TJRR 10080098733
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008009873-3
APELANTE: BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A
APELADO: DJACIR RAIMUNDO DE SOUSA
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito da 5ª. Vara Cível da Comarca de Boa Vista, na Ação Ordinária nº 01006136298-3, que julgou procedente o pedido para: “... a) vedar a capitalização de juros nos contratos mencionados nesta ação; b) limitar os juros remuneratórios a 2% ao mês; c) condenar o réu a restituir ao autor o valor recebido indevidamente ...” (fl.114).
Consta nos autos que o Autor realizou quatro empréstimos com o Banco Sudameris Brasil S/A/Réu, nos quais, segundo aquele, foram aplicadas taxas de juros abusivas e realizadas capitalizações ilegais, o que o motivou a requerer judicialmente a revisão das cláusulas contratuais e a repetição do indébito.
O Apelante sustenta, em suma, que: a) o Requerente não provou a abusividade nas taxas de juros previstas nos seus contratos; b) os juros foram ponderados e estão abaixo da média daquelas aplicadas pelo mercado; c) ações revisionais como esta contribuem apenas para elevar o spread bancário; d) “...o fator determinante para a diminuição da taxa de juros é o risco, quanto menor o risco, menor será a taxa de juros praticada nos contratos...” (fl.125).
Requer, ao final, o conhecimento e provimento do apelo, para reformar integralmente a sentença recorrida.
O recurso foi recebido em seu duplo efeito (fl. 130).
O Apelado afirma, nas contra-razões, que: a) o Código de Defesa do Consumidor aplica-se perfeitamente ao caso (Súmula 297 do STJ); b) “... a legislação a ser aplicada in casu, é a antiga redação do art. 192, §3º de nossa Lex Mater”(fl.136); c) a cláusula que estabelece a capitalização mensal dos juros deve ser declarada nula (Súmula 121 do STF); c) a comissão de permanência não se constitui em juros remuneratórios ou compensatórios (Súmula 30 do STJ).
Pugna pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
Encaminhem-se os autos ao Revisor.
Boa Vista – RR, 14 de maio de 2008.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº. 001008009873-3
APELANTE: BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A
APELADO: DJACIR RAIMUNDO DE SOUSA
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
VOTO
O cerne deste recurso é analisar a abusividade, ou não, dos juros aplicados nos contratos de financiamentos firmados entre o Autor e o Banco Sudameris Brasil S/A.
O Juiz a quo julgou procedente o pedido autoral, limitou os juros remuneratórios no percentual de 2% ao mês (24% a.a.) e condenou o Réu a restituir os valores pagos indevidamente.
O Apelante, em sua primeira alegação, diz que o Autor não apresentou provas demonstrando a abusividade dos juros aplicados nos seus contratos de financiamento.
Ocorre que o pedido de inversão do ônus da prova foi deferido (despacho de fl. 69), ficando a cargo do Réu comprovar a insubsistência dos pedidos do Autor.
Entretanto, a única prova apresentada por ele foi a perícia contábil às fls.91/101, em que consta unicamente os cálculos dos juros utilizados nos contratos, à luz dos índices do IGP-M e INPC. Acredito que o perito restringiu-se a esse parâmetro, em razão das partes não ter apresentado os quesitos e indicado os assistentes técnicos, conforme solicitado no despacho de fl. 69.
Assim, a referida alegação do Apelante não persiste, tendo vista que a incumbência de apresentar provas sobre o direito em discussão passou a ser sua, o que não foi realizado.
Passo, então, a análise do percentual dos juros utilizados nos contratos em questão.
A aplicação do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras é indiscutível.
Pois bem.
O CDC obriga que todos os envolvidos na relação de consumo respeitem o princípio da boa-fé objetiva e não incluam em seus contratos cláusulas abusivas, entendidas como aquelas que ponham o consumidor em desvantagem em relação ao fornecedor. Essa é a disposição do inc. III do art. 4º. da L.F. nº. 8.078/90:
“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
[...]
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;”
A observância desse princípio, nos contratos de consumo, também vem sendo defendida pelos tribunais brasileiros, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça. Como exemplo, transcrevo jurisprudência:
“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIÇO DE TELEFONIA. COBRANÇA DE "ASSINATURA BÁSICA RESIDENCIAL". NATUREZA JURÍDICA: TARIFA. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. EXIGÊNCIA DE LICITAÇÃO. EDITAL DE DESESTATIZAÇÃO DAS EMPRESAS FEDERAIS DE TELECOMUNICAÇÕES MC/BNDES N. 01/98 CONTEMPLANDO A PERMISSÃO DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA. CONTRATO DE CONCESSÃO QUE AUTORIZA A MESMA EXIGÊNCIA. RESOLUÇÕES N. 42/04 E 85/98, DA ANATEL, ADMITINDO A COBRANÇA. DISPOSIÇÃO NA LEI N. 8.987/95. POLÍTICA TARIFÁRIA. LEI 9.472/97. AUSÊNCIA DE OFENSA A NORMAS E PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES DA CORTE ADMITINDO O PAGAMENTO DE TARIFA MÍNIMA EM CASOS DE FORNECIMENTO DE ÁGUA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO ARESTO A QUO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC REPELIDA. DESNECESSIDADE DA PRESENÇA DA ANATEL NA LIDE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ AFASTADA. LEGALIDADE DA COBRANÇA DA ASSINATURA BÁSICA DE TELEFONIA. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL.
[...]
22. O conceito de abusividade no Código de Defesa do Consumidor envolve cobrança ilícita, excessiva, possibilitadora de vantagem desproporcional e incompatível com os princípios da boa-fé e da eqüidade, valores negativos não presentes na situação em exame.
[...]”
(STJ, REsp 984.028/PB, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, 1ª. T., j. 06.11.2007, DJ 26.11.2007).
Constitucionalmente, a defesa do consumidor pelo Estado brasileiro reside principalmente no inc. V do art. 170 da CF que diz:
“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
V - defesa do consumidor;”
Diante disso, entendo que o art. 4º. da L.F. nº. 4.595/64, que estabelece que o Conselho Monetário Nacional limitará a taxa de juros, não pode ter efeitos sobre a própria Constituição Federal e demais normas infraconstitucionais brasileiras. Isso porque qualquer interpretação que afaste a obrigação estatal de proteger o consumidor é absolutamente inconstitucional.
No caso em análise, o Banco Sudameris Brasil S/A impôs ao consumidor-contratante as respectivas obrigações:
1º financiamento (fl.11): Valor: R$ 10.990,82.
Total de parcelas: 24
JUROS: 54,6483% a.a.
2º financiamento (fl.17): Valor: R$ 1.919,63.
Total de parcelas: 36
JUROS: 60,1032% a.a.
3º financiamento (fl.14): Valor: R$ 10.363,11.
Total de parcelas: 24
JUROS: 52,8682% a.a.
4º financiamento (fl.17): Valor: R$ 3.124,55.
Total de parcelas: 24
JUROS: 40,9238% a.a.
Ora, a abusividade dos juros utilizados nos respectivos financiamentos é visível.
Entretanto, essa é uma prática corriqueira de grande parte dos bancos do país. Isso ocorre porque são pouquíssimas as pessoas que possuem conhecimentos técnicos e informações sobre a situação financeira dos bancos, suficientes para perceber, de plano, se um percentual de juros é ou não abusivo.
Em decorrência disso, uma pessoa comum está sujeita a todos os tipos de abuso, restando-lhe apenas o socorro da L.F. nº. 8.078/90.
É verdade que o limite de 12% a.a., previsto na lei de usura não se aplica às instituições financeiras (Súmula 596 - STF). Contudo, isso não autoriza o desrespeito flagrante ao inc. V do art. 170 da Constituição Federal, liberando as instituições para fixarem juros compensatórios da forma que mais lhes favoreça, muitas vezes abusando da confiança e do pouco conhecimento do consumidor médio.
Como já disse, as regras do Código de Defesa do Consumidor são aplicadas a todas as relações de consumo, e é necessário sabermos qual limite, permitido pelo princípio da boa-fé, seria melhor para o consumidor e para a instituição.
O Superior Tribunal de Justiça admite a limitação dos juros quando houver demonstração cabal de que são excessivos. O que aquela Corte não permite é a aplicação, pura e simples, da Lei de Usura para isso (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 604.470/RS, Rel. Min. CASTRO FILHO, 3ª. T., j. 23.08.2007, DJ 10.09.2007 p. 225).
Assim, numa economia em que a inflação alcança menos de 1% (um por cento) ao mês, totalizando um percentual de, aproximadamente, 8% (oito por cento) ao ano, torna-se óbvio dizer que cobranças com juros de 40,9238% a 60,1032% a.a. são, evidentemente, abusivas.
Considerando tais circunstâncias, a conclusão do Juiz a quo não poderia ser outra senão a redução dos juros aplicados nos contratados em análise.
Por oportuno, faz bem ressaltar que este Tribunal, além de decidir pela redução dos juros bancários, vem fixando-os no percentual de 12% a.a., consoante acórdãos das AC 10070073043, AC 10070081137 e AC 10070090567. Ou seja, redução ainda superior ao reconhecido na sentença (24% a.a.).
Por essas razões, conheço e nego provimento ao recurso, mantendo íntegra a sentença.
É como voto.
Boa Vista, 03 de junho de 2008.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº. 001008009873-3
APELANTE: BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A
APELADO: DJACIR RAIMUNDO DE SOUSA
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
EMENTA
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULA CONTRATUAL – PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE – APELAÇÃO CÍVEL – POSSIBILIDADE DE REVISÃO DE CLÁUSULAS E DE INTERVENÇÃO ESTATAL SEMPRE EM PROL DO CONSUMIDOR, ASSEGURADA COMO UM DOS PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA BRASILEIRA – LIMITAÇÃO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS – OCORRÊNCIA EM CASO DE ABUSIVIDADE – PERCENTUAIS DE JUROS QUE VARIAVAM ENTRE 40,923% A 60,1032% AO ANO - EXCESSIVOS – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Colenda Câmara Única, integrantes da Turma Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Sala das Sessões da Câmara Única do E. TJRR, em Boa Vista - RR, 03 de junho de 2008.
Des. Carlos Henriques
Presidente
Des. Ricardo Oliveira
Julgador
Des. Almiro Padilha
Relator
Publicado no Diário do Poder Judiciário, ANO X - EDIÇÃO 3879, Boa Vista-RR, 09 de julho de 2008, p. 03.
( : 03/06/2008 ,
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Ementa
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008009873-3
APELANTE: BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A
APELADO: DJACIR RAIMUNDO DE SOUSA
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito da 5ª. Vara Cível da Comarca de Boa Vista, na Ação Ordinária nº 01006136298-3, que julgou procedente o pedido para: “... a) vedar a capitalização de juros nos contratos mencionados nesta ação; b) limitar os juros remuneratórios a 2% ao mês; c) condenar o réu a restituir ao autor o valor recebido indevidamente ...” (fl.114).
Consta nos autos que o Autor realizou quatro empréstimos com o Banco Sudameris Brasil S/A/Réu, nos quais, segundo aquele, foram aplicadas taxas de juros abusivas e realizadas capitalizações ilegais, o que o motivou a requerer judicialmente a revisão das cláusulas contratuais e a repetição do indébito.
O Apelante sustenta, em suma, que: a) o Requerente não provou a abusividade nas taxas de juros previstas nos seus contratos; b) os juros foram ponderados e estão abaixo da média daquelas aplicadas pelo mercado; c) ações revisionais como esta contribuem apenas para elevar o spread bancário; d) “...o fator determinante para a diminuição da taxa de juros é o risco, quanto menor o risco, menor será a taxa de juros praticada nos contratos...” (fl.125).
Requer, ao final, o conhecimento e provimento do apelo, para reformar integralmente a sentença recorrida.
O recurso foi recebido em seu duplo efeito (fl. 130).
O Apelado afirma, nas contra-razões, que: a) o Código de Defesa do Consumidor aplica-se perfeitamente ao caso (Súmula 297 do STJ); b) “... a legislação a ser aplicada in casu, é a antiga redação do art. 192, §3º de nossa Lex Mater”(fl.136); c) a cláusula que estabelece a capitalização mensal dos juros deve ser declarada nula (Súmula 121 do STF); c) a comissão de permanência não se constitui em juros remuneratórios ou compensatórios (Súmula 30 do STJ).
Pugna pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
Encaminhem-se os autos ao Revisor.
Boa Vista – RR, 14 de maio de 2008.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº. 001008009873-3
APELANTE: BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A
APELADO: DJACIR RAIMUNDO DE SOUSA
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
VOTO
O cerne deste recurso é analisar a abusividade, ou não, dos juros aplicados nos contratos de financiamentos firmados entre o Autor e o Banco Sudameris Brasil S/A.
O Juiz a quo julgou procedente o pedido autoral, limitou os juros remuneratórios no percentual de 2% ao mês (24% a.a.) e condenou o Réu a restituir os valores pagos indevidamente.
O Apelante, em sua primeira alegação, diz que o Autor não apresentou provas demonstrando a abusividade dos juros aplicados nos seus contratos de financiamento.
Ocorre que o pedido de inversão do ônus da prova foi deferido (despacho de fl. 69), ficando a cargo do Réu comprovar a insubsistência dos pedidos do Autor.
Entretanto, a única prova apresentada por ele foi a perícia contábil às fls.91/101, em que consta unicamente os cálculos dos juros utilizados nos contratos, à luz dos índices do IGP-M e INPC. Acredito que o perito restringiu-se a esse parâmetro, em razão das partes não ter apresentado os quesitos e indicado os assistentes técnicos, conforme solicitado no despacho de fl. 69.
Assim, a referida alegação do Apelante não persiste, tendo vista que a incumbência de apresentar provas sobre o direito em discussão passou a ser sua, o que não foi realizado.
Passo, então, a análise do percentual dos juros utilizados nos contratos em questão.
A aplicação do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras é indiscutível.
Pois bem.
O CDC obriga que todos os envolvidos na relação de consumo respeitem o princípio da boa-fé objetiva e não incluam em seus contratos cláusulas abusivas, entendidas como aquelas que ponham o consumidor em desvantagem em relação ao fornecedor. Essa é a disposição do inc. III do art. 4º. da L.F. nº. 8.078/90:
“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
[...]
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;”
A observância desse princípio, nos contratos de consumo, também vem sendo defendida pelos tribunais brasileiros, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça. Como exemplo, transcrevo jurisprudência:
“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIÇO DE TELEFONIA. COBRANÇA DE "ASSINATURA BÁSICA RESIDENCIAL". NATUREZA JURÍDICA: TARIFA. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. EXIGÊNCIA DE LICITAÇÃO. EDITAL DE DESESTATIZAÇÃO DAS EMPRESAS FEDERAIS DE TELECOMUNICAÇÕES MC/BNDES N. 01/98 CONTEMPLANDO A PERMISSÃO DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA. CONTRATO DE CONCESSÃO QUE AUTORIZA A MESMA EXIGÊNCIA. RESOLUÇÕES N. 42/04 E 85/98, DA ANATEL, ADMITINDO A COBRANÇA. DISPOSIÇÃO NA LEI N. 8.987/95. POLÍTICA TARIFÁRIA. LEI 9.472/97. AUSÊNCIA DE OFENSA A NORMAS E PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES DA CORTE ADMITINDO O PAGAMENTO DE TARIFA MÍNIMA EM CASOS DE FORNECIMENTO DE ÁGUA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO ARESTO A QUO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC REPELIDA. DESNECESSIDADE DA PRESENÇA DA ANATEL NA LIDE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ AFASTADA. LEGALIDADE DA COBRANÇA DA ASSINATURA BÁSICA DE TELEFONIA. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL.
[...]
22. O conceito de abusividade no Código de Defesa do Consumidor envolve cobrança ilícita, excessiva, possibilitadora de vantagem desproporcional e incompatível com os princípios da boa-fé e da eqüidade, valores negativos não presentes na situação em exame.
[...]”
(STJ, REsp 984.028/PB, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, 1ª. T., j. 06.11.2007, DJ 26.11.2007).
Constitucionalmente, a defesa do consumidor pelo Estado brasileiro reside principalmente no inc. V do art. 170 da CF que diz:
“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
V - defesa do consumidor;”
Diante disso, entendo que o art. 4º. da L.F. nº. 4.595/64, que estabelece que o Conselho Monetário Nacional limitará a taxa de juros, não pode ter efeitos sobre a própria Constituição Federal e demais normas infraconstitucionais brasileiras. Isso porque qualquer interpretação que afaste a obrigação estatal de proteger o consumidor é absolutamente inconstitucional.
No caso em análise, o Banco Sudameris Brasil S/A impôs ao consumidor-contratante as respectivas obrigações:
1º financiamento (fl.11): Valor: R$ 10.990,82.
Total de parcelas: 24
JUROS: 54,6483% a.a.
2º financiamento (fl.17): Valor: R$ 1.919,63.
Total de parcelas: 36
JUROS: 60,1032% a.a.
3º financiamento (fl.14): Valor: R$ 10.363,11.
Total de parcelas: 24
JUROS: 52,8682% a.a.
4º financiamento (fl.17): Valor: R$ 3.124,55.
Total de parcelas: 24
JUROS: 40,9238% a.a.
Ora, a abusividade dos juros utilizados nos respectivos financiamentos é visível.
Entretanto, essa é uma prática corriqueira de grande parte dos bancos do país. Isso ocorre porque são pouquíssimas as pessoas que possuem conhecimentos técnicos e informações sobre a situação financeira dos bancos, suficientes para perceber, de plano, se um percentual de juros é ou não abusivo.
Em decorrência disso, uma pessoa comum está sujeita a todos os tipos de abuso, restando-lhe apenas o socorro da L.F. nº. 8.078/90.
É verdade que o limite de 12% a.a., previsto na lei de usura não se aplica às instituições financeiras (Súmula 596 - STF). Contudo, isso não autoriza o desrespeito flagrante ao inc. V do art. 170 da Constituição Federal, liberando as instituições para fixarem juros compensatórios da forma que mais lhes favoreça, muitas vezes abusando da confiança e do pouco conhecimento do consumidor médio.
Como já disse, as regras do Código de Defesa do Consumidor são aplicadas a todas as relações de consumo, e é necessário sabermos qual limite, permitido pelo princípio da boa-fé, seria melhor para o consumidor e para a instituição.
O Superior Tribunal de Justiça admite a limitação dos juros quando houver demonstração cabal de que são excessivos. O que aquela Corte não permite é a aplicação, pura e simples, da Lei de Usura para isso (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 604.470/RS, Rel. Min. CASTRO FILHO, 3ª. T., j. 23.08.2007, DJ 10.09.2007 p. 225).
Assim, numa economia em que a inflação alcança menos de 1% (um por cento) ao mês, totalizando um percentual de, aproximadamente, 8% (oito por cento) ao ano, torna-se óbvio dizer que cobranças com juros de 40,9238% a 60,1032% a.a. são, evidentemente, abusivas.
Considerando tais circunstâncias, a conclusão do Juiz a quo não poderia ser outra senão a redução dos juros aplicados nos contratados em análise.
Por oportuno, faz bem ressaltar que este Tribunal, além de decidir pela redução dos juros bancários, vem fixando-os no percentual de 12% a.a., consoante acórdãos das AC 10070073043, AC 10070081137 e AC 10070090567. Ou seja, redução ainda superior ao reconhecido na sentença (24% a.a.).
Por essas razões, conheço e nego provimento ao recurso, mantendo íntegra a sentença.
É como voto.
Boa Vista, 03 de junho de 2008.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº. 001008009873-3
APELANTE: BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A
APELADO: DJACIR RAIMUNDO DE SOUSA
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
EMENTA
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULA CONTRATUAL – PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE – APELAÇÃO CÍVEL – POSSIBILIDADE DE REVISÃO DE CLÁUSULAS E DE INTERVENÇÃO ESTATAL SEMPRE EM PROL DO CONSUMIDOR, ASSEGURADA COMO UM DOS PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA BRASILEIRA – LIMITAÇÃO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS – OCORRÊNCIA EM CASO DE ABUSIVIDADE – PERCENTUAIS DE JUROS QUE VARIAVAM ENTRE 40,923% A 60,1032% AO ANO - EXCESSIVOS – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Colenda Câmara Única, integrantes da Turma Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Sala das Sessões da Câmara Única do E. TJRR, em Boa Vista - RR, 03 de junho de 2008.
Des. Carlos Henriques
Presidente
Des. Ricardo Oliveira
Julgador
Des. Almiro Padilha
Relator
Publicado no Diário do Poder Judiciário, ANO X - EDIÇÃO 3879, Boa Vista-RR, 09 de julho de 2008, p. 03.
( : 03/06/2008 ,
: ,
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Data do Julgamento
:
03/06/2008
Data da Publicação
:
09/07/2008
Classe/Assunto
:
Apelação Cível )
Relator(a)
:
DES. ALMIRO PADILHA
Tipo
:
Acórdão
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