main-banner

Jurisprudência


TJRR 10070084685

Ementa
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL Nº. 001007008468-5 APELANTE: ESTADO DE RORAIMA APELADOS: MANVEL VEÍCULOS LTDA. E OUTROS RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA RELATÓRIO O ESTADO DE RORAIMA interpôs esta apelação contra a sentença proferida pelo Juiz de Direito da 8ª. Vara Cível da Comarca de Boa Vista, na Execução Fiscal nº. 001001019332-3, por meio da qual o processo foi extinto, em razão da prescrição intercorrente. O Recorrente alega, em síntese, que: “1) O novo § 4º do artigo 40 da Lei nº 6.830/80, [...] aplica-se tão somente às hipóteses de arquivamento da execução fiscal [...]. Compulsando os autos verifica-se que não há decisão ordenando o arquivamento da presente Execução fiscal; 2) O termo a quo do prazo prescricional é a decisão que ordenar o arquivamento do processo executivo [...]. Como não existe a referida decisão, sequer o prazo inicial da prescrição intercorrente teve início; 3) O § 4º sob análise possui natureza de norma processual, aplicando-se, pois, aos processos em curso; 4) A prescrição intercorrente somente poderá ser reconhecida pelo magistrado se houver paralisação do feito, pelo prazo prescricional, em razão da não localização do devedor ou de seus bens (§ 2º do art. 40 da Lei n.º 6.830, de 1980);” (sic – fl. 182). Pede a anulação da sentença. O recurso foi recebido nos efeitos suspensivo e devolutivo (fl. 185). A MANVEL VEÍCULOS LTDA. requereu a decretação da prescrição intercorrente (fls. 187-192). É o relatório. Deixo de encaminhar os autos ao Ministério Público, em razão de sua abstinência em intervir, já manifestada em diversos outros processos como este. Encaminhem-se os autos à revisão. Boa Vista, 10 de dezembro de 2007. Des. ALMIRO PADILHA Relator CÂMARA ÚNICA - TURMA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL N.º 001007008468-5 APELANTE: O ESTADO DE RORAIMA APELADOS: MANVEL VEÍCULOS LTDA. E OUTROS RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA VOTO Com o advento da Lei nº 11.051/04, que modificou o art. 40 da LEF (Lei nº 6.830/80), passou-se a admitir, de forma tranqüila, a possibilidade da decretação de ofício da prescrição intercorrente, desde que observados os requisitos do lapso temporal e da prévia oitiva da Fazenda Pública, conforme se depreende da dicção do art. 6º: “Art. 6º. O art. 40 da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, passa a vigorar com a seguinte redação: ‘Art. 40. .................. § 4º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o Juiz depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.’ (NR)”. Essa nova redação diz que o juiz poderá decretar a prescrição intercorrente de ofício “Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional” e se ouvir previamente a Fazenda Pública. No caso em análise, os dois requisitos foram preenchidos: o Magistrado ouviu previamente a Fazenda Pública (fls. 161-164); o arquivamento provisório ocorreu em 05/09/01 (fl. 20) e de lá para cá transcorreram os cinco anos. Além disso, o § 5º. do art. 219 do CPC também permite a decretação dessa forma e não impõe requisito algum para isso. Assim, rejeito a preliminar. No mérito, o Recorrente não tem razão. Duas questões devem ser analisadas para sabermos, com certeza, se houve ou não a prescrição no caso em análise: qual lei estava em vigor no momento da realização do ato citatório e se a citação por edital tem o efeito de interromper o prazo prescricional. As normas referentes aos conflitos de lei no tempo, dizem que as leis podem ter três efeitos: retroativo, ultrativo e de eficácia imediata. No efeito retroativo, as novas disposições legais incidem sobre fatos (ou sobre os efeitos desses fatos) ocorridos anteriormente à entrada em vigor da nova lei. No ultrativo, as regras da lei revogada continuam a incidir sobre fatos ou efeitos ocorridos depois da entrada em vigor do novo dispositivo. E na eficácia imediata, os efeitos da nova lei incidem sobre todos os fatos (ou sobre os efeitos desses fatos) que ocorrerem após a entrada em vigor do novo normativo. Sendo importante ressaltar que sempre deverão ser respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (CF, inc. XXXVI do art. 5.º). Em regra no Direito brasileiro, quando não houver disposição expressa em contrário, as novas normas terão eficácia imediata e geral, conforme dispõem o art. 6.º da Lei de Introdução ao Código Civil e o inc. XXXVI do art. 5.º de nossa Constituição Federal. Sobre isso, ensinam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, quando comentam o princípio da irretroatividade dos efeitos da lei nova: “Irretroatividade da lei. O princípio da irretroatividade da lei está consagrado entre nós pelas disposições da CF 5.º XXXVI e da LICC 6.º caput ('efeito imediato'), razão pela qual se asseguram a sobrevivência e a ultratividade da lei antiga. Por esse princípio a lei nova não pode retroagir para atingir o ato jurídico perfeito, o direito adquirido ou a coisa julgada. A lei nova tem efeito imediato e geral (LICC 6.º caput), atingindo somente os fatos futuros (facta futura) que se realizarem já sob sua vigência, não abrangendo os fatos pretéritos (facta praeterita), estes últimos protegidos pela cláusula constitucional.” A Lei Complementar Federal n.º 118/2005, que alterou, entre outras coisas, o disposto no inc. I do parágrafo único do 174 do CTN, tem eficácia imediata, como já vimos, por força do art. 6.º da LICC. Ou seja, seus efeitos incidem sobre aqueles fatos ocorridos depois de sua entrada em vigor. A respeito do conflito de leis processuais no tempo, Humberto Theodoro Júnior ensina: “Há quem afirme o caráter retroativo das leis de processo, tendo em vista sua incidência imediata, inclusive sobre os processos em curso. Como explica Amaral Santos, 'encarregou-se a doutrina contemporânea de demonstrar o engano em que incide esta firmação'. Na verdade, a lei que se aplica em questões processuais é a que vigora no momento da prática do ato formal, e não a do tempo em que o ato material se deu. Também a lei processual respeita o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (Constituição Federal, art. 5.º, inc. XXXVI, e Lei de Introdução, art. 6.º) E mesmo quando a lei nova atinge um processo em andamento, nenhum efeito tem sobre os fatos ou atos ocorridos sob o império da lei revogada. Alcança o processo no estado em que se achava no momento de sua entrada em vigor, mas respeita os efeitos dos atos já praticados, que continuam regulados pela lei do tempo em que foram consumados. Se, por exemplo, a lei nova não mais considera título executivo um determinado documento particular, mas se a execução já havia sido proposta ao tempo da lei anterior, a execução forçada terá prosseguimento normal sob o império ainda da norma revogada. Em suma: as leis processuais são de efeito imediato frente aos feitos pendentes, mas não são retroativas, pois só os atos posteriores à sua entrada em vigor é que se regularão por seus preceitos. Tempus regit actum” A respeito dessa EFICÁCIA IMEDIATA, Francisco Amaral leciona: “No direito intertemporal, vigem dois princípios fundamentais: a) o do efeito imediato da lei, pelo qual a lei nova se aplica a todos os fatos que ocorrerem durante a sua vigência; e b) o da irretroatividade, pelo qual os fatos verificados sob o império da lei antiga continuam regidos por ela, respeitando-se o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, tudo isso em favor da segurança jurídica. Esses dois princípios correspondem a duas concepções teóricas fundamentais: a objetiva de Roubier, que distingue o efeito retroativo do efeito imediato da lei, e a subjetiva, de Gabba, que estabelece, como limite à vigência da lei nova, o direito adquirido. [...] O sistema jurídico brasileiro contém as seguintes regras sobre a matéria: a) são de ordem constitucional os princípios da irretroatividade da lei nova e do respeito ao direito adquirido; b) esses dois princípios obrigam ao legislador e ao juiz; c) a regra, no silêncio da lei, é a irretroatividade; d) pode haver retroatividade expressa, desde que não atinja direito adquirido; e) a lei nova tem efeito imediato, não se aplicando aos fatos anteriores.” Neste caso, temos um processo civil que foi ajuizado e começou a tramitar, com a prática de diversos atos importantes, durante a vigência de determinado dispositivo legal. Posteriormente, outro veio e revogou o primeiro expressamente, sem estabelecer um efeito retroativo. Aquilo que foi praticado (ajuizamento, recebimento em cartório, despacho do juiz, citação, vista etc.) segue as normas processuais em vigor na data em que foram feitos, por força do princípio da irretroatividade e da eficácia imediata da lei nova (LICC, art. 6.º). Inclusive os efeitos daqueles atos, se já tiverem ocorrido, deverão ser respeitados da forma como a norma antiga determinava. O despacho que ordenou a citação neste processo, a tentativa de citação por Oficial de Justiça e a citação por edital, ocorreram muito antes da vigência da nova lei, portanto, produziram os efeitos previstos na antiga redação do inc. I do parágrafo único do art. 174 do CTN, que dizia: “Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I- pela citação pessoal feita ao devedor;” Esse dispositivo foi muito discutido nos tribunais brasileiros, até que o Superior Tribunal de Justiça adotou o entendimento de que não é só a citação pessoal, mas também a ficta, desde que válida, que interrompe a prescrição. Nesse sentido: “PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO. CITAÇÃO POR EDITAL. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. 1. O Tribunal de origem não deixou de considerar a existência da citação editalícia nos autos, mas entendeu que aquela ficção jurídica não tem o condão de interromper a prescrição, não havendo afronta, portanto, às disposições do art. 535, II, do CPC. 2. Segundo a firme orientação desta Corte, a citação por edital, realizada após tentativa frustada de localização da executada por meio de oficial de justiça, tem o condão de interromper o prazo prescricional, até mesmo porque se enquadra no conceito de ato judicial que constitui o devedor em mora, nos termos do art. 174, III, do Código Tributário Nacional. 3. Recurso especial provido em parte.” (REsp 836.546/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 20.06.2006, DJ 01.08.2006 p. 427 - destaquei) Esta ação foi ajuizada em 23/01/98 contra três devedores, MANVEL VEÍCULOS LTDA., MANOEL PROGÊNIO RIBEIRO e AIDA PENHA DOS SANTOS RIBEIRO. Os dois primeiros foram citados pessoalmente em 05/08/98 (fl. 10). O processo foi suspenso por um ano em 20/05/99 (fl. 14), pelo qual o prazo prescricional também ficou (LEF, art. 40). Apenas em 09/06/04 (fls.48-51), percebeu-se que a Srª. AIDA PENHA DOS SANTOS RIBEIRO ainda não havia sido citada e requereu-se sua citação por edital, o que foi feito em 22/06/04. Da data do ajuizamento da ação até a data da citação, passaram pouco mais de cinco anos (já descontado o período da suspensão), portanto, ocorreu a prescrição intercorrente em relação a ela. Quanto aos outros dois Executados, percebi que não houve causa alguma de interrupção do prazo prescricional desde a citação, já descontando o período da suspensão, e, portanto, até a data da sentença, realmente ocorreu a prescrição intercorrente. Em conclusão: é possível a decretação de ofício da prescrição intercorrente, na forma do § 4.º do art. 40 da LEF e do § 5º. do art. 219 do CPC; a nova redação do inc. I do parágrafo único do art. 174 do CTN não pode ser aplicada aos fatos anteriores a sua vigência, porque a L. C. F. n.º 118/2005 não tem efeito retroativo; no caso concreto, para a Executada AIDA PENHA DOS SANTOS RIBEIRO o prazo prescricional transcorreu antes de sua citação por edital, e, quanto aos demais, a prescrição intercorrente ocorreu no período entre a citação pessoal e a sentença. Por essas razões, conheço e nego provimento ao recurso. É como voto. Boa Vista, 12 de fevereiro de 2008. Des. ALMIRO PADILHA Relator CÂMARA ÚNICA - TURMA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL N.º 001007008468-5 APELANTE: O ESTADO DE RORAIMA APELADOS: MANVEL VEÍCULOS LTDA. E OUTROS RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA EMENTA EXECUÇÃO FISCAL – PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – APELAÇÃO CÍVEL – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. É possível a decretação de ofício da prescrição intercorrente, na forma do § 4.º do art. 40 da LEF e do § 5º. do art. 219 do CPC. 2. A nova redação do inc. I do parágrafo único do art. 174 do CTN não pode ser aplicada aos fatos anteriores a sua vigência, porque a L. C. F. n.º 118/2005 não tem efeito retroativo. 3. No caso concreto, para a Executada AIDA PENHA DOS SANTOS RIBEIRO o prazo prescricional transcorreu antes de sua citação por edital, e, quanto aos demais, a prescrição intercorrente ocorreu no período entre a citação pessoal e a sentença. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores, integrantes da Turma Cível da Câmara Única do Tribunal de Justiça de Roraima, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso nos termos do voto do Relator, que integra este julgado. Sala das Sessões, em Boa Vista, 12 de fevereiro de 2008. Des. CARLOS HENRIQUES Presidente Des. JOSÉ PEDRO Julgador Des. ALMIRO PADILHA Relator Publicado no Diário do Poder Judiciário, ANO X - EDIÇÃO 3792, Boa Vista-RR, 27 de fevereiro de 2008, p. 02. ( : 12/02/2008 , : , : 0 ,

Data do Julgamento : 12/02/2008
Data da Publicação : 27/02/2008
Classe/Assunto : Apelação Cível )
Relator(a) : DES. ALMIRO PADILHA
Tipo : Acórdão
Mostrar discussão