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Jurisprudência


TJRR 10060053527

Ementa
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N.º 0010.06.005352-7 / BOA VISTA. 1.º Recorrente / 2.º Recorrido: Ministério Público de Roraima. 2.º Recorrente / 1.º Recorrido: Zacarias Gondim Lins Neto de Andrade Castelo Branco. Advogada: Marlene Moreira Elias. Relator: Des. Lupercino Nogueira. RELATÓRIO Tratam os autos de recursos em sentido estrito, interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA (fls. 184/190) e por ZACARIAS GONDIM LINS NETO DE ANDRADE CASTELO BRANCO (fls. 202/211), contra a r. sentença de fls. 178/183, da lavra do MM. Juiz de Direito da 1.ª Vara Criminal, que pronunciou o 2.º recorrente como incurso no art. 121, caput, c/c o art. 14, II, ambos do CP. Alega o 1.º recorrente, em síntese, que a qualificadora do recurso que dificultou a defesa do ofendido (art. 121, § 2.º, IV, do CP), não poderia ter sido afastada pelo juízo monocrático, pois compete ao Conselho de Sentença decidir sobre sua viabilidade. O 2.º recorrente, por sua vez, sustenta que não teve intenção de matar a vítima, pois houve apenas um desentendimento entre ex-sócios. Aduz, outrossim, que a vítima não tem interesse na punição do acusado. Requer, assim, a reforma do decisum, a fim de obter a absolvição sumária ou a desclassificação do crime para lesão corporal culposa ou, ainda, o reconhecimento da prescrição antecipada. Foram apresentadas as respectivas contra-razões (fls. 192/198 e 213/219). Na fase de retratação, o juízo monocrático manteve a decisão resistida (fl. 220). Em parecer de fls. 232/239, opina a douta Procuradoria de Justiça pelo provimento do primeiro recurso e improvimento do segundo. É o relatório. Designe-se data para julgamento. Boa Vista, 24 de agosto de 2010. Des. LUPERCINO NOGUEIRA Relator CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N.º 0010.06.005352-7 / BOA VISTA. 1.º Recorrente / 2.º Recorrido: Ministério Público de Roraima. 2.º Recorrente / 1.º Recorrido: Zacarias Gondim Lins Neto de Andrade Castelo Branco. Advogada: Marlene Moreira Elias. Relator: Des. Lupercino Nogueira. VOTO O 1.º recurso, interposto pelo Parquet, deve prosperar. Sabe-se que as qualificadoras só podem ser excluídas da sentença de pronúncia quando, de forma incontroversa, mostrarem-se absolutamente improcedentes, o que não ocorre no presente caso. Com efeito, há indícios da existência da qualificadora do art. 121, § 2.º, IV, do CP (recurso que dificultou a defesa do ofendido), pois, conforme depoimento da testemunha José Gazineu de Souza, a vítima foi atingida por disparo de arma de fogo, dentro do seu veículo, quando se afastava do local onde ocorreu a discussão com o acusado (fls. 128/130). Em caso semelhante, o TJDF assim decidiu: “RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - SENTENÇA DE PRONÚNCIA - TENTATIVA DE HOMICÍDIO - DISPAROS DE ARMA DE FOGO CONTRA A VÍTIMA - RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA QUE TERIA SIDO SURPREENDIDA COM OS DISPAROS DENTRO DE SEU VEÍCULO QUANDO SE AFASTAVA DO LOCAL ONDE OCORREU A DISCUSSÃO - QUALIFICADORA EXCLUÍDA NA PRONÚNCIA AO ENTENDIMENTO DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU DE QUE A VÍTIMA NÃO FOI SURPREENDIDA - PEDIDO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA QUE A QUALIFICADORA SEJA INCLUÍDA NA PRONÚNCIA - DÚVIDA SOBRE A ALEGAÇÃO DE QUE A VÍTIMA NÃO FOI SURPREENDIDA PELO RÉU - COMPETÊNCIA DO CONSELHO DE SENTENÇA - IN DUBIO PRO SOCIETATE. 1. Estando a materialidade suficientemente demonstrada e havendo indício de autoria, impõe-se o pronunciamento do réu para que seja submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri. 2. Somente quando cabalmente demonstrada a inexistência de qualificadora, permite-se a sua exclusão na sentença de pronúncia. Havendo duas versões acerca da existência da qualificadora contida no inciso IV do § 2º do art. 121 do Código Penal, uma de que a vítima teria sido surpreendida pelo réu com os disparos de arma de fogo, e outra do réu, de que teria atirado apenas para assustar a vítima, não a surpreendendo com os disparos, a dúvida deve ser levada ao conselho de sentença, juiz natural da causa, que decidirá qual das versões lhe parece mais verossímil. Havendo, pois, dúvida, esta deverá ser dirimida pelo júri popular, porque na fase do juízo de admissibilidade da acusação impera o princípio in dubio pro societate e não o princípio in dubio pro reo. 3. Recurso conhecido e provido para determinar a inclusão na sentença de pronúncia da qualificadora prevista no inciso IV do § 2º do art. 121 do Código Penal.” (TJDF, RSE 20050310065502, 1.ª Turma Criminal, Rel. Des. Roberval Casemiro Belinati, j. 15.02.2007, DJU 11.04.2007, p. 102). Aliás, vale repisar que não se cuida, no momento, de decisão condenatória, mas de mero juízo de admissibilidade da acusação, vigorando o princípio in dubio pro societate. Assim, é necessário verificar apenas se a acusação é viável, deixando o exame mais acurado para o Júri Popular, juiz natural para apreciação dos crimes dolosos contra a vida. Nesse sentido: “RECURSO ESPECIAL - PROCESSO PENAL - HOMICÍDIO QUALIFICADO - PRONÚNCIA - EXCLUSÃO DE QUALIFICADORAS - VALORAÇÃO DAS PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI - RECURSO PROVIDO. 1. A exclusão das qualificadoras, na pronúncia, somente pode ocorrer quando se verificar, de plano, sua improcedência, sendo vedado nessa fase valorar as provas para afastar a imputação concretamente apresentada pela acusação, sob pena de se usurpar a competência do juiz natural da causa, o Tribunal do Júri. 2. Recurso provido.” (STJ, REsp. 472754/ DF, 6.ª Turma, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 24.11.2004, DJ 01.07.2005, p. 646). Por outro lado, o 2.º recurso, interposto pela defesa, não merece ser provido. Com efeito, a desclassificação, por ocasião do judicium accusationis, só pode ocorrer quando o seu suporte fático for detectável de plano e isento de polêmica relevante, o que não ocorre no presente caso. A materialidade está consubstanciada no laudo de exame de corpo de delito (fl. 17) e no auto de apresentação e apreensão da arma de fogo (fl. 12). Os indícios de autoria, por sua vez, emergem não só do interrogatório do recorrente na polícia, onde admitiu que “chegou a disparar dois tiros de revólver contra a pessoa de Claumildes Filgueira de Vasconcelos” (fl. 13), mas também das declarações da vítima, conforme se extrai do seguinte excerto: “(...) logo que chegou no estabelecimento procurou um garçom e nesse momento foi empurrado pelo acusado (...) saiu do restaurante para evitar qualquer problema (...) foi apanhado de surpresa com os disparos pois estava dentro do carro com os vidros fechados; (...).” (Claumilde Filgueira de Vasconcelos, fl. 84). Desta forma, vê-se que inexiste, no caso vertente, certeza de que o animus do recorrente não estava dirigido a ceifar a vida da vítima, requisito imprescindível para a desclassificação pretendida. Assim, correta a pronúncia do acusado, visto que o questionamento sobre a intenção do agente é matéria diretamente ligada ao meritum causae, e, sendo assim, o juízo a ser formulado a esse respeito é de inteira competência do Tribunal do Júri, conforme esclarece a jurisprudência: “RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – HOMICÍDIO QUALIFICADO. 1. Para a pronúncia do réu, basta a prova da existência do crime e indícios de autoria, o que restou configurado pelos depoimentos prestados em juízo pelas testemunhas, pela vítima e pelo próprio acusado, sendo que a intenção de matar deve ser apreciada pelo Júri. 2. Negou-se provimento ao recurso em sentido estrito.” (TJDF, RSE 20010210027559, 2.ª T. Crim., Rel. Des. Sérgio Rocha, j. 02.02.2006, DJ 19.07.2006, p. 109). “RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO – DESCLASSIFICAÇÃO – LESÃO CORPORAL – IMPOSSIBILIDADE. I. O decreto de pronúncia é incensurável, na medida em que está devidamente comprovada a materialidade do delito e há indícios suficientes da autoria, devendo as dúvidas acaso existentes, mormente quanto à existência do animus necandi, ser apreciadas pelo conselho de sentença, juiz natural da causa. II. Negou-se provimento. Unânime.” (TJDF, RSE 20050410016262, 2.ª T. Crim., Rel. Des. José Divino, j. 22.06.2006, DJ 25.10.2006, p. 99). Destarte, havendo lastro probatório mínimo a amparar a acusação, não há como acolher a pretensão defensiva para absolver sumariamente o acusado ou desclassificar o delito, inexistindo, ainda, qualquer violação aos dispositivos legais mencionados, a título de prequestionamento, nas razões recursais (fl. 210). Por derradeiro, cabe ressaltar que a jurisprudência do STJ e do STF já firmou o entendimento de que não se admite o reconhecimento da prescrição pela pena em perspectiva (prescrição antecipada) tendo em vista que não existe norma legal que a autorize, conforme se extrai do julgado abaixo: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL. PRESCRIÇÃO COM BASE NA PENA EM PERSPECTIVA. INADMISSIBILIDADE. 1. Conforme salientado na decisão agravada, este Superior Tribunal de Justiça e o Excelso Pretório firmaram compreensão no sentido de que é inadmissível o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal com base na pena hipoteticamente calculada, a denominada prescrição em perspectiva, por ausência de previsão legal. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg no REsp 1124737/PR, Rel. Min. Og Fernandes, 6.ª Turma, j. em 18/02/2010, DJe 08/03/2010). Nesse sentido a recente Súmula 438 do STJ: “É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal”. ISTO POSTO, em consonância com o parecer ministerial, dou provimento ao primeiro apelo (acusação), para incluir na pronúncia a qualificadora prevista no art. 121, § 2.º, IV (recurso que dificultou a defesa do ofendido), do CP, e nego provimento ao segundo recurso (defesa). É como voto. Boa Vista, 31 de agosto de 2010. Des. LUPERCINO NOGUEIRA Relator CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N.º 0010.06.005352-7 / BOA VISTA. 1.º Recorrente / 2.º Recorrido: Ministério Público de Roraima. 2.º Recorrente / 1.º Recorrido: Zacarias Gondim Lins Neto de Andrade Castelo Branco. Advogada: Marlene Moreira Elias. Relator: Des. Lupercino Nogueira. RECURSOS EM SENTIDO ESTRITO – TENTATIVA DE HOMICÍDIO SIMPLES – QUALIFICADORA EXCLUÍDA DA PRONÚNCIA – IMPOSSIBILIDADE – COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI – DESCLASSIFICAÇÃO OU ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA – INADMISSIBILIDADE – VIABILIDADE DA ACUSAÇÃO – PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO “IN DUBIO PRO SOCIETATE” – RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO ANTECIPADA – DESCABIMENTO – SÚMULA 438 DO STJ. 1. As qualificadoras só podem ser excluídas da sentença de pronúncia quando, de forma incontroversa, mostrarem-se absolutamente improcedentes. 2. A desclassificação, por ocasião do judicium accusationis, só pode ocorrer quando o seu suporte fático for detectável de plano e isento de polêmica relevante. Deve prevalecer, na espécie, o princípio in dubio pro societate. 3. O questionamento sobre a intenção do agente é matéria diretamente ligada ao mérito da causa, e, sendo assim, o juízo a ser formulado a esse respeito é de inteira competência do Tribunal do Júri. 4. É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal (Súmula 438 do STJ). 5. Recurso do Parquet provido e o da defesa improvido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Câmara Única – Turma Criminal, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, por unanimidade, em harmonia com o parecer ministerial, em dar provimento ao primeiro recurso e negar provimento ao segundo, nos termos do voto do Relator. Sala das Sessões, em Boa Vista, 31 de agosto de 2010. Des. LUPERCINO NOGUEIRA Presidente Interino e Relator Des. RICARDO OLIVEIRA Revisor Dra. GRACIETE SOTTO MAYOR RIBEIRO Juíza Convocada Esteve presente: Dr.(a) .............................................. Procurador(a) de Justiça Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4390, Boa Vista, 3 de setembro de 2010, p. 018. ( : 31/08/2010 , : XIII , : 18 ,

Data do Julgamento : 31/08/2010
Data da Publicação : 03/09/2010
Classe/Assunto : Recurso em Sentido Estrito )
Relator(a) : DES. LUPERCINO DE SA NOGUEIRA FILHO
Tipo : Acórdão
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