFENSORA PÚBLICA: TEREZINHA MUNIZ
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
PROMOTOR DE JUSTIÇA: ISAIAS MONTANARI JÚNIOR
RELATOR: DES. LUPERCINO NOGUEIRA
RELATÓRIO
FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA e FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS, inconformados com a decisão do MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal, que os condenou pela prática do delito previsto no art. 12, caput, c/c art. 18, inciso III, da Lei nº 6.368/76, interpuseram os presentes recursos de apelação.
O primeiro apelante, em suas razões recursais, às fls. 310/333, alega, preliminarmente, que:
a) houve cerceamento de defesa, pois não teve a oportunidade de se defender da imputação de associação, uma vez que foi denunciado apenas pelo delito previsto no art. 12, da lei nº 6.368/76;
b) as provas colhidas durante o inquérito policial não podem ser utilizadas para fundamentar a condenação, posto que imprestáveis e baseadas exclusivamente nos depoimentos dos policiais.
No mérito, alega que não há provas suficientes para a sua condenação.
Requer a reforma da sentença monocrática, para que seja absolvido ou, em caso de entendimento diverso, seja desclassificado o delito de tráfico, pelo qual foi condenado, para o de uso próprio.
O segundo apelante apresentou suas razões recursais, às fls. 358/373, alegando, em síntese, que as provas dos autos não foram devidamente valoradas, pois o juízo a quo levou em consideração apenas as provas apresentadas pela acusação, desconsiderando as testemunhas apresentadas pela defesa e que não há provas suficientes para fundamentar a condenação imposta ao apelante.
Ao final, requer:
a) os benefícios da Justiça Gratuita;
b) o recebimento e provimento da presente apelação para o fim de reformar a sentença recorrida, absolvendo-o da prática do delito pelo qual foi denunciado ou, em caso de entendimento diverso, para que seja reduzida a pena base que lhe foi aplicada para o mínimo legal.
Em contra-razões, às fls. 337/347 e 379//385, o douto representante do Ministério Público Estadual pugna pelo conhecimento dos recursos e por seus parciais provimentos, apenas para excluir a causa de aumento de pena prevista no art. 18, III, da Lei nº 6.368/76, mantendo-se a sentença nos seus demais termos.
Às fls. 389/394 e 398/408, a representante ministerial de 2º Grau manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento dos recursos, apenas para afastar a incidência da causa de aumento de pena prevista no artigo 18, III, da Lei nº 6.368/76 e alterar o regime de cumprimento de pena, alterando-o para o regime inicialmente fechado, em razão da “novatio legis in mellius”.
É o sucinto relatório.
Encaminhem-se à douta revisão.
Boa Vista (RR), 17 de julho de 2007.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
- Relator -
CÂMARA ÚNICA
TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 001005004638-1
1º APELANTE: FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA
ADVOGADO: EDNALDO GOMES VIDAL
2º APELANTE: FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS
DEFENSORA PÚBLICA: TEREZINHA MUNIZ
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
PROMOTOR DE JUSTIÇA: ISAIAS MONTANARI JÚNIOR
RELATOR: DES. LUPERCINO NOGUEIRA
VOTO
Defiro os benefícios da Justiça Gratuita para o 2º Apelante.
Recebo os recursos porque se acham presentes os seus pressupostos de admissibilidade.
Narra a denúncia, verbis:
“Segundo restou apurado, na manhã do dia 05.02.05, o denunciado Francisco das Chagas Santos Silva foi conduzido ao Pronto Socorro São Bento por ter sofrido um acidente de trânsito. Iniciados os procedimentos de praxe, os técnicos de enfermagem que o atenderam encontraram, no bolso de sua calça, a substância entorpecente acima descrita, acondicionada em um saco plástico verde. Suspeitando de sua natureza ilícita, os funcionários acionaram a Polícia, que efetuou a prisão em flagrante do primeiro denunciado.
Ato contínuo, em diligências realizadas para identificar quem havia fornecido a droga para o primeiro denunciado, uma equipe de policiais civis da Delegacia de Repressão a Entorpecentes obteve informações que a levou até a residência do segundo denunciado.
Assim, nas circunstâncias de tempo e lugar acima citadas, os policiais Sérgio Renato Borba Jesus Júnior e Máximo Antonio Pereira Chaves, liderados pelo Delegado Temair Carlos de Siqueira, realizaram uma busca na casa do segundo denunciado, logrando encontrar uma folha de jornal, toda manchada com um líquido amarelo, exalando odor característico de pasta base de cocaína, uma balança com capacidade de 10k, além de uma peneira pequena, conforme descrito no auto de apresentação e apreensão de fls. 20.
Ao ver a atuação da Polícia, uma dos moradores da casa situada ao lado da residência do segundo denunciado estranhou a presença de um saco plástico de cor verde em seu quintal, contendo uma substância esbranquiçada. Desconfiado, informou o ocorrido ao Delegado Temair Carlos, que foi até o local e apreendeu aquela substância, identificada pelo laudo de exame preliminar de fls. 24 como sendo cocaína.
Indagado pelos policiais, o segundo denunciado admitiu que, minutos antes, havia jogado a cocaína para o quintal de seu vizinho, pois havia visto a viatura policial rondando nas proximidades. Por força dessa situação, foi o segundo denunciado também preso em flagrante.
Ao praticar a conduta delituosa acima descrita, os denunciados incorreram nas penas do art. 12 da Lei nº 6.368/76.”
O primeiro apelante foi condenado à pena de 10(dez) anos e 08(oito) meses de reclusão, em regime integralmente fechado, e 177(cento e setenta e sete) dias-multa, e o segundo apelante à pena de 08(oito) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, e 133(cento e trinta e três) dias-multa, pela prática do delito previsto no art. 12 c/c art. 18, III, da Lei nº 6.368/76.
Em preliminar, alega o primeiro apelante que houve cerceamento de defesa pois foi denunciado por uma capitulação e condenado por outra e que a condenação não pode subsistir porque baseada exclusivamente nas provas colhidas no inquérito e nos depoimentos dos policiais.
Passo a análise da preliminar de cerceamento de defesa, postergando a análise da segunda preliminar em razão da mesma confundir-se com o mérito.
Alega o primeiro apelante que teve seu direito de defesa cerceado, pois o Ministério Público ao oferecer denúncia tipificou a possível conduta do apelante como a descrita no art. 12, da Lei nº 6.368/76, no entanto, ele foi condenado pelo delito previsto no art. 12 c/c art. 18, III, da Lei nº 6.368/76. Tal situação lhe trouxe prejuízo pois não houve fato novo que fundamentasse a alteração, nem oportunidade para que se defendesse.
Não merece prosperar a referida alegação.
Examinando-se a denúncia, conclui-se, sem maior esforço, que a descrição dos fatos tidos como delituosos está perfeitamente delineada, de modo a permitir a articulação defensiva, atendendo às exigências do art. 41 do CPP, que dispõe:
“Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.”
Esclareça-se que, o que busca a norma ao fixar os requisitos elencados no art. 41 do CPP é a clara exposição dos fatos e fundamentos jurídicos, que não se confundem com o enquadramento jurídico, e que visa assegurar ao denunciado o direito constitucional da ampla defesa.
Ressalte-se ainda que, o juiz decidirá com base nos fatos e circunstâncias constantes nos autos, deixando de importar a classificação jurídica que lhes deram as partes. Sendo assim, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia e não da sua classificação legal.
Este é entendimento firmado pela jurisprudência pátria:
“TÓXICO. ART. 12 DA LEI Nº 6.368/76. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE MANDADO DE BUSCA. SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE FIXOU O REGIME INTEGRALMENTE FECHADO PARA O CUMPRIMENTO DA REPRIMENDA IMPOSTA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. CONDUTA NÃO CAPITULADA NA DENÚNCIA. ALTERAÇÃO, DE OFÍCIO, DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO PENA. AFASTAMENTO DO ÓBICE DETERMINADO PELO ART. 2º, §1º, DA LEI Nº 8.072/90. PRONUNCIAMENTO RECENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EM SEDE DE HABEAS CORPUS.
(...)
O réu defende-se dos fatos narrados na denúncia e não da sua classificação legal e, se o fato está narrado na denúncia, não se pode alegar cerceamento de defesa, pois ela deve ser exercitada amplamente, opondo-se à acusação formalizada.
Em processo penal, o réu se defende dos fatos e, não, da tipificação.
(...)”. (TJMG – 1ª Câmara Criminal, ApCr nº 1.0515.03.005357-0, Rel. Des. Sérgio Braga, j. 03.04.2007, rejeitaram a preliminar, deram provimento ao apelo do Ministério Público e negaram provimento ao apelo da defesa, unânime, DJ 13.04.2007)
No presente caso, como bem asseverou o apelante, não houve fato novo, ou seja, os fatos foram os mesmos narrados na denúncia e contra os quais o apelante apresentou defesa, não havendo que se falar em cerceamento de defesa.
Do exposto, rejeito a preliminar argüida.
Ultrapassada a preliminar, passo ao exame do mérito das duas apelações.
Alega o 1º apelante que sua condenação foi baseada nas provas produzidas durante o inquérito policial e, basicamente, nos depoimentos dos policiais, e o 2º apelante, por sua vez, alega que as provas dos autos não foram devidamente valoradas pelo MM. Juiz a quo, que não considerou os depoimentos das suas testemunhas, e que não há provas suficientes para sua condenação.
A materialidade delitiva está consubstanciada no Auto de Apresentação e Apreensão (fl. 24) e nos Laudos de Exame Pericial, às fls. 26/28 e 212/215.
A autoria, por sua vez, é incontestável diante do conjunto probatório produzido em juízo e recai sobre ambos os recorrentes.
Inicialmente, cumpre esclarecer que para a caracterização do crime do art. 12, caput, da Lei 6.368/76, basta que o agente pratique qualquer dos 18 (dezoito) núcleos verbais do tipo misto alternativo. Desta forma, não há necessidade de prática de um efetivo ato de comércio, necessário apenas que o agente traga consigo ou guarde a substância entorpecente para incorrer na reprimenda fixada para o tipo. O crime é de perigo abstrato, punindo-se a conduta pelo risco que ela representa para a saúde pública.
É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“CRIMINAL. HC. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. FALSA IDENTIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS DA INTERNACIONALIDADE DO TRÁFICO. DILAÇÃO PROBATÓRIA E REEXAME DO MATERIAL FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPROPRIEDADE DO WRIT. CONFIGURAÇÃO DO CRIME. TIPO DE AÇÃO MÚLTIPLA DE CONTEÚDO VARIADO. DOLO DE TER EM DEPÓSITO SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. DELITO ÚNICO. DEMAIS ARGUMENTOS SUPERADOS. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, CONCEDIDA.
(...)
O delito de tráfico de entorpecentes compreende dezoito ações identificadas pelos diversos núcleos do tipo, sendo certo que o crime se consuma com a prática de qualquer das ações, por se tratar de delito de ação múltipla, no qual são admitidas várias condutas para sua consumação. (grifo nosso)
(...). Ordem parcialmente conhecida, e nesta extensão, concedida, nos termos do voto do Relator.” (STJ – 5ª Turma, HC 70217/SP, rel. Min. Gilson Dipp, j. 15.02.2007, unânime, DJU 19.03.2007, p. 379)
“RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CONSUMAÇÃO. TRADIÇÃO DA DROGA. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. PROGRESSÃO DE REGIME. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL E CONSTITUCIONAL NÃO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA Nº 126 DO STJ. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2º, §1º, DA LEI Nº 8.072/90, PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
1. É desnecessária a efetiva tradição da droga para a configuração do crime do art. 12, caput, da Lei nº 6.368/76, bastando a efetiva aquisição do entorpecente, para a consumação do ilícito penal. Precedentes do STJ. (grifo nosso)
2. (...). Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.” (STJ – 5ª Turma, REsp 820420/SP, rel. Min. Laurita Vaz, j. 03.08.2006, unânime, DJU 11.09.2006, p. 343)
Verifica-se nos autos que o 1º apelante foi flagrado trazendo consigo aproximadamente 01(um) quilo de cocaína e o 2º apelante guardando 1 (um) quilo de cocaína, além de 01(uma) balança com capacidade para 10(dez) quilos e 01(uma) peneira pequena.
Apesar da negativa dos apelantes, o conjunto probatório é robusto em indicá-los como autores do delito e derrubam a alegação de que a condenação foi baseada somente nas provas produzidas na fase inquisitorial.
Os depoimentos da testemunha ADRIANA VIAN, tanto da fase inquisitorial quanto na judicial são coerentes e indicam o 1º apelante como um dos autores do delito, como podemos ver, verbis:
“(...)que estava de plantão na sala de emergência do Pronto Socorro, na parte da manhã, quando chegou um senhor chamado Francisco das Chagas Santos Silva, para ser atendido. Que: o mesmo estava consciente, com um corte acima da lábio superior e um outro corte na testa. Que; como é rotina do OS, solicitei a um funcionário por nome Cezar Augusto que retirasse a roupa do senhor Francisco, e olhasse os pertences do bolso da roupa do referido senhor. Que; vi quando o funcionário Cezar Augusto retirou de dentro da calça do senhor Francisco um saco de cor verde, que continha uma substância esbranquiçada pastosa. Que; após isso comuniquei a Administração do Pronto Socorro.” (fl. 11)
“(...)
P: Quem foi que encontrou a droga com ele?
R: é assim, é um procedimento, pelo menos da minha equipe toda vez que chega uma acidentado e eu digo que é um politraumatizado, ou seja mas pediu um lugar machucado, a rotina da lei que que é: tira-se a roupa do paciente, porque eu quero fazer um exame físico completo porque as vezes ele pode ter um corte na cabeça e lesões em outros lugares. Então a gente tira toda a roupa do paciente, foi o que aconteceu com a este, a gente tirou toda a roupa, aí eu tenho que identificar todos pertences porque eu coloco todos dentro de um saco preto de lixo aí eu lacro com o nome do paciente porque eu preciso ver se tem dinheiro o alguma outra coisa, então foi tirado toda a roupa do paciente e um dos auxiliares, eu não sei se o César ou a Sebastiana, um dos auxiliares começou a mostrar os pertences, porque eu quem anoto, o que tem, então ele foi mostrando que tinha e colocando no saco. Então nem sempre pode ser a mesma pessoa quem tirou, a pessoa que está me mostrando. Então eu acho que me mostrou foi o César (sic)
P: que lhe mostrou os pertences?
R: e me mostrou os pertences dizendo ‘olha enfermeira estou tirando isso, o onde eu coloco isso?
P: o que vocês viram de anormal?
R: foi tirando a roupa aí ele e disse assim ‘tem esse saco eu não sei o quê que é o que que eu faço’, eu disse para pôr no saco que depois identifica. Era uma sacolinha de supermercado, que tinha uma massa branca dentro, a Sebastiana ainda falou que achava que era massa de vidraceiro, por isso eu não sei se foi ela ou se foi o César que mostrou o saquinho, ela pôs no saco preto, depois que todo mundo olhou ninguém sabia que era, eu falei que ia avisar a administração o que surgiu a dúvida sobre que que era, eu falei para chamar o PM que fica na frente e disse que is avisar a administração, aí nós entregamos para a PM
(...)
P: alguém lá no pronto-socorro que chegou a identificar como droga aquele material?
R: não foi rápido, ficou aquela história assim, parece que um dos meninos que estavam lá chegou a dizer que era outro que não é, porque a gente já está tinha visto com um outro paciente só que eram trouxinhas pequenas
P: e essa era grande a quantidade?
R: era um saco de supermercado assim
P: como uma bola de futebol de salão?
R: eu não sei quando a mãe do boa de futebol de salão mas era um tanto... deixa eu pensar... pouco menor do que uma cabeça, ou dois punhos fechados
P: uma cabeça de recém-nascido?
R: é, isso p do pode ser mais ou menos isso. Mas foi rápido, a gente tá na dúvida a Sebastiana disse que era massa de vidraceiro
P: chegaram na ventilar poder ser droga na hora?
R: Sim
P: por isso chamaram a PM?
R: chamamos a PM e eu fui avisar a administração, foi rápida de chegar o PM
P: a senhora lembra o nome dessa pessoa?
R: do que?
P: essa pessoa que foi encontrado esse material, a sua lembro nome dele?
R: Francisco da Chagas, o sobrenome eu não sei” (Fls. 180/182)
No mesmo sentido é depoimento da testemunha CÉSAR AUGUSTO SALUSTIANO DO NASCIMENTO FILHO:
“(...)
P: For senhor que fez um levantamento da roupa do acusado quando ele chegou?
R: quando o acusado chegou, fizemos o procedimento de rotina, toda a equipe foi para cima do paciente aí a gente faz o procedimento que é tirar as roupas, para ver se tem escoriações, se têm fraturas, aí eu estava tirando o sapato, outra colega estava tirando a calça, quando ela estava tirando um saco verde que estava no bolso da calça dele e passou para mim, aí eu perguntei ‘enfermeira e isso aqui de que eu faço’ ela disse ‘não, põe no saco preto’, que é um saco que a gente coloca todos objetos do paciente e quando ele tem alta a gente entrega os pertences dele
P: e aí, e esse material?
R: aí ela disse para colocar no saco preto e o coloquei no saco preto. Aí veio um colega e perguntou
P: e colega?
R: e colega que estava de plantão, o César Vital a ele pegou aí perguntou ‘enfermeira e isso aqui’ ficou como suspeita de que seria alguma coisa parecida com droga, porque até então eu pensava que era massa de ...
P: vidro?
R: é, de vidraceiro eu até fiz uma brincadeira com um colega a de ‘o cara estava fazendo um bicozinho para ganhar um dinheirinho, aí ele se acidentou’ aí ele pegou, chamou a polícia, porque achou suspeito aí pegaram e levaram para fazer exame no laboratório. Depois eles voltaram a me disseram que era
P: que era o que?
R: droga. Aí eles ficaram falando com o senhor Francisco das Chagas e eu fui cuidar dos meus afazeres
P: quer dizer que na hora em que vocês acharam esse material, já desconfiaram que poderia ser droga?
R: sim
P: quem entregou o material para o PM?
R: e um não sei lhe dizer agora, mais eu acho que foi a enfermeira
P: o senhor lembra a quantidade, se era grande?
R: era um bolo assim Doutor
P: do tamanho de uma bola de futebol de salão?
R: isso” (Fls. 187/189)
Por outro lado, outras testemunhas também indicam o 2º apelante como um dos autores do delito. MARIA APARECIDA LEOCÁDIO DE MENEZES afirma:
“Que estava presente quando os policiais encontraram no quintal da casa ao lado um saco plástico contendo uma massa esbranquiçada aparentando ser pasta base de cocaína. Que diariamente observava que naquela residência, havia movimentação intença(sic) de pessoas, inclusive a maioria dos veículos eram veículos novos. Que; os moradores da casa nunca saiam por muito tempo, eram sempre saídas rápidas.” (fl. 13)
“P: a senhora estava presente na hora que ele foi preso?
R: tava.
P: a senhora estava aonde?
R: eu estava na minha casa quando eu ouvi o tiroteio, então eu corri para ver minha mãe que morava na frente e eles estavam lá, prenderam eles, eu estava só presenciando de longe, mas eles foram na casa da minha mãe perguntar se podia presenciar a busca. Disse que podia ir, aí eu fui, acompanhei eles e outro vizinho ao lado.
P: que vizinho?
R: não sei o nome dele, mora na mesma rua que eu tava morando, na S-18, não sei o nome dele, que eu não conheço também. Então na busca lá eu presenciei a busca deles. Foram no quarto, averiguar as coisas que acharam, balde com cheiro da droga, um jornal, um saco e uma balança, e por fim, saíram da casa, a vizinha achou uma droga do lado da casa dela, uma bolsa azul, aí me chamaram para presenciar a droga, foi isso que eu vi.
P: que droga era?
R: eu não conheço
P: sim, mas era mato, que é maconha, ou era pasta?
R: pó.
P: há era pó? (sic)
R: acho que era pó, num saco, eu não sei bem, não conheço.
P: era grande a quantidade, assim tipo meio quilo, um quilo?
R: eles disseram que parece que era dois quilos, assim o policial falou.
P: pela quantidade, a senhora lembra, imagine assim um saco de açúcar?
R: acho que era isso mais ou menos.
P: um quilo, dois quilos?
R: acho que era dois quilos
(...)
P: qual foi a reação do acusado, o que ele disse?
R: aí realmente ele disse que jogou porque viu o carro da polícia rondando, aí jogou ao lado da casa da vizinha.
P: ele disse que era dele?
R: ele confessou depois que era dele, que ele jogou.
P: ele disse pra que era essa droga?
R: não, porque eu saí da casa, ficou os policiais lá com eles.
P: a senhora viu quando ele disse que era dele a droga?
R: disse que era dele.
P: e disse que jogou porque a polícia tinha chegado?
R: disse que jogou porque a polícia tinha chegado.
(...)
P: Dona Maria Aparecida, a senhora presenciou, chegou a presenciar movimento de pessoas intenso nessa casa?
R: sim, todo dia tinha vários carro na frente, moto, que até caminhão chegava de madrugada, chegava lá.
(...)
P: o juiz já perguntou u vou repetir, depois que foi encontrado esse pacote de droga ele afirmou que era dele?
R: isso
P: e ele disse que havia jogado essa droga lá por qual razão?
R: porque o carro da polícia vinha rondando por duas vezes, achou que o carro era da polícia e jogou a droga ao lado da casa da vizinha.” (Fls. 183/186)
Temos, ainda, os depoimentos dos policiais que participaram das diligências. O Policial Civil SÉRGIO RENATO BORBA JESUS JÚNIOR afirma:
“Que; ao chegar na DRE fiquei sabendo que tinha um homem preso com um kilo de substância entorpecente. Que; por volta das 12:00 horas, juntamente com os Del Temais Siqueira e Daniel Ferreira, iniciou-se uma busca nos bairro da cidade tentando encontrar a casa do possível fornecedor da droga apreendida. Que; aproximadamente 13:00, eu, os Del. Temair, Daniel e o Ag. Máximo, adentramos no quintal de uma residência localizada na Rua S-18, no bairro Santa Luzia, pois segundo informações ali morava o fornecedor da droga que fora vendida para o homem que havia sido preso anteriormente. Que; após toda as pessoas serem rendidas, na companhia de duas testemunhas do povo, iniciamos uma busca na casa, onde em dos quartos da casa foi encontrada uma lixeira de cor amarela, dentro da qual, havia uma folha de jornal toda manchada com um líquido amarelo, com um odor característico de pasta base de cocaína. Que; foi encontrada também na cozinha uma balança com capacidade de 10kg e uma peneira pequena. Que; fui chamado pelo vizinho da casa onde estavamos, para que verifica algo que havia sido encontrado em seu quintal. Que; ao chegar no local, juntamente com o Del. Temair e duas testemunhas do povo, encontramos um saco plástico de cor verde contendo dentro uma substância pastosa de cor branca, com forte odor, aparentando ser pasta base de cocaína. Que; após indagar do Sr. Fábio sobre a substância encontrada, ele confessou que havia jogado o saco por cima do muro, pois tinha visto o carro da polícia passar em frente a sua casa. Que; imediatamente foi dada voz de prisão ao Sr. Fábio.” (Fl. 06)
“P: o senhor lembra do que? Qual foi o evento que o senhor lembra deles?
R: o senhor Francisco nos foi trazido pela PM, lá do hospital geral, que de acordo com eles havia sido encontrado aproximadamente um quilo de pasta base de cocaína junto com ele.
(...)
P: e depois, o que vocês fizeram?
R: o nosso interesse era saber onde ele havia adquirido. Depois que nós verificamos o nome dele aí nós fomos perceber que ele já era um indivíduo já conhecido no bairro Caetano Filho, no Beiral, justamente pelo tráfico, havia algumas investigações sobre ele, se eu não me engano, e nós indagamos sobre a questão de onde ele havia conseguido a droga. Ele ficou relutante de onde havia conseguido a droga, ficou receoso, talvez por causa das condições em que ele se encontrava e só nos comentou que tinha sido no Pintolândia. E nós perguntamos em que Pintolândia havia sido, porque os bairros pintolândia eles se subdividiram em outros nomes, e ele disse que tinha sido no Santa Luzia. E o delegado havia dito que havia um local no Santa Luzia, específico, que já havia sido investigado, que eu não faço parte da equipe de investigação, só do setor de operações e que provavelmente poderia ser aquele local. Nós nos deslocamos até lá, chagamos lá na frente, perguntamos se era lá o local, ele falou que não era.
P: o Francisco foi com vocês?
R: sr. Francisco. Aí o delegado falou o seguinte pra ele, que a gente poderia descer com ele do carro e perguntar de alguns vizinhos se conheciam ele. Ele ficou nervoso, disse que não era pra nós fazermos isso se não iam matar ele. Aí tudo deu a indicar que seria ali mesmo. Retornamos para a delegacia, deixamos o sr. Francisco e voltamos a residência.
P: que residência?
R: na residência do sr. Fábio.
(...)
“começamos a fazer o procedimento de busca dentro do quarto do sr. Fábio, de acordo com ele era quarto dele. Eu encontrei um cesto de roupa de bebê, cestinho amarelo, com jornal, tava molhado, úmido, e o odor que ele exalava era de pasta base de cocaína, era característico, só que não havia o produto.
(...)
P: depois que encontrou esse jornal úmido?
R: tá, aí começamos a fazer a busca, encontramos uma balança, achamos uma peneira e não achamos o produto, isso acompanhados de duas testemunhas do povo, que residiam lá perto. (...) e como estávamos encerrando a busca o vizinho da casa do sr. Fábio, olhando de frente, o vizinho do lado direito, nos chamou, pediu que nós fôssemos até o quintal da residência dele, aí nós fomos, a testemunha nos acompanhando, lá encontramos uma sacolinha de bebê e ao lado uma substância pastosa, que pelas características e pelo odor aparentava ser pasta base de cocaína.
P: qual a quantidade, o senhor lembra?
R: depois foi constatado que era, se não me engano, novecentos e poucas gramas ou um quilo, mais ou menos um quilo de pasta base de cocaína.
(...)
P: a reação do Fábio, ele falou se a droga era dele ou não?
R: quando nós pegamos e indagamos de quem era a droga, ele ficou nervoso e o irmão dele ficou nervoso também ele falou '‘não, a droga é minha, eu vi quando vocês passaram com a viatura aí na frente, corri lá dentro, coloquei na bolsa e joguei do outro lado...” (Fls. 167/173)
Ademais, a alegação de que os depoimentos dos policias não podem ser considerados não merece prosperar, posto que tais depoimentos são uniformes e coerentes, descrevendo os fatos e a investigação e, ainda, as circunstâncias da apreensão da droga.
Convém ressaltar que, estes depoimentos passaram pelo crivo do contraditório, foram corroborados por outros elementos de prova e, ainda, têm plena eficácia probatória, visto que partem de pessoas presumidamente idôneas, foram prestados sob o compromisso de dizerem a verdade e não há nos autos nada que indique a existência de interesse escuso dos policiais na condenação dos ora apelantes que venha a ter o condão de infirmar a idoneidade ou veracidade de seus testemunhos.
É o entendimento da jurisprudência pátria:
“TÓXICOS. TRÁFICO. AGENTE PRESO EM FLAGRANTE GUARDANDO EM SUA RESIDÊNCIA SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES DIVIDIDAS EM DOSES UNITÁRIAS. DELITO CARACTERIZADO. PROVA. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL. RETRATAÇÃO. DEPOIMENTO POLICIAL. VALIDADE.
- (...).
- É iterativa a jurisprudência de nossos tribunais no sentido de que os policiais, civis ou militares, mormente os que se encontravam no momento e no lugar do crime, não estão impedidos de depor, pois não podem ser considerados inidôneos ou suspeitos, pela simples condição funcional .
- Recurso conhecido e improvido.” (TJMG – 1ª Câmara Criminal, Apelação Crime 1.0024.05.707546-7/001, Rel. Des. Gudesteu Biber, j. 19.12.2005, v.u., negaram provimento, DJ 13.1.2006)
Assim, a alegação de insuficiência de provas não pode subsistir diante do exame do conjunto probatório produzido na fase inquisitorial e durante a instrução processual, que deixa evidente que os apelantes cometeram o delito pelo qual foram condenados, não podendo ser operada a desclassificação pretendida pelo 1º apelante nem a absolvição pretendida pelo 2º apelante.
Ressalte-se ainda, que a alegação de que não houve valoração das provas apresentadas pela defesa não merece prosperar, pois vigora no processo penal brasileiro o Princípio do Livre Convencimento, segundo o qual o Juiz forma a sua convicção pela livre apreciação das provas, significando que o juiz é soberano na análise das provas produzidas durante o processo, tendo a faculdade de formar livremente a sua convicção acerca dos fatos e do direito, atribuindo valor às provas e, ao final, decidir de acordo com seu convencimento.
Neste sentido:
“PENAL E PROCESSO PENAL. ESTUPRO. SISTEMA DA LIVRE APRECIAÇÃO DE PROVAS. AUSÊNCIA DE DEPOIMENTO DA VÍTIMA. CRIME COMPROVADO POR TESTEMUNHA E LAUDO PERICIAL. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. O juiz forma a sua convicção pela livre apreciação d aprova. Não fica adstrito a critérios valorativos e apriorísticos e é livre na sua escolha, aceitação e valoração. (Doutrina)
2. (...)
3. Embargos conhecidos e improvidos.” (TJDFT – Câmara Criminal, Emb.Infr.Crim. nº 20020710047414, Rel. Des. Nilsoni de Freitas, j. 05.10.2005, negaram provimento, unânime, DJU 20.04.2006, p. 162)
“FURTO. NEGATIVA DE AUTORIA. APREENSÃO DA RES FURTIVA NA POSSE DO AGENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA.
(...)
Vigorando no processo penal brasileiro o Princípio do Livre Convencimento, segundo o qual o Juiz forma a sua convicção pela livre apreciação da prova, não há por que desprezar os depoimentos da fase policial, que, colhidos no calor dos acontecimentos e sendo, portanto, mais ricos em detalhes, mostram-se aptos a embasar o decreto condenatório, mormente quando se harmonizam com a prova colhida na fase judicial.
Recurso improvido.” (TJMG – 5ª Câmara Criminal, ApCr. Nº 2.0000.00.511347-5, Rel. Des. Antônio Armando dos Anjos, j. 10.01.2006, negaram provimento, unânime, DJ 25.02.2006)
No que pertine à fixação da pena base do 2º apelante, entendo que a mesma deve ser reduzida posto que o 2º apelante é primário e possui bons antecedentes. No entanto, não se pode olvidar que sua conduta é reprovável e nociva à sociedade e, ainda, que foi preso com uma grande quantidade de substância entorpecente, razão pela qual fixo a pena base em 04(quatro) anos de reclusão e 66(sessenta e seis) dias-multa.
Quanto à causa de aumento relativa à associação eventual, prevista no art. 18, inciso III, da Lei nº 6.368/76, verifica-se que a nova Lei Antitóxicos (Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, que entrou em vigor no dia 08.10.2006), não prevê mais a referida causa de aumento de pena, assim como também não criou qualquer tipo penal correspondente.
Dessa forma, ocorreu, quanto à referida causa de aumento, abolição pela lei nova, cuidando-se, nesse caso, de novatio legis in mellius. Assim, necessária aplicação retroativa, que, quando ocorre, beneficia o agente, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal.
Neste sentido:
“TRÁFICO. PORTE DE ARMA ILEGAL. NULIDADES. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. FACULDADE DO AUTUADO. CONDENAÇÃO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROVA SEGURA DA PROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO. DEPOIMENTO DE POLICIAL. VALOR PROBANTE. CONCURSO FORMAL. NÃO OCORRÊNCIA. PENA. REDUÇÃO. CABIMENTO. LEI 11.343/03. NOVA LEI DE TÓXICOS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA REFERENTE À ASSOCIAÇÃO EVENTUAL. DECOTAÇÃO.POSSIBILIDADE. REDUÇÃO DA PENA. REGIME PRISIONAL INICIALMENTE FECHADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
A pena prevista no art. 18, III, da Lei nº 6.368/76, deverá ser decotada da condenação, já que entrou em vigor, no dia 08 de outubro de 2006, a nova Lei de Tóxicos (Lei nº 11.343/06) que, expressamente, revogou as Leis nºs 6.368/76 e 10.409/02, não prevendo tal figura delitiva”. (TJMG – 2ª Câmara Criminal, ApCr nº 1.0024.06.995603-5, Rel. Des. José Antonino Baía Borges, j. 22.03.2007, rejeitaram as preliminares e deram parcial provimento, unânime, DJ 13.04.2007)
Diante disso, excluo das penas dos apelantes a causa de aumento aplicada com base no revogado inciso III, do artigo 18, da lei nº 6.368/76, tornando definitiva em 8(anos) anos de reclusão e 133(cento e trinta e três) dias-multa a pena do 1º Apelante FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA e em 04(quatro) anos de reclusão e 66(sessenta e seis) dias-multa a pena do 2º Apelante, FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS.
No que pertine ao regime de cumprimento, ainda que se trate de crime hediondo, com o advento da Lei nº 11.464, de 28 de março de 2007, que alterou o art. 2º da Lei nº 8.072/90, a pena aplicada deve ser cumprida inicialmente no regime fechado e não integralmente no regime fechado, como estipulou a sentença a quo. Tratando-se, nesse caso, também, de novatio legis in mellius, com aplicação retroativa, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal. Entretanto, cumpre ressaltar que caberá ao juízo das execuções penais analisar os pedidos de progressão do regime prisional considerando o comportamento da cada condenado e o preenchimento dos demais requisitos necessários.
Do exposto, em consonância com o Parecer Ministerial, conheço e dou parcial provimento aos presentes recursos, alterando a sentença monocrática somente no que pertine à pena e ao seu regime de cumprimento.
É como voto.
Boa Vista (RR), 24 de julho de 2007.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
- Relator -
CÂMARA ÚNICA
TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 001005004638-1
1º APELANTE: FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA
ADVOGADO: EDNALDO GOMES VIDAL
2º APELANTE: FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS
DEFENSORA PÚBLICA: TEREZINHA MUNIZ
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
PROMOTOR DE JUSTIÇA: ISAIAS MONTANARI JÚNIOR
RELATOR: DES. LUPERCINO NOGUEIRA
EMENTA
APELAÇÃO CRIME. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR NÃO ACOLHIDA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CONFIGURAÇÃO. CONJUNTO PROBATÓRIO SEGURO. ABSOLVIÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. VALIDADE. PROVAS. VALORAÇÃO. “PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO”. ART. 18, III, DA LEI Nº 6.368/76. NOVATIO “LEGIS IN MELLIUS”. LEI Nº 11.343/2006. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. PROGRESSÃO.
1. Não se traduz em cerceamento de defesa, o fato do réu ter sido denunciado por uma capitulação legal e condenado por outra, uma vez que ele se defende os fatos narrados na denúncia e não da sua classificação legal. Preliminar rejeitada.
2. Para a caracterização do crime do art. 12 da Lei 6.368/76, basta que o agente pratique qualquer dos 18 (dezoito) núcleos verbais do tipo misto alternativo. Não há necessidade da prática de um efetivo ato de comércio, necessário apenas que o agente traga consigo ou guarde a substância entorpecente para incorrer na reprimenda fixada para o tipo.
3. Diante do conjunto probatório robusto, produzido tanto na fase inquisitorial quanto na judicial, incabível a absolvição e desclassificação pretendidas.
4. Os depoimentos dos policiais têm plena eficácia probatória, principalmente se corroborados por outros elementos de prova.
5. No Processo Penal brasileiro vigora o Princípio do Livre Convencimento, segundo o qual o Juiz forma a sua convicção pela livre apreciação das provas, significando que o juiz é soberano na análise das provas produzidas durante o processo, tendo a faculdade de formar livremente a sua convicção acerca dos fatos e do direito, atribuindo valor às provas e, ao final, decidir de acordo com seu convencimento, não podendo se falar em ausência de valoração das provas apresentadas pela defesa.
6. A pena base deve ser reduzida, diante da primariedade e dos bons antecedentes do apelante, porém, não se pode olvidar que sua conduta é reprovável e nociva à sociedade e, ainda, que foi preso com uma grande quantidade de substância entorpecente, razão pela qual deve ser fixada um pouco acima do mínimo.
7. A causa de aumento relativa à associação eventual, prevista no art. 18, inciso III, da Lei nº 6.368/76, foi abolida pela nova lei Antitóxicos, a Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, que entrou em vigor no dia 08.10.2006, que também não criou qualquer tipo penal correspondente. Cuidando-se, nesse caso, de novatio legis in mellius, que tem aplicação retroativa, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal, a referida majorante deve ser decotada das penas impostas aos acusados.
8. Com o advento da Lei nº 11.464, de 28 de março de 2007, que alterou o art. 2º da Lei nº 8.072/90, a pena aplicada aos crimes hediondos ou a eles equiparados, deve ser cumprida inicialmente no regime fechado. Tratando-se, nesse caso, também, de novatio legis in mellius, tem aplicação retroativa, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal.
9. Recursos parcialmente providos.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 001005004638-1, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Turma Criminal da Colenda Câmara Única do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade e em consonância com o douto parecer Ministerial, em conhecer e dar parcial provimento aos presentes recursos, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte deste Julgado.
Sala das Sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos vinte e quatro dias do mês de julho do ano de dois mil e sete.
Des. CARLOS HENRIQUES
- Presidente -
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
- Relator -
Juiz Convocado ERICK LINHARES
- Julgador -
Esteve presente: Dr(ª).______________________________
- Procurador(a) de Justiça –
Publicado no Diário do Poder Judiciário, Boa Vista-RR, 10 de Agosto de 2007, ANO X - EDIÇÃO 3664, p. 03.
( : 24/07/2007 ,
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Ementa
CÂMARA ÚNICA
TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 001005004638-1
1º APELANTE: FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA
ADVOGADO: EDNALDO GOMES VIDAL
2º APELANTE: FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS
DEFENSORA PÚBLICA: TEREZINHA MUNIZ
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
PROMOTOR DE JUSTIÇA: ISAIAS MONTANARI JÚNIOR
RELATOR: DES. LUPERCINO NOGUEIRA
RELATÓRIO
FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA e FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS, inconformados com a decisão do MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal, que os condenou pela prática do delito previsto no art. 12, caput, c/c art. 18, inciso III, da Lei nº 6.368/76, interpuseram os presentes recursos de apelação.
O primeiro apelante, em suas razões recursais, às fls. 310/333, alega, preliminarmente, que:
a) houve cerceamento de defesa, pois não teve a oportunidade de se defender da imputação de associação, uma vez que foi denunciado apenas pelo delito previsto no art. 12, da lei nº 6.368/76;
b) as provas colhidas durante o inquérito policial não podem ser utilizadas para fundamentar a condenação, posto que imprestáveis e baseadas exclusivamente nos depoimentos dos policiais.
No mérito, alega que não há provas suficientes para a sua condenação.
Requer a reforma da sentença monocrática, para que seja absolvido ou, em caso de entendimento diverso, seja desclassificado o delito de tráfico, pelo qual foi condenado, para o de uso próprio.
O segundo apelante apresentou suas razões recursais, às fls. 358/373, alegando, em síntese, que as provas dos autos não foram devidamente valoradas, pois o juízo a quo levou em consideração apenas as provas apresentadas pela acusação, desconsiderando as testemunhas apresentadas pela defesa e que não há provas suficientes para fundamentar a condenação imposta ao apelante.
Ao final, requer:
a) os benefícios da Justiça Gratuita;
b) o recebimento e provimento da presente apelação para o fim de reformar a sentença recorrida, absolvendo-o da prática do delito pelo qual foi denunciado ou, em caso de entendimento diverso, para que seja reduzida a pena base que lhe foi aplicada para o mínimo legal.
Em contra-razões, às fls. 337/347 e 379//385, o douto representante do Ministério Público Estadual pugna pelo conhecimento dos recursos e por seus parciais provimentos, apenas para excluir a causa de aumento de pena prevista no art. 18, III, da Lei nº 6.368/76, mantendo-se a sentença nos seus demais termos.
Às fls. 389/394 e 398/408, a representante ministerial de 2º Grau manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento dos recursos, apenas para afastar a incidência da causa de aumento de pena prevista no artigo 18, III, da Lei nº 6.368/76 e alterar o regime de cumprimento de pena, alterando-o para o regime inicialmente fechado, em razão da “novatio legis in mellius”.
É o sucinto relatório.
Encaminhem-se à douta revisão.
Boa Vista (RR), 17 de julho de 2007.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
- Relator -
CÂMARA ÚNICA
TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 001005004638-1
1º APELANTE: FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA
ADVOGADO: EDNALDO GOMES VIDAL
2º APELANTE: FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS
DEFENSORA PÚBLICA: TEREZINHA MUNIZ
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
PROMOTOR DE JUSTIÇA: ISAIAS MONTANARI JÚNIOR
RELATOR: DES. LUPERCINO NOGUEIRA
VOTO
Defiro os benefícios da Justiça Gratuita para o 2º Apelante.
Recebo os recursos porque se acham presentes os seus pressupostos de admissibilidade.
Narra a denúncia, verbis:
“Segundo restou apurado, na manhã do dia 05.02.05, o denunciado Francisco das Chagas Santos Silva foi conduzido ao Pronto Socorro São Bento por ter sofrido um acidente de trânsito. Iniciados os procedimentos de praxe, os técnicos de enfermagem que o atenderam encontraram, no bolso de sua calça, a substância entorpecente acima descrita, acondicionada em um saco plástico verde. Suspeitando de sua natureza ilícita, os funcionários acionaram a Polícia, que efetuou a prisão em flagrante do primeiro denunciado.
Ato contínuo, em diligências realizadas para identificar quem havia fornecido a droga para o primeiro denunciado, uma equipe de policiais civis da Delegacia de Repressão a Entorpecentes obteve informações que a levou até a residência do segundo denunciado.
Assim, nas circunstâncias de tempo e lugar acima citadas, os policiais Sérgio Renato Borba Jesus Júnior e Máximo Antonio Pereira Chaves, liderados pelo Delegado Temair Carlos de Siqueira, realizaram uma busca na casa do segundo denunciado, logrando encontrar uma folha de jornal, toda manchada com um líquido amarelo, exalando odor característico de pasta base de cocaína, uma balança com capacidade de 10k, além de uma peneira pequena, conforme descrito no auto de apresentação e apreensão de fls. 20.
Ao ver a atuação da Polícia, uma dos moradores da casa situada ao lado da residência do segundo denunciado estranhou a presença de um saco plástico de cor verde em seu quintal, contendo uma substância esbranquiçada. Desconfiado, informou o ocorrido ao Delegado Temair Carlos, que foi até o local e apreendeu aquela substância, identificada pelo laudo de exame preliminar de fls. 24 como sendo cocaína.
Indagado pelos policiais, o segundo denunciado admitiu que, minutos antes, havia jogado a cocaína para o quintal de seu vizinho, pois havia visto a viatura policial rondando nas proximidades. Por força dessa situação, foi o segundo denunciado também preso em flagrante.
Ao praticar a conduta delituosa acima descrita, os denunciados incorreram nas penas do art. 12 da Lei nº 6.368/76.”
O primeiro apelante foi condenado à pena de 10(dez) anos e 08(oito) meses de reclusão, em regime integralmente fechado, e 177(cento e setenta e sete) dias-multa, e o segundo apelante à pena de 08(oito) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, e 133(cento e trinta e três) dias-multa, pela prática do delito previsto no art. 12 c/c art. 18, III, da Lei nº 6.368/76.
Em preliminar, alega o primeiro apelante que houve cerceamento de defesa pois foi denunciado por uma capitulação e condenado por outra e que a condenação não pode subsistir porque baseada exclusivamente nas provas colhidas no inquérito e nos depoimentos dos policiais.
Passo a análise da preliminar de cerceamento de defesa, postergando a análise da segunda preliminar em razão da mesma confundir-se com o mérito.
Alega o primeiro apelante que teve seu direito de defesa cerceado, pois o Ministério Público ao oferecer denúncia tipificou a possível conduta do apelante como a descrita no art. 12, da Lei nº 6.368/76, no entanto, ele foi condenado pelo delito previsto no art. 12 c/c art. 18, III, da Lei nº 6.368/76. Tal situação lhe trouxe prejuízo pois não houve fato novo que fundamentasse a alteração, nem oportunidade para que se defendesse.
Não merece prosperar a referida alegação.
Examinando-se a denúncia, conclui-se, sem maior esforço, que a descrição dos fatos tidos como delituosos está perfeitamente delineada, de modo a permitir a articulação defensiva, atendendo às exigências do art. 41 do CPP, que dispõe:
“Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.”
Esclareça-se que, o que busca a norma ao fixar os requisitos elencados no art. 41 do CPP é a clara exposição dos fatos e fundamentos jurídicos, que não se confundem com o enquadramento jurídico, e que visa assegurar ao denunciado o direito constitucional da ampla defesa.
Ressalte-se ainda que, o juiz decidirá com base nos fatos e circunstâncias constantes nos autos, deixando de importar a classificação jurídica que lhes deram as partes. Sendo assim, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia e não da sua classificação legal.
Este é entendimento firmado pela jurisprudência pátria:
“TÓXICO. ART. 12 DA LEI Nº 6.368/76. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE MANDADO DE BUSCA. SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE FIXOU O REGIME INTEGRALMENTE FECHADO PARA O CUMPRIMENTO DA REPRIMENDA IMPOSTA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. CONDUTA NÃO CAPITULADA NA DENÚNCIA. ALTERAÇÃO, DE OFÍCIO, DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO PENA. AFASTAMENTO DO ÓBICE DETERMINADO PELO ART. 2º, §1º, DA LEI Nº 8.072/90. PRONUNCIAMENTO RECENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EM SEDE DE HABEAS CORPUS.
(...)
O réu defende-se dos fatos narrados na denúncia e não da sua classificação legal e, se o fato está narrado na denúncia, não se pode alegar cerceamento de defesa, pois ela deve ser exercitada amplamente, opondo-se à acusação formalizada.
Em processo penal, o réu se defende dos fatos e, não, da tipificação.
(...)”. (TJMG – 1ª Câmara Criminal, ApCr nº 1.0515.03.005357-0, Rel. Des. Sérgio Braga, j. 03.04.2007, rejeitaram a preliminar, deram provimento ao apelo do Ministério Público e negaram provimento ao apelo da defesa, unânime, DJ 13.04.2007)
No presente caso, como bem asseverou o apelante, não houve fato novo, ou seja, os fatos foram os mesmos narrados na denúncia e contra os quais o apelante apresentou defesa, não havendo que se falar em cerceamento de defesa.
Do exposto, rejeito a preliminar argüida.
Ultrapassada a preliminar, passo ao exame do mérito das duas apelações.
Alega o 1º apelante que sua condenação foi baseada nas provas produzidas durante o inquérito policial e, basicamente, nos depoimentos dos policiais, e o 2º apelante, por sua vez, alega que as provas dos autos não foram devidamente valoradas pelo MM. Juiz a quo, que não considerou os depoimentos das suas testemunhas, e que não há provas suficientes para sua condenação.
A materialidade delitiva está consubstanciada no Auto de Apresentação e Apreensão (fl. 24) e nos Laudos de Exame Pericial, às fls. 26/28 e 212/215.
A autoria, por sua vez, é incontestável diante do conjunto probatório produzido em juízo e recai sobre ambos os recorrentes.
Inicialmente, cumpre esclarecer que para a caracterização do crime do art. 12, caput, da Lei 6.368/76, basta que o agente pratique qualquer dos 18 (dezoito) núcleos verbais do tipo misto alternativo. Desta forma, não há necessidade de prática de um efetivo ato de comércio, necessário apenas que o agente traga consigo ou guarde a substância entorpecente para incorrer na reprimenda fixada para o tipo. O crime é de perigo abstrato, punindo-se a conduta pelo risco que ela representa para a saúde pública.
É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“CRIMINAL. HC. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. FALSA IDENTIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS DA INTERNACIONALIDADE DO TRÁFICO. DILAÇÃO PROBATÓRIA E REEXAME DO MATERIAL FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPROPRIEDADE DO WRIT. CONFIGURAÇÃO DO CRIME. TIPO DE AÇÃO MÚLTIPLA DE CONTEÚDO VARIADO. DOLO DE TER EM DEPÓSITO SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. DELITO ÚNICO. DEMAIS ARGUMENTOS SUPERADOS. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, CONCEDIDA.
(...)
O delito de tráfico de entorpecentes compreende dezoito ações identificadas pelos diversos núcleos do tipo, sendo certo que o crime se consuma com a prática de qualquer das ações, por se tratar de delito de ação múltipla, no qual são admitidas várias condutas para sua consumação. (grifo nosso)
(...). Ordem parcialmente conhecida, e nesta extensão, concedida, nos termos do voto do Relator.” (STJ – 5ª Turma, HC 70217/SP, rel. Min. Gilson Dipp, j. 15.02.2007, unânime, DJU 19.03.2007, p. 379)
“RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CONSUMAÇÃO. TRADIÇÃO DA DROGA. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. PROGRESSÃO DE REGIME. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL E CONSTITUCIONAL NÃO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA Nº 126 DO STJ. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2º, §1º, DA LEI Nº 8.072/90, PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
1. É desnecessária a efetiva tradição da droga para a configuração do crime do art. 12, caput, da Lei nº 6.368/76, bastando a efetiva aquisição do entorpecente, para a consumação do ilícito penal. Precedentes do STJ. (grifo nosso)
2. (...). Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.” (STJ – 5ª Turma, REsp 820420/SP, rel. Min. Laurita Vaz, j. 03.08.2006, unânime, DJU 11.09.2006, p. 343)
Verifica-se nos autos que o 1º apelante foi flagrado trazendo consigo aproximadamente 01(um) quilo de cocaína e o 2º apelante guardando 1 (um) quilo de cocaína, além de 01(uma) balança com capacidade para 10(dez) quilos e 01(uma) peneira pequena.
Apesar da negativa dos apelantes, o conjunto probatório é robusto em indicá-los como autores do delito e derrubam a alegação de que a condenação foi baseada somente nas provas produzidas na fase inquisitorial.
Os depoimentos da testemunha ADRIANA VIAN, tanto da fase inquisitorial quanto na judicial são coerentes e indicam o 1º apelante como um dos autores do delito, como podemos ver, verbis:
“(...)que estava de plantão na sala de emergência do Pronto Socorro, na parte da manhã, quando chegou um senhor chamado Francisco das Chagas Santos Silva, para ser atendido. Que: o mesmo estava consciente, com um corte acima da lábio superior e um outro corte na testa. Que; como é rotina do OS, solicitei a um funcionário por nome Cezar Augusto que retirasse a roupa do senhor Francisco, e olhasse os pertences do bolso da roupa do referido senhor. Que; vi quando o funcionário Cezar Augusto retirou de dentro da calça do senhor Francisco um saco de cor verde, que continha uma substância esbranquiçada pastosa. Que; após isso comuniquei a Administração do Pronto Socorro.” (fl. 11)
“(...)
P: Quem foi que encontrou a droga com ele?
R: é assim, é um procedimento, pelo menos da minha equipe toda vez que chega uma acidentado e eu digo que é um politraumatizado, ou seja mas pediu um lugar machucado, a rotina da lei que que é: tira-se a roupa do paciente, porque eu quero fazer um exame físico completo porque as vezes ele pode ter um corte na cabeça e lesões em outros lugares. Então a gente tira toda a roupa do paciente, foi o que aconteceu com a este, a gente tirou toda a roupa, aí eu tenho que identificar todos pertences porque eu coloco todos dentro de um saco preto de lixo aí eu lacro com o nome do paciente porque eu preciso ver se tem dinheiro o alguma outra coisa, então foi tirado toda a roupa do paciente e um dos auxiliares, eu não sei se o César ou a Sebastiana, um dos auxiliares começou a mostrar os pertences, porque eu quem anoto, o que tem, então ele foi mostrando que tinha e colocando no saco. Então nem sempre pode ser a mesma pessoa quem tirou, a pessoa que está me mostrando. Então eu acho que me mostrou foi o César (sic)
P: que lhe mostrou os pertences?
R: e me mostrou os pertences dizendo ‘olha enfermeira estou tirando isso, o onde eu coloco isso?
P: o que vocês viram de anormal?
R: foi tirando a roupa aí ele e disse assim ‘tem esse saco eu não sei o quê que é o que que eu faço’, eu disse para pôr no saco que depois identifica. Era uma sacolinha de supermercado, que tinha uma massa branca dentro, a Sebastiana ainda falou que achava que era massa de vidraceiro, por isso eu não sei se foi ela ou se foi o César que mostrou o saquinho, ela pôs no saco preto, depois que todo mundo olhou ninguém sabia que era, eu falei que ia avisar a administração o que surgiu a dúvida sobre que que era, eu falei para chamar o PM que fica na frente e disse que is avisar a administração, aí nós entregamos para a PM
(...)
P: alguém lá no pronto-socorro que chegou a identificar como droga aquele material?
R: não foi rápido, ficou aquela história assim, parece que um dos meninos que estavam lá chegou a dizer que era outro que não é, porque a gente já está tinha visto com um outro paciente só que eram trouxinhas pequenas
P: e essa era grande a quantidade?
R: era um saco de supermercado assim
P: como uma bola de futebol de salão?
R: eu não sei quando a mãe do boa de futebol de salão mas era um tanto... deixa eu pensar... pouco menor do que uma cabeça, ou dois punhos fechados
P: uma cabeça de recém-nascido?
R: é, isso p do pode ser mais ou menos isso. Mas foi rápido, a gente tá na dúvida a Sebastiana disse que era massa de vidraceiro
P: chegaram na ventilar poder ser droga na hora?
R: Sim
P: por isso chamaram a PM?
R: chamamos a PM e eu fui avisar a administração, foi rápida de chegar o PM
P: a senhora lembra o nome dessa pessoa?
R: do que?
P: essa pessoa que foi encontrado esse material, a sua lembro nome dele?
R: Francisco da Chagas, o sobrenome eu não sei” (Fls. 180/182)
No mesmo sentido é depoimento da testemunha CÉSAR AUGUSTO SALUSTIANO DO NASCIMENTO FILHO:
“(...)
P: For senhor que fez um levantamento da roupa do acusado quando ele chegou?
R: quando o acusado chegou, fizemos o procedimento de rotina, toda a equipe foi para cima do paciente aí a gente faz o procedimento que é tirar as roupas, para ver se tem escoriações, se têm fraturas, aí eu estava tirando o sapato, outra colega estava tirando a calça, quando ela estava tirando um saco verde que estava no bolso da calça dele e passou para mim, aí eu perguntei ‘enfermeira e isso aqui de que eu faço’ ela disse ‘não, põe no saco preto’, que é um saco que a gente coloca todos objetos do paciente e quando ele tem alta a gente entrega os pertences dele
P: e aí, e esse material?
R: aí ela disse para colocar no saco preto e o coloquei no saco preto. Aí veio um colega e perguntou
P: e colega?
R: e colega que estava de plantão, o César Vital a ele pegou aí perguntou ‘enfermeira e isso aqui’ ficou como suspeita de que seria alguma coisa parecida com droga, porque até então eu pensava que era massa de ...
P: vidro?
R: é, de vidraceiro eu até fiz uma brincadeira com um colega a de ‘o cara estava fazendo um bicozinho para ganhar um dinheirinho, aí ele se acidentou’ aí ele pegou, chamou a polícia, porque achou suspeito aí pegaram e levaram para fazer exame no laboratório. Depois eles voltaram a me disseram que era
P: que era o que?
R: droga. Aí eles ficaram falando com o senhor Francisco das Chagas e eu fui cuidar dos meus afazeres
P: quer dizer que na hora em que vocês acharam esse material, já desconfiaram que poderia ser droga?
R: sim
P: quem entregou o material para o PM?
R: e um não sei lhe dizer agora, mais eu acho que foi a enfermeira
P: o senhor lembra a quantidade, se era grande?
R: era um bolo assim Doutor
P: do tamanho de uma bola de futebol de salão?
R: isso” (Fls. 187/189)
Por outro lado, outras testemunhas também indicam o 2º apelante como um dos autores do delito. MARIA APARECIDA LEOCÁDIO DE MENEZES afirma:
“Que estava presente quando os policiais encontraram no quintal da casa ao lado um saco plástico contendo uma massa esbranquiçada aparentando ser pasta base de cocaína. Que diariamente observava que naquela residência, havia movimentação intença(sic) de pessoas, inclusive a maioria dos veículos eram veículos novos. Que; os moradores da casa nunca saiam por muito tempo, eram sempre saídas rápidas.” (fl. 13)
“P: a senhora estava presente na hora que ele foi preso?
R: tava.
P: a senhora estava aonde?
R: eu estava na minha casa quando eu ouvi o tiroteio, então eu corri para ver minha mãe que morava na frente e eles estavam lá, prenderam eles, eu estava só presenciando de longe, mas eles foram na casa da minha mãe perguntar se podia presenciar a busca. Disse que podia ir, aí eu fui, acompanhei eles e outro vizinho ao lado.
P: que vizinho?
R: não sei o nome dele, mora na mesma rua que eu tava morando, na S-18, não sei o nome dele, que eu não conheço também. Então na busca lá eu presenciei a busca deles. Foram no quarto, averiguar as coisas que acharam, balde com cheiro da droga, um jornal, um saco e uma balança, e por fim, saíram da casa, a vizinha achou uma droga do lado da casa dela, uma bolsa azul, aí me chamaram para presenciar a droga, foi isso que eu vi.
P: que droga era?
R: eu não conheço
P: sim, mas era mato, que é maconha, ou era pasta?
R: pó.
P: há era pó? (sic)
R: acho que era pó, num saco, eu não sei bem, não conheço.
P: era grande a quantidade, assim tipo meio quilo, um quilo?
R: eles disseram que parece que era dois quilos, assim o policial falou.
P: pela quantidade, a senhora lembra, imagine assim um saco de açúcar?
R: acho que era isso mais ou menos.
P: um quilo, dois quilos?
R: acho que era dois quilos
(...)
P: qual foi a reação do acusado, o que ele disse?
R: aí realmente ele disse que jogou porque viu o carro da polícia rondando, aí jogou ao lado da casa da vizinha.
P: ele disse que era dele?
R: ele confessou depois que era dele, que ele jogou.
P: ele disse pra que era essa droga?
R: não, porque eu saí da casa, ficou os policiais lá com eles.
P: a senhora viu quando ele disse que era dele a droga?
R: disse que era dele.
P: e disse que jogou porque a polícia tinha chegado?
R: disse que jogou porque a polícia tinha chegado.
(...)
P: Dona Maria Aparecida, a senhora presenciou, chegou a presenciar movimento de pessoas intenso nessa casa?
R: sim, todo dia tinha vários carro na frente, moto, que até caminhão chegava de madrugada, chegava lá.
(...)
P: o juiz já perguntou u vou repetir, depois que foi encontrado esse pacote de droga ele afirmou que era dele?
R: isso
P: e ele disse que havia jogado essa droga lá por qual razão?
R: porque o carro da polícia vinha rondando por duas vezes, achou que o carro era da polícia e jogou a droga ao lado da casa da vizinha.” (Fls. 183/186)
Temos, ainda, os depoimentos dos policiais que participaram das diligências. O Policial Civil SÉRGIO RENATO BORBA JESUS JÚNIOR afirma:
“Que; ao chegar na DRE fiquei sabendo que tinha um homem preso com um kilo de substância entorpecente. Que; por volta das 12:00 horas, juntamente com os Del Temais Siqueira e Daniel Ferreira, iniciou-se uma busca nos bairro da cidade tentando encontrar a casa do possível fornecedor da droga apreendida. Que; aproximadamente 13:00, eu, os Del. Temair, Daniel e o Ag. Máximo, adentramos no quintal de uma residência localizada na Rua S-18, no bairro Santa Luzia, pois segundo informações ali morava o fornecedor da droga que fora vendida para o homem que havia sido preso anteriormente. Que; após toda as pessoas serem rendidas, na companhia de duas testemunhas do povo, iniciamos uma busca na casa, onde em dos quartos da casa foi encontrada uma lixeira de cor amarela, dentro da qual, havia uma folha de jornal toda manchada com um líquido amarelo, com um odor característico de pasta base de cocaína. Que; foi encontrada também na cozinha uma balança com capacidade de 10kg e uma peneira pequena. Que; fui chamado pelo vizinho da casa onde estavamos, para que verifica algo que havia sido encontrado em seu quintal. Que; ao chegar no local, juntamente com o Del. Temair e duas testemunhas do povo, encontramos um saco plástico de cor verde contendo dentro uma substância pastosa de cor branca, com forte odor, aparentando ser pasta base de cocaína. Que; após indagar do Sr. Fábio sobre a substância encontrada, ele confessou que havia jogado o saco por cima do muro, pois tinha visto o carro da polícia passar em frente a sua casa. Que; imediatamente foi dada voz de prisão ao Sr. Fábio.” (Fl. 06)
“P: o senhor lembra do que? Qual foi o evento que o senhor lembra deles?
R: o senhor Francisco nos foi trazido pela PM, lá do hospital geral, que de acordo com eles havia sido encontrado aproximadamente um quilo de pasta base de cocaína junto com ele.
(...)
P: e depois, o que vocês fizeram?
R: o nosso interesse era saber onde ele havia adquirido. Depois que nós verificamos o nome dele aí nós fomos perceber que ele já era um indivíduo já conhecido no bairro Caetano Filho, no Beiral, justamente pelo tráfico, havia algumas investigações sobre ele, se eu não me engano, e nós indagamos sobre a questão de onde ele havia conseguido a droga. Ele ficou relutante de onde havia conseguido a droga, ficou receoso, talvez por causa das condições em que ele se encontrava e só nos comentou que tinha sido no Pintolândia. E nós perguntamos em que Pintolândia havia sido, porque os bairros pintolândia eles se subdividiram em outros nomes, e ele disse que tinha sido no Santa Luzia. E o delegado havia dito que havia um local no Santa Luzia, específico, que já havia sido investigado, que eu não faço parte da equipe de investigação, só do setor de operações e que provavelmente poderia ser aquele local. Nós nos deslocamos até lá, chagamos lá na frente, perguntamos se era lá o local, ele falou que não era.
P: o Francisco foi com vocês?
R: sr. Francisco. Aí o delegado falou o seguinte pra ele, que a gente poderia descer com ele do carro e perguntar de alguns vizinhos se conheciam ele. Ele ficou nervoso, disse que não era pra nós fazermos isso se não iam matar ele. Aí tudo deu a indicar que seria ali mesmo. Retornamos para a delegacia, deixamos o sr. Francisco e voltamos a residência.
P: que residência?
R: na residência do sr. Fábio.
(...)
“começamos a fazer o procedimento de busca dentro do quarto do sr. Fábio, de acordo com ele era quarto dele. Eu encontrei um cesto de roupa de bebê, cestinho amarelo, com jornal, tava molhado, úmido, e o odor que ele exalava era de pasta base de cocaína, era característico, só que não havia o produto.
(...)
P: depois que encontrou esse jornal úmido?
R: tá, aí começamos a fazer a busca, encontramos uma balança, achamos uma peneira e não achamos o produto, isso acompanhados de duas testemunhas do povo, que residiam lá perto. (...) e como estávamos encerrando a busca o vizinho da casa do sr. Fábio, olhando de frente, o vizinho do lado direito, nos chamou, pediu que nós fôssemos até o quintal da residência dele, aí nós fomos, a testemunha nos acompanhando, lá encontramos uma sacolinha de bebê e ao lado uma substância pastosa, que pelas características e pelo odor aparentava ser pasta base de cocaína.
P: qual a quantidade, o senhor lembra?
R: depois foi constatado que era, se não me engano, novecentos e poucas gramas ou um quilo, mais ou menos um quilo de pasta base de cocaína.
(...)
P: a reação do Fábio, ele falou se a droga era dele ou não?
R: quando nós pegamos e indagamos de quem era a droga, ele ficou nervoso e o irmão dele ficou nervoso também ele falou '‘não, a droga é minha, eu vi quando vocês passaram com a viatura aí na frente, corri lá dentro, coloquei na bolsa e joguei do outro lado...” (Fls. 167/173)
Ademais, a alegação de que os depoimentos dos policias não podem ser considerados não merece prosperar, posto que tais depoimentos são uniformes e coerentes, descrevendo os fatos e a investigação e, ainda, as circunstâncias da apreensão da droga.
Convém ressaltar que, estes depoimentos passaram pelo crivo do contraditório, foram corroborados por outros elementos de prova e, ainda, têm plena eficácia probatória, visto que partem de pessoas presumidamente idôneas, foram prestados sob o compromisso de dizerem a verdade e não há nos autos nada que indique a existência de interesse escuso dos policiais na condenação dos ora apelantes que venha a ter o condão de infirmar a idoneidade ou veracidade de seus testemunhos.
É o entendimento da jurisprudência pátria:
“TÓXICOS. TRÁFICO. AGENTE PRESO EM FLAGRANTE GUARDANDO EM SUA RESIDÊNCIA SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES DIVIDIDAS EM DOSES UNITÁRIAS. DELITO CARACTERIZADO. PROVA. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL. RETRATAÇÃO. DEPOIMENTO POLICIAL. VALIDADE.
- (...).
- É iterativa a jurisprudência de nossos tribunais no sentido de que os policiais, civis ou militares, mormente os que se encontravam no momento e no lugar do crime, não estão impedidos de depor, pois não podem ser considerados inidôneos ou suspeitos, pela simples condição funcional .
- Recurso conhecido e improvido.” (TJMG – 1ª Câmara Criminal, Apelação Crime 1.0024.05.707546-7/001, Rel. Des. Gudesteu Biber, j. 19.12.2005, v.u., negaram provimento, DJ 13.1.2006)
Assim, a alegação de insuficiência de provas não pode subsistir diante do exame do conjunto probatório produzido na fase inquisitorial e durante a instrução processual, que deixa evidente que os apelantes cometeram o delito pelo qual foram condenados, não podendo ser operada a desclassificação pretendida pelo 1º apelante nem a absolvição pretendida pelo 2º apelante.
Ressalte-se ainda, que a alegação de que não houve valoração das provas apresentadas pela defesa não merece prosperar, pois vigora no processo penal brasileiro o Princípio do Livre Convencimento, segundo o qual o Juiz forma a sua convicção pela livre apreciação das provas, significando que o juiz é soberano na análise das provas produzidas durante o processo, tendo a faculdade de formar livremente a sua convicção acerca dos fatos e do direito, atribuindo valor às provas e, ao final, decidir de acordo com seu convencimento.
Neste sentido:
“PENAL E PROCESSO PENAL. ESTUPRO. SISTEMA DA LIVRE APRECIAÇÃO DE PROVAS. AUSÊNCIA DE DEPOIMENTO DA VÍTIMA. CRIME COMPROVADO POR TESTEMUNHA E LAUDO PERICIAL. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. O juiz forma a sua convicção pela livre apreciação d aprova. Não fica adstrito a critérios valorativos e apriorísticos e é livre na sua escolha, aceitação e valoração. (Doutrina)
2. (...)
3. Embargos conhecidos e improvidos.” (TJDFT – Câmara Criminal, Emb.Infr.Crim. nº 20020710047414, Rel. Des. Nilsoni de Freitas, j. 05.10.2005, negaram provimento, unânime, DJU 20.04.2006, p. 162)
“FURTO. NEGATIVA DE AUTORIA. APREENSÃO DA RES FURTIVA NA POSSE DO AGENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA.
(...)
Vigorando no processo penal brasileiro o Princípio do Livre Convencimento, segundo o qual o Juiz forma a sua convicção pela livre apreciação da prova, não há por que desprezar os depoimentos da fase policial, que, colhidos no calor dos acontecimentos e sendo, portanto, mais ricos em detalhes, mostram-se aptos a embasar o decreto condenatório, mormente quando se harmonizam com a prova colhida na fase judicial.
Recurso improvido.” (TJMG – 5ª Câmara Criminal, ApCr. Nº 2.0000.00.511347-5, Rel. Des. Antônio Armando dos Anjos, j. 10.01.2006, negaram provimento, unânime, DJ 25.02.2006)
No que pertine à fixação da pena base do 2º apelante, entendo que a mesma deve ser reduzida posto que o 2º apelante é primário e possui bons antecedentes. No entanto, não se pode olvidar que sua conduta é reprovável e nociva à sociedade e, ainda, que foi preso com uma grande quantidade de substância entorpecente, razão pela qual fixo a pena base em 04(quatro) anos de reclusão e 66(sessenta e seis) dias-multa.
Quanto à causa de aumento relativa à associação eventual, prevista no art. 18, inciso III, da Lei nº 6.368/76, verifica-se que a nova Lei Antitóxicos (Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, que entrou em vigor no dia 08.10.2006), não prevê mais a referida causa de aumento de pena, assim como também não criou qualquer tipo penal correspondente.
Dessa forma, ocorreu, quanto à referida causa de aumento, abolição pela lei nova, cuidando-se, nesse caso, de novatio legis in mellius. Assim, necessária aplicação retroativa, que, quando ocorre, beneficia o agente, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal.
Neste sentido:
“TRÁFICO. PORTE DE ARMA ILEGAL. NULIDADES. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. FACULDADE DO AUTUADO. CONDENAÇÃO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROVA SEGURA DA PROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO. DEPOIMENTO DE POLICIAL. VALOR PROBANTE. CONCURSO FORMAL. NÃO OCORRÊNCIA. PENA. REDUÇÃO. CABIMENTO. LEI 11.343/03. NOVA LEI DE TÓXICOS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA REFERENTE À ASSOCIAÇÃO EVENTUAL. DECOTAÇÃO.POSSIBILIDADE. REDUÇÃO DA PENA. REGIME PRISIONAL INICIALMENTE FECHADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
A pena prevista no art. 18, III, da Lei nº 6.368/76, deverá ser decotada da condenação, já que entrou em vigor, no dia 08 de outubro de 2006, a nova Lei de Tóxicos (Lei nº 11.343/06) que, expressamente, revogou as Leis nºs 6.368/76 e 10.409/02, não prevendo tal figura delitiva”. (TJMG – 2ª Câmara Criminal, ApCr nº 1.0024.06.995603-5, Rel. Des. José Antonino Baía Borges, j. 22.03.2007, rejeitaram as preliminares e deram parcial provimento, unânime, DJ 13.04.2007)
Diante disso, excluo das penas dos apelantes a causa de aumento aplicada com base no revogado inciso III, do artigo 18, da lei nº 6.368/76, tornando definitiva em 8(anos) anos de reclusão e 133(cento e trinta e três) dias-multa a pena do 1º Apelante FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA e em 04(quatro) anos de reclusão e 66(sessenta e seis) dias-multa a pena do 2º Apelante, FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS.
No que pertine ao regime de cumprimento, ainda que se trate de crime hediondo, com o advento da Lei nº 11.464, de 28 de março de 2007, que alterou o art. 2º da Lei nº 8.072/90, a pena aplicada deve ser cumprida inicialmente no regime fechado e não integralmente no regime fechado, como estipulou a sentença a quo. Tratando-se, nesse caso, também, de novatio legis in mellius, com aplicação retroativa, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal. Entretanto, cumpre ressaltar que caberá ao juízo das execuções penais analisar os pedidos de progressão do regime prisional considerando o comportamento da cada condenado e o preenchimento dos demais requisitos necessários.
Do exposto, em consonância com o Parecer Ministerial, conheço e dou parcial provimento aos presentes recursos, alterando a sentença monocrática somente no que pertine à pena e ao seu regime de cumprimento.
É como voto.
Boa Vista (RR), 24 de julho de 2007.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
- Relator -
CÂMARA ÚNICA
TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 001005004638-1
1º APELANTE: FRANCISCO DAS CHAGAS SANTOS SILVA
ADVOGADO: EDNALDO GOMES VIDAL
2º APELANTE: FÁBIO RIBEIRO DOS SANTOS
DEFENSORA PÚBLICA: TEREZINHA MUNIZ
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
PROMOTOR DE JUSTIÇA: ISAIAS MONTANARI JÚNIOR
RELATOR: DES. LUPERCINO NOGUEIRA
EMENTA
APELAÇÃO CRIME. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR NÃO ACOLHIDA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CONFIGURAÇÃO. CONJUNTO PROBATÓRIO SEGURO. ABSOLVIÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. VALIDADE. PROVAS. VALORAÇÃO. “PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO”. ART. 18, III, DA LEI Nº 6.368/76. NOVATIO “LEGIS IN MELLIUS”. LEI Nº 11.343/2006. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. PROGRESSÃO.
1. Não se traduz em cerceamento de defesa, o fato do réu ter sido denunciado por uma capitulação legal e condenado por outra, uma vez que ele se defende os fatos narrados na denúncia e não da sua classificação legal. Preliminar rejeitada.
2. Para a caracterização do crime do art. 12 da Lei 6.368/76, basta que o agente pratique qualquer dos 18 (dezoito) núcleos verbais do tipo misto alternativo. Não há necessidade da prática de um efetivo ato de comércio, necessário apenas que o agente traga consigo ou guarde a substância entorpecente para incorrer na reprimenda fixada para o tipo.
3. Diante do conjunto probatório robusto, produzido tanto na fase inquisitorial quanto na judicial, incabível a absolvição e desclassificação pretendidas.
4. Os depoimentos dos policiais têm plena eficácia probatória, principalmente se corroborados por outros elementos de prova.
5. No Processo Penal brasileiro vigora o Princípio do Livre Convencimento, segundo o qual o Juiz forma a sua convicção pela livre apreciação das provas, significando que o juiz é soberano na análise das provas produzidas durante o processo, tendo a faculdade de formar livremente a sua convicção acerca dos fatos e do direito, atribuindo valor às provas e, ao final, decidir de acordo com seu convencimento, não podendo se falar em ausência de valoração das provas apresentadas pela defesa.
6. A pena base deve ser reduzida, diante da primariedade e dos bons antecedentes do apelante, porém, não se pode olvidar que sua conduta é reprovável e nociva à sociedade e, ainda, que foi preso com uma grande quantidade de substância entorpecente, razão pela qual deve ser fixada um pouco acima do mínimo.
7. A causa de aumento relativa à associação eventual, prevista no art. 18, inciso III, da Lei nº 6.368/76, foi abolida pela nova lei Antitóxicos, a Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, que entrou em vigor no dia 08.10.2006, que também não criou qualquer tipo penal correspondente. Cuidando-se, nesse caso, de novatio legis in mellius, que tem aplicação retroativa, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal, a referida majorante deve ser decotada das penas impostas aos acusados.
8. Com o advento da Lei nº 11.464, de 28 de março de 2007, que alterou o art. 2º da Lei nº 8.072/90, a pena aplicada aos crimes hediondos ou a eles equiparados, deve ser cumprida inicialmente no regime fechado. Tratando-se, nesse caso, também, de novatio legis in mellius, tem aplicação retroativa, nos termos do artigo 2º do Código Penal e do art. 5º, XL, da Constituição Federal.
9. Recursos parcialmente providos.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 001005004638-1, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Turma Criminal da Colenda Câmara Única do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade e em consonância com o douto parecer Ministerial, em conhecer e dar parcial provimento aos presentes recursos, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte deste Julgado.
Sala das Sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos vinte e quatro dias do mês de julho do ano de dois mil e sete.
Des. CARLOS HENRIQUES
- Presidente -
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
- Relator -
Juiz Convocado ERICK LINHARES
- Julgador -
Esteve presente: Dr(ª).______________________________
- Procurador(a) de Justiça –
Publicado no Diário do Poder Judiciário, Boa Vista-RR, 10 de Agosto de 2007, ANO X - EDIÇÃO 3664, p. 03.
( : 24/07/2007 ,
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Data do Julgamento
:
24/07/2007
Data da Publicação
:
10/08/2007
Classe/Assunto
:
Apelação Criminal )
Relator(a)
:
DES. LUPERCINO DE SA NOGUEIRA FILHO
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