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Jurisprudência


TJRR 10080101107

Ementa
CAMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL Nº 010.08.010110-7/Boa Vista Apelantes: Alex de Souza Bezerra e Kátia Pereira de Souza Defensor: Dr. Rogenilton Ferreira Gomes (DPE) Apelado: Ministério Público Estadual RELATÓRIO Trata-se de apelação criminal interposta por Alex de Souza Bezerra e Kátia Pereira de Souza às fls. 269/281, em contrariedade à sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Boa Vista, às fls.213/238, que os condenou pela prática prevista no art. 12, “caput” da Lei nº 6.368/1976, aplicando ao primeiro apelante a pena privativa de liberdade de 05 (cinco) anos e 03 (três) meses de reclusão e 75 (setenta e cinco) dias-multa, e à segunda, a pena de 02 (dois) anos de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa. Às fls. 269/281, a Defesa apresentou as razões recursais em que alega que a condenação baseou-se em conjunto probatório frágil, alicerçado somente no depoimento dos policiais, inexistindo qualquer prova concreta da prática de tráfico por parte dos acusados. Sustentam os recorrentes que a pequena quantidade da droga encontrada -13,7g. (treze gramas e sete decigramas de cocaína) não se destinava à comercialização, mas sim ao consumo pessoal do apelante Alex, o qual assume a propriedade do entorpecente por ser usuário desde os 12 anos de idade, razão pela qual a defesa pugna pela reforma da sentença condenatória, devendo, em relação ao acusado Alex, ser promovida a desclassificação do delito de tráfico para o de uso de substância entorpecente, previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006. Alternativamente, pleiteou a redução da reprimenda, tendo em vista a pequena quantidade encontrada em seu poder. Em relação à ré Kátia, a defesa pleiteia a sua absolvição, por ausência de qualquer prova que demonstre a prática delituosa. Em contra-razões, a representante do Ministério Público de primeiro grau pugnou às fls. 283/288 pela manutenção do decisum, asseverando que a prática de tráfico encontra respaldo nos contexto probatório contido nos autos, mormente pelos depoimentos dos policiais que efetuaram a prisão em flagrante dos acusados. Parecer da douta Procuradoria de Justiça às fls. 290/294 pelo conhecimento e provimento parcial da apelação, isto é, somente quanto ao pedido de concessão do benefício da justiça gratuita aos recorrentes, porém, quanto ao mérito, opina pela manutenção integral da sentença de primeiro grau. Com o relatório, vista ao eminente desembargador-revisor, nos termos do art. 178, II do Regimento Interno. Boa Vista, 1º de julho de 2009. Des. Mauro Campello Relator CAMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL Nº 010.08.010110-7/Boa Vista Apelantes: Alex de Souza Bezerra e Kátia Pereira de Souza Defensor: Dr. Rogenilton Ferreira Gomes (DPE) Apelado: Ministério Público Estadual Relator: Des. Mauro Campello VOTO Em 28 de setembro de 2006, o Ministério Público Estadual ofereceu denúncia em desfavor dos ora apelantes Alex de Souza Bezerra e Kátia Pereira de Souza, dando-os como incursos nas sanções do art. 12, “caput” c/c art. 18, III, ambos da Lei nº 6.368/76. Narra a peça acusatória, em síntese, que em 11 de agosto de 2006, por volta das 10 horas, os acusados foram presos em flagrante por manterem em depósito, na residência da apelante Kátia, (genitora de Alex) um invólucro contendo 13,7 (treze gramas e sete decigramas) de cocaína, substância de uso proscrito em todo Território Nacional por causar dependência física e/ou psíquica de acordo com a porta ria de nº 344/98, de DIMED/MS. Consta da exordial que os policiais vinham investigando o paradeiro de Alex, foragido do Sistema Prisional deste Estado, e encontraram-no abrigado na residência de Kátia, ambos apelantes nestes autos. Segundo descreve a denúncia, foram encontrados aparelhos eletrônicos e celulares na residência dos acusados, o que levou os policiais a suspeitarem que tais objetos seriam resultado de permuta com eventuais usuários de drogas. Conforme relata a denúncia, a droga apreendida foi encontrada dentro de um tijolo, por indicação de Kátia, sendo que Alex assumiu ser o proprietário da substância entorpecente, afirmando que a mesma era destinada ao seu consumo. Auto de apresentação e apreensão encontra-se às fls. 14/15; Antecedentes Criminais da Justiça Estadual do réu Alex de Souza Bezerra repousam às fls. 57/59 e 73/75 e 102, e os da ré Kátia Pereira de Souza estão às fls. 60 e 64. Audiência de Instrução e Julgamento realizada em 05/02/2007 com interrogatório dos réus e oitiva das testemunhas Celso Pires Lima (degravação fls. 162/170), Alex San Cley Moura dos Santos (degravação fls. 170/176), Euzinete Alves do Nascimento (degravação fls. 176/180). Laudo de exame definitivo em substância às fls. 185/188. Alegações Finais do Ministério Público às fls. 190/196 e pela Defensoria Pública às fls. 198/210. Concluída a instrução processual, foi reconhecida pelo MM. Juiz a quo a procedência parcial da acusação, sendo proferida sentença às fls. 213/238 condenando os apelantes nas sanções do art. 12 da Lei nº 6.368/76, cabendo ao réu Alex de Souza Bezerra a pena de 05 (cinco) anos e 03 (três) meses de reclusão, além de 75 (setenta e cinco) dias-multa, imputando-se à segunda apelante a pena de 02 (dois) anos de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa. Não houve interposição de recurso por parte do Ministério Público. Os apelantes, através da Defensoria Pública Estadual, pugnam pela reforma da sentença, visando a desclassificação do delito atribuído ao réu Alex, (de tráfico para uso de substância entorpecente).Alternativamente, postulam a diminuição da pena cominada. Pleiteia-se em relação à apelante Kátia, a sua absolvição, por fragilidade do conjunto probatório, devendo ser aplicado o princípio in dubio pro reo. Por fim, a Defesa requer os benefícios da Justiça Gratuita, uma vez que os apelantes não dispõem de recursos para arcar com o pagamento de custas sem prejuízo do próprio sustento. Inicialmente, quanto ao pedido de concessão dos benefícios da Justiça Gratuita, defiro o pleito formulado pela Defesa uma vez que os acusados vêm sendo assistidos desde o início do processo pela nobre Defensoria Pública Estadual, havendo manifestação de que não estão em condições de prover as custas processuais sem prejuízo do próprio sustento. Quanto ao mérito, da análise detida dos elementos contidos nos autos, entendo que merece provimento a presente apelação, devendo ser reformada a r. decisão a quo. No que concerne à materialidade, esta pode ser constatada pelo auto de apreensão de fl. 14/15; laudo de exame preliminar toxicológico de fl. 47 e, mormente, pelo laudo toxicológico definitivo de fls.185/188. Consoante se observa do referido laudo definitivo, foi analisado o seguinte material: "0,8g (oito decigramas) - conteúdo líquido - de substância pulverulenta, de coloração esbranquiçada, acondicionada em envelope identificado, lacrado e rubricado. (...) Procedidas as análises, clássicas e instrumental, realizadas na substância recebida revelaram a presença do alcalóide COCAÍNA.". Todavia, quanto à autoria da prática de tráfico, não se vislumbra do conjunto probatório carreado aos autos, os elementos de convicção suficientes para confirmar o decreto condenatório. Em relação inicialmente ao apelante Alex, tenho que a autoria do delito de tráfico não restou claramente definida nas provas produzidas nos autos. Verifico que o acusado, ao ser citado nos termos da acusação, confessou que a droga apreendida (13,7g) era sua, e que esta se destinava ao seu consumo pessoal, afirmando ser usuário de drogas desde os 12 anos de idade. Analisemos alguns trechos de seu interrogatório em Juízo, conforme degravação contida às fls. 148/180. P: O senhor já foi preso e processado anteriormente? R: Eu nuca fui condenado não, mas já fui preso P: Estava preso? R: No 155. P: Conforme relatos da denúncia, o senhor teria sido preso realmente com essa droga. Quantos gramas eram? R: Eu tinha pego treze gramas, mas não era esse total não. P: O senhor pegou com quem, o senhor se recorda? R: Lá no Beiral. P: E o senhor pegou essa droga pra que? R: Pra mim fumar mesmo. P: Pro senhor fumar? R: Ã-hã. Sou usuário de droga. P: E a dona Kátia? R: Minha mãe não tem nada a ver não. P: O que ela é sua? R: É minha mãe. P: Foi na mesma casa que o senhor estava? R: Foi na mesma casa. P: Ela sabia que ...? R: Ela sabe que eu sou usuário. Mas não sabia que eu tava com essa droga lá não. P: O que o senhor disse para o delegado? R: Eu falei pro delegado que eu queria ir pro interior. Que ia levar o resto da droga pro interior, mas não era pra vender não, era pra mim fumar no interior a droga. Falei pra ele. Falei pra ele que a droga era minha, que minha mãe não tinha nada a ver e soltaram minha mãe, lá no 3º o delegado liberou minha mãe. P:Qual o bairro que você mora? R: Santa Tereza. P: Tem boca de fumo lá perto? R: Tem várias. P: Eles apreenderam linha na sua casa também? R: Tinha linha lá no quarto da minha mãe lá. P: E esse plástico foi apreendido no quintal? R: No quintal. P: E essa droga foi apreendida dentro da casa? R: Foi achada dentro do meu bolso. Eu tava dormindo na hora que eles chegaram, aí me revistaram e acharam a droga. Aí tinha um pouquinho que eu tinha coisado pra mim fumar, que eu esqueci lá no buraco do tijolo, eles acharam também. P: Como é que fuma isso? R: Mistura com cigarro, com maconha e faz o cigarro. P: Quantas pessoas tinham na casa quando o senhor foi preso? R: Tava o meu irmão, meu irmão pequeno que tem nove meses, meu irmão de três anos, meu irmão de dezessete, uma menina que tava andando comigo, e as filhas do meu primo que tava lá. P: Como é que tava esse plástico que a polícia pegou lá fora? R: Era um plástico de lixo que tava lá jogado. P: Apreenderam dinheiro lá também? R: Não, dinheiro não pegaram não. P: O senhor ajudou a vender a droga desse amigo que o senhor ajudou a embalar? R: Ele dava pra mim fumar, mas eu não vendia não. P: E sua mãe, disse o que lá na hora pra polícia? R: Falou que a droga era minha que não sabia que tava comigo. Aí o delegado foi e liberou ela lá do 3º, falou que ela ia ficar como testemunha de mim. P: Ela disse realmente que “o entorpecente que foi apreendido foi comprado por Alex pra ser revendido no interior do estado”? R: Não. P: A sua mãe falou isso pro delegado? R: Não tinha como vender que eu não conhecia quase ninguém lá no estado. P: Sua mãe chegou a indicar para os policiais onde estaria guardado a outra quantidade de drogas? R: Não. P: O senhor já respondeu processo por droga ou essa é a primeira vez? R: Eu tenho 16 (uso). Quando eu era de menor. P: Você disse que já tem um 16, quando era de menor? R: Tenho. P: Com que idade você começou a usar droga? R: Acho que com 12 anos. P: E você já procurou algum tratamento, alguma clínica? R: Eu freqüentava a SEMDES. Fazia reunião lá, de droga lá, eu ia lá direto. Todo dia eu ia pra lá. P: Esse 155 que você responde, você estava furtando pra comprar droga? R: É, pra comprar droga. P: Os policiais chegaram ali por que tiveram alguma denúncia por que ali você estava vendendo droga ou foram pra te recapturar? R: Foram pra me capturar, por que o vizinho me viu lá e meu denunciou. Tem raiva de mim lá e me viu, aí descobriu que eu tava foragido e denunciou. P: Então os policiais que te prenderam foi da captura? R: Foi da captura. P: Não foi da entorpecentes? R: Não, não. P: Aí na revista que encontraram? R: Na revista encontraram. P: Qual a droga que encontraram primeiro, a que estava com o senhor ou a que estava no muro? R: A que estava comigo. Acharam no meu bolso primeiro, aí foram lá revirar tudo e encontraram no buraco do muro, aí acharam esse pouquinho que estava lá. Como é cediço, embora se reconheça que a negativa, ou mesmo a tentativa de assunção, de crime de menor monta seja uma prática comum, cumpre ao órgão acusador demonstrar de forma convincente os fatos delituosos narrados na denúncia, mormente tendo em conta, como ocorre no presente caso, a diferença entre os delitos em questão (tráfico e uso), tanto no que se refere às suas sanções, a severidade da pena cominada, como em relação às conseqüências da aplicação desta aos acusados, razões pelas quais, é sempre válido lembrar que a simples existência de indícios não é suficiente para embasar um decreto condenatório, sendo necessária, pois, a existência de conjunto probatório seguro para dar ensejo à condenação. Neste sentido, a meu ver, as provas amealhadas aos autos não são robustas o suficiente para caracterizar o delito de tráfico, seja pela quantidade apreendida (13,7g), seja pela incerteza e contradição demonstrada nos depoimentos dos policiais que efetuaram o flagrante, seja também pela ausência de qualquer outro depoimento testemunhal (de algum usuário, por exemplo) que confirme a ter comprado material entorpecente no endereço em questão. Às fls. 163/164, na degravação do depoimento prestado em Juízo pelo policial Celso Pires Lima constata-se que o mesmo presta seu depoimento usando o vocábulo “parece”, ou seja, sem a necessária convicção, ora afirmando que o local era freqüentado por pessoas que faziam uso e compravam droga, ora relatando que o ponto destinava-se somente ao consumo de drogas, senão vejamos: P: Já era conhecido da polícia ali o local, como ponto de droga? R: Já, por que a gente tinha ido várias vezes atrás do Alex e as pessoas que freqüentavam a casa disseram que ali já era bastante conhecido e a variedade de papelotes encontrados lá, parece (grifei) que eles compravam lá e lá mesmo eles fumavam, os companheiros do Alex e as pessoas que iam visitar lá. P: Era local de uso de droga também? R: Isso, isso. P: O Alex era usuário também? R: Usuário. P: Mas ele chegou a falar? R: Sim, a gente já sabe por que conforme a investigação foi correndo e as pessoas que a gente perguntava eram drogados também e diziam ‘não, eu tive ontem com o Alex lá na casa dele, fumando com ele. Ele ta lá, ele ta lá’ P: E essa pessoa que falava que havia estado fumando, falava que comprava também? R: Não. Só dizia que fumava lá com ele. (grifei) Lá na casa do Alex. P: Ele chegou a afirmar que ele ia vender parte dessa droga? R: Não senhor. Só dei meu depoimento e fui embora. P: O senhor disse que achou um monte de plástico cortado no quintal? R: Sim, não, os plásticos já eram aqueles de uso, aqueles pára-quedas, já usados. Então na fissura, eles usavam e jogavam, eram bastantes, muitos. Neste mesmo sentido é o depoimento do agente policial Alex San Cley Moura dos Santos à fl. 277: P: No quintal havia alguma coisa jogada? R: Só vestígio de que alguém usou droga ali, que era, nós chamamos na linguagem policial ‘pára-quedas’é o saquinho plástico só’. A testemunha Euzinete Alves do Nascimento, vizinha da acusada Kátia, às fls. 176/179, da mesma forma, declarou em Juízo desconhecer a existência de tráfico no local: P: a senhora é vizinha deles? R: Moro na mesma rua. P: A quantos anos a senhora mora nessa rua? R: Eu tô sete anos nessa rua. P: Tem informação se na casa ali eles vendiam drogas? R: Não, não vendiam de jeito nenhum. P: A senhora tem informação se a dona Kátia usava drogas, ela e o filho dela? R: Não, só o filho. P: Só o filho usava? R: Isso. P: E quando a senhora ficava de tardezinha lá na casa, não via ninguém estranho entrar e sair lá da casa não? R: De jeito nenhum. P: Não tinha festa lá, churrasquinho de noite, essas coisas assim? R: Não, não. Ou seja, da análise dos depoimentos colacionados, constata-se que o Ministério Público não logrou êxito em trazer aos autos sequer um depoimento que confirmasse seguramente a prática de tráfico naquele endereço, através da informação, por exemplo, de usuários que ratificassem a aquisição de drogas no local. O que há, salvo melhor juízo, são tão-somente, suspeitas, coletadas unicamente dos depoimentos policiais que faziam parte da equipe de capturas, quanto à prática de tráfico no local, inexistindo provas decisivas e suficientes quanto à prática deste crime. Desta forma, o que se depreende dos depoimentos é que o local era ponto de consumo de droga, fato que é admitido pelo próprio apelante Alex, conforme transcrito acima. Assim também, observo que os vestígios encontrados, e dados como indicativos da prática de tráfico, como linha, tesoura e sacos plásticos vazios, bem como aparelhos celulares, não podem ser tidos como suficientes para caracterizar tal delito, uma vez que são encontrados em qualquer residência, não encontrando esteio em outros subsídios para formar o necessário juízo de convicção quanto ao tráfico. Outrossim, verifico também que, além da pequena quantidade de entorpecente encontrada na residência da acusada Kátia -13,7g de cocaína - , não foi encontrada qualquer importância pecuniária com o apelante Alex que pudesse servir de indicativo de que teria sido aferida com o comércio de entorpecentes, amoldando-se os fatos mais adequadamente, como característicos de uso de entorpecente. Neste sentido, considero que presumir que o apelado estaria praticando uma das condutas previstas no tipo penal de tráfico de entorpecentes seria ferir o princípio da presunção da inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, violando também um dos princípios que regem o direito penal, qual seja o in dubio pro reo. A propósito, trago à baila os seguintes acórdãos pela imposição da desclassificação quando frágil a prova da prática do delito do artigo 12, da lei 6.368/76: "TÓXICOS - TRÁFICO - DÚVIDA SOBRE A FINALIDADE DA DROGA APREENDIDA EM PODER DO RÉU - DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO - ADMISSIBILIDADE - Inexistindo prova de comercialização da substância tóxica encontrada em poder do réu, e sendo ele confessadamente viciado, impõe-se a desclassificação do delito para o artigo 16 da Lei n. 6.368/76, em obediência ao princípio do ´in dubio pro reo´, especialmente se pequena a quantidade apreendida - Recurso conhecido e parcialmente provido". (Apelação Criminal n. 1.0525.00.004093-7/001 - Comarca de Pouso Alegre - Primeira Câmara Criminal do TJMG - unânime - Relator: DES. GUDESTEU BIBER - Data do Julgamento: 11/05/2004). "APELAÇÃO CRIMINAL - TÓXICOS - TRÁFICO - PROVAS - MEROS INDÍCIOS - FRAGILIDADE - DESCLASSIFICAÇÃO - POSSIBILIDADE - PORTE PARA USO - CONFISSÃO. ´Indícios, ainda que veementes, não bastam por si só à prolação de decreto condenatório, sendo indispensável a tal desiderato a certeza da responsabilidade penal´ (RT 565/380). Diante da incerteza do tráfico e, em sendo confessado o delito de porte para uso, impõe-se a desclassificação delitiva do art. 12 para o art. 16 da Lei 6.368/76, como forma de implementar a máxima ´in dubio pro reo´. Em sendo vedada a possibilidade de adoção do princípio da responsabilidade penal objetiva, impõe-se a solução desclassificatória quando a prova produzida nos autos for insuficiente para determinar a autoria delitiva pelo tráfico e restar suficiente para embasar condenação pela prática de porte para uso de substância entorpecente. Recurso da defesa a que se dá provimento, restando prejudicado o recurso do Ministério Público". (Apelação Criminal n. 1.0693.03.018329-9/001 - Comarca de Três Corações - Primeira Câmara Criminal do TJMG - unânime - Relator: DES. TIBAGY SALLES - Data do Julgamento: 06/04/2004). Deste modo, existindo, ao menos, dúvidas acerca da finalidade da droga encontrada e confessando o réu a propriedade da substância para o uso próprio, deve o mesmo ser condenado nas sanções do artigo 28, da Lei nº 11 343/2006, em atenção ao princípio in dubio pro reo. Quanto à apelante Kátia, em relação à informação de que esta teria indicado onde estaria a droga, tal fato foi negado por ambos os apelantes, podendo-se notar certa contradição nos depoimentos dos agentes policiais, uma vez que a testemunha Celso Pires de Lima, um dos policiais que efetuou o flagrante, afirmou que Kátia teria apontado para um tijolo em que estava guardada a droga, enquanto que o outro policial, Alex San Cley, relatou que a droga foi encontrada após revista feita pelos próprios agentes no local. Vejamos: P: Quem disse pro senhor que estava dentro do tijolo? R: Foi ela. No momento ela negou, e eu falei pra ela que eu iria procurar e iria encontrar por que eu tinha certeza que ali existia droga, que a atitude que ela tinha tomado foi pra esconder a droga, que ali existia droga, aí eu falei pra ela ‘você quer que eu encontre, ou você vai me mostrar a droga?’, aí ela baixou a cabeça e levantou e eu disse ‘cadê a droga?’, aí ela apontou para o tijolo.” (depoimento do agente Celso Pires de Lima – degravação fl.165) Por sua vez, às fls. 170/171, o agente Alex San Cley assim relatou os fatos “Nós recebemos uma denúncia que o acusado Alex, ele tinha fugido um dia antes da Penitenciária, daí, no outro dia nós recebemos uma denúncia que ele estaria nessa casa. Nos dirigimos até lá e quando chegamos, a mãe dele ficou um pouco nervosa com a nossa presença. Perguntamos onde o acusado tava, o foragido no caso, ela disse que tava dormindo. Nós pedimos para adentrar a casa dela e constatamos que o mesmo estava dormindo. Tava dormindo ele, tinha uma garota com ele, acho que era namorada, e mais o irmão dele menor. Como já saímos com ele já algemado, a mãe dele correu pra dentro de um quarto que fica separado um pouco da casa, fica grudado na casa, mas só que pelo lado de fora. Ela correu pra dentro e o colega, o Celso, achou estranho e pediu que ela saísse. Ela demorou um pouco pra sair do quarto. Quando ela saiu ela ficou mais nervosa ainda. Daí então ele pediu pra eu revistar juntamente com ele e ficou um colega no carro, ficou mais um colega fora desse quarto e nós dois entramos. Quando nós entramos, a primeira coisa que ele viu foi um tijolo no cantinho da parede, ele levantou o tijolo e tava uma trouxinhas. Então nós resolvemos fazer uma revista geral no quarto, foi quando encontramos telefone celular, encontramos linha pra enrolar trouxinhas ... P: Ela acompanhou essa diligência que vocês ...? R: Acompanhou. P: E o acusado Alex, estava aonde? R: O acusado Alex estava algemado do lado de fora do quarto, só ela. P: Ela viu na hora que vocês acharam a droga dentro do tijolo? R:Viu, viu. P:O que ela falou? R: Ela falou que não era dela, que era do filho dela P: Ela falou pra quê que era essa droga? R: Não, não falou pra quê que era.” Vê-se, portanto, que os depoimentos não se apresentam com a necessária harmonia para sustentar a condenação, eis que no primeiro é relatado que a acusada Kátia teria indicado onde estava a droga, enquanto que no segundo, consta que esta foi apreendida após revistas dos policiais. Diante do exposto, tenho que é cabível tanto a desclassificação do crime de tráfico atribuído ao apelante Alex, para o de uso de substância entorpecente, previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006, bem como a absolvição da apelante Kátia, uma vez que não se demonstrou inequivocamente a participação desta na prática ilícita, devendo ser aplicado ao caso presente o princípio in dubio pro reo. Sobre o tema, o renomado Guilherme de Souza Nucci assinala: “Na relação processual, em caso de conflito entre a inocência do réu – e sua liberdade – e o direito-dever do Estado de punir, havendo dúvida razoável, deve o juiz decidir em favor do acusado. Exemplo disso está na previsão de absolvição quando não existir prova suficiente da imputação formulada (art. 386, VI, CPP). Por outro lado, quando dispositivos processuais penais forem interpretados, apresentando dúvida razoável quanto ao seu real alcance e sentido, deve-se optar pela versão mais favorável ao acusado, que como já se frisou , é presumido inocente até que se demonstre o contrário”. (in Manual de Processo e Execução Penal, São Paulo – Ed. Revista dos Tribunais, 2005, p. 78) ISTO POSTO, em dissonância com o douto parecer ministerial, dou provimento integral ao presente apelo, de modo a desclassificar o delito de tráfico ilícito de entorpecentes atribuído ao acusado Alex de Souza Bezerra, para aquele previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006, bem como absolvo a apelante Kátia Pereira de Souza do crime atribuído na sentença a quo, deferindo ainda os benefícios da Justiça Gratuita requeridos pela Defesa. Expeça-se o competente alvará de soltura em favor somente do apelante Alex de Souza Bezerra, salvo se por outro motivo deva permanecer preso, tendo em vista que a apelante Kátia encontra-se solta conforme se constata na r. sentença a quo à fl. 236. É como voto. Boa Vista, 21 de julho de 2009. Des. Mauro Campello Relator CAMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL Nº 010.08.010110-7/Boa Vista Apelantes: Alex de Souza Bezerra e Kátia Pereira de Souza Defensor: Dr. Rogenilton Ferreira Gomes (DPE) Apelado: Ministério Público Estadual Relator: Des. Mauro Campello EMENTA APELAÇÃO CRIMINAL – ART. 12 DA LEI Nº 6.368/76 - QUANTIDADE DE DROGA MAIS COMPATÍVEL AO DELITO DE USO –FRAGILIDADE DE PROVAS QUANTO À TRAFICÂNCIA - DESCLASSIFICAÇÃO OPERADA EM RELAÇÃO AO PRIMEIRO APELANTE, E ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO À SEGUNDA - APELAÇÃO PROVIDA 1- O pedido de desclassificação para o crime de uso próprio de entorpecente merece prosperar, uma vez que a decisão de primeiro grau não está calcada em elementos seguros de convicção quanto à mercancia da droga apreendida. 2- Não havendo prova cabal no sentido de demonstrar a participação dos réus na prática ilícita de tráfico de entorpecentes, é de rigor a aplicação do princípio "in dubio pro reo", uma vez que um decreto condenatório não pode se basear em mera probabilidade e indícios. 3- Apelação provida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros da Câmara Única, Turma Criminal, do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em dissonância com o Parquet, em julgar procedente a presente apelação criminal, nos termos do voto do relator, que integra este julgado. Sala das sessões do egrégio Tribunal de Justiça de Roraima, aos vinte e um dias do mês de julho de 2009. Des. Mauro Campello – Presidente e Relator Des. Lupercino Nogueira– Julgador Des. Ricardo Oliveira - Julgador Ministério Público Estadual Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XII - EDIÇÃO 4129, Boa Vista, 31 de julho de 2009, p. 031. ( : 21/07/2009 , : XII , : 31 ,

Data do Julgamento : 21/07/2009
Data da Publicação : 31/07/2009
Classe/Assunto : Apelação Criminal )
Relator(a) : DES. MAURO JOSE DO NASCIMENTO CAMPELLO
Tipo : Acórdão
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