TJRR 10060054392
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0010.06.005439-2 / BOA VISTA.
Apelante: Antonio Pereira da Gama.
Defensora Pública: Terezinha Muniz.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Lupercino Nogueira.
RELATÓRIO
Trata-se de apelação (fl. 234), interposta por ANTONIO PEREIRA DA GAMA, contra a r. sentença de fls. 211/230, da lavra do MM. Juiz de Direito da 2.ª Vara Criminal, que o condenou a 04 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, por infração ao art. 12, caput, da então vigente Lei n.º 6.368/76, e art. 180 do CP, em concurso material.
O apelante, em razões de fls. 249/268, alega, em síntese, que sua condenação baseou-se unicamente nos depoimentos dos policiais que efetuaram o flagrante, em detrimento das demais provas produzidas.
Sustenta, ainda, que “ao longo da instrução processual, não restou suficientemente provado que a substância entorpecente apreendida em razão dos fatos narrados na Exordial Acusatória, estivesse sendo mantida em depósito por este, bem como, também, que o mesmo tivesse receptado o bem furtado por Eliezer Pereira da Silva.”
Por fim, assevera que, por ser pobre na forma da lei, não possui condições de efetuar o pagamento das custas processuais.
Requer, assim, a reforma da sentença, a fim de obter a absolvição, com base no princípio “in dubio pro reo”, bem como o deferimento do benefício da Justiça Gratuita.
Em contra-razões (fls. 270/274), o apelado defende o acerto do decisum guerreado, pugnando, ao final, por sua manutenção.
Em parecer de fls. 238/244, opina o Ministério Público de 2.° grau pelo improvimento do recurso.
É o relatório.
À douta revisão regimental.
Boa Vista, 24 de agosto de 2010.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0010.06.005439-2 / BOA VISTA.
Apelante: Antonio Pereira da Gama.
Defensora Pública: Terezinha Muniz.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Lupercino Nogueira.
VOTO
Não merece acolhida o pleito absolutório formulado.
Com efeito, a materialidade e autoria dos delitos de tráfico de entorpecentes e receptação restaram amplamente demonstradas.
Extrai-se dos autos que, após realizarem investigações sobre o furto de uma televisão, policiais civis lograram êxito em localizar a residência do principal suspeito, Eliezer Pereira da Silva.
Efetuada a abordagem do mesmo, foram apreendias, em seu poder, 13 (treze) trouxinhas de maconha. Questionado sobre a televisão furtada e sobre a origem da droga, Eliezer afirmou que havia trocado, com o apelante, a televisão pela maconha (fl. 13).
Assim, os agentes de polícia se dirigiram à residência do apelante, onde foi encontrada a televisão furtada e 05 (cinco) invólucros de substância entorpecente, perfazendo 69,8 g (sessenta e nove gramas e oito decigramas) de maconha (fls. 21, 23, 26/29 e 80/82).
Os depoimentos dos policiais que efetuaram o flagrante, mostram-se coerentes e harmônicos em todas as fases do processo, não deixando dúvidas a respeito dos delitos praticados (fls.140/145).
Tais depoimentos revestem-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-los apenas pelo fato de emanarem de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal.
O testemunho do agente policial somente não terá valor quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente, ou quando se demonstrar – tal como ocorre com qualquer testemunha – que seu depoimento não encontra suporte nem se harmoniza com outros elementos probatórios, o que, in casu, não acontece.
Nesse sentido:
“APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA SUSTENTAR O DECRETO CONDENATÓRIO – VALIDADE DOS DEPOIMENTOS DE POLICIAIS – NEGATIVA DA RÉ, EM DETRIMENTO DOS DEMAIS ELEMENTOS DOS AUTOS – INADMISSIBILIDADE – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS – DESCABIMENTO.
1. Não há que se falar em insuficiência de provas quando existem testemunhos seguros a respeito do comércio de substância entorpecente, principalmente quando corroborados pelos demais elementos de convicção.
2. Os depoimentos de policiais constituem prova idônea para sustentar a condenação, especialmente quando em consonância com o conjunto probatório.
3. Admitir a simples negativa da ré, em detrimento de um tal cabedal de provas, seria menosprezar a lógica, princípio máximo em matéria de dialética probatória e corolário da livre persuasão racional.
(...)
5. Recurso improvido. (TJRR, Ap. Crim. 0010.06.005578-6, Rel. Des. Ricardo Oliveira, j. 05/09/2006, DJ 3449, p.02).
Impende, ainda, ressaltar que tais testemunhos foram corroborados pelas declarações de Jonas Pereira da Gama (fls. 146/147), que presenciou o momento da prisão, bem como o fato de que o próprio apelante assumiu, ao ser flagranteado, a propriedade da droga.
Quanto à televisão, afirmou ter adquirido de Eliezer pela quantia de R$ 60,00 (sessenta reais) e, ao contrário do que alega a defesa, tinha plena ciência de que tal eletrodoméstico era proveniente de furto, já que percebeu que estava sem nota fiscal, motivo que o levou a perguntar se “era fragrante (sic) ainda” (fl. 95).
Não obstante tenha se retratado em juízo, alegando que estava apenas guardando a televisão e a droga para Eliezer – sendo que, quanto esta última, não sabia do que se tratava, visto que estava dentro de um saco –, tal versão não basta para desmerecer a prova produzida durante a instrução.
Sobre o tema:
“PENAL – ROUBO CIRCUNSTANCIADO (ART. 157, § 2.º, INCISOS I E II, DO CÓDIGO PENAL) – AUTORIA – CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL – RETRATAÇÃO – CONTEXTO PROBATÓRIO – IRREGULARIDADE NA APREENSÃO DA RES FURTIVA – FLAGRANTE PRESUMIDO. Não há como prosperar a retratação em juízo quando o contexto no qual se insere torna patente a veracidade das declarações prestadas extrajudicialmente (...).” (TJDF, Ap. Crim. 20050710111157, 1.ª Turma, Rel. Des. Mário Machado, DJU 29/03/2006, p. 77).
“PENAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – CONDENAÇÃO – RECURSO – ABSOLVIÇÃO – CONJUNTO PROBATÓRIO IDÔNEO – NÃO PROVIMENTO. (...) 2. Admitir a simples negativa do réu em detrimento de um tal cabedal de provas seria menosprezar a lógica, princípio máximo em matéria de dialética probatória e corolário da livre persuasão racional. 3. Recurso a que se nega provimento.” (TJDF, Ap. Crim. 20030110839448, 1.ª Turma, Rel. Des. Edson Alfredo Smaniotto, DJU 25/05/2005, p. 49).
Assim, não se pode desprezar as declarações do apelante feitas na polícia, sem que se tenha demonstrado qualquer coação, principalmente quando em harmonia com o conjunto probatório.
No tocante ao regime de cumprimento da reprimenda imposta, merece reforma a sentença.
Isso porque o § 1.º do art. 2.º da Lei n.º 8.072/90, alterado pela Lei n.º 11.464/07, agora permite, expressamente, a concessão da progressão de regime.
Nesse sentido:
“HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO. ABSOLVIÇÃO EM PRIMEIRO GRAU. CONDENAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. PENA TOTAL: 20 ANOS DE RECLUSÃO. REGIME INTEGRALMENTE FECHADO. ALEGAÇÃO DE INOCÊNCIA. IMPROPRIEDADE DO MANDAMUS. POSSIBILIDADE DE PROGRESSÃO DE REGIME PARA CONDENADOS POR CRIME HEDIONDO. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA. HC CONCEDIDO, DE OFÍCIO, TÃO-SÓ E APENAS PARA FIXAR O REGIME INICIAL FECHADO PARA O CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE IMPOSTA AO PACIENTE.
(...)
2. O Plenário do colendo Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do HC 82.959-7/SP, decidiu ser inconstitucional o § 1.º do art. 2.º da Lei 8.072/90, que vedava a progressão de regime aos condenados por crimes hediondos. Sob a inspiração dessa decisão, foi editada a Lei 11.464/2007, que alterou o art. 2.º da Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), suprimindo a referida vedação, já declarada inconstitucional, ao fixar o regime inicialmente fechado aos condenados pelo cometimento de tal espécie de crime.
3. Dessa forma, fixado o regime integralmente fechado pelo Tribunal a quo, deve ser concedida a ordem, de ofício, para adequá-lo ao novo regramento legal.
4. Ante o exposto, denega-se a ordem. Concede-se HC, de ofício, apenas e tão-somente para estabelecer o regime inicial fechado para o cumprimento da reprimenda imposta ao paciente, recomendando-se ao Tribunal Estadual que oficie à Defensoria Pública que atua em Contagem/MG, para requerer o que entender de direito em favor do paciente.”
(STJ, HC 134.219/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5.ª Turma, j. em 04/03/2010, DJe 12/04/2010).
Portanto, no caso em exame, o cumprimento da pena privativa de liberdade deve ocorrer inicialmente em regime fechado.
Convém lembrar que, embora tal matéria não tenha sido ventilada especificamente no recurso da defesa (que optou pelo fundamento mais abrangente: a absolvição), é pacífico o entendimento de que a apelação devolve o mérito da ação penal à apreciação pelo Tribunal em sua totalidade e, sendo favorável ao réu, a modificação na sentença pode ser realizada (TJSP, RT 522/323).
Finalmente, quanto ao último ponto impugnado, frise-se que o questionamento cinge-se à condenação em custas processuais, não dizendo respeito à multa imposta cumulativamente à pena restritiva de liberdade.
Com efeito, não cabe aqui o deferimento da Justiça Gratuita, visto que o apelante é assistido pela Defensoria Pública, e portanto, já usufrui os benefícios previstos na Lei n.º 1.060/50.
Conforme jurisprudência pacífica, o réu, ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, deve ser condenado ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do CPP, ficando, contudo, seu pagamento sobrestado enquanto perdurar seu estado de pobreza, pelo prazo de cinco anos, quando então a obrigação estará prescrita, conforme determina o art. 12 da Lei n.º 1.060/50.
Nesse sentido:
“ROUBO CIRCUNSTANCIADO E CRIME DE RESISTÊNCIA - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - EXCLUSÃO DE QUALIFICADORAS DO CRIME DE ROUBO - DESCABIMENTO - DOSIMETRIA DA PENA - AUMENTO POR CONCURSO DE PESSOA E RESTRIÇÃO À LIBERDADE DA VÍTIMA - ALTERAÇÃO DO REGIME - POSSIBILIDADE - CUSTAS PROCESSUAIS - CONDENAÇÃO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
(...)
4) - O beneficiário da justiça gratuita, quando sucumbente, deve ser condenado nas verbas da sucumbência, mas a exigibilidade ficará suspensa enquanto a parte não puder arcar com o pagamento, nos exatos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50.
5) - Recurso conhecido e parcialmente provido.”
(TJDFT, 20090310249455APR, Rel. Des. Luciano Moreira Vasconcellos, 1.ª T. Crim., j. em 10/06/2010, DJ 22/06/2010, p. 186).
Nessa esteira, a isenção somente poderá ser concedida ao réu na fase de execução do julgado, por ser o momento adequado para aferir a real situação financeira do condenado, já que existe a possibilidade de sua alteração após a data da condenação.
Nesse sentido:
“(...) A apuração do estado de miserabilidade jurídica do réu, para fins de isenção do pagamento de custas processuais, deve ser requerida perante o juízo das execuções” (...).
(TJDFT, 20080310244878APR, Rel. Des. Roberval Casemiro Belinati, 2.ª T. Crim., j. em 18/06/2010, DJ 02/07/2010, p. 166).
ISTO POSTO, concordando, em parte, com o parecer ministerial, dou provimento parcial ao recurso, tão-somente para determinar que a pena privativa de liberdade seja cumprida inicialmente em regime fechado, mantendo a sentença em seus demais termos.
É como voto.
Boa Vista, 31 de agosto de 2010.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0010.06.005439-2 / BOA VISTA.
Apelante: Antonio Pereira da Gama.
Defensora Pública: Terezinha Muniz.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Lupercino Nogueira.
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES E RECEPTAÇÃO, EM CONCURSO MATERIAL – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA SUSTENTAR O DECRETO CONDENATÓRIO – VALIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS – RETRATAÇÃO DO RÉU, EM DETRIMENTO DOS DEMAIS ELEMENTOS DOS AUTOS – INADMISSIBILIDADE – DETERMINAÇÃO DE QUE A PENA SEJA CUMPRIDA EM REGIME INTEGRALMENTE FECHADO – IMPOSSIBILIDADE – PAGAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS – BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA – POSSIBILIDADE.
1. Não há que se falar em insuficiência de provas quando existem testemunhos seguros a respeito do depósito da substância entorpecente e do delito de receptação.
2. Os depoimentos de policiais constituem prova idônea para sustentar a condenação, especialmente quando em consonância com o conjunto probatório.
3. Admitir a simples negativa do réu, em detrimento de um tal cabedal de provas, seria menosprezar a lógica, princípio máximo em matéria de dialética probatória e corolário da livre persuasão racional.
4. Diante da nova redação do § 1.º do art. 2.º da Lei n.º 8.072/90, permitindo, expressamente, a progressão, o cumprimento da pena privativa de liberdade deve ocorrer inicialmente em regime fechado.
5. A condição de beneficiário da Justiça Gratuita não isenta o pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do CPP, c/c o art. 12 da Lei n.º 1.060/50.
6. Recurso parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Câmara Única – Turma Criminal, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade, em harmonia parcial com o parecer ministerial, em dar provimento, em parte, à apelação, nos termos do voto do Relator.
Sala das Sessões, em Boa Vista, 31 de agosto de 2010.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
Presidente Interino e Relator
Des. RICARDO OLIVEIRA
Revisor
Dra. GRACIETE SOTTO MAYOR RIBEIRO
Juíza Convocada
Esteve presente:
Dr.(a) ..............................................
Procurador(a) de Justiça
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4390, Boa Vista, 3 de setembro de 2010, p. 005.
( : 31/08/2010 ,
: XIII ,
: 5 ,
Ementa
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0010.06.005439-2 / BOA VISTA.
Apelante: Antonio Pereira da Gama.
Defensora Pública: Terezinha Muniz.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Lupercino Nogueira.
RELATÓRIO
Trata-se de apelação (fl. 234), interposta por ANTONIO PEREIRA DA GAMA, contra a r. sentença de fls. 211/230, da lavra do MM. Juiz de Direito da 2.ª Vara Criminal, que o condenou a 04 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, por infração ao art. 12, caput, da então vigente Lei n.º 6.368/76, e art. 180 do CP, em concurso material.
O apelante, em razões de fls. 249/268, alega, em síntese, que sua condenação baseou-se unicamente nos depoimentos dos policiais que efetuaram o flagrante, em detrimento das demais provas produzidas.
Sustenta, ainda, que “ao longo da instrução processual, não restou suficientemente provado que a substância entorpecente apreendida em razão dos fatos narrados na Exordial Acusatória, estivesse sendo mantida em depósito por este, bem como, também, que o mesmo tivesse receptado o bem furtado por Eliezer Pereira da Silva.”
Por fim, assevera que, por ser pobre na forma da lei, não possui condições de efetuar o pagamento das custas processuais.
Requer, assim, a reforma da sentença, a fim de obter a absolvição, com base no princípio “in dubio pro reo”, bem como o deferimento do benefício da Justiça Gratuita.
Em contra-razões (fls. 270/274), o apelado defende o acerto do decisum guerreado, pugnando, ao final, por sua manutenção.
Em parecer de fls. 238/244, opina o Ministério Público de 2.° grau pelo improvimento do recurso.
É o relatório.
À douta revisão regimental.
Boa Vista, 24 de agosto de 2010.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0010.06.005439-2 / BOA VISTA.
Apelante: Antonio Pereira da Gama.
Defensora Pública: Terezinha Muniz.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Lupercino Nogueira.
VOTO
Não merece acolhida o pleito absolutório formulado.
Com efeito, a materialidade e autoria dos delitos de tráfico de entorpecentes e receptação restaram amplamente demonstradas.
Extrai-se dos autos que, após realizarem investigações sobre o furto de uma televisão, policiais civis lograram êxito em localizar a residência do principal suspeito, Eliezer Pereira da Silva.
Efetuada a abordagem do mesmo, foram apreendias, em seu poder, 13 (treze) trouxinhas de maconha. Questionado sobre a televisão furtada e sobre a origem da droga, Eliezer afirmou que havia trocado, com o apelante, a televisão pela maconha (fl. 13).
Assim, os agentes de polícia se dirigiram à residência do apelante, onde foi encontrada a televisão furtada e 05 (cinco) invólucros de substância entorpecente, perfazendo 69,8 g (sessenta e nove gramas e oito decigramas) de maconha (fls. 21, 23, 26/29 e 80/82).
Os depoimentos dos policiais que efetuaram o flagrante, mostram-se coerentes e harmônicos em todas as fases do processo, não deixando dúvidas a respeito dos delitos praticados (fls.140/145).
Tais depoimentos revestem-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-los apenas pelo fato de emanarem de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal.
O testemunho do agente policial somente não terá valor quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente, ou quando se demonstrar – tal como ocorre com qualquer testemunha – que seu depoimento não encontra suporte nem se harmoniza com outros elementos probatórios, o que, in casu, não acontece.
Nesse sentido:
“APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA SUSTENTAR O DECRETO CONDENATÓRIO – VALIDADE DOS DEPOIMENTOS DE POLICIAIS – NEGATIVA DA RÉ, EM DETRIMENTO DOS DEMAIS ELEMENTOS DOS AUTOS – INADMISSIBILIDADE – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS – DESCABIMENTO.
1. Não há que se falar em insuficiência de provas quando existem testemunhos seguros a respeito do comércio de substância entorpecente, principalmente quando corroborados pelos demais elementos de convicção.
2. Os depoimentos de policiais constituem prova idônea para sustentar a condenação, especialmente quando em consonância com o conjunto probatório.
3. Admitir a simples negativa da ré, em detrimento de um tal cabedal de provas, seria menosprezar a lógica, princípio máximo em matéria de dialética probatória e corolário da livre persuasão racional.
(...)
5. Recurso improvido. (TJRR, Ap. Crim. 0010.06.005578-6, Rel. Des. Ricardo Oliveira, j. 05/09/2006, DJ 3449, p.02).
Impende, ainda, ressaltar que tais testemunhos foram corroborados pelas declarações de Jonas Pereira da Gama (fls. 146/147), que presenciou o momento da prisão, bem como o fato de que o próprio apelante assumiu, ao ser flagranteado, a propriedade da droga.
Quanto à televisão, afirmou ter adquirido de Eliezer pela quantia de R$ 60,00 (sessenta reais) e, ao contrário do que alega a defesa, tinha plena ciência de que tal eletrodoméstico era proveniente de furto, já que percebeu que estava sem nota fiscal, motivo que o levou a perguntar se “era fragrante (sic) ainda” (fl. 95).
Não obstante tenha se retratado em juízo, alegando que estava apenas guardando a televisão e a droga para Eliezer – sendo que, quanto esta última, não sabia do que se tratava, visto que estava dentro de um saco –, tal versão não basta para desmerecer a prova produzida durante a instrução.
Sobre o tema:
“PENAL – ROUBO CIRCUNSTANCIADO (ART. 157, § 2.º, INCISOS I E II, DO CÓDIGO PENAL) – AUTORIA – CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL – RETRATAÇÃO – CONTEXTO PROBATÓRIO – IRREGULARIDADE NA APREENSÃO DA RES FURTIVA – FLAGRANTE PRESUMIDO. Não há como prosperar a retratação em juízo quando o contexto no qual se insere torna patente a veracidade das declarações prestadas extrajudicialmente (...).” (TJDF, Ap. Crim. 20050710111157, 1.ª Turma, Rel. Des. Mário Machado, DJU 29/03/2006, p. 77).
“PENAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – CONDENAÇÃO – RECURSO – ABSOLVIÇÃO – CONJUNTO PROBATÓRIO IDÔNEO – NÃO PROVIMENTO. (...) 2. Admitir a simples negativa do réu em detrimento de um tal cabedal de provas seria menosprezar a lógica, princípio máximo em matéria de dialética probatória e corolário da livre persuasão racional. 3. Recurso a que se nega provimento.” (TJDF, Ap. Crim. 20030110839448, 1.ª Turma, Rel. Des. Edson Alfredo Smaniotto, DJU 25/05/2005, p. 49).
Assim, não se pode desprezar as declarações do apelante feitas na polícia, sem que se tenha demonstrado qualquer coação, principalmente quando em harmonia com o conjunto probatório.
No tocante ao regime de cumprimento da reprimenda imposta, merece reforma a sentença.
Isso porque o § 1.º do art. 2.º da Lei n.º 8.072/90, alterado pela Lei n.º 11.464/07, agora permite, expressamente, a concessão da progressão de regime.
Nesse sentido:
“HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO. ABSOLVIÇÃO EM PRIMEIRO GRAU. CONDENAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. PENA TOTAL: 20 ANOS DE RECLUSÃO. REGIME INTEGRALMENTE FECHADO. ALEGAÇÃO DE INOCÊNCIA. IMPROPRIEDADE DO MANDAMUS. POSSIBILIDADE DE PROGRESSÃO DE REGIME PARA CONDENADOS POR CRIME HEDIONDO. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA. HC CONCEDIDO, DE OFÍCIO, TÃO-SÓ E APENAS PARA FIXAR O REGIME INICIAL FECHADO PARA O CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE IMPOSTA AO PACIENTE.
(...)
2. O Plenário do colendo Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do HC 82.959-7/SP, decidiu ser inconstitucional o § 1.º do art. 2.º da Lei 8.072/90, que vedava a progressão de regime aos condenados por crimes hediondos. Sob a inspiração dessa decisão, foi editada a Lei 11.464/2007, que alterou o art. 2.º da Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), suprimindo a referida vedação, já declarada inconstitucional, ao fixar o regime inicialmente fechado aos condenados pelo cometimento de tal espécie de crime.
3. Dessa forma, fixado o regime integralmente fechado pelo Tribunal a quo, deve ser concedida a ordem, de ofício, para adequá-lo ao novo regramento legal.
4. Ante o exposto, denega-se a ordem. Concede-se HC, de ofício, apenas e tão-somente para estabelecer o regime inicial fechado para o cumprimento da reprimenda imposta ao paciente, recomendando-se ao Tribunal Estadual que oficie à Defensoria Pública que atua em Contagem/MG, para requerer o que entender de direito em favor do paciente.”
(STJ, HC 134.219/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5.ª Turma, j. em 04/03/2010, DJe 12/04/2010).
Portanto, no caso em exame, o cumprimento da pena privativa de liberdade deve ocorrer inicialmente em regime fechado.
Convém lembrar que, embora tal matéria não tenha sido ventilada especificamente no recurso da defesa (que optou pelo fundamento mais abrangente: a absolvição), é pacífico o entendimento de que a apelação devolve o mérito da ação penal à apreciação pelo Tribunal em sua totalidade e, sendo favorável ao réu, a modificação na sentença pode ser realizada (TJSP, RT 522/323).
Finalmente, quanto ao último ponto impugnado, frise-se que o questionamento cinge-se à condenação em custas processuais, não dizendo respeito à multa imposta cumulativamente à pena restritiva de liberdade.
Com efeito, não cabe aqui o deferimento da Justiça Gratuita, visto que o apelante é assistido pela Defensoria Pública, e portanto, já usufrui os benefícios previstos na Lei n.º 1.060/50.
Conforme jurisprudência pacífica, o réu, ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, deve ser condenado ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do CPP, ficando, contudo, seu pagamento sobrestado enquanto perdurar seu estado de pobreza, pelo prazo de cinco anos, quando então a obrigação estará prescrita, conforme determina o art. 12 da Lei n.º 1.060/50.
Nesse sentido:
“ROUBO CIRCUNSTANCIADO E CRIME DE RESISTÊNCIA - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - EXCLUSÃO DE QUALIFICADORAS DO CRIME DE ROUBO - DESCABIMENTO - DOSIMETRIA DA PENA - AUMENTO POR CONCURSO DE PESSOA E RESTRIÇÃO À LIBERDADE DA VÍTIMA - ALTERAÇÃO DO REGIME - POSSIBILIDADE - CUSTAS PROCESSUAIS - CONDENAÇÃO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
(...)
4) - O beneficiário da justiça gratuita, quando sucumbente, deve ser condenado nas verbas da sucumbência, mas a exigibilidade ficará suspensa enquanto a parte não puder arcar com o pagamento, nos exatos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50.
5) - Recurso conhecido e parcialmente provido.”
(TJDFT, 20090310249455APR, Rel. Des. Luciano Moreira Vasconcellos, 1.ª T. Crim., j. em 10/06/2010, DJ 22/06/2010, p. 186).
Nessa esteira, a isenção somente poderá ser concedida ao réu na fase de execução do julgado, por ser o momento adequado para aferir a real situação financeira do condenado, já que existe a possibilidade de sua alteração após a data da condenação.
Nesse sentido:
“(...) A apuração do estado de miserabilidade jurídica do réu, para fins de isenção do pagamento de custas processuais, deve ser requerida perante o juízo das execuções” (...).
(TJDFT, 20080310244878APR, Rel. Des. Roberval Casemiro Belinati, 2.ª T. Crim., j. em 18/06/2010, DJ 02/07/2010, p. 166).
ISTO POSTO, concordando, em parte, com o parecer ministerial, dou provimento parcial ao recurso, tão-somente para determinar que a pena privativa de liberdade seja cumprida inicialmente em regime fechado, mantendo a sentença em seus demais termos.
É como voto.
Boa Vista, 31 de agosto de 2010.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0010.06.005439-2 / BOA VISTA.
Apelante: Antonio Pereira da Gama.
Defensora Pública: Terezinha Muniz.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Lupercino Nogueira.
APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES E RECEPTAÇÃO, EM CONCURSO MATERIAL – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA SUSTENTAR O DECRETO CONDENATÓRIO – VALIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS – RETRATAÇÃO DO RÉU, EM DETRIMENTO DOS DEMAIS ELEMENTOS DOS AUTOS – INADMISSIBILIDADE – DETERMINAÇÃO DE QUE A PENA SEJA CUMPRIDA EM REGIME INTEGRALMENTE FECHADO – IMPOSSIBILIDADE – PAGAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS – BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA – POSSIBILIDADE.
1. Não há que se falar em insuficiência de provas quando existem testemunhos seguros a respeito do depósito da substância entorpecente e do delito de receptação.
2. Os depoimentos de policiais constituem prova idônea para sustentar a condenação, especialmente quando em consonância com o conjunto probatório.
3. Admitir a simples negativa do réu, em detrimento de um tal cabedal de provas, seria menosprezar a lógica, princípio máximo em matéria de dialética probatória e corolário da livre persuasão racional.
4. Diante da nova redação do § 1.º do art. 2.º da Lei n.º 8.072/90, permitindo, expressamente, a progressão, o cumprimento da pena privativa de liberdade deve ocorrer inicialmente em regime fechado.
5. A condição de beneficiário da Justiça Gratuita não isenta o pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do CPP, c/c o art. 12 da Lei n.º 1.060/50.
6. Recurso parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Câmara Única – Turma Criminal, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade, em harmonia parcial com o parecer ministerial, em dar provimento, em parte, à apelação, nos termos do voto do Relator.
Sala das Sessões, em Boa Vista, 31 de agosto de 2010.
Des. LUPERCINO NOGUEIRA
Presidente Interino e Relator
Des. RICARDO OLIVEIRA
Revisor
Dra. GRACIETE SOTTO MAYOR RIBEIRO
Juíza Convocada
Esteve presente:
Dr.(a) ..............................................
Procurador(a) de Justiça
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4390, Boa Vista, 3 de setembro de 2010, p. 005.
( : 31/08/2010 ,
: XIII ,
: 5 ,
Data do Julgamento
:
31/08/2010
Data da Publicação
:
03/09/2010
Classe/Assunto
:
Apelação Criminal )
Relator(a)
:
DES. LUPERCINO DE SA NOGUEIRA FILHO
Tipo
:
Acórdão
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