TJRR 10060068839
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001006006883-9
APELANTE: J. J. DA S.
APELADA: M. H. DE L.
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
RELATÓRIO
J. J. DA S. interpôs esta Apelação Cível em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista nos autos da Ação de Reconhecimento e Dissolução de União Estável c/c Partilha de Bens nº 001005107122-2.
O Autor afirma, na petição inicial, que manteve união estável com a Ré entre 1971 a 1994, período em que formaram um patrimônio supostamente composto por uma casa de alvenaria no bairro 13 de Setembro, nesta Capital, um sítio situado na região da Confiança III, Município de Caracaraí, uma vila com 08 quartos, também no bairro 13 de Setembro, e um sítio na cidade de Vitorino Freire, no Maranhão.
Requer, assim, o reconhecimento e a dissolução da união estável, bem como a partilha dos bens, propondo antecipadamente ficar com a propriedade do sítio em Caracaraí e com a vila, no bairro 13 de Setembro.
A Ré, em sua contestação, aduz que o sítio localizado em Vitorino Freire pertence à sua genitora, e que em relação aos demais bens já foi efetuada uma partilha amigável.
Nessa partilha, a Demandada teria comprado a parte que cabia ao seu ex-companheiro em relação à casa de alvenaria do bairro 13 de Setembro, e o Autor teria ficado com a propriedade do sítio situado na região de Caracaraí. Afirma, ainda, que a vila arrolada pelo Requerente teria sido adquirida pela Ré, quando já separados, e era somente um lote de terras, sem nenhuma benfeitoria.
O Autor, em sede de réplica, suscita a falsidade do recibo juntado pela Ré à fl. 76, o qual demonstra a compra da meação do Demandante sobre a casa do bairro 13 de Setembro. Requer, ademais, a realização de prova pericial para atestar a veracidade da assinatura acostada no referido documento.
Em seguida foi realizada a audiência de instrução e julgamento com a oitiva de testemunhas de defesa e de acusação. Todavia, não houve a produção de prova pericial.
O Magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a existência da união estável e decretar a sua dissolução, bem como para determinar a partilha dos bens, cabendo ao Autor o imóvel rural situado na região da Confiança III, no Município de Caracaraí, e, à Ré o imóvel urbano localizado no bairro 13 de Setembro.
Inconformado com o decisum, o Autor interpôs este recurso suscitando, preliminarmente, o incidente de falsidade aduzido em sede de réplica, requerendo perícia no documento de fl. 76, sob o fundamento de que a assinatura ali acostada não é sua.
No mérito, aduz, em suma, que:
a) a partilha, na forma como efetuada pela sentença, está desproporcional, à medida que o Autor ficou com um único bem no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), e a Ré, com dois imóveis de alto valor comercial;
b) “As testemunhas do Apelante foram unânimes em afirmar que da relação de ambos nunca ouviram falar em partilha amigável, nem compra de parte dos bens pela ré, tendo havido uma falsa partilha sem homologação em Juízo [...].”;
c) a inverdade trazida pela Ré fica evidenciada pela data do documento juntado à fl. 76, segundo o qual o Apelante teria vendido sua parte na residência em 12 de setembro de 1990, época em que as partes ainda conviviam, tendo se separado somente em 1994;
d) [...] o nobre Julgador monocrático não levou em consideração a prova documental e testemunhal do autor, ao contrário, se baseou em documento suspeito, do qual se requereu perícia na impugnação [...]” (fl. 212);
Ao final, requer a reforma da sentença no tópico referente à partilha dos bens, para que esta seja efetuada na forma como sugerido na inicial.
A Recorrida apresentou contra-razões às fls. 224/227, alegando que as provas carreadas aos autos são legítimas e o que o Apelante tenta, na verdade, auferir lucros com a separação, muito embora a partilha já tenha sido efetivada desde 1990 por acordo entre as partes, quando o Recorrente assinou um recibo de venda de sua parte na residência do bairro 13 de Setembro.
Pugna, assim, pela manutenção do decisum atacado.
O Representante do Ministério Público de 2º grau afirmou, em sede preliminar, que o incidente de falsidade suscitado pelo Apelante foi feito na via e na forma inadequadas, sendo imperioso rejeitá-lo.
No mérito aponta que no que tange à partilha, não se aplicam as disposições da Lei 9.278/96, já que a união foi dissolvida antes de 1996. Todavia, como houve uma partilha amigável, ficando o apelante com o imóvel rural, “[...] a meação dos bens, como quer tornar crível o autor, não se apresenta como solução mais justa, sobretudo porque não conseguiu provar o que alega, diferentemente da apelada que avigora suas declarações com documentos que apontam a veracidade de suas contra-razões.” (fl. 240).
Opina, ao final, pelo desprovimento do recurso.
Subiram os autos a este Tribunal, cabendo-me a relatoria.
É o relatório.
Encaminhem-se à revisão.
Boa Vista-RR, 22 de dezembro de 2009.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001006006883-9
APELANTE: J. J. DA S.
APELADA: M. H. DE L.
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
VOTO
Após detida análise do feito, convenci-me de que a sentença deve ser anulada. Explico.
Conforme exposto no relatório, o Apelante pretende, com a demanda, que seja reconhecida e em seguida dissolvida sua relação de união estável com a Ré, ora Apelada. Em consequência disso, pleiteia a partilha dos bens adquiridos na constância da união.
A Ré, em sua contestação, afirma, entre outras coisas, que no ano de 1990 efetuou uma partilha amigável com o Autor, quando então comprou a parte dele no imóvel em que residiam, conforme recibo de compra e venda juntado à fl.76.
O Autor, todavia, nega a realização de qualquer partilha amigável, afirmando, ainda, que sua assinatura do mencionado recibo é falsa, razão porque pede a produção de prova pericial, a fim de atestar a veracidade do documento.
Pois bem. Compulsando os autos, verifico que, de fato, o Demandante pleiteou a realização de prova pericial no momento oportuno, qual seja, em sua réplica (fl. 95). Ademais, reiterou o pedido quando provocado pelo Magistrado de primeiro grau, consoante se extrai das fls. 103 e 107/108.
Não bastasse isso, o Autor, nas alegações finais, novamente manifestou-se pela produção de prova pericial sobre a assinatura constante no recibo juntado pela Ré.
Como se vê, o Apelante em diversas oportunidades pugnou pela produção de prova pericial, sustentando a falsidade de sua suposta assinatura no documento acostado aos autos pela Recorrida (fl. 16).
Trata-se, em meu sentir, de uma alegação grave e que, por isso, merece ser apreciada com cautela, mormente em face dos depoimentos das testemunhas de ambas as partes, que não se recordam de ter havido qualquer partilha amigável, in verbis:
Informante (do Autor) G. U. P.: “[...] que não sabe de uma eventual compra do autor pela requerida em relação a meação do bem do 13 de Setembro.[...]” (fl. 167).
Testemunha (do Autor) M. G. de S. G.: “[...] que não ouviu falar que o casal tinha feito nenhum acordo de partilha.” (fl. 168).
Testemunha (da Ré) M. da S.: “[...] que não sabe dizer se houve acordo de partilha de bens entre o casal na época da separação; [...]” (fl. 168).
Testemunha (da Ré) J. R. de L.: “[...] que não é do conhecimento do depoente que a requerida tenha adquirido a meação do imóvel do 13 de setembro junto ao autor; [...]” (fl. 168).
De mais a mais, de tudo quanto consta nos autos, depreende-se que a separação do casal ocorreu no ano de 1994, todavia, a suposta partilha amigável é datada de 12 de setembro de 1990, o que corrobora a necessidade da produção de uma perícia na assinatura do autor.
Ocorre que o Magistrado de primeiro grau não chegou a deferir ou indeferir o pedido de realização da perícia, obstando até mesmo a interposição de recurso. Ora, sem decisão, não há como interpor o respectivo recurso.
Ademais, nota-se que a sentença utilizou, como um de seus fundamentos justamente a ocorrência de uma anterior partilha amigável, como se extrai do seguinte trecho:
Noticiam os autos que as partes conviveram pelo período de 1971 a 1994. Ainda, que no ano de 1990 houve a primeira separação de fato, o que ensejou a partilha amigável, com a compra da meação do Autor pela Ré (fls. 76). (fl. 189).
Assim, estou que o Autor teve cerceado seu direito de defesa quanto aos documentos juntados pela Ré, haja vista que nem sequer teve apreciado seu pedido de produção de prova pericial, razão pela deve ser anulada a sentença ora combatida.
No mesmo sentido, peço vênia para transcrever alguns julgados:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PARTILHA DE BENS. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. JULGAMENTO SEM PRÉVIA MANIFESTAÇÃO JUDICIAL ACERCA DA PROVA REQUERIDA. CERCEAMENTO DE DEFESA. 1. A litigiosidade que cerca a destinação do acervo sujeito à divisão torna necessário que o processamento do pedido cumprisse com o rito ordinário ¿ com possibilidade ampla de produção de prova. 2. Ao sentenciar, sem se manifestar previamente acerca do pedido de avaliação judicial, a magistrada deixou de ofertar a prestação jurisdicional porque privou a parte da produção probatória reiteradas vezes requerida e essencial ao deslinde da questão litigiosa - qual seja a perícia para avaliação do acervo de bens. 3. Igualmente caracteriza cerceamento de defesa, porque a ausência de decisão nesse sentido priva a parte do acesso à instância recursal. PROVERAM O SEGUNDO APELO E JULGARAM PREJUDICADO O PRIMEIRO, À UNANIMIDADE. (Apelação Cível Nº 70019713205, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 27/06/2007)
***
REVISÃO DE CONTRATO - REQUERIMENTO DE PROVA PERICIAL - AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO SENTENCIANETE - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - CERCEAMENTO DE DEFESA - ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR SUSCITADA - ANULAÇÃO DO PROCESSO.
1. É anulável, até mesmo de ofício, o processo no qual restringiu-se o direito à produção de prova da parte insistentemente requerido, configurando o cerceamento de defesa.
2. A aplicação do artigo 330, I, do CPC, exige muita cautela do magistrado, pois a mais tênue dúvida pode gerar a necessidade de produção de prova.
3. O óbice prematuro da fase instrutória compromete a busca da verdade real e afeta, de modo decisivo, a entrega da prestação jurisdicional.
4. Preliminar acolhida. Recurso provido. Unânime. (TJDF - 20080111072990APC, Relator ROMEU GONZAGA NEIVA, 5ª Turma Cível, julgado em 22/10/2009, DJ 12/11/2009 p. 101)
***
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ACIDENTÁRIA - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - INVALIDEZ PERMANENTE - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO - REALIZAÇÃO DE PERÍCIA - PROVIDÊNCIA IMPRESCINDÍVEL - DETERMINAÇÃO DE OFÍCIO. O julgador, seja da primeira, seja da segunda INSTÂNCIA, tem não só a faculdade, mas o dever de determinar, mesmo de ofício, a realização das provas necessárias ao deslinde da questão posta em litígio, sem a qual a análise do mérito do recurso torna-se impossível (art. 130 do CPC). Exigindo a demanda uma instrução probatória mais acurada, com a realização de prova pericial médica, especialmente em relação à verificação da alegada invalidez permanente do autor, sendo certo que as provas até então produzidas são insuficientes, necessária se mostra à cassação da sentença de primeiro grau que decidiu antecipadamente a lide, com a determinação de retorno dos autos à primeira INSTÂNCIA para o devido prosseguimento do feito com a produção da perícia necessária. (TJMG, APELAÇÃO CÍVEL / REEXAME NECESSÁRIO N° 1.0701.06.151176-5/001, RELATOR: EXMO. SR. DES. ELIAS CAMILO, j. 23/04/08, p. 30/05/08)
Como se vê, a ausência de manifestação judicial quanto ao requerimento de prova pericial, que, nos autos, mostra-se imprescindível, é motivo ensejador da anulação da sentença.
Nem se diga que o Autor não elaborou o seu pedido na forma e via “adequada”, ou seja, na forma de um incidente de falsidade, pois o que ele pleiteia é a produção de prova pericial a fim de atestar a veracidade da assinatura constante no recibo de compra e venda. Não suscita, em si, a declaração de falsidade.
De mais a mais, não existe óbice para que uma parte suscite a falsidade material de um documento como uma mera questão incidental, consoante ensinam Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira:
Nada impede, porém que a parte suscite a falsidade material ou ideológica como mera questão incidental em sua defesa, sem pedir que o juiz decida a questão principaliter tantum. “Se a parte argüia falsidade em simples defesa e sem o formalismo do incidente regido pelos arts. 390 e SS. Do Código de Processo Civil, o que a propósito decidir o juiz terá eficácia restrita à causa e essa decisão figurará entre os fundamentos da sentença final (declaração incidenter tantum)”. Nesses casos, pois, não se vai falar em coisa julgada material. (Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, 3ª ed., p. 184).
Ante o exposto, conheço o recurso e anulo a sentença a fim de que outra seja proferida a partir do encerramento da instrução processual, observando-se, todavia, o pedido de produção de prova pericial.
Retornem os autos ao juízo de origem para o prosseguimento do feito com a perícia necessária.
É como voto.
Boa Vista-RR, 09 de fevereiro de 2010.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001006006883-9
APELANTE: J. J. DA S.
APELADA: M. H. DE L.
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
EMENTA
RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. PARTILHA DE BENS. RECIBO DE COMPRA E VENDA JUNTADO PELA RÉ, ATESTANDO A EXISTÊNCIA DE UMA PARTILHA AMIGÁVEL ANTERIOR COM A VENDA DA MEAÇÃO DO AUTOR RELATIVAMENTE AO IMÓVEL EM QUE RESIDIA O CASAL. PEDIDO DO AUTOR PARA REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL A FIM DE ATESTAR A VERACIDADE DE SUA ASSINATURA NO RECIBO DE COMPRA E VENDA. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO JUDICIAL QUANTO AO PEDIDO DE PERÍCIA. CERCEMANTO DE DEFESA. PROVA SUBSTANCIAL PARA O DESLINDE DO LITÍGIO. SENTENÇA ANULADA.
Deve ser anulada a sentença proferida sem que tenha sido apreciado o pedido confeccionado reiteradas vezes para produção de prova pericial, haja vista que enseja o cerceamento do direito de defesa do Autor, seja porque não pôde obter a produção probatória pretendida, seja porque ficou impedido de ter acesso à instância recursal.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Colenda Câmara Única, integrantes da Turma Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em conhecer o recurso e anular a sentença, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Sala das Sessões da Câmara Única do E. TJRR, em Boa Vista - RR, 09 de fevereiro de 2010.
Des. Mauro Campello
Presidente e julgador
Des. Robério Nunes
Julgador
Des. Almiro Padilha
Relator
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4274, Boa Vista, 12 de março de 2010, p. 31.
( : 09/02/2010 ,
: XIII ,
: 31 ,
Ementa
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001006006883-9
APELANTE: J. J. DA S.
APELADA: M. H. DE L.
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
RELATÓRIO
J. J. DA S. interpôs esta Apelação Cível em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista nos autos da Ação de Reconhecimento e Dissolução de União Estável c/c Partilha de Bens nº 001005107122-2.
O Autor afirma, na petição inicial, que manteve união estável com a Ré entre 1971 a 1994, período em que formaram um patrimônio supostamente composto por uma casa de alvenaria no bairro 13 de Setembro, nesta Capital, um sítio situado na região da Confiança III, Município de Caracaraí, uma vila com 08 quartos, também no bairro 13 de Setembro, e um sítio na cidade de Vitorino Freire, no Maranhão.
Requer, assim, o reconhecimento e a dissolução da união estável, bem como a partilha dos bens, propondo antecipadamente ficar com a propriedade do sítio em Caracaraí e com a vila, no bairro 13 de Setembro.
A Ré, em sua contestação, aduz que o sítio localizado em Vitorino Freire pertence à sua genitora, e que em relação aos demais bens já foi efetuada uma partilha amigável.
Nessa partilha, a Demandada teria comprado a parte que cabia ao seu ex-companheiro em relação à casa de alvenaria do bairro 13 de Setembro, e o Autor teria ficado com a propriedade do sítio situado na região de Caracaraí. Afirma, ainda, que a vila arrolada pelo Requerente teria sido adquirida pela Ré, quando já separados, e era somente um lote de terras, sem nenhuma benfeitoria.
O Autor, em sede de réplica, suscita a falsidade do recibo juntado pela Ré à fl. 76, o qual demonstra a compra da meação do Demandante sobre a casa do bairro 13 de Setembro. Requer, ademais, a realização de prova pericial para atestar a veracidade da assinatura acostada no referido documento.
Em seguida foi realizada a audiência de instrução e julgamento com a oitiva de testemunhas de defesa e de acusação. Todavia, não houve a produção de prova pericial.
O Magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a existência da união estável e decretar a sua dissolução, bem como para determinar a partilha dos bens, cabendo ao Autor o imóvel rural situado na região da Confiança III, no Município de Caracaraí, e, à Ré o imóvel urbano localizado no bairro 13 de Setembro.
Inconformado com o decisum, o Autor interpôs este recurso suscitando, preliminarmente, o incidente de falsidade aduzido em sede de réplica, requerendo perícia no documento de fl. 76, sob o fundamento de que a assinatura ali acostada não é sua.
No mérito, aduz, em suma, que:
a) a partilha, na forma como efetuada pela sentença, está desproporcional, à medida que o Autor ficou com um único bem no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), e a Ré, com dois imóveis de alto valor comercial;
b) “As testemunhas do Apelante foram unânimes em afirmar que da relação de ambos nunca ouviram falar em partilha amigável, nem compra de parte dos bens pela ré, tendo havido uma falsa partilha sem homologação em Juízo [...].”;
c) a inverdade trazida pela Ré fica evidenciada pela data do documento juntado à fl. 76, segundo o qual o Apelante teria vendido sua parte na residência em 12 de setembro de 1990, época em que as partes ainda conviviam, tendo se separado somente em 1994;
d) [...] o nobre Julgador monocrático não levou em consideração a prova documental e testemunhal do autor, ao contrário, se baseou em documento suspeito, do qual se requereu perícia na impugnação [...]” (fl. 212);
Ao final, requer a reforma da sentença no tópico referente à partilha dos bens, para que esta seja efetuada na forma como sugerido na inicial.
A Recorrida apresentou contra-razões às fls. 224/227, alegando que as provas carreadas aos autos são legítimas e o que o Apelante tenta, na verdade, auferir lucros com a separação, muito embora a partilha já tenha sido efetivada desde 1990 por acordo entre as partes, quando o Recorrente assinou um recibo de venda de sua parte na residência do bairro 13 de Setembro.
Pugna, assim, pela manutenção do decisum atacado.
O Representante do Ministério Público de 2º grau afirmou, em sede preliminar, que o incidente de falsidade suscitado pelo Apelante foi feito na via e na forma inadequadas, sendo imperioso rejeitá-lo.
No mérito aponta que no que tange à partilha, não se aplicam as disposições da Lei 9.278/96, já que a união foi dissolvida antes de 1996. Todavia, como houve uma partilha amigável, ficando o apelante com o imóvel rural, “[...] a meação dos bens, como quer tornar crível o autor, não se apresenta como solução mais justa, sobretudo porque não conseguiu provar o que alega, diferentemente da apelada que avigora suas declarações com documentos que apontam a veracidade de suas contra-razões.” (fl. 240).
Opina, ao final, pelo desprovimento do recurso.
Subiram os autos a este Tribunal, cabendo-me a relatoria.
É o relatório.
Encaminhem-se à revisão.
Boa Vista-RR, 22 de dezembro de 2009.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001006006883-9
APELANTE: J. J. DA S.
APELADA: M. H. DE L.
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
VOTO
Após detida análise do feito, convenci-me de que a sentença deve ser anulada. Explico.
Conforme exposto no relatório, o Apelante pretende, com a demanda, que seja reconhecida e em seguida dissolvida sua relação de união estável com a Ré, ora Apelada. Em consequência disso, pleiteia a partilha dos bens adquiridos na constância da união.
A Ré, em sua contestação, afirma, entre outras coisas, que no ano de 1990 efetuou uma partilha amigável com o Autor, quando então comprou a parte dele no imóvel em que residiam, conforme recibo de compra e venda juntado à fl.76.
O Autor, todavia, nega a realização de qualquer partilha amigável, afirmando, ainda, que sua assinatura do mencionado recibo é falsa, razão porque pede a produção de prova pericial, a fim de atestar a veracidade do documento.
Pois bem. Compulsando os autos, verifico que, de fato, o Demandante pleiteou a realização de prova pericial no momento oportuno, qual seja, em sua réplica (fl. 95). Ademais, reiterou o pedido quando provocado pelo Magistrado de primeiro grau, consoante se extrai das fls. 103 e 107/108.
Não bastasse isso, o Autor, nas alegações finais, novamente manifestou-se pela produção de prova pericial sobre a assinatura constante no recibo juntado pela Ré.
Como se vê, o Apelante em diversas oportunidades pugnou pela produção de prova pericial, sustentando a falsidade de sua suposta assinatura no documento acostado aos autos pela Recorrida (fl. 16).
Trata-se, em meu sentir, de uma alegação grave e que, por isso, merece ser apreciada com cautela, mormente em face dos depoimentos das testemunhas de ambas as partes, que não se recordam de ter havido qualquer partilha amigável, in verbis:
Informante (do Autor) G. U. P.: “[...] que não sabe de uma eventual compra do autor pela requerida em relação a meação do bem do 13 de Setembro.[...]” (fl. 167).
Testemunha (do Autor) M. G. de S. G.: “[...] que não ouviu falar que o casal tinha feito nenhum acordo de partilha.” (fl. 168).
Testemunha (da Ré) M. da S.: “[...] que não sabe dizer se houve acordo de partilha de bens entre o casal na época da separação; [...]” (fl. 168).
Testemunha (da Ré) J. R. de L.: “[...] que não é do conhecimento do depoente que a requerida tenha adquirido a meação do imóvel do 13 de setembro junto ao autor; [...]” (fl. 168).
De mais a mais, de tudo quanto consta nos autos, depreende-se que a separação do casal ocorreu no ano de 1994, todavia, a suposta partilha amigável é datada de 12 de setembro de 1990, o que corrobora a necessidade da produção de uma perícia na assinatura do autor.
Ocorre que o Magistrado de primeiro grau não chegou a deferir ou indeferir o pedido de realização da perícia, obstando até mesmo a interposição de recurso. Ora, sem decisão, não há como interpor o respectivo recurso.
Ademais, nota-se que a sentença utilizou, como um de seus fundamentos justamente a ocorrência de uma anterior partilha amigável, como se extrai do seguinte trecho:
Noticiam os autos que as partes conviveram pelo período de 1971 a 1994. Ainda, que no ano de 1990 houve a primeira separação de fato, o que ensejou a partilha amigável, com a compra da meação do Autor pela Ré (fls. 76). (fl. 189).
Assim, estou que o Autor teve cerceado seu direito de defesa quanto aos documentos juntados pela Ré, haja vista que nem sequer teve apreciado seu pedido de produção de prova pericial, razão pela deve ser anulada a sentença ora combatida.
No mesmo sentido, peço vênia para transcrever alguns julgados:
APELAÇÃO CÍVEL. PARTILHA DE BENS. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. JULGAMENTO SEM PRÉVIA MANIFESTAÇÃO JUDICIAL ACERCA DA PROVA REQUERIDA. CERCEAMENTO DE DEFESA. 1. A litigiosidade que cerca a destinação do acervo sujeito à divisão torna necessário que o processamento do pedido cumprisse com o rito ordinário ¿ com possibilidade ampla de produção de prova. 2. Ao sentenciar, sem se manifestar previamente acerca do pedido de avaliação judicial, a magistrada deixou de ofertar a prestação jurisdicional porque privou a parte da produção probatória reiteradas vezes requerida e essencial ao deslinde da questão litigiosa - qual seja a perícia para avaliação do acervo de bens. 3. Igualmente caracteriza cerceamento de defesa, porque a ausência de decisão nesse sentido priva a parte do acesso à instância recursal. PROVERAM O SEGUNDO APELO E JULGARAM PREJUDICADO O PRIMEIRO, À UNANIMIDADE. (Apelação Cível Nº 70019713205, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 27/06/2007)
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REVISÃO DE CONTRATO - REQUERIMENTO DE PROVA PERICIAL - AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO SENTENCIANETE - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - CERCEAMENTO DE DEFESA - ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR SUSCITADA - ANULAÇÃO DO PROCESSO.
1. É anulável, até mesmo de ofício, o processo no qual restringiu-se o direito à produção de prova da parte insistentemente requerido, configurando o cerceamento de defesa.
2. A aplicação do artigo 330, I, do CPC, exige muita cautela do magistrado, pois a mais tênue dúvida pode gerar a necessidade de produção de prova.
3. O óbice prematuro da fase instrutória compromete a busca da verdade real e afeta, de modo decisivo, a entrega da prestação jurisdicional.
4. Preliminar acolhida. Recurso provido. Unânime. (TJDF - 20080111072990APC, Relator ROMEU GONZAGA NEIVA, 5ª Turma Cível, julgado em 22/10/2009, DJ 12/11/2009 p. 101)
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APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ACIDENTÁRIA - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - INVALIDEZ PERMANENTE - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO - REALIZAÇÃO DE PERÍCIA - PROVIDÊNCIA IMPRESCINDÍVEL - DETERMINAÇÃO DE OFÍCIO. O julgador, seja da primeira, seja da segunda INSTÂNCIA, tem não só a faculdade, mas o dever de determinar, mesmo de ofício, a realização das provas necessárias ao deslinde da questão posta em litígio, sem a qual a análise do mérito do recurso torna-se impossível (art. 130 do CPC). Exigindo a demanda uma instrução probatória mais acurada, com a realização de prova pericial médica, especialmente em relação à verificação da alegada invalidez permanente do autor, sendo certo que as provas até então produzidas são insuficientes, necessária se mostra à cassação da sentença de primeiro grau que decidiu antecipadamente a lide, com a determinação de retorno dos autos à primeira INSTÂNCIA para o devido prosseguimento do feito com a produção da perícia necessária. (TJMG, APELAÇÃO CÍVEL / REEXAME NECESSÁRIO N° 1.0701.06.151176-5/001, RELATOR: EXMO. SR. DES. ELIAS CAMILO, j. 23/04/08, p. 30/05/08)
Como se vê, a ausência de manifestação judicial quanto ao requerimento de prova pericial, que, nos autos, mostra-se imprescindível, é motivo ensejador da anulação da sentença.
Nem se diga que o Autor não elaborou o seu pedido na forma e via “adequada”, ou seja, na forma de um incidente de falsidade, pois o que ele pleiteia é a produção de prova pericial a fim de atestar a veracidade da assinatura constante no recibo de compra e venda. Não suscita, em si, a declaração de falsidade.
De mais a mais, não existe óbice para que uma parte suscite a falsidade material de um documento como uma mera questão incidental, consoante ensinam Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira:
Nada impede, porém que a parte suscite a falsidade material ou ideológica como mera questão incidental em sua defesa, sem pedir que o juiz decida a questão principaliter tantum. “Se a parte argüia falsidade em simples defesa e sem o formalismo do incidente regido pelos arts. 390 e SS. Do Código de Processo Civil, o que a propósito decidir o juiz terá eficácia restrita à causa e essa decisão figurará entre os fundamentos da sentença final (declaração incidenter tantum)”. Nesses casos, pois, não se vai falar em coisa julgada material. (Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, 3ª ed., p. 184).
Ante o exposto, conheço o recurso e anulo a sentença a fim de que outra seja proferida a partir do encerramento da instrução processual, observando-se, todavia, o pedido de produção de prova pericial.
Retornem os autos ao juízo de origem para o prosseguimento do feito com a perícia necessária.
É como voto.
Boa Vista-RR, 09 de fevereiro de 2010.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001006006883-9
APELANTE: J. J. DA S.
APELADA: M. H. DE L.
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
EMENTA
RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. PARTILHA DE BENS. RECIBO DE COMPRA E VENDA JUNTADO PELA RÉ, ATESTANDO A EXISTÊNCIA DE UMA PARTILHA AMIGÁVEL ANTERIOR COM A VENDA DA MEAÇÃO DO AUTOR RELATIVAMENTE AO IMÓVEL EM QUE RESIDIA O CASAL. PEDIDO DO AUTOR PARA REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL A FIM DE ATESTAR A VERACIDADE DE SUA ASSINATURA NO RECIBO DE COMPRA E VENDA. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO JUDICIAL QUANTO AO PEDIDO DE PERÍCIA. CERCEMANTO DE DEFESA. PROVA SUBSTANCIAL PARA O DESLINDE DO LITÍGIO. SENTENÇA ANULADA.
Deve ser anulada a sentença proferida sem que tenha sido apreciado o pedido confeccionado reiteradas vezes para produção de prova pericial, haja vista que enseja o cerceamento do direito de defesa do Autor, seja porque não pôde obter a produção probatória pretendida, seja porque ficou impedido de ter acesso à instância recursal.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Colenda Câmara Única, integrantes da Turma Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em conhecer o recurso e anular a sentença, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Sala das Sessões da Câmara Única do E. TJRR, em Boa Vista - RR, 09 de fevereiro de 2010.
Des. Mauro Campello
Presidente e julgador
Des. Robério Nunes
Julgador
Des. Almiro Padilha
Relator
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4274, Boa Vista, 12 de março de 2010, p. 31.
( : 09/02/2010 ,
: XIII ,
: 31 ,
Data do Julgamento
:
09/02/2010
Data da Publicação
:
12/03/2010
Classe/Assunto
:
Apelação Cível )
Relator(a)
:
DES. ALMIRO PADILHA
Tipo
:
Acórdão
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